(Publicado originalmente na Folha de Londrina)
— Companheiros, eu venho do futuro. Não lhes tomarei muito tempo. Estou aqui exclusivamente para lhes dar uma informação. Sabem esse homem que vocês tanto admiram, que vocês tanto defendem, que vocês sonham em ver na cadeira presidencial? Pois é, amigos: este homem um dia será condenado a nove anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Os mais engraçadinhos dirão que é um ano de prisão por cada de seus dedos das mãos, mas eu não vou compartilhar a pilhéria; para mim, trata-se um assunto sério, muito sério.
Vocês devem achar que eu estou louco. Quem sabe pensem que eu sou um agente a serviço da burguesia ou um saudosista da ditadura militar. Não é nada disso, amigos. Estou aqui exclusivamente para evitar que, daqui a alguns anos, vocês sintam vergonha de si mesmos ao lembrar que fizeram campanha para este indivíduo ou para seu partido.
Saibam, meus amigos, que daqui a 28 anos boa parte dos líderes do partido estará ou na prisão em vias de ir para a cadeia. Este sonho revolucionário que começou com presos políticos terminará com políticos presos.
Não me olhem assim, companheiros. Se vocês me derem ouvidos agora, saibam que daqui a alguns anos agradecerão por eu ter vindo hoje. Vocês deixarão de passar vergonha defendendo corruptos que se utilizam da miséria do povo para ganhar dinheiro e poder em quantidades jamais vistas. Vocês deixarão de apoiar uma organização criminosa que se une ao que existe de pior na humanidade para garantir seu domínio sobre as pessoas comuns. Vocês deixarão de ser cúmplices da transformação do Brasil no país mais assassino e analfabeto do mundo.
Enquanto vocês ficam aí discutindo autonomia universitária e ensino gratuito — mesmo que a maioria aqui tenha dinheiro sobrando pra pagar universidade, era só gastar menos com cerveja! —, os companheiros do seu amado partido vão fazer aparelhamento da máquina estatal e instalar o maior esquema de corrupção da história da democracia ocidental... Não sejam cúmplices desse crime, meus amigos. Ouçam a voz de quem viu e sofreu o futuro!
E você aí, cabeçudo. Você mesmo! Deixe de perder seu tempo com essas intermináveis reuniões políticas que não levam a nada, e vá estudar! Vá pesquisar um pouco sobre os crimes do socialismo, sobre o sistema mais cruel e genocida que já existiu sobre a face da terra! Sabe esse muro que está ruindo lá na Europa? Pois o seu querido candidato quer reconstruí-lo aqui na América Latina, rapaz! Tome jeito nessa vida! Corte esse cabelo e ocupe a biblioteca!
Era isso que eu tinha a dizer, rapazes. Essa era a minha questão de ordem na assembleia do tempo. Agora, preciso voltar a 2017, porque as coisas podem ficar feias por lá. Certa vez alguém disse que o Brasil é o país do futuro. Pois essa pessoa se esqueceu de dizer que o futuro era nebuloso. Adeus!
(...)
— Quem era o maluco? Será que ele usou algum tipo de droga nova? Bom, vamos retomar a nossa pauta sobre o Restaurante Universitário... Quem está inscrito? Companheiro Paulo, a palavra é sua.
(Publicado originalmente na Gazeta do Povo)
A narrativa da moda nos debates sobre criminalidade no Brasil é baseada na proposição fundamental de que somos um país violento porque padecemos de um mal chamado “encarceramento em massa”. Essa é a base de um novo mantra: urge o desencarceramento de delinquentes, na realidade vítimas de um sistema injusto. Na mesma velocidade com que foi adotado como panaceia pela cúpula da Justiça brasileira (a começar pelo CNJ e pelo STF) – sem qualquer debate público digno do nome – o desencarceramento tornou-se objeto de feroz campanha publicitária que envolve, dentre outros grupos ativistas, uma tal “Rede Justiça Criminal”, ente fantasmagórico que diz reunir 8 ONGs “preocupadas com o sistema criminal brasileiro” (prisaonaoejustica.org). Dentre as reivindicações da abnegada militância, destaca-se a inarredável proibição de prender, pois cadeias superlotadas geram “mais violência”, sendo necessário apostar em mecanismos que dificultem a prisão ou induzam a soltura de criminosos. Afinal, no Brasil, prende-se demais. Será?
De acordo com Relatório do CNMP, em 2015 havia no Brasil 196.749 presos provisórios e 259.359 condenados submetidos ao regime fechado (num total de 456.108 indivíduos efetivamente presos). Proporcionalmente ao número de habitantes, ocupamos o 30° lugar no ranking mundial de população prisional (prisionstudies.org), caindo para 77° no que concerne ao número de presos provisórios. O raquitismo desses índices salta aos olhos quando cotejado com a cifra negra da criminalidade: o Brasil registra cerca de 60 mil mortes intencionais por ano (um brasileiro é morto a cada nove minutos).
Apenas entre 2000 e 2015 cerca de 800 mil brasileiros foram assassinados (número equivalente à população de João Pessoa-PB), com um percentual de elucidação que gira entre constrangedores 5 e 8%, segundo o Diagnóstico da Investigação de Homicídios da ENASP. Ou seja: no brevíssimo período de 15 anos, já deduzido o recorde de 19% de elucidação obtido nos 43.123 inquéritos finalizados pelo programa Meta 2, é possível estimar que mais de 700 mil homicídios cometidos no Brasil sequer tiveram a autoria apurada! Somam-se a isso os quase 600 mil mandados de prisão pendentes de cumprimento, os mais de 100 mil com prazo expirado (dados do Banco Nacional de Mandados de Prisão) e o baixíssimo índice de elucidação verificado em relação a outros crimes graves (apenas um em cada 53 roubos registrados tem a autoria esclarecida no Rio de Janeiro). Eis uma boa noção de quão falaciosa é a narrativa do “encarceramento em massa”. Segundo a teoria da escolha racional, de Gary Stanley Becker – economista americano agraciado com o Prêmio Nobel em Ciências Econômicas –, a quantidade de crimes cometidos é determinada por um cálculo de risco e recompensa envolvidos na empreitada (a alta probabilidade de condenação é fator preponderante para inibir o criminoso). Os números acima apresentados são reveladores do estado de anomia a que foi reduzido o Brasil, que, não por acaso, é campeão mundial em número absoluto de homicídios (com 11% dos assassinatos do planeta).
Contando com 21 das 50 cidades mais violentas do mundo, o País que entre 2011 e 2015 registrou mais mortes violentas do que a guerra da Síria figura na vergonhosa 108ª posição do ranking de 162 países do Global Peace Index – 2017.
Ignorando os dados concretos, os apólogos do desencarceramento, como donos da verdade e da razão, exercem forte pressão para que todo o sistema penal se curve às suas prescrições, sem incluir entre elas nada que possa melhorar as condições dos sistemas penitenciário e de persecução criminal. Só há uma solução aceitável: manter assaltantes, homicidas, traficantes e estupradores longe das cadeias, mas no seio da sociedade cujas regras desprezam, em meio às suas vítimas atuais e potenciais. Mais vagas prisionais, mais polícia judiciária e policiamento ostensivo, e, sobretudo a retomada, pelo Estado, dos espaços prisionais dominados por criminosos, são vistas como indesejáveis medidas de afirmação de um sistema injusto. Preferindo uma verborragia falaz à realidade, refletem os postulados marxistas da criminologia crítica, baseada na premissa neurótica de que o sistema penal é apenas uma estrutura de controle de uma classe social, dominada por uma elite que busca manter sua hegemonia, reduzindo a problemática da criminalidade ao pauperismo fantasioso dos estereótipos da luta de classes. A união de 8 ONGs numa rede financiada por fundações como Open Society, OAK, Ford e outros braços da elite globalista – ramos artificiais de um único grupo de pressão, criados para simular uma pluralidade de manifestações independentes e espontâneas a reverberar a ideologia de que criminosos agem em nome dos pobres, mesmo que sejam exatamente os pobres as vítimas preferenciais do banditismo – explica porque o Brasil se comprometeu a reduzir em 10% seu contingente carcerário perante a ONU, que atualmente nada mais é que a estrutura burocrática do globalismo.
Transformar deliberadamente o sistema prisional num espantalho – no ano de 2013 o CNJ já sugeria a responsabilização das autoridades de 11 Estados, que deixaram de investir R$ 103,4 milhões destinados aos presídios – para em seguida denunciar-lhe a ineficácia e promover a agenda do desencarceramento é uma monstruosidade inominável. Ao eleger como prioridade a soltura de criminosos, o governo brasileiro reafirma o compromisso com a impunidade, cospe nas famílias enlutadas e escarnece de milhares de cadáveres, cujo sangue derramado clama aos céus por justiça.
* Diego Pessi e Leonardo Giardin de Souza são Promotores de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul e autores do livro Bandidolatria e Democídio, ensaios sobre garantismo penal e criminalidade no Brasil.
O feriado de “14 de Julho”, data nacional da França, é considerado, por muita gente, inclusive franceses, como a celebração da célebre Tomada da Bastilha – fato que marca, tradicionalmente, o início da Revolução Francesa, o fim do absolutismo monárquico. Certo? O fato sim, a data nacional não. Há dois “14 de Julho” na história da revolução e, por isso, a confusão com as datas.
Tomada da Bastilha, 14 de Julho de 1789
No dia 12 de Julho de 1789, Camille Desmoulins um advogado gago, mas brilhante orador, fez um inflamado discurso diante da multidão reunida nos jardins do Palais-Royal, em Paris. Anunciou que Necker, responsável pelas finanças da França, havia sido demitido e que isso era sinal de retrocesso da monarquia contra o povo. Enfiando duas pistolas no seu casaco, conclamou a todos formarem milícias para se defenderem do exército do rei. “Ás armas!”, ressoou seu grito por toda cidade. No dia seguinte, centenas de populares, investiram contra os Inválidos, um antigo hospital militar onde se concentrava um razoável arsenal. Saquearam 3 mil fuzis e 20 canhões. Mas não encontraram pólvora. Correu o boato de que a pólvora estava estocada na Bastilha, uma antiga fortaleza que servia de prisão. Com suas enormes muralhas de 25 metros de altura, a fortaleza era, para o povo, um símbolo do despotismo real. Dizia-se que, em suas masmorras, centenas de prisioneiros políticos apodreciam sob os olhos de soldados sanguinários, prontos para massacrar a população à ordem do rei. Invadir a fortaleza tornou-se, então, alvo da fúria popular contra toda exploração, miséria e injustiça sofrida.
Para lá seguiram cerca de mil pessoas armadas, na manhã do dia 14 de Julho. Ao ver a multidão furiosa às portas da Bastilha, o comandante Bernard de Launay tentou negociar: abriria os portões se fosse poupado. Ele não tinha alternativa, a fortaleza estava vulnerável, defendida por uma pequena guarnição de 110 soldados desmobilizados e somente três canhões em condições de uso.
Launay abriu os portões e logo foi agarrado e decapitado. Sua cabeça foi espetada em uma lança e carregada em macabro triunfo pelas ruas. Os demais soldados foram abatidos sem piedade e outros rapidamente passaram para o lado dos revoltosos.
A turba violenta invadiu as dependências da fortaleza e, para sua surpresa, não encontrou pólvora. Nas celas, havia apenas sete presos: 4 falsários, um aristocrata acusado de devassidão e dois loucos. Tamanho esforço para tão pouco resultado! Mas o fato tinha um forte significado: um símbolo da monarquia absolutista fora derrubado naquela manhã de verão. A tomada da Bastilha era apenas a ponta inicial de um rastilho de pólvora que incendiou Paris, depois a França e o resto do mundo ocidental. Portanto, o “14 de Julho” comemora a Tomada da Bastilha? Não. A história é mais complexa.
Festa da Federação, 14 de Julho de 1790
Um ano depois daquele verão violento, muita coisa havia acontecido: os bens do clero foram confiscados, os nobres perderam a maioria de seus privilégios e foi aprovada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. A declaração assegurava, aos cidadãos, os direitos civis: liberdade de pensamento e expressão, igualdade perante a lei, defesa da propriedade, direito de se rebelar contra os abusos do governo. O rei Luis XVI e sua família não residiam mais na tranquila e distante Versalhes. Desde outubro de 1789, foram obrigados a se mudarem para Paris, no coração dos tumultos populares. Estava em andamento uma Assembleia Nacional Constituinte e o rei acenava que concordava com isso e iria obedecer as leis.
Diante desses acontecimentos, a cidade respirava otimismo, a revolução parecia caminhar para um final feliz. Era preciso comemorar as conquistas obtidas, a reconciliação do povo com a monarquia, esquecer e perdoar as violências e o sangue derramado. A festa ganhou o nome de Festa da Federação e a data escolhida foi o 14 de Julho, de 1790.
O festejo ocorreu no Campo de Marte, em Paris. Ali foi construída uma imensa arena para 100 mil pessoas. No centro, ergueu-se o Altar da Pátria, de 6 metros de altura. As obras foram realizadas em clima de fraternidade e entusiasmo. Deputados e nobres, de camisas arregaçadas, ajudaram nos preparativos. Conta-se que até o rei foi visto com uma enxada nas mãos. No Altar da Pátria, o bispo Talleyrand celebrou uma missa solene, com a presença de 300 padres e 400 coroinhas! No final da grande cerimônia, o rei vem para a frente e, na presença da rainha Maria Antonieta e do delfim (príncipe herdeiro) e, diante da multidão, jura fidelidade à Constituição (que só seria promulgada no ano seguinte). Gritos de “Viva o rei” e “Viva a Pátria” ecoaram entre a multidão.
A grande festa de unidade nacional, contudo, não sobreviveu por muito tempo. A revolução tinha apenas começado e muitas cabeças ainda rolariam, inclusive a do rei e da rainha, três anos depois. Viria Robespierre e o Terror, Napoleão Bonaparte etc.
A escolha da Data Nacional
Havia, na França, um consenso da importância do 14 de Julho. Mas qual deles? A tomada da Bastilha, um motim popular sangrento que desencadeou um processo revolucionário com todo tipo de excessos? A Festa da Federação, uma comemoração pacífica e reconciliadora? Em 1880, o governo francês proclamou o 14 de Julho como data nacional evocando a Festa da Federação que, para os deputados, representava mais o espírito nacional. Em uma época de agitações operárias e crescimento do movimento socialista não era prudente celebrar uma revolta popular. Era melhor uma data que evocasse uma festa pacífica do que um evento que insuflasse o povo contra o governo.
Assim, a cada 14 de Julho, a França comemora, oficialmente, uma antiga celebração patriótica, ocorrida em 1790, abençoada pela Igreja e dirigida por um governante . Na memória coletiva, contudo, a data continua sendo associada à tomada da Bastilha e é na atual Praça da Bastilha, em seus bares e restaurantes, que os franceses erguem brindes ao fim do despotismo e à soberania popular.
Fonte Le 14 Juillet, fête bourgeoise ou révolutionnaire? Le Point.
Site Camille Desmoullins.
SCHAMA, Simon. Cidadãos. Uma crônica da Revolução Francesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
http://www.ensinarhistoriajoelza.com.br/14-de-julho-data-nacional-da-franca/ - Blog: Ensinar História - Joelza Ester Domingues
(Publicado originalmente em www.nivaldocordeiro.net)
A sentença prolatada pelo juiz Sérgio Moro do Lula, condenando-o a 9 anos e seis meses de prisão, praticamente decretou a sua morte política. O período que se abre agora até a confirmação da sentença em segunda instância será apenas um prolongado velório e, como todo velório, terminará no sepultamento político do ex-presidente. A pergunta que se coloca é o que será do PT sem Lula candidato e como ficará a política partidária do Brasil sem a carismática figura do ex-presidente.
Não há dúvida de que a mais singular criatura a aparecer no cenário político nacional no último quartel do século passado foi o PT, capitaneado pelo carrancudo Lula. A esquerda mais revolucionária alinhou-se com ele e acabou chegando à Presidência da República em 2002, tendo ficando por 14 anos no poder, oito anos sob a presidência de Lula e os demais sob Dilma Rousseff, cujo mandato foi interrompido pelo impeachment. O PT singularizou-se pelo discurso "ético", mas, como demonstrou Olavo de Carvalho, essa ética revolucionária é o oposto da ética do senso comum cristão, é a própria cartilha de intenção de crimes revolucionários.
Ademais, a intenção de "mudar tudo que está aí" nunca foi escondida, algo que só poderia ser feito mediante ou golpe de Estado ou passando por cima do ordenamento jurídico. Foi o que foi feito com o mensalão e com o petrolão e toda a prática criminosa resultado da tentativa de perpetuação no poder.
O problema é que o PT jamais teve maioria parlamentar e foi obrigado a se aliar ao PMDB que, nesses anos todos, serviu de freio aos anseios revolucionários do PT. As falcatruas derivaram da tentativa de alugar uma base aliada obediente, disposta a aprovar tudo. Houve erro de cálculo, pois a tal base nunca votou incondicional. As três grandes derrotas parlamentares sofridas foram justamente de autoria desse partido: a recusa da CPMF, a negação do terceiro mandato a Lula e o impeachment de Dilma Rousseff. A única força de oposição eficaz que o PT teve foi o PMDB.
A contradição óbvia vivida pelo PT é ter uma plataforma revolucionária sendo implantada dentro da ordem democrática, numa sociedade aberta com imprensa livre. O PT colocou foco na nomeação dos juízes das cortes superiores, que passaram a interpretar a Constituição contra a letra do que nela estava escrito. Mesmo assim, vieram as condenações do mensalão no STF, pois no campo penal não há muito o que interpretar diante das provas. Seus líderes foram condenados, exceto Lula, protegido que foi pela Procuradoria Geral, fato que lhe permitiu escapar ao impeachment.
Ao PT agora resta ou assumir de vez sua face revolucionária e, ato contínuo, eleger a violência como instrumento de chegada ao PT, ou se enquadrar na legalidade e se tornar um partido nanico, sem bandeiras e sem recursos. O ajuntamento de revolucionários que se tornou a sigla poderia então se dissolver, pois já não teria serventia para os propósitos revolucionários.
Em face da Idade, Lula deve encerrar sua carreira política lutando pela liberdade pessoal nas barras dos tribunais. Deixou de ser líder político relevante, na verdade já está fora da política eleitoral, fonte que foi de seu poder durante toda vida. Sem votos, Lula não é nada e ele agora não pode mais pleitear cargos eletivos, a se confirmar a sentença se Sérgio Moro em segunda instância. O vácuo político deixado por Lula e pelo PT parece estar sendo preenchido pela emergência de forças de centro-direita. O partido mostrou-se frágil demais sem a figura demagógica do seu líder máximo, Lula.
A eleição de 2018 promete uma renovação radical dos nomes propostos pelas agremiações políticas. Não se sabe quem sairá vencedor, mas sabemos quem será o grande perdedor: o PT. Já foi assim em 2016. O partido vai desidratar de vez, dando lugar a novas forças que deverão emergir.
Quem viver verá.
* Economista pela FGV-SP, é também empresário livreiro.
Quando alguém pede um autógrafo num exemplar de meu livro O que Sei de Lula(Topbooks, Rio de Janeiro, 2011), minha definição favorita para o protagonista que perfilei em suas 522 páginas é “Macunaíma de palanques e palácios”. É necessária, contudo, uma pequena inversão na frase com que Mário de Andrade definiu magistralmente seu personagem-símbolo da brasilidade, “um herói sem nenhum caráter”. Lula talvez mereça uma definição com uma troca de lugar do pronome indefinido na frase: “um herói sem caráter nenhum”.
Conheci-o em 1975, quando acompanhei sua ascensão à condição de maior dirigente sindical da História ao preparar, negociar e dirigir as greves que ajudaram a extinguir a longa noite da ditadura tecnocrático-militar. Quase meio século depois, contudo, o empreiteiro Norberto Odebrecht, herdeiro e herdado da construtora encalacrada na corrupção da Lava Jato, contou que lhe pagou propinas para evitar greves. Ou seja, o maior líder operário teria sido também o maior “traíra” da história do movimento obreiro, tendo chegado ao ponto de tirar proveito pessoal de sua condição de condutor de massas.
As greves espetaculares dos metalúrgicos do ABC, lideradas por ele de um palanque armado no centro do Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, contestaram a estrutura legal do peleguismo varguista, que perdurou na ditadura. As paralisações das montadoras de automóveis e fábricas da cadeia automotiva roeram os pés de barro do regime autoritário, que ruiu sobre as próprias bases. Mas ele mesmo foi informante dos militares, como contei na abertura de meu livro citado. E também do diretor do Dops paulista, o delegado Romeu Tuma, conforme relatou o filho deste, o também delegado que foi secretário de Justiça do Ministério da Justiça da primeira gestão presidencial de Lula, Romeu Tuma Jr. Nunca, em momento algum, as informações dadas nas páginas seja de O que Sei de Lula, seja de Assassinato de Reputações, também editado pela Topbooks, foram contestadas em entrevista, artigo ou processo judicial.
No entanto, essas bombas de hidrogênio sobre a imagem de qualquer político de esquerda no mundo inteiro não produziram o efeito de um traque junino na mitologia em torno do entregador de lavanderia e torneiro mecânico que chegou ao mais elevado posto da República. Neste, aliás, produziu a catástrofe de efeito ainda mais deletério: o maior escândalo de corrupção da História e, em consequência dele, uma crise política, que está passando pela segunda tentativa de afastamento do presidente da República, e econômica, que levou 14 milhões de trabalhadores à tragédia do desemprego. No entanto, o ex-presidente mantém a fama, a condição de mito e o poder que isso transfere. É o político mais celebrado na memória do povo e o mais temido pelas elites dirigentes, às quais sempre serviu, embora tendo sempre vendido o peixe de que é seu inimigo favorito.
O retirante nascido no agreste pernambucano e criado nas franjas industriais da Grande São Paulo, de onde emergiu para a fama, foi o pai dos pobres, que nunca se esquecem dele, e a mãe dos burgueses, que preferem vê-lo a distância segura, mas sabem que na hora H poderão contar com sua eterna gratidão. Por isso, o chefe da organização criminosa que limpou todos os cofres da República é o chefão da conspiração daqueles que participaram com ele desse assalto. Agora condenado, vale mais para ele do que para qualquer outra eventual vítima da limpeza da Operação Lava Jato aquele slogan do anúncio de vodca: “Eu sou você amanhã”. Por isso é o “rei do paparico”, embora suas qualidades pessoais e de gestor não possam ser comparadas ao cardápio do restaurante do Porto que leva esse nome.
*Jornalista, poeta e escritor
E o Brasil segue na trilha dos "progressistas" como um sonâmbulo que sofre um pesadelo. Temer continua a governar sem deter o poder para tanto. E os que o detêm são os mesmos de antes, acobertados pela mídia que os torna invisíveis desde que a lei do silêncio, a princípio tímida, estrategicamente, depois desavergonhadamente entrou em vigor.
Com isso, o que os ingênuos acreditam ser nossa Constituição Federal é um diploma legal infraconstitucional, não a nossa Lei Fundamental. Acreditam mas desconfiam. "Emissário de um rei desconhecido/Cumpro informes instruções de além/ E as bruscas palavras que aos lábios me vêm/Soam-me a um outro e anômalo sentido." (Fernando Pessoa)
Então, vetustos guardiões paramentados para defender a Carta Magna em seus sodalícios, como doutos que não se iludem com as enganosas aparências, aplicam a verdadeira norma suprema emanada do poder desconhecido pelas massas, assim como se as sessões transcorressem num tribunal de além, muito além da lenda republicana que nossos olhos embaçam com a miragem de um reino de súditos desgovernados por fantoches.
Porque não há vácuo no poder, por mais que assim nos pareça a realidade que vivenciamos. O que há mesmo é essa anomalia encenada por ilusionistas no teatro continental da Pátria Grande projetada para ser uma província do Olimpo onde imperam os deuses malditos.
Quo vadis, Brasil? Por onde andam sua gente bronzeada, seu mulato inzoneiro, o bravo povo e seu brado retumbante? Em que nuvens do céu escondeu-se o seu brio? Até quando suportarás ouvir calado o alarido dos que clamam Fora, Brasil! agitando bandeiras e símbolos que ecoam palavras rudes deste sentido inconfundível? O que espera o gigante acormecido para despertar, ficar de pé, sacudir a poeira e dar a volta por cima?