Na Bíblia no livro de João, capítulo 10, Jesus Cristo conta a conhecidíssima parábola do Bom Pastor, a qual diz que as ovelhas sempre seguirão a voz de seu pastor em vez de seguirem o comando de estranhos, sob o risco de serem mortas por seus predadores. Nessa parábola, alerta-se sobre o papel da liderança nas nossas vidas, lembrando-nos que um pastor não pode ser autoritário, senão as ovelhas pastoreadas não responderão mais aos seus comandos.
O trecho bíblico, aplicado à realidade política atual, vem muito a calhar no que concerne à esquerda brasileira. A esquerda, seus representantes e seus partidos políticos, sempre se colocam à frente como os monopolistas das virtudes humanas, que com uma boa propaganda acaba por atrair muitas pessoas para as suas fileiras. A propaganda socialista, prometendo acabar com todos os problemas do mundo, acaba por transformar suas figuras de liderança nos “Bons Pastores” que conduzirão as ovelhas – no caso a população – para um caminho onde terão todos os confortos e benesses.
O problema é que a ideologia socialista leva sempre para um caminho totalitário, mais cedo ou mais tarde. O centenário José Osvaldo de Meira Penna diz que o socialismo é uma espécie de altruísmo imposto pela polícia, numa tentativa de criar-se um novo homem, ignorando completamente a natureza humana e a convivência em sociedade. Nessas inúmeras tentativas de criação do homem socialista nos mais diversos cantos do planeta, cerca de 100 milhões de vidas foram ceifadas e tudo que o foi multiplicado nesses governos foi a miséria.
E a realidade atual no Brasil mostra muitos políticos de esquerda colocando-se como os salvadores da pátria. De Lula a Ciro Gomes, de Jandira Feghali a Marina Silva, passando pelo queridinho da esquerda da Zona Sul do Rio, Marcelo Freixo, os lobos travestidos de bons pastores estão sedentos para colocarem seus maldosos planos em ação. Usam e abusam da propaganda da bondade, prometem o céu na terra com doses cavalares de doutrinação ideológica escolar, fazem jornalismo parcial, bem como marketing político avassalador. Ao chegarem no poder, mais cedo ou mais tarde, o disfarce de bom pastor cai e o lobo devora as ovelhas embebido por um ideologismo feroz.
A situação atual exige muitos cuidados com os lobos travestidos de bons pastores. Vejamos a Venezuela e os treze anos de governo do PT aqui em nosso Brasil: são mostras suficientes de que os cuidadores são, na verdade, detratores. A população deve evitar políticos que já mostraram que querem transformar o Estado em um bem pessoal, evitando, assim, que caiam nas falsas promessas dessas pessoas de moral duvidosa e corruptos que querem deixar para todos nós um caminho de servidão.
• Publicado originalmente em http://www.sentinelalacerdista.com.br/
• Graduando em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pesquisador na área de História da Cultura Brasileira. Atua como assessor parlamentar na Câmara Municipal de Niterói.
Estou de volta das férias em Portugal. Fazia três semanas que não ouvia falar em assalto, homicídio, bala perdida. Do aeroporto para casa, senti que havia voltado. O carro não parava de sacudir, nas irregularidades do asfalto; do carro da frente, alguém jogou pela janela uma garrafa vazia; ao lado, outro nos ultrapassa produzindo, em sua aparelhagem de som, um barulho horrível de virabrequim quebrado. É o choque da volta. Voltei ao país desorganizado, cheio de corrupção e de gente que considera isso muito normal. Por aqui, a insegurança, a corrupção, os 170 assassinatos por dia têm sido assunto secundário. A moda é expor intimidades, discutir sexo, cor da pele, entrar nas ondas do politicamente correto, sempre que houver tempo recreativo, daqueles que não precisam sair de casa de madrugada para pegar a condução, passar o dia no trabalho ganhando pouco, e que voltam para casa cansados e prontos para o dia seguinte.
Terminando 2017 pode-se reconhecer que o governo realizou um segundo milagre econômico. O país estava no caos quando Dilma foi impedida de continuar. Um ano e meio depois, voltou a crescer a criar emprego, a ganhar valor real para o salário, com juros baixando, inflação bem baixa, investimentos de volta, sucesso nas contas externas, mas ainda precisando diminuir as despesas do estado. O déficit e a dívida pública são sérios entraves. O estado é inchado, cheio de gorduras e com pouco músculo, a não ser na capacidade de cobrar impostos. Os serviços públicos são ruins e quase nada sobra para investir. Os impostos servem para sustentar o estado.
O governo tenta diminuir o déficit com uma tímida reforma na Previdência. Mais discreta que aquela que o então ministro da Fazenda Antônio Palocci recomendou ao presidente Lula que fizesse, em 2007. As centrais sindicais ameaçaram e o presidente recuou. Agora o déficit se agigantou e não tem mais jeito. São as mesmas centrais que se revoltam contra a modernização das leis trabalhistas. Juízes com cacoete de sindicato, falam em não aplicar a lei, como se eles tivessem mandato de legisladores. Incrivel como se aposta contra o país. Como eu já escrevi aqui: parece que somos masoquistas.
Agora o que ocupa a classe política não é com os temas que sufocam a população, como altos tributos, burocracia, saúde e educação precárias, insegurança pública, dificuldades de trânsito, infraestrutura do passado, crise ética, desorganização urbana e tantas outras mazelas. O que vem preocupando os políticos são as eleições no ano que vem. Como conquistar o poder? - perguntam os opositores. Como permanecer no poder? - perguntam os governistas. Eles estão atrás das respostas. Será que terão respostas para as demandas da população? Dá um calafrio na espinha só de pensar que temos elegido, com o nosso voto, pessoas que só tem contribuído para afundar o país. Mas insisto que pode haver trigo nesse joio. Afinal, brasileiro é esperançoso.
* Publicado originalmente em http://www.sonoticias.com.br/
Boa parte do noticiário da semana passada descrevia os debates sobre a passeata gay em Roma como um confronto entre o movimento homossexual e a "extrema-direita". É típico exemplo de manipulação de vocabulário, que, adotada em escala mundial, tem mais força persuasiva do que qualquer argumentação ou campanha de publicidade explícita.
O deslocamento semântico da "extrema-direita" cada vez mais para o centro visa a criar na opinião pública, por meio da sugestão irracional repetida, uma associação entre a imagem hedionda do nazi-fascismo e a de qualquer resistência, por mais mínima e discreta, que se oponha aos caprichos e exigências da militância enragée.
Extremismo é, por definição, o emprego de meios violentos para impor mudanças ainda mais violentas, como por exemplo leis raciais darwinistas ou a supressão forçada da religião. Quando a imprensa em massa, com o maior ar de inocência, passa a chamar de "extremista" qualquer cidadão pacífico que se apegue aos mandamentos de sua velha religião em vez de curvar-se com veloz solicitude às exigências repentinas de revolucionários histéricos, estamos diante de um caso óbvio de manipulação, destinada a forçar a rápida implantação de novos hábitos e valores por meio do engodo, eludindo os riscos do debate honesto e franco.
Se alguém dissesse, com todas as sílabas, que ser contra casamentos de machos com machos é nazismo, a mentira grotesca se denunciaria no ato. Embutida em frases de noticiário, passa como obviedade inofensiva. Repetido o truque algumas vezes, já se pode proclamá-la em voz alta sem risco de contestação: o hábito introjetado bloqueia as objeções conscientes.
A maior parte da Humanidade não tem defesa contra esse ardil. Espremidos entre a hipótese de ceder às novas palavras de ordem e a de tornar-se suspeitos de nazismo, quantos cidadãos terão o tempo e a prudência de tomar um recuo, de rejeitar a formulação do problema, de desmontar a armadilha lógica preparada para limitar sua visão dos fatos e sua capacidade de escolha? A maioria simplesmente aceitará a opção que lhe impõem. É verdade que cada concessão, isolada, significa pouco. Mas o efeito acumulado de milhares de pequenas concessões é o comprometimento integral da alma, a completa abdicação do juízo crítico. Não se pode nem chamar isso de servidão voluntária: é a servidão hipnótica.
Uma imprensa que submete seus leitores a esse tratamento não tem a menor idéia do que sejam democracia e liberdade de opinião, pois se esforça para liquidá-las no ato mesmo em que alardeia defendê-las. Não há debate possível sem o acesso consciente aos problemas em disputa. Tanto quanto a censura ostensiva, a transferência proposital das escolhas para o reino nebuloso das reações inconscientes é um abuso de autoridade, uma prepotência cínica que suprime o direito de saber, fundamento do direito de opinar.
A falsa rotulação de extremismo é só um exemplo entre milhares. Ninguém, hoje em dia, pode se dizer um cidadão livre e responsável, apto a votar e a discutir como gente grande, se não está informado das técnicas de manipulação da linguagem e da consciência, que certas forças políticas usam para ludibriá-lo, numa agressão mortal à democracia e à liberdade.
Essas técnicas são de emprego maciço, constante e pertinaz nos meios de comunicação e nas escolas. Apesar de sua imensa variedade, todas têm por princípio básico a distração induzida, o bloqueio sutil do julgamento consciente. Opiniões que, expostas com nitidez, suscitariam a mais obstinada oposição, são facilmente aceitas quando apresentadas de maneira implícita e envoltas numa névoa de desatenção. Há publicações inteiras, programas de TV inteiros, livros didáticos inteiros que são, de ponta a ponta, desatenção planejada.
Até a década de 70, quando a maior parte das técnicas a que me refiro estava ainda em fase de estudos em laboratório, os intelectuais se interessavam pelo assunto, investigavam, discutiam a imoralidade e a periculosidade da ameaça iminente que elas representavam para a democracia.
Charles Morgan deu o alarma em "Liberties of the Mind", Aldous Huxley em "Regresso ao admirável mundo novo", Arthur Koestler promoveu congressos internacionais para discutir o perigo, Ivan Illitch fez pesquisas memoráveis sobre a manipulação das consciências pelo establishment médico e educacional.
De súbito, as discussões cessaram e as técnicas denunciadas foram entrando, uma a uma, sem a menor resistência, no uso cotidiano de jornais, escolas, canais de TV. Não é de estranhar que essa mudança tenha sido acompanhada de um vasto recrutamento de intelectuais "progressistas" para organismos internacionais, ONGs, serviços secretos e outras entidades interessadas em conduzir a discreta mutação psíquica dos povos. Hoje praticamente não há mais intelectuais independentes. Todos se cansaram de "interpretar o mundo" e aceitaram ser bem pagos para "transformá-lo".
A elite de intelectuais ativistas que hoje maneja os cordões é tão cínica que chega a inventar as mais artificiosas justificativas ideológicas dessa manobra maquiavélica. É inútil argumentar racionalmente, proclama Richard Rorty: tudo o que podemos fazer, diz ele, é "inculcar sutilmente nas pessoas os nossos modos de falar". E Antonio Gramsci, antecipando-se aos tempos, já tinha criado toda uma teoria da "revolução passiva" para demonstrar que a sonsa indiferença da multidão distraída vale por adesão explícita e basta para provar que a tomada do poder pelos comunistas foi uma escolha democrática do povo.
Como não enxergar a dose extraordinária de malícia, de presunção arrogante, de desprezo pela liberdade de consciência, que há nessas doutrinas de farsantes e tiranetes?
Publicado em O Globo, 15 de julho de 2000
Uma nota, assinada pela Secretaria de Segurança Pública e comandantes das três forças (CBMDF, PMDF e PCDF), afastou indícios de terrorismo na conduta do sargento CBMDF Fabrício Santos, o qual, durante um surto psicótico ou algo parecido, tomou a direção de um caminhão de sua corporação e disparou rumo ao Congresso Nacional, altas horas da noite, quando os senhores parlamentares dormiam nos braços de Morfeu.
No entanto, os comandantes das forças informaram que o sargento responderá pelos crimes de furto qualificado, desobediência, danos ao material da administração militar e tentativa de dano.
O Judiciário, por sua vez, lastreado na lista de crimes, converteu a prisão em flagrante em preventiva, sem recorrer a nenhuma das medidas cautelares diversas da privação de liberdade previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, como é, aliás, de costume nas audiências de custódia.
Não vejo como enquadrar a ação do sargento no artigo 155 do Código Penal, uma vez que, ao se apoderar do caminhão do Corpo de Bombeiros, ele não tinha a intenção de subtrair para si coisa alheia móvel. Acostumado a conduzir esse tipo de veículo durante 10 anos, Fabrício, durante o surto, tendo acesso às chaves, usou o caminhão para executar um gesto tresloucado.
A desobediência e o dano são apurados por meio de Termo Circunstanciado, caso em que, se estiver em pleno gozo de suas faculdades mentais, o autor do fato assina Termo de Compromisso de Comparecimento a Juízo e é liberado de imediato.
A análise das circunstâncias demonstra que o autor não estava em pleno gozo de suas faculdades mentais, deveria ter sido submetido a uma avaliação psiquiátrica e até internado por ordem judicial, ad cautelam, ou recolhido administrativamente pelo Corpo de Bombeiros Militar, com base no Código Penal Militar e Código de Processo Penal Militar, mas não ser trancafiado como um preso qualquer, quando, pela análise da situação, até um leigo perceberá que não é bem assim.
Por fim, lamenta-se que, na ânsia de aparecer, alguém teve a ideia de espalhar que se tratava de ato terrorista. Desmontada a versão, passaram a tratar o profissional como ladrão, numa prova de que uma grande parte da humanidade perdeu a compaixão e está muito longe de ser humana.
Miguel Lucena é Delegado de Polícia Civil do DF, jornalista e escritor.
Nota de Heitor De Paola
Eis o texto do cardeal Carlo Caffarra (foto) ao qual fiz referências no programa O Outro Lado da Notícia do dia 22 de setembro, gentilmente traduzido por Ageu Marinho e publicado originalmente pelo LifeSiteNews.
A “última barreira” para Satã destruir a humanidade é a dualidade masculino/feminino, afirma cardeal dubia
Por Claire Crétian
Uma ideologia global alimentada por uma liberdade “insana” e “literalmente louca” agora está tentando destruir a “última barreira” que preserva a humanidade de perder o significado de ser “humano”, a saber, a “natureza sexual da pessoa humana na sua dualidade de homem e mulher”, escreveu o cardeal Carlo Caffarra, um cardeal “dubia” recentemente falecido, em um manuscrito publicado pela primeira vez no LifeSiteNews. [“Dubia cardinals” é como são designados os cardeais signatários das dúvidas levantadas ao Papa Francisco por ocasião da publicação da encíclica Amoris Laetitia].
Caffarra escreveu o manuscrito como um prefácio ao livro da socióloga Gabriele Kuby intitulado A Revolução Sexual Global: A Destruição da Liberdade em nome da Liberdade [no original: The Global Sexual Revolution: Destruction of Freedom in the Name of Freedom]. Porém o livro seguiu para impressão antes que as palavras do cardeal fossem recebidas. O manuscrito foi obtido pelo LifeSiteNews.
* * *
Texto completo do prefácio não publicado do cardeal Carlo Caffarra para o livro de Gabriele Kuby “A Revolução Sexual Global – A Destruição da Liberdade em Nome da Liberdade”.
Traduzido para o inglês por Diane Montagna.
O estudo de Gabriele Kuby sobre o panorama cultural no presente livro é um clamor de trombeta para despertar-nos do torpor da razão que nos está arrastando para a perda de liberdade consequentemente de nós mesmos. E Jesus já nos advertira que isso, a perda de nós mesmos, seria a mais trágica perda de todas, ainda que ganhássemos todo o mundo.
A cada página que lia, ouvia dentro de mim mesmo as palavras do enganador do mundo todo: “Você será como Deus, conhecendo o bem e o mal” (Gn 3:5).
A pessoa humana elevou-se a si mesmo a uma posição de autoridade moral soberana na qual “Eu” sozinho determino o que é bom e o que é mal. Essa é uma liberdade que é literalmente louca: é uma liberdade sem logos (isto é, razão ou princípio ordenador).
Mas se esse é o contexto teórico (se posso colocar desta forma) do livro inteiro, a obra examina especificamente a destruição da última realidade que permanece de pé no seu caminho. Como irei explicar, o livro também aponta como a liberdade que enlouquece gradualmente engendra as mais devastadoras tiranias.
David Hume escreveu que fatos são coisas teimosas: eles teimosamente desafiam qualquer ideologia. A autora demonstra, e eu considero que acertadamente, que a última barreira a qual essa liberdade insana deve demolir é a natureza sexual da pessoa humana na sua dualidade de homem e mulher, e na sua instituição racional estabilizada pelo casamento monogâmico e pela família. Atualmente essa causa insana está destruindo a sexualidade natural humana e por conseguinte também o casamento e a família. Estas páginas, dedicadas a examinar essa destruição, contêm uma rara profundidade de percepção.
Mas há um outro tema que corre através das páginas deste livro: a obra dessa insana liberdade tem uma estratégia precisa, pois está sendo dirigida, guiada e governada em nível global. Qual é essa estratégia? É aquela d’O Grande Inquisidor, de Dostoyevsky, que diz a Cristo: “Você dá a eles liberdade eu dou-lhes pão. Eles me seguirão.” A estratégia é clara: dominar o homem formando um pacto com um de seus instintos básicos. O novo Grande Inquisidor não mudou a estratégia. Ele diz a Cristo: “Você promete regozijo no prudente, íntegro e casto exercício da sexualidade; eu prometo o gozo desregrado. Você verá que eles me seguirão.” O novo Inquisidor escraviza através da ilusão do prazer sexual completamente livre de regras.
Se, como acredito, a análise de Gabriele Kuby é algo que é compartilhado, há apenas uma conclusão. O que Platão previu acontecerá: liberdade extrema conduzirá à mais grave e feroz tirania. Não é coincidência que a autora fez dessa reflexão platônica a epígrafe do primeiro capítulo: um tipo de chave interpretativa de todo o livro.
E os clérigos? Não é incomum que eles se contentem em ser facilitadores dessa eutanásia da liberdade. E ainda, como Paulo nos instruiu, Cristo morreu para nos tornar verdadeiramente livres.
Eu espero que este grande livro seja lido por aqueles que têm responsabilidades públicas, por aqueles que têm responsabilidades educacionais, e pelos jovens, as primeiras vítimas do novo Grande Inquisidor.
* O Cardeal Carlo Caffarra é Arcebispo Emérito de Bolonha.
(1) Em inglês, intensifying verb. Essa expressão foi um problema tanto para o tradutor como para o editor (Heitor). Esta solução é do editor.
http://www.heitordepaola.com
(Publicado originalmente em www.mises.org.br)
Antes da Revolução Russa, o Partido Comunista tinha duas alas: Bolchevique e Menchevique.
Os Bolcheviques acreditavam na imediata imposição do socialismo por meios violentos, com confisco armado das propriedades, das fábricas, e das fazendas, e o assassinato dos burgueses e reacionários que porventura oferecessem resistência.
Já os Mencheviques (que também se autorrotulavam social-democratas) defendiam uma abordagem mais gradual, não-violenta e não-revolucionária para o mesmo objetivo. Para estes, a liberdade e a propriedade deveriam ser abolidas pelo voto da maioria.
Os Bolcheviques venceram a Revolução Russa e implantaram o terror. No entanto, após cometerem crimes inimagináveis, eles praticamente desapareceram do cenário. Já os Mencheviques, no entanto, não apenas seguem vivos como também se fortaleceram e se expandiram, e estão no poder de boa parte dos países democráticos.
Os mencheviques modernos seguem, em sua essência, as mesmas táticas dos Mencheviques russos: em vez de abolirem a propriedade privada e a economia de mercado, como queriam os Bolcheviques, os atuais mencheviques entenderam ser muito melhor um arranjo em que a propriedade privada e o sistema de preços são mantidos, mas o estado mantém os capitalistas e uma truncada economia de mercado sob total controle, regulando, tributando, restringindo e submetendo todos os empreendedores às ordens do estado.
Para os mencheviques atuais, tradições burguesas como propriedade privada e economia de mercado devem ser toleradas, mas a economia tem de ser rigidamente regulada e tributada. Políticas redistributivistas são inegociáveis. Uma fatia da renda dos indivíduos produtivos da sociedade deve ser confiscada e redistribuída para os não-produtivos. Grandes empresários devem ser submissos aos interesses do regime e, em troca, devem ser beneficiados por subsídios e políticas industriais, e também protegidos por tarifas protecionistas.
Acima de tudo, cabe aos burocratas do governo — os próprios mencheviques — intervir no mercado para redistribuir toda a riqueza e manter a economia funcionando de acordo com seus desígnios.
No entanto, a estratégia menchevique não se resume à economia. A questão cultural é tão ou mais importante. Para os mencheviques atuais, a cultura burguesa deve ser substituída por uma nova mentalidade condicionada ao modo de pensar social-democrata, e a estratégia para isso consiste na imposição lenta e gradual de uma revolução cultural.
Os mencheviques, fiéis ao seu ideal "democrático", sempre se sentiram desconfortáveis com a ideia de revolução, preferindo muito mais a "evolução" gradual produzida pelas eleições democráticas. O estado deve ser totalmente aparelhado por intelectuais partidários e simpatizantes, de modo a garantir uma tomada hegemônica das instituições culturais e sociais do país. Daí a desconsideração pelos gulags e pela revolução armada.
Como tudo começou
As raízes do menchevismo atual não estão na Rússia de Lênin, mas sim na Londres de 1883, quando um grupo de socialistas adeptos do gradualismo fundou a Sociedade Fabiana. Liderada por um cidadão chamado Hubert Bland, os mais famosos membros da sociedade eram o dramaturgo George Bernard Shaw, os autores Sidney e Beatrice Webb, e o artista William Morris.
A Sociedade Fabiana tem este nome em homenagem a Quintus Fabius Maximus, político, ditador e general da República Romana (275-203 a.C.) que conseguiu derrotar Aníbal na Segunda Guerra Púnica adotando a estratégia de não fazer confrontos diretos e em larga escala (nos quais os romanos haviam sido derrotados contra Aníbal), mas sim de incorrer apenas em pequenas e graduais ações, as quais ele sabia que podia vencer, não importa o tanto que ele tivesse de esperar.
Em suma, Quintus Fabius Maximus era um estrategista militar que evitava qualquer confrontação aberta e decisiva; em vez disso, ele preferia fatigar seus oponentes com táticas procrastinadoras e cansativas, manobras enganadoras e assédios contínuos.
Fundada exatamente no ano da morte de Marx com o intuito de promover as idéias do filósofo alemão por meio do gradualismo, a Sociedade Fabiana almejava "condicionar" a sociedade, como disse a fabiana Margaret Cole, por meio de medidas socialistas disfarçadas. Ao atenuar e minimizar seus objetivos, a Sociedade Fabiana tinha o intuito de não incitar os inimigos do socialismo, tornando-os menos combativos.
Ao contrário dos revolucionários marxistas, os socialistas fabianos conheciam muito bem o funcionamento das políticas públicas britânicas. Sendo os especialistas originais, eles fizeram várias pesquisas, elaboraram planos, publicaram panfletos e livros, e criaram várias propostas legislativas, sempre contando com a ajuda de aliados nas universidades, igrejas e jornais. Eles também treinaram oradores, escritores e políticos. Sidney Webb foi além e fundou a London School of Economics em 1895 para ser o quartel-general desse trabalho.
Embora a Sociedade Fabiana jamais houvesse tido mais do que 4.000 membros, foram eles que criaram, promoveram e conduziram pelo Parlamento a maior parte das políticas sociais britânicas até o início da década de 1980. O resultado foi uma economia em frangalhos e uma sociedade esclerosada, situação esta que só começou a ser revertida quando Margaret Thatcher começou a "desfabianizar" a Inglaterra.
Os fabianos foram bem-sucedidos em seu objetivo de criar um "estado provedor", um estado assistencialista que cuidaria não apenas dos pobres, mas também da classe média, do berço ao túmulo.
Seja na forma de compensações trabalhistas, ou de pensões e aposentadorias, seguro-desemprego e medicina socializada, os fabianos sempre enfatizaram a "reforma social". Segundo o escritor John T. Flynn, os fabianos
Perceberam prematuramente o imenso valor das reformas sociais em acostumar os cidadãos a ver o estado como a ferramenta para curar todas as suas doenças e inquietudes. Eles viram que uma agitação em prol de um estado assistencialista poderia se tornar o veículo ideal para incutir idéias socialistas nas mentes do cidadão comum.
Outra inovação fabiana: reformas sociais invariavelmente envolviam algum tipo de "seguridade". As pessoas seriam induzidas a aceitar o socialismo caso este fosse apresentado por meio de modelos oriundos das ciências atuariais, tendo empresas de seguro como base.
Empresas de seguro genuínas, baseando-se em estatísticas de distribuição aleatória de acidentes, coletam dinheiro de seus segurados na forma de um consórcio e concentram-no em um fundo, desta forma tornando o mundo menos incerto para seus membros. Os fabianos, muito espertamente, pegaram esse modelo e disseram: concentremos a riqueza de todos nas mãos do estado e seremos felizes, saudáveis e teremos uma vida melhor.
Aneurin Bevan, o ministro da saúde fabiano do governo trabalhista dos pós-guerra, que criou o National Health Service — o sistema estatal de saúde britânico (veja algumas notícias recentes da saúde britânica estatal aqui, aqui, aqui e aqui) —, chegou realmente a argumentar que tal modelo iria drasticamente aumentar a expectativa de vida de todos, chegando ao ponto de postergar a morte indefinidamente.
Mas a verdadeira visão fabiana do estado foi mais bem explicitada no livro de Sidney e Beatrice Webb intitulado Soviet Communism: A New Civilization?, publicado em 1935 (o ponto de interrogação foi removido do título após a primeira edição). O livro glorificava a URSS de Stalin como se fosse virtualmente um paraíso na terra.
Como marxistas, embora de uma outra estirpe, os Webbs aprovavam o stalinismo — se não os meios, os fins. "Os fabianos eram, de uma certa forma, marxistas mais bem treinados do que o próprio Marx", disse Joseph Schumpeter. Que continuou:
Concentrar-se nos problemas que podem ser alterados por métodos políticos práticos, adaptar-se à evolução das questões sociais, e deixar o objetivo supremo ser alcançado automaticamente [por meio da alteração cultural das massas] é algo que está muito mais de acordo com a doutrina fundamental de Marx do que a ideologia revolucionária que ele próprio propôs.
Conclusão
No linguajar fabiano, impostos são "contribuições", gastos do governo são "investimentos", criticar o governo é "entreguismo" ou "falta de patriotismo", donos de propriedades são "elites", "reacionários" e "privilegiados", e "mudança" significa " socialismo".
Quando os atuais social-democratas pedem "sacrifícios" da população em prol dos "ajustes" do governo, tenha em mente que os fabianos diziam exatamente o mesmo, defendendo, segundo as próprias palavras de Beatrice Webb, a "transferência" da "emoção do serviço sacrificante" de Deus para o estado.
Para os fabianos, o estado (seus burocratas e toda a sua mentalidade) é o único deus por quem a população deve se sacrificar.
Por fim, vale ressaltar que o desaparecimento dos bolcheviques nunca foi lamentado pelos social-democratas fabianos. Muito pelo contrário: os social-democratas fabianos agora detêm o monopólio da marcha "progressista" da história rumo à Utopia.
A janela de vidro pintada que adorna a casa de Beatrice Webb em Surrey, Inglaterra, mostra George Bernard Shaw e Sidney Webb remodelando o mundo com uma bigorna, tendo ao fundo o brasão da Sociedade Fabiana: um lobo em pele de cordeiro. Aquele lobo está hoje entre nós.
* Lew Rockwell é o chairman e CEO do Ludwig von Mises Institute, em Auburn, Alabama, editor do website LewRockwell.com, e autor dos livros Speaking of Liberty e The Left, the Right, and the State.