Percival Puggina

26/04/2016

 

 Transcrevo resposta a uma mensagem que recebi de leitora (1) com críticas ao meu anterior artigo sobre reações feministas à matéria em que a revista Veja ocupou-se da esposa do vice-presidente da República.

Prezada senhora. Agradeço sua mensagem. Devo dizer que o artigo que escrevi sobre o assunto foi curtido por quase 500 pessoas. Quarenta e oito por cento, mulheres. Portanto, a leitura que a senhora faz dos fatos não é mais do que uma opinião em torno da qual há divergências substanciais.

Detalho um pouco mais, aqui, meu entendimento. A matéria da Veja é irrelevante, de interesse apenas para quem tem curiosidade sobre a vida das celebridades. Não me parece que, ao finalizar dizendo que Temer é um homem de sorte, a revista ou a jornalista Juliana Linhares estejam sinalizando o estilo de vida que dona Marcela escolheu como algo a ser afirmado como padrão. Até porque, sendo a autora jornalista da Veja, estaria, ela mesma, se excluindo do suposto padrão que a senhora e outros quiseram encontrar nas entrelinhas de seu texto.

Quanto ao mais, o estilo de vida que dona Marcela escolheu para si é algo que diz respeito a ela e à família dela. Fazê-la objeto de uma saraivada de críticas como percebi, consultando posts aqui e ali (e foram ignoradas no seu comentário), é uma coisa sem sentido que me parece não encontrar de parte dela conduta correspondente. Muitas feministas querem o direito de viver como bem entendem e se escandalizam com a vida que Marcela escolheu... Paradoxo! E esse paradoxo foi um dos pontos que sublinhei em meu artigo.

Por outro lado, quando feministas criam movimentos e promovem ações públicas, sujeitam-se ao crivo da opinião alheia. Ações externas, manifestações de rua, conteúdos publicados nas redes sociais, perdem o caráter privado e íntimo que impediria outras pessoas de expressar suas próprias compreensões sobre tais pautas. Foi no uso desse direito que escrevi o artigo que a desagradou. E seu desagrado é tão legítimo quanto a discordância que expressei. Sem pretender uma erudição que não tenho, cito a conhecida frase de Terêncio: "Nada humano me é estranho". Um dos equívocos do feminismo é esse que a senhora comete quando pretende que apenas as mulheres possam opinar sobre questões femininas.

O mal-estar causado pela matéria da Veja só pode ter três motivos: 1) má interpretação do sentido geral do texto, algo que uma releitura talvez retifique; 2) rejeição política à revista e ao marido da senhora em questão; e 3) teimosa recusa à obviedade expressa na frase final da matéria: "Temer é um homem de sorte". Ora, negar isso é negar uma evidência. Temer é um homem de sorte, sim senhora. Quem dirá que não, sem avançar em devaneios despidos de comprovação sobre a vida íntima do casal?

Quem escreve se vale do que aprendeu e eu aprendi, vendo e lendo, que há um projeto em curso no Ocidente, atacando, por todos os flancos, os valores da civilização. O projeto revolucionário ganhou multiplicidade de formas e se concentrou em atacar a resistência cultural que o Cristianismo lhe opunha. Entre incontáveis manifestações desse fenômeno sociológico e político contemporâneo, sublinho: os ataques frontais ao cristianismo e à instituição familiar, a vulgarização da sexualidade, o tipo de ensino ideologizado que é levado aos jovens, a manipulação da história, as políticas de gênero e excessos da agenda gay, a supressão dos símbolos religiosos em espaços públicos, aberrações como a promovida para afrontar a Jornada Mundial da Juventude e a levada a efeito por alunas do ICH da UFPel em outubro passado, a vulgarização do uso de drogas, o desrespeito à propriedade privada, as rupturas da ordem e o emprego da violência em atos públicos, a tolerância para com a criminalidade, e, claro, os excessos do feminismo que, de um salto, vai da justa defesa da igualdade para o total desvario das condutas.

Tudo isso serve a um mesmo objetivo - fragilizar os valores cristãos, apagar a sã filosofia, criar um novo Direito para um projeto social e político revolucionário que, sem exceção, fracassou em todas as suas experiências históricas. Não estou vendo fantasmas. Simplesmente estou vendo.

Assim, se a senhora encontra nos seus círculos de relações dissensos em relação às posições que defendo, nada há de surpreendente: essas pautas são, mesmo, controversas. No entanto, como afirmei acima, eu sei que há, entre todas, um traço comum. Há o ataque e há a defesa de valores que muito prezo, para o bem de meus filhos, sobrinhos e netos. Como a senhora bem diz, é perfeitamente possível ser isso e não ser aquilo. A provocação que fiz na parte final do meu artigo, mencionando o impeachment, teve um objetivo para mim importante: eu quis lembrar o conjunto da obra a ser protegida. Muitas vezes, as pessoas não se dão conta de que ao perderem de vista o conjunto servem muito bem a quem tem péssimas intenções sobre o todo, vale dizer, a quem tem intenções totalitárias. E o mal que apontei nesta carta infiltra-se e se serve de todas essas pautas.

Cordialmente
Percival Puggina

 

(1) Bom dia! lamento muito que sua visão de mundo seja ou isso ou aquilo. Informo que tem muitos aquilos e muitos issos. Escrevo sobre sua coluna a respeito da bela, recatada e do lar.... São tantas as mulheres, tantas as trabalhadoras, tantas as provedoras. Qual o interesse da Veja em retratar essa senhora com esses adjetivos? Provavelmente essa senhora tem inúmeras outras qualidades também.... Por que reforçar esses? Você fala na condição de homem. Deixe falar quem sabe do que está falando. Deixe as mulheres falarem. Se feminista ou não, é a nossa opção. Politicamente, temos direito de nos posicionar. Se sim ou não ao impechment, se sim ou não a considerá-lo golpe. Não empacote as pessoas, nem as mulheres. As pessoas não pensam por blocos. Há muitas nuances. A moça tem o direito de ser como quiser... assim como todas as mulheres.... o problema está em empacotar, rotular, enaltecer algumas qualidades..... qual o interesse.... Se você se ofende com a reação da mulheres, é porque é homem. Só uma mulher sabe o que vive, o que sofre e o que precisa enfrentar diariamente.
 

Percival Puggina

24/04/2016

 

" A Constituição determina que, para que o impeachment aconteça, é preciso ter crime de responsabilidade. E não tem, contra mim, nenhuma acusação de corrupção." (Dilma Rousseff, em NY, dia 22 de abril)

 Não sei se resta algum degrau na escada da dignidade do cargo presidencial para Dilma descer e macular ainda mais a própria imagem e a imagem do Brasil. A presidente afirma que não é corrupta, como se a distância entre isso e a santidade fosse vencida numa pedalada de cinco minutos.

 Nossa dirigente máxima já cometeu crimes gravíssimos, que hoje habitam, apenas, a zona sombria de sua consciência. Foram anistiados. Ela os cometeu quando pegou em armas para implantar uma ditadura comunista no Brasil. Cometeu-os sabendo que a nação nada queria com sua organização, métodos e ideias. O desrespeito de Dilma ao Brasil e seu povo é, portanto, uma história antiga, só superada mediante robustas mistificações e maquilagem publicitária. O modelo que seguiu na juventude foi proporcionado, patrocinado e orientado pelas tiranias soviética e cubana. Era o que ela pretendia e nunca deixou de pretender, como fica patente cada vez que vai a Havana beijar as mãos sanguinárias dos Castro. Dela nunca se ouviu palavra de arrependimento.

 Hoje, ao afirmar que não é corrupta, a presidente objetiva, de um lado, transmitir a falsa ideia de que apenas a corrupção pessoal pode motivar um processo como o que enfrenta. Ora, ainda que não tenha auferido recursos da corrupção, esses crimes, praticados dentro do seu governo, pela equipe sob seu comando e supervisão, ao longo de mais de uma década, proporcionaram a ela e a seu partido a manutenção do poder. Mas Dilma, a exemplo de Lula, nada soube e nada viu. Tudo lhe caiu do céu. Se a corrupção é o crime por excelência no teatro da política, por que tanto desmazelo? Por que tantos corruptos notórios no seu entorno? Por que agasalhar Lula com o cobertor de um ministério, para "usar em caso de necessidade"?

 Por outro lado, quanto ao impeachment, Dilma e os seus parecem considerar irrelevante o controle parlamentar sobre a despesa pública. Tal desprezo é próprio de pessoas acostumadas a usarem nosso dinheiro para proveito pessoal ou político! Ignorância pura e simples é que não há de ser. Refresquemos a memória: não foi para estabelecer esse controle que nasceram os parlamentos deliberativos? Não foi principalmente por ele que, em 1215, se revoltaram os barões ingleses redigindo a Magna Carta Libertatum e exigindo do rei João que a assinasse? Estamos falando de um princípio constitucional com oito séculos de vigência! Sua ruptura é grave ofensa ao parlamento e à nação.

 Nossa presidente mentiu desbragadamente aos eleitores em 2014; afundou as contas públicas, a economia privada e grandes estatais; fez disparar o desemprego; furou os tetos a respeitar e os pisos a não transpor. Transformou o Palácio em pavilhão de comício e comitê central de seu partido. Vive encapsulada para escapar de vaias e panelaços. Esfarelou seu apoio parlamentar e, em desmedida soberba, quer permanecer assim até 2018.

Acontece que o amor próprio de Dilma contrasta com seu desamor ao Brasil. Ele estava presente nos tempos da clandestinidade, no internacionalismo inerente ao comunismo, no desapreço às nossas raízes e à nossa história, na sempre ardilosa construção da luta de classes e no conceito da Pátria Grande, falsamente bolivariana e verdadeiramente comunista, urdida nos conluios do FSP e da Unasul.

Dia 22, em Nova Iorque, esse desvario chegou ao cúmulo de sugerir sanções do Mercosul e da Unasul ao Brasil caso seu impeachment avance. Nossa presidente repete Luís XV: "Depois de mim, o dilúvio!". Afoguemo-nos todos. As recentes manifestações de Dilma no palco internacional correspondem ao item 7 do art. 9º da Lei dos Crimes de Responsabilidade: "Proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo". Ou não?

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.


 

Percival Puggina

21/04/2016

 

 As mulheres são os seres mais admiráveis da criação, um nadinha assim abaixo dos anjos. Por esse motivo, aliás, chamar mulher de anjo talvez seja a mais comum das metáforas. Paradoxalmente, a reconhecida dificuldade de entendê-las ocupa bom lugar no repertório de encantos femininos. Mulheres são mesmo assim, não por que sejam menos racionais, mas porque não é apenas nas obras ficcionais que o mistério atrai. Não sem razão, Oscar Wilde escreveu que as mulheres não devem ser entendidas, mas amadas. Ponto, Oscar. Não precisa dizer mais nada.

 Este breve preâmbulo tem a ver com dona Marcela. Para quem ainda não sabe do novo hit das redes sociais, a jovem senhora é a esposa do vice-presidente Michel Temer. "Bela, recatada e do lar", na expressão usada em matéria publicada no site da Veja, Marcela provocou ondas de indignação que se propagaram com aquela velocidade por vezes difícil de explicar, embora se entenda como funciona: o assunto faz a pauta, que faz o assunto e assim sucessivamente até que a energia se dissipa e tudo cai no esquecimento. Nesta semana, porém, Marcela - bela, recatada e do lar - é assunto. Não porque queira, mas porque as pessoas se interessam pela vida dos famosos. Muita gente ganha dinheiro e notoriedade dedicando-se a escrever e a falar sobre eles. O que turbinou o interesse pela mulher do vice-presidente foi se declarar "do lar". Marcela não trabalha! Dedica-se à casa, ao marido e ao filho! No pleno exercício de sua liberdade, escolheu essa vida para viver!

 Escândalo! Bastou a informação para que as feministas se ouriçassem e não apenas fizessem cair sobre ela seu desprezo e seus anátemas, mas os propagassem como vírus na internet para que tal repulsa sirva de exemplo e nenhuma outra criatura se atreva a conferir celebridade a semelhante opção de vida.

Se já é difícil entender as mulheres, mais difícil ainda é entender as feministas. Valha-me Deus, no momento em que me ponho perante esse mistério. Pergunto: não é o feminismo uma espécie de libertarianismo do qual não escapa qualquer dimensão do ser mulher? Não é ela, senhora de si mesma? Seu poder e seus direitos não incidem até mesmo sobre a vida do filho em seu ventre? Não deve ela estar liberada de todas as amarras e opressões?

Sob tais conceitos, dos quais em parte divirjo, não consigo entender como milhares de mulheres e alguns homens alinhados com essas ideias possam pretender impor a Marcela - bela, recatada e do lar - o estilo de vida por eles prescrito para o tipo de mulher que idealizam. Como se essa idealização não fosse (e os textos nas redes sociais mostraram que é) uma forma de opressão e tirania. Marcela acaba de se descobrir "politicamente incorreta"...

Saiba, leitor: se você fizer uma enquete entre quantos palpitam sobre a vida da mulher do vice-presidente descobrirá que "todas e todos" acham que impeachment é golpe.

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

 

Percival Puggina

18/04/2016

 

Assisti de ponta a ponta a sessão da Câmara dos Deputados que deliberou sobre a admissibilidade do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Foi uma experiência emocionante e muito instrutiva. Nos telões armados no Parque Moinhos de Vento (Parcão) em Porto Alegre, em uníssono com a multidão, vibrei a cada Sim e vaiei a cada Não. Devo ter calculado quase uma centena de regras de três tentando antecipar um sempre cambiante resultado final.

Muito instrutiva a observação dos votantes, em especial a turma do Não. Marcharam para o cadafalso político uniformemente ensaiados. Repetiam os mesmos mantras que se revelaram inúteis ao longo dos últimos 15 meses! Levaram suas frases feitas até o alçapão da derrota. Traziam nos olhos um postiço furor cívico. Entre elas, o paradoxal estribilho sem verso "Impeachment é golpe" - uma contradição em termos porque o ato não pode ser as duas coisas: ou é impeachment ou é golpe. Ao final, temos que o povo, o TCU, boa parte da mídia, o STF, o Hélio Bicudo (quem diria?) e mais de 2/3 da Câmara são, todos, "golpistas". E se somam ao "golpista" magistrado Sérgio Moro, aos também "golpistas" promotores que atuam na Operação Lava Jato (outra conspiração) "golpista" e à notoriamente "golpista" Polícia Federal. Por quê? Porque diante do terremoto moral, econômico, fiscal e social que acometeu o governo e o pais, isso é tudo que o PT tem a dizer à nação. No meu modo de ver, em vista das proporções que tomou, o governo da República é o maior e mais danoso golpe impetrado num país democrático desde que Hitler chegou ao poder na Alemanha.

Um segundo mantra se repetiu ao longo da sessão. Refiro-me aos desaforos, em tom crescente, dirigidos a Eduardo Cunha. Entre os adjetivos de uma escala que começava com "patife" e chegava até "gangster", restaram poucos não utilizados pelos que pretenderam ser originais.

Não me surpreenderam os ataques ao presidente, que muito provavelmente os merecesse. O que me espantou foi constatar que partiam de bancadas empenhadas, ao último fio de voz, à última lufada de ar dos pulmões, na defesa de uma organização criminosa inteira. Organização que se apossou do poder central da República e ali praticou (no pouco que já se sabe com prova provada) o maior saque de que se tem notícia na história universal. Diante dela, Cunha entra na lista como mero trombadinha. Mas para o PT, enquanto Cunha é um bandido cuja presença na sessão deslegitima a deliberação do último domingo, o partido, com quanto pesa contra si, é um insubstituível modelo de virtudes, apto a dar lições de dignidade ao mundo.


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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

17/04/2016

 

 O governo petista tem sido muito ingrato com Eduardo Cunha. De março até dezembro de 2015, os pedidos de impeachment oriundos dos mais variados cantos do país faziam fila no protocolo da Câmara. Enquanto a nação se alvoroçava, movida a estelionato eleitoral e Lava Jato, o presidente da Casa, como bom vendeiro, usou aquela munição para negociar proteção a si mesmo, em especial na Comissão de Ética. Houve um período - vejam só - em que os três deputados do PT naquele nobre colegiado ajudaram Cunha, ausentando-se para que as reuniões não tivessem quórum. Apenas quando se viu perdido, em 2 de dezembro, muito a contragosto, o deputado retirou da pilha o requerimento que hoje segue curso constitucional no Congresso.

 Esse prazo proporcionado pelos cambalachos do presidente da Câmara deveria ter sido entendido como de fato era: uma dádiva em meio ao infortúnio. Bem usado, cada dia desses meses valia mais do que uma boca livre no Piantella para toda a bancada. De fato, a deliberada morosidade de Cunha proporcionou ao PT e ao governo tempo para mudar rumos, desculpar-se, curar-se e abandonar a arrogância tão presunçosa quanto vazia. O partido poderia emitir sinais de arrependimento, reconhecendo seus erros. Livrar-se dos corruptos expurgando as más companhias internas e externas. Admitir a má condução da política econômica e dar adeus definitivo à irresponsabilidade fiscal. Poderia entender que vitória eleitoral não é credencial para apropriação do Estado.

Todas essas condutas e atitudes implicam sofrimento moral. Mas todas são muito mais saudáveis e menos ofensivas à razão e ao eleitorado do que fazer de conta que os males não existiram e que os crimes não foram cometidos. Irrecuperavelmente danoso é chamar corruptos de heróis do povo brasileiro; é louvar criminosos e acusar o juiz; é condenar o vazamento e silenciar sobre o que vazou; é repetir sandices como a de que criticar o governo é coisa de quem não gosta de ver pobre dentro de avião; é afirmar, à exaustão de toda paciência, que partido e governo são vítimas de conspiração promovida por meia dúzia de golpistas; é excitar ânimos e conclamar milícias ao uso da violência; é comprar da freguesia apoio parlamentar por lote e cabeça; é esperar que sujeiras pretéritas encubram as atuais; é crer que denunciar o passado suscite mais interesse do que retificar o presente e o futuro.

Ambos, partido e governo escolheram persistir nos mesmos erros e usaram contra si mesmos o valioso tempo de que dispuseram. Quando perceberam ... (por exigência contratual de exclusive com o veículo, para este conteúdo, o restante do artigo deve ser lido em http://zh.clicrbs.com.br/rs/opiniao/colunistas/percival-puggina/ultimas-noticias/).
 

Percival Puggina

15/04/2016

 

É muito comum que jovens com interesse na política, percebendo a necessidade de participarem mais efetivamente na vida local, regional e nacional, consultem minhas barbas brancas sobre o partido ao qual deveriam filiar-se. Eu me angustio diante dessa pergunta. Como dizer o que devo sem desestimular o idealismo daquela alma juvenil? Quem ingressa na política com ideais no coração, princípios e valores impressos na consciência e ideias na cabeça levará um imediato choque de realidade. A política não poupa esses sentimentos.

Obrigo-me, então, a uma longa explicação sobre o que leva os partidos a escavarem sem cessar o fundo do poço do descrédito. Levo em conta, ao dialogar com esses jovens, que o choque de realidade gerado por algumas palavras fortes é mais positivo do que o impacto que ela, a realidade, nua e crua, possa gerar sobre almas desavisadas. Já vi isso acontecer muitas vezes para desconsiderar seu significado nos indivíduos e na própria política. Esta é um espaço onde o mal conta com facilidades para sobrepujar o bem e onde, com muita frequência, as opções se fazem entre um mal maior e um mal menor. O bem não leva uma vida fácil na política. E, mesmo assim, há que escolher; e mesmo assim ela é uma atividade essencial à vida dos povos.

Vem-me à mente, enquanto escrevo, algumas palavras do meu amado papa João Paulo II na longa exortação que dirigiu aos leigos em 1988. Transcrevo-as: 

"(...) todos e cada um têm o direito e o dever de participar na política, embora em diversidade e complementaridade de formas, níveis, funções e responsabilidades. As acusações de arrivismo, idolatria de poder, egoísmo e corrupção que muitas vezes são dirigidas aos homens do governo, do parlamento, da classe dominante ou partido político, bem como a opinião muito difusa de que a política é um lugar de necessário perigo moral, não justificam minimamente o ceticismo nem o absenteísmo dos cristãos pela coisa pública. Pelo contrário, é muito significativa a palavra do Concílio Vaticano II: «A Igreja louva e aprecia o trabalho de quantos se dedicam ao bem da nação e tomam sobre si o peso de tal cargo, ao serviço dos homens»".

Parece-me muito adequado esse facho de luz para esclarecer uma realidade como a brasileira nestes dias tormentosos em que a esperança voa errante sem lugar de pouso. É preciso compreender que a política continuará determinando destinos, mas o Estado será tão mais útil quanto mais empenhado em se tornar crescentemente desnecessário; que sempre haverá escolhas a fazer e que, por vezes, nada será melhor do que o mal menor; que a maior riqueza de uma nação repousa em seus jovens e que lhes proporcionar condições para uma vida produtiva pelo conhecimento e pelo trabalho é muito mais significativo a eles e à nação do que manipulá-los ideologicamente.

O saber, a cultura, o trabalho, a busca do mérito, a liberdade, o amor ao Bem (ainda que vago, mas verdadeiramente amado) não podem estar ausentes da Política e do Direito. E cabe a nós dar-lhes vida e vigência. Não teremos qualquer esperança se não formos, nós mesmos, a esperança.

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

12/04/2016

 

 Depois de longas horas assistindo a sessões da comissão especial do impeachment, posso testemunhar que o maior antagonismo não se formou entre o sim e o não, entre direita e esquerda, governistas e opositores. A mais notória divergência foi a mesma que, historicamente, se estabelece entre a verdade e o partido governista. Nele, fato, história, realidade e verdade são submetidos ao filtro das conveniências e ganham, sempre e sempre, o aspecto e a versão que mais convém aos seus interesses.

  Tal ditame integra a natureza mesma dos partidos revolucionários e totalitários de qualquer viés, criados para constituir uma nova ordem e sendo, portanto, insubmissos à ordem e à moral vigentes. Rápida folheada de vista na história é suficiente para estampar profusão de exemplos dessas ocultações trapaceiras em novelos de falsidades, mistificações e dissimulações. É aquilo que estava, por exemplo, na cabeça de Brecht quando, em "A medida punitiva", estabeleceu: "Quem luta pelo comunismo tem que dizer a verdade e não dizer a verdade, manter a palavra e não cumprir a palavra (...). Quem luta pelo comunismo tem de todas as virtudes apenas uma - a de lutar pelo comunismo".

Não era diferente a convicção de Goebbels, ministro de Propaganda de Hitler, quando ensinou que a mentira repetida mil vezes torna-se verdade. Foi o que ainda ontem (11/04), em sua última fala na sessão da Comissão Especial, num rasgo de sinceridade, o deputado José Guimarães, líder do governo, disse sobre a vinculação entre impeachment e golpe: "Pegou!", disse ele. "A vinculação entre impeachment e golpe pegou". Não se trata, necessariamente, de uma vinculação real. É uma vinculação que, pela repetição, "pegou".

Quero ater-me, aqui, a outro atropelamento da verdade, repetido ao longo dos últimos meses até não restar caco de paciência para ouvi-lo. Refiro-me à afirmação de que as pedaladas foram exigência da generosa dedicação do governo aos necessitados, pobres, humildes e carentes da pátria. Moradores do coração do governo, resgatados da miséria por sua prestimosa atuação, seriam estes Joões, Marias e Josés os destinatários principais dos recursos que fizeram explodir o orçamento e levaram o governo ao crime de responsabilidade unanimemente apontado pelo Tribunal de Contas da União.

Enquanto esse discurso era salivado de boca em boca no plenário da comissão, o Banco Central, a três quilômetros dali, divulgava que os atrasos de repasses do governo a bancos públicos haviam alcançado R$ 60 bilhões no final de 2015, e que a maior parcela, no valor de R$ 17,3 bilhões, foi destinada ao rombo do PSI-BNDES.

O rombo em miúdos: 30% do montante pedalado corresponde ao subsídio proporcionado pelo governo aos graciosos juros de 4% a 6% ao ano, cobrados nos empréstimos bilionários concedidos pelo BNDES a grandes empresas. Quem não os haveria de querer? O montante desses financiamentos, em meados de 2015, chegava a R$ 461 bilhões. O peso do subsídio sobre a dívida pública, ao longo das próximas décadas, vai a quase R$ 200 bilhões! Isso é dar esmola aos pobres e ser pródigo com os afortunados e endinheirados.
 

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

 

 

Percival Puggina

08/04/2016



 O bem falante ministro Marco Aurélio Mello me faz lembrar muitos petistas que conheço. Diminutivos e aumentativos variam conforme a conveniência. Probleminhas e problemões mudam de lado segundo a retórica do momento. Sérgio Moro (símbolo nacional de uma justiça como a nação deseja) tanto lhe serve como bom exemplo do que denomina "promissora conduta das instituições nacionais", quanto de justiça servida “em cambulhada”. Sérgio Moro é conveniente quando o ministro quer elogiar o poder cuja cúpula ele, Marco Aurélio, integra e que está longe de representar a Justiça que a nação deseja. Mas deixa de ser bom, o juiz de Curitiba, quando o ministro pretende isentar o STF de responsabilidades pela lentidão dos processos em sua longa dormição nas gavetas, onerosa longevidade e intoleráveis prescrições. Para o ministro, a demora serviria à boa justiça...

 Quem acompanha com interesse cívico os fatos que se desenrolam nos mais altos escalões do poder não pode, em sã consciência, negar o que vê: um poder judiciário mais do que politizado. Politicamente alinhado em sua cúpula. Nele, as cortesias de praxe escondem das vistas do público as dissenções e as desconfianças internas. Um exemplo foi brilhantemente apresentado pelo jornalista José Nêumanne. Acumulam-se ações contra o presidente da Câmara e do Senado. Ambos repugnam à nação. Os procedimentos para afastar Eduardo Cunha avançam e isso é ótimo, mas servem ao governo que quer vê-lo pelas costas. Os procedimentos para afastar Renan Calheiros se arrastam e isso é péssimo, mas servem ao governo que precisa dele como do ar que respira, até a conclusão do processo de impeachment no Senado. Acho que não preciso desenhar tal assimetria.

 Inquirido sobre o ato falho do colega Roberto Barroso no comentário que fez sobre essa gente do PMDB como alternativa de poder, Marco Aurélio foi para o púlpito dos advogados defender o ministro que falou ignorando a transmissão externa. Ora, o próprio Barroso cuidou de deixar estampada a gravidade do erro quando recomendou que apagassem a fita!

Indagado sobre o inegável desvio de finalidade presente na nomeação de Lula para a Casa Civil, Marco Aurélio Mello deu uma volta na frase, parecendo concordar, e apresentou a ideia de que, por outro lado, não se poderia desconhecer a hipótese de que a presidente estivesse, de fato, precisando de Lula como tábua de salvação. “Me tira os tubos”, como diria aquele personagem de Jô Soares.

Logo após sua exibição de vaidade em rede nacional, o Ministro Marco Aurélio voltou ao serviço, subiu nas tamancas e determinou que o presidente da Câmara desse continuidade a inaudito pedido de impeachment contra o vice-presidente, impetrado por um governista tão delirante quanto burro porque reconhece em Temer o crime que o PT nega em Dilma. Cunha disse que ia recorrer, mas perante o próprio rabo preso, obedeceu. Eu não entendo: os ministros despacham o que querem, quando querem, mas obrigam os demais poderes e despachar quando eles querem. Quem disse que querer não é, necessariamente, poder, desconhece Marco Aurélio e o STF.

Na minha perspectiva, a casa caiu quando ele afirmou que, sendo o STF “o último bastião da cidadania”, o processo de impeachment, ainda que aprovado no julgamento do Senado, poderá passar ao crivo do Supremo – “caso haja dúvida sobre o cometimento de crime pela presidente da República”. Ou seja, a decisão de 594 deputados e senadores pode cair por seis a cinco no STF. E até mesmo, quem sabe, por uma liminar monocrática... Nesse caso, que terão feito Câmara e Senado ao deliberarem exatamente sobre tal questão? O site do PT festejou a declaração. No meu léxico, o nome da pretensão exposta pelo ministro é Ditadura através do Judiciário.

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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

04/04/2016

 

No dia 31 de março, convocado pela presidente, um grupo de supostos defensores da democracia e da legalidade se reuniu no Palácio do Planalto. O motivo do evento (um dos tantos em que Dilma e Lula têm aparecido para um público subalterno, escolhido a dedo) era assinar atos de regularização de terras para reforma agrária e comunidades quilombolas. Na prática, comício político em favor da presidente e exaltado chamamento à violência e à luta contra o “golpe”.

 O assunto foi fartamente noticiado. A sede da chefia de Estado e governo brasileiros prestou-se para discursos e condutas indignas (assista aqui a fala do representante da Contag). Nesse pronunciamento, como mote para convocar ações violentas, atentatórias à ordem pública, surge o clichê “bancada da bala”. No idioma esquerdista, “bancada da bala” designa um grupo de parlamentares formado por adversários do desarmamento e ruralistas. Eles gostariam que fosse respeitada a decisão tomada pelo povo brasileiro no referendo de 2005. Naquele significativo momento cívico, dois terços da população rejeitaram a proibição, mas o petismo inconformado, ao regulamentar administrativamente a matéria, sepultou a decisão nacional. Quem não sabe perder é o pessoal de estrela no peito.
 Evidencia-se, também nisso, uma das muitas diferenças fundamentais entre os verdadeiramente democratas e os militantes petistas. A dita “bancada da bala”, presumivelmente violenta a partir do rótulo, respeita até a desrespeitosa regulamentação determinada pelo governo, que transforma a posse legal de armas numa gincana de dificuldades e custos. Paradoxalmente, a verdadeira bancada da bala ocupava assentos no evento palaciano! Ali estavam os protetores de bandidos como parceiros da luta de classe. Ali rugiam os verdadeiramente violentos, chamando à luta. Um protesto inadequado diante da moradia de certo ministro do STF, virou mote para os companheiros responderem com anúncio de invasão do parlamento, ataques à “bancada da bala” e assaltos a propriedades rurais. Ali sentavam, também, os defensores dos direitos dos criminosos, dos traficantes, donos de arsenais muito mais efetivos e ativos que os da lei e da ordem. Ali estava um governo que não combate o tráfico e mantém relações cordialíssimas com as FARC narcoterroristas. Ali, também, os que permitiram que a bala, hoje, corra solta em tiroteios no meio urbano.

 A esquerda militante a serviço da causa serve-se de clichês como quem come amendoim. Vai um atrás do outro. E a mídia amiga é inesgotável no fornecimento para que, por repetição, o clichê se converta em reflexo da realidade. Vai-se, num pulo, da expressão ao fato.

Não surpreende que o Palácio do Planalto esteja convertido em puxadinho do PT. Quem comparece a seus eventos, quem os organiza, quem os mobiliza e quem os dirige não tem a menor noção sobre limites da ação política. A presidente desrespeita cotidianamente a dignidade de seu cargo! Não é por outro motivo que o país chegou à atual situação e que uma organização criminosa (Orcrim) se instalou no coração do poder. Agora, a Orcrim anuncia que vai à luta para não sair. Ao cidadão de bem não é tolerado, sequer, indignar-se com tudo isso. Se expressar sua revolta, lhe jogam por cima os clichês do ódio e da intolerância. Não foi à toa que publiquei um livro cujo título é “A tomada do Brasil (pelos maus brasileiros)”.


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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.