O filho de Érico Veríssimo escreveu uma crônica na qual fez piada, com sua veia humorística latejando com o sangue da ironia, para desqualificar quem receia o comunismo como uma tragédia.
Sob o título "Na Cama", o humorista ironizou a fobia disseminada pela propaganda anti-soviética durante os primeiros anos da guerra fria.
O deboche, portanto, é velho e rançoso. Tem o sabor de óleo de rícino, terror de todas as crianças da época em que o bicho papão resolvia a rebeldia que as matinha acordadas e querendo brincar na hora de menino obediente ir pra cama. Coisa do tempo em que as moças faziam permanente no cabelo e os moços usavam blusão de couro como o ídolo Elvis Presley.
Mas como o cronista é um progressista de esquerda, esse anacronismo foi problematizado e se converteu atualíssimo. Faz de conta que o tempo não passou. Elvis é eterno, não é mesmo?
Fazendo esse contorcionismo cronológico para revogar no teatro de sua mente o colapso do império soviético que ele considerava eterno como os diamantes, o humorista progressista cogita despertar gargalhadas ou, quiçá, risadas nos leitores de hoje? Não creio. Penso que ele não seja tão alienado.
Sua pretensão, assim intuo, modestamente, foi confundir seus contemporâneos - pois os mais novos nem sabem ao certo o que foram aqueles velhos tempos - com a comparação falaciosa entre a realidade que estamos vivenciando, com crescente angústia, e a fantasia ultrapassada de um mito já esquecido.
Num ato falho, porém, ele revelou que o partido, hoje no poder, é aquele mesmo do cidadão da piada que se escondeu embaixo da cama. Que não come criancinhas como dizia a propaganda enganosa. Não é um bicho-papão. É só um óleo de rícino. Melhor fazer com ele o que eu fazia quando era menino. Despejava no vaso seu conteúdo e o substituía por água com bicarbonato de sódio açucarada.
Minha saudosa mãe nunca percebeu essa minha traquinagem.
Em tempo: Nunca leio o filho de Érico Veríssimo. Soube da crônica pelo site do Políbio Braga, que fez um comentário a seu respeito.
(Publicado originalmente em http://www.institutoliberal.org.br)
Grande jornal carioca noticiou que foram fechadas, em dezembro, quase 600 mil vagas de emprego no mercado formal de trabalho, elevando para 1,5 milhão o número de empregos formais extintos em 2015, pior ano desde que começou a ser medida essa questão e, pela primeira vez em quinze anos, o país termina um ano com menos trabalhadores com carteira assinada do que começou.
Obviamente que esse resultado está totalmente relacionado com a péssima condução econômica do país e tudo o que sempre falamos por aqui: excesso de burocracia, alta carga tributária, direitos trabalhistas descabidos, protecionismo. Em uma expressão, é o tal do “custo-Brasil” para se produzir e se comercializar.
Algumas dessas pessoas demitidas não serão reabsorvidas no mercado tão cedo, seja por falta de investimentos ou por falta de qualificação pessoal para os bons empregos que existem, mas sem gente treinada para ocupá-los. E isso deve ser sempre levado em consideração. O custo-Brasil é, em última análise, o gigantesco custo de transação que os agentes econômicos possuem no Brasil, e quando a produtividade do empregado não compensa esse custo, ele é mandado embora. Os pobres são justamente os de mais baixa produtividade, em virtude da baixa escolaridade, e são os primeiros a serem atingidos pelo aumento do custo-Brasil.
Como se resolve o problema do custo-Brasil? Somente duas respostas se impõem.
A primeira resposta é efetivamente reformando as instituições de forma que esse custo não mais subsista. Essa, no entanto, não é uma alternativa válida no momento, já que o PT está no Governo e aumentar o custo-Brasil não só é parte da filosofia do partido, como eles fazem isso com uma maestria “nunca antes vista na história desse país”.
Para termos reformas institucionais tais como Macri fez na Argentina, somente em 2018 (ou antes, com muita sorte, através da cassação ou impeachment da presidente).
A segunda resposta já é mais imediata, e é normalmente o que acontece em época de caos econômico: o chamado jeitinho brasileiro. O jeitinho brasileiro nada mais é do que a resposta cultural a um problema político grave. Como o Brasil é um estado inchado, burocrático e patrimonialista, normalmente as pessoas só conseguem prosperar e comercializar burlando esse sistema, através da informalidade, que é um nome bonito para mercado negro.
De acordo com alguns estudos, 45% da população trabalhadora brasileira está empregada na informalidade, que corresponde a 20% do PIB brasileiro. O mercado informal é um mercado, até certo ponto, livre, mas com outros problemas de custos de transação envolvidos, como falta de segurança, inconfiabilidade na execução dos contratos, falta de um sistema de justiça que resolva conflitos, dentro outros. Ele pode não ser um modelo ideal, mas quando ele cresce às custas do modelo legal do Estado de Direito vigente, demonstra, na prática, que os seus custos de transação estão, ainda que momentaneamente, mais eficientes que os do sistema estatal, e isso é assustador.
Logo, essas pessoas que foram demitidas provavelmente seguirão para o mercado de trabalho paralelo da informalidade, isso se não desistirem de trabalhar por conta de benefícios governamentais. Se o custo-Brasil da formalidade não baixar a ponto de reabsorvê-las, esse desequilíbrio se tornará permanente, gerando violência, pobreza, atraso social e prejudicando novamente, além de permanentemente, as famílias pobres do Brasil. Ou pensamos realmente em implementar a primeira resposta para os problemas do custo-Brasil, abrindo mercados, reduzindo carga tributária, removendo burocracias e reformando a legislação trabalhista, ou em breve o Brasil poderá ser um país de pobres informais.
* Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.
(Publicado na edição impressa de VEJA)
Onde foi parar neste começo de 2016 o “carrinho novo” que, segundo o ex-presidente Lula, o operário brasileiro finalmente teve dinheiro e crédito para comprar, por conta das virtudes de seu governo? Onde andariam todos os trabalhadores humildes que deixaram “a elite inconformada” por começarem a viajar de avião, pela primeira vez na história deste país? Onde poderia estar circulando neste momento o “Trem-Bala” que, segundo Lula garantiu mais de uma vez, seria inaugurado dali a pouquinho e calaria a boca dos que “torcem contra” o governo? Alguém já conseguiu tirar uma caneca de água da transposição do Rio São Francisco? O que aconteceu com a conta de luz barata e com a lição de economia que a presidente Dilma Rousseff deu ao planeta em 2013? O Brasil, assegurou ela, acabava de provar que era possível, sim, crescer, distribuir renda, baratear a vida para os pobres e ter finanças sadias, tudo ao mesmo tempo, “em meio a um mundo cheio de dificuldades”. Não só isso. Seu governo acabava de colocar o Brasil numa “situação privilegiada” perante a comunidade das nações, com “energia cada vez melhor e mais barata, mais que suficiente para o presente e o futuro”. Os “pessimistas” tinham sido derrotados, informou Dilma.
E os juros? Na mesma ocasião, a presidente comunicou que “os juros estão caindo como nunca” - e hoje? Outra coisa: sabe-se da existência de algum posto onde seria possível comprar gasolina barata, feito de que o governo tanto se orgulhava até o encerramento da eleição presidencial de 2014? O Brasil entrou, afinal, na Opep, como Lula previa diante da nossa transformação em potência na produção de petróleo? Aliás, por falar nisso, quando foi a última festa para comemorar mais uma descoberta do “pré-sal”, com Lula e Dilma fazendo aquelas marcas pretas de óleo nos uniformes cor de laranja com que eram fantasiados? Procuram-se notícias, também, do real forte - tão forte que iria dispensar o dólar nas transações internacionais do Brasil, pelas altas análises do Itamaraty. Seria interessante saber onde foi parar o investment grade que as grandes agências mundiais de avaliação de risco deram ao Brasil pouco tempo atrás - prova definitiva, segundo o governo, de que o mundo capitalista enfim se curvava diante da gestão econômica de Lula, Dilma, PT e de suas “políticas sociais”. O mesmo se pode perguntar em relação ao “gostinho” declarado pelo ex-presidente em ver o Primeiro Mundo em “crise” e o Brasil correndo para o abraço. Onde está “o pleno emprego”? Onde está a “Pátria Educadora”? Onde está o maior programa de distribuição de renda já visto na história da humanidade?
Nada disso se encontra disponível no presente momento. Carrinho novo? A indústria automobilística acaba de ter, em 2015, o pior desempenho em quase trinta anos - isso mesmo, desde 1987, nas remotas profundezas do governo José Sarney. As companhias de aviação estão de joelhos; se estão perdendo até os passageiros ricos, imagine-se os pobres. A energia barata virou uma piada: as contas de luz subiram 50% em 2015, e vão subir de novo neste ano. Os juros andam perto de 15% - um paraíso mundial para os “rentistas” com os quais a esquerda brasileira tanto se horroriza nos discursos e a quem tanto favorece na vida real. No assunto petróleo, o que se tem, acima de tudo, é uma Petrobras que o governo quebrou, por ladroagem e incompetência, e hoje não tem dinheiro para investir nada; na verdade, ela jamais deveu tanto. O real perdeu 50% do seu valor no ano passado, e voltou, após mais de vinte anos, à sua condição de moeda bananeira. O governo presidiu uma recessão de 3,5% em 2015 - isso em cima de crescimento zero em 2014 - e prepara-se para socar na economia outro recuo neste ano, de 2,5% ou mais. Há 10 milhões de desempregados neste país, no corrente mês de janeiro. O último IDH, uma das medidas mundiais mais respeitadas para avaliar o bem-estar dos países, deixou o Brasil em 75º lugar - e quem pode achar que está bem, em qualquer coisa, se fica no 75º lugar? O investment grade sumiu: como o Senhor, na Bíblia, a Moody’s, a S&P e a Fitch dão, a Moody’s, a S&P e a Fitch tiram.
É este o país que resultou, na prática, dos treze anos de Lula, Dilma e PT. Ninguém no governo tem a menor ideia de como sair disso - nem poderia ter, quando o seu único objetivo, hoje em dia, é ficar de bem com o senador Renan Calheiros e traficar no Congresso um jeito para escapar do impeachment. Daí só se pode esperar que as coisas continuem piorando, piorando, piorando - até que chega um dia em que continuam a piorar.
A folhinha nos oferece o custo médio do Estado brasileiro por mês (R$ 223 bilhões ), e por dia (R$ 7,3 bilhões). O cronômetro, por hora (R$ 306 milhões)
A astronomia desconhece unidades de medidas cotidianas, como metro e quilômetro. Tudo é, no mínimo, bilhão. São 5,9 bilhões de quilômetros da Terra a Plutão, e 263 bilhões da Terra ao centro da Via Láctea. Assimilá-las não é trivial. Acontece o mesmo com as despesas do Estado, listadas em bilhão, dezenas de bilhão, centenas de bilhão de reais, tudo astronômico e desafiador como as distâncias cósmicas. Em 2015, as pastas da Educação e da Saúde receberam dotação de mais de R$ 100 bilhões cada uma. Ainda assim, faltou dinheiro. O gasto com o pagamento dos servidores federais superou os R$ 280 bilhões. A Previdência custou mais de meio trilhão. O Orçamento Geral da União foi de R$ 2,68 trilhões de reais. Números siderais, com tantos zeros, são alcançados pelas calculadoras. Mas deixam as pessoas um pouco confusas. Uma forma de trazer o debate a um patamar mais terreno é realizar os cálculos com apoio do calendário (a boa e velha folhinha) e do cronômetro. Pode parecer estranho, mas faz sentido. Acompanhe.
A folhinha nos oferece o custo médio do Estado brasileiro por mês (R$ 223 bilhões ), e por dia (R$ 7,3 bilhões). O cronômetro, por hora (R$ 306 milhões) e por minuto (R$ 5 milhões). Com estes novos fatiamentos, podemos executar cálculos mais palpáveis. Para melhorar o saneamento, por exemplo, um dos grandes flagelos nacionais, o Estado reserva, por ano, apenas nove horas das despesas globais. O Congresso Nacional custa, anualmente, um dia e seis horas de orçamento. O Bolsa Família, três dias e 19 horas. O Ministério da Defesa, 11 dias, Saúde e a Educação, cerca de 15 dias cada.
Além de dimensionar as despesas no tempo, o método revela que certas economias apresentadas pelas autoridades como fruto de um admirável esforço fiscal são mais modestas do que parecem. Em setembro do ano passado, o Ministério do Planejamento divulgou um pacote de cortes que incluía extinção de ministérios, eliminação de cargos de confiança e reduções variadas de gastos administrativos. Total da economia do pacote: R$ 2 bilhões no ano. Pelo cronômetro, o Estado comprometeu-se a enxugar seis horas e 34 minutos do bolo anual. Pouco, já que o ano tem 8.760 horas. No caso de 2016, bissexto, 24 horas a mais.
O Orçamento de 2015, que deveria apresentar superávit, fechou com déficit de R$ 118,6 bilhões. Zerá-lo significaria um esforço fiscal semelhante a 16 dias da despesa anual. Equivaleria a cortar, em cada mês, um dia e oito horas de custos. Mas as autoridades não conseguiram, e isso nos rendeu a perda do grau de investimento. A folhinha e o cronômetro escancaram o tipo de país que estamos construindo. Em 2015, o Estado reservou aos investimentos, base para o futuro, apenas dez dias de recursos — e executou cinco. Investimento é infraestrutura. São obras necessárias para tornar o país socialmente mais justo e economicamente mais competitivo. Já as despesas referentes aos compromissos assumidos no passado consomem quase cinco meses do Orçamento. São dois meses e sete dias do ano para os serviços da dívida pública e outros dois meses e 12 dias para o pagamento da Previdência.
Como o Brasil vai progredir destinando cinco dias do ano ao futuro e quase cinco meses ao passado? Parar de pagar a dívida não é opção, mas conter seu avanço vertiginoso, uma obrigação. O mesmo vale para a Previdência, um sistema que só para em pé se guiado pela lógica atuarial, não por conceitos subjetivos e discutíveis de justiça. Se o método do cronômetro e da folhinha não ajudar os governantes a compreender o tamanho do desafio, restará o método da moedinha. Cara, o Brasil vira um país insignificante; coroa, ele quebra.
* Eduardo Oinegue é jornalista
(Postado originalmente em www.tribunadainternet.com.br)
Qualquer cidadão com um mínimo de conhecimento e experiência já constatou que no Brasil o Executivo e o Legislativo são dois poderes apodrecidos, uma realidade que se comprova facilmente, bastando observar o enriquecimento inexplicável das autoridades. Em nosso país, não há fiscalização eficaz sobre esse fenômeno de alpinismo social, embora não existam maiores dificuldades para que se comece a fazê-lo. Mas quem se interessa?
Nos Estados Unidos, um criminoso de alta periculosidade como Al Capone, chefe de quadrilha e homicida, só foi para a cadeia, em 1931, quando o apanharam por sonegação fiscal. Se não demonstrasse o enriquecimento ilícito, o mais famoso gangster da História jamais seria aprisionado.
Em diversos países, a corrupção e os crimes fiscais são considerados delitos gravíssimos, com penas severas e implacáveis. Enquanto isso, no Brasil, não falta quem defenda o enriquecimento ilícito. Esta semana, em Paris, o excêntrico advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, conhecido como Kakay, que fatura alto em cima de 11 réus da Lava Jato, deu entrevista dizendo que o Brasil vive hoje a "criminalização da riqueza" e depois liderou um manifesto de advogados contra a Lava Jato, vejam a que ponto pode chegar a distorção de valores em nosso país.
LAVA JATO É EXCEÇÃO
Nos dias de hoje, aqui no Bananal, não há notícia de condenação de milionário por sonegação fiscal. A Lava Jato é exceção, não há dúvida. O Judiciário está tão apodrecido quanto os outros poderes. O brasileiro carente tem de pagar IPVA para dirigir um fusquinha 63, a longevidade do veículo não elimina a cobrança de seguro, taa social é uma característica de nxa de vistoria etc. Mas o dono de um avião a jato, de um helicóptero turbinado ou de uma lancha de 122 pés está isento de pagar IPVA. E o Kakay ainda acha que os ricos estão sendo perseguidos...
A realidade é outra. Os milionários têm muitas regalias no país e a coisa mais difícil e ver algum deles atrás das grades. Com a ajuda dos Kakays e das brechas da lei, os processos prescrevem, não há cumprimento de pena, tudo é festa. Este é o Brasil dos nossos dias.
SACO IMUNDO DA ROUBALHEIRA
Mas é claro que os advogados que defendem a impunidade dos milionários são poucos. Vejam o que disse Alexandre Thiollier, do escritório Thiollier e Advogados, em comentário publicado quinta-feira (14) no site "Migalhas", sob o título "Criminalização da riqueza"?
"Em entrevista publicada ontem no UOL, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro afirmou que o Brasil vive a criminalização da riqueza. Provavelmente fez esse comentário porque seus clientes abastados estão sendo investigados/denunciados no que se resolveu chamar de Lava Jato. Engana-se o colega, quando pretende jogar no mesmo saco imundo da roubalheira, uma imensidão de pessoas honestas que conseguiram angariar majestosos patrimônios sem furtar um centavo. O Brasil vive hoje, Dr. Kakay, a criminalização de políticos e empresários milionários que assaltaram as empresas estatais e/ou governos. E tenha a certeza que o Brasil torce para ver todos os culpados trancafiados, e bem trancados, na cadeia, após o devido processo legal. Pessoas sérias e honestas não aceitam essa generalização; ao contrário, continuam acreditando que é do trabalho honesto e diário que se forma a riqueza."
A atual crise política e econômica possui três grandes estruturas da sociedade brasileira, que não estão evidenciadas como deveriam perante a opinião pública, são elas: patrimonialismo, estatismo e multipartidarismo.
O patrimonialismo, conceito trabalhado em Os Donos do Poder (Raymundo Faoro, 1958), aparece nas investigações da Operação Lava-Jato. Ou seja, o que o Brasil sofre não é um problema intrínseco do capitalismo, mas sim um desvirtuamento das relações entre executivos, acionistas e agentes do Estado. O patrimonialismo é uma forma de contornar o Estado de Direito e as Instituições, a fim de garantir vantagens à margem da lei para políticos e empresários, que fazem isso mediante cultura de protagonismo que o Estado desfruta no Brasil (estatismo).
Logo, o estatismo estimula o patrimonialismo, tendo em vista que o Brasil é um país de renda média, mas que o Estado possui dimensão (carga tributária) compatível ao de uma nação de renda alta. Em linha com isso, mais da metade do crédito concedido tem participação do Estado. Dessa forma, é inegável que empresas tentem viabilizar via Estado operações de crédito que, numa sociedade não estatista dar-se-iam majoritariamente via mercado financeiro. A Nova Matriz Econômica e a sua política de juros subsidiados foi outro exemplo, que indiretamente pôde fomentar relações incestuosas entre Estado e empresas.
Obviamente, o estatismo por si só não justifica crimes como evidenciados pela Lava-Jato. Assim, o melhor remédio para evitar isso seria uma dura punição aos agentes envolvidos, bem como compatibilizar o porte do Estado ao tamanho de nossa economia. No entanto, recentemente houve MP da leniência, que alterou a lei Anticorrupção que "excluía" empresas investigadas pelo MPF de participarem de licitações públicas e, infelizmente, o novo Ministro da Fazenda advoga a favor de liberar mais crédito público para destravar a economia-, mesmo diante da crise fiscal.
Pois bem, outra estrutura relevante é o multipartidarismo, característica esta marcante de nosso sistema político. O multipartidarismo crescente só faz dificultar a formação de consensos e maiorias para aprovar reformas para o país. Mais: ao invés de os partidos apresentarem fusões entre si, assistimos à uma série de registros de legendas. A classe política, portanto, não consegue atacar a questão do multipartidarismo crescente, que está inviabilizando o presidencialismo de coalizão. Para piorar, a presidente Dilma aprovou aumento do Fundo Partidário, o que indiretamente é mais um incentivo para a criação de legendas e que também pressiona os gastos públicos. Sem mencionar que agora as eleições também serão financiadas com recursos do orçamento (mais estatismo), como se financiamento público fosse uma panaceia.
Portanto, depreende-se que nenhuma das três estruturas que conduziu o Brasil para a crise vigente foi devidamente compreendida. Pelo contrário, o que se nota é o fortalecimento da visão estatista, que pode retroalimentar o patrimonialismo e, inclusive, o multipartidarismo (ausência de cláusula de barreira e do aumento do Fundo Partidário). Todo esse cenário reforça a falta de credibilidade dos atores políticos, principalmente os governistas. Vivemos mais do mesmo. A crise, assim, parece não ter deixado grandes lições aprendidas.
Cristiano Rodrigues, Economista (USP) e Ciência Política
Vinícius Gouveia, Economista (USP) e Ciência Política