Percival Puggina

22/12/2022

 

Percival Puggina

         Recentemente participei de uma reunião em que se debatia o tema da “independência” no relacionamento conjugal. Assunto interessante porque em torno dele se tem estabelecido grande confusão, sendo muitos os que consideram coisa desejável, no casamento moderno, uma recíproca e absoluta independência entre os pares.

Não existe isso em qualquer instituição humana. As instituições, assim como todas as sociedades, se compõem precisamente porque as pessoas dependem uma das outras; uma sociedade de membros totalmente independentes seria algo tão atomizado e disperso quanto inútil.

Na vida conjugal, e em especial nas relações onde o amor se impõe como elemento vinculante fundamental (embora não único), essa interdependência dos membros pode levar - e com frequência leva - ao sacrifício. Qualquer pai, mãe, marido ou mulher sabe que o amor cobra capacidade de renúncia, e a exige, especialmente nos momentos de crise pessoal, nas enfermidades, e sempre que há fardos a serem compartilhados.

Um dos maiores problemas que atingem a instituição familiar e sua estabilidade nos dias de hoje está localizado nessa fobia cultural à renúncia e ao sacrifício, entendidas pelo avesso - como elementos destruidores da natureza humana - e não como construtivos e constitutivos de sua maturidade.

O Natal de Jesus, e é sobre isso que desejo escrever, exemplifica com muita clareza que, no plano de Deus, o amor é inseparável da doação e da renúncia. O Natal não é apenas uma bela história - a mais bela das histórias - como afirma recente comercial na TV. Ele é também um drama real, convivido nas duas cidades, a de Deus e a dos homens: Deus se faz homem para estabelecer uma “nova e eterna Aliança” com a humanidade a que ama. E seguindo a lógica do amor, vai ao sacrifício de si mesmo.

Esse “dar-se” resiste, no ensinamento cristão, contra a dimensão comercial que cada vez mais domina as festas de fim de ano onde as relações se tornam crescentemente materiais, numa sequência que começa com o simples “receber”, passa pelo “trocar” e talvez chegue ao “dar alguma coisa”, mas raramente cogita do “dom de si”, que é a essência do Natal. Espero que este Natal de 1996 seja para cada um, em cada família, ocasião de refletir sobre as exigências do amor, segundo o exemplo de Jesus de Nazaré.

Nota do editor: Este artigo replica o publicado no Natal de 1996. Ele mostra que, passados 28 anos, persistem os problemas humanos e a perenidade da mensagem cristã.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

21/12/2022

 

Percival Puggina

         Meninos, eu vi. Eu vi deputados furiosos com a intromissão do Supremo em assunto que estava sendo objeto de negociação na Câmara dos Deputados. Vale dizer, no dinheiro das emendas.

Se ministro do Supremo prender deputado, eles dizem: “Dane-se, não gosto dele!”. Se aplicarem tornozeleira, tudo bem. Se desarmarem deputado, eles assistem. Se cortarem o acesso de parlamentares às redes sociais, ninguém se importa. Façam os “supremos” o que fizerem contra a governabilidade do país ou contra as liberdades de expressão e o direito de ir e vir dos cidadãos – a Casa do Povo a tudo assiste com cara de paisagem. Rodrigo Maia, depois que largou a presidência da Câmara, foi ser secretário de Estado em São Paulo e abandonou a política. Seu sucessor, Arthur Lira, também largou a política. O que ele faz é outra coisa, parecida, mas não é política, na perspectiva da sociedade. Tudo isso a Casa tolera, com as raras, notórias e brilhantes exceções (que por poucas, todos conhecem).

Vou usar a palavra tolerância, mas não no sentido que o leitor está pensando. Direi que a tolerância do Congresso tem um limite e esse limite atende pelo nome vulgar de “grana”. Mexeu na grana das emendas e até quem está em casa de cuecas, veste as calças e se manda para Brasília expressar indignação. E pasmem: imediatamente começaram a falar em excessos do Judiciário, em ativismo judicial, em desprestígio do parlamento e até na indignação dos cidadãos...

Sim, sim, sei. Não precisa explicar. Eu só queria, mesmo, entender.

Como aluno atento do mestre Alexandre de Moraes, aprendi dele algumas “categorias criminais” novas, de criação própria, desenhadas à perfeição para aplicar restrição de direitos conforme seu gosto. São categorias fluidas, gasosas, tais como, entre outras, atos antidemocráticos, fake news, militância digital, desordem informacional.

Na mesma batida, eu alinho algumas condutas igualmente etéreas, aplicáveis ao descomunal protagonismo do STF agora percebido pelo Poder Legislativo brasileiro. Ele pode começar a reagir usando as seguintes “categorias criminais”: ativismo judicial, militância cartorial, desordem hierárquica, agilidade punitiva em contradição com a morosidade processual.

Se precisarem de outras, eu arrumo aqui.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

20/12/2022

 

Percival Puggina

         As palavras de Gustavo Gayer em sua diplomação como deputado federal eleito pelo estado de Goiás repercutiram nacionalmente. Mais bem ainda fariam se pronunciadas como parte de um discurso inteiro. No entanto, serviram como clarão nas trevas, como um flash de irresignação perante as anomalias da hora presente.

Quem manda é o STF!”, completou ele enquanto deixava o palco tendo o diploma pelo qual tantos se empenharam tanto. Sei bem o que ele pensava. Qual a serventia desse documento que certifica nossa legitimidade para o exercício da representação popular se essa missão nos é tomada pelo poder sem voto que resolveu “furar o teto” de suas competências? Não são subtraídas pelo simples querer, ou enfado, ou desagrado de um ministro do Supremo, as prerrogativas constitucionais como as que asseguram a total liberdade de expressão dos parlamentares?

Durante muitos, muitíssimos anos, li e ouvi, dissertações em que o orador, falando sobre tiranias, citando Ruy Barbosa, afirmava desde os altiplanos de um saber histórico: “A pior tirania é a do Judiciário porque dela não há a quem recorrer”. Lá dos baixios de minha ignorância eu sempre me perguntava: onde, raios, uma coisa horrorosa dessas pode acontecer?

Agora eu sei. Está em curso diante dos nossos olhos, fazendo vítimas ao nosso redor. Aliás, já estamos todos fustigados pelo seu chicote no ciberespaço ou na restrição de liberdades. Quantos já têm medo de escrever ou falar, ou trazem no lombo os vergões desses chicotes causados por multas, silêncios obsequiosos e bloqueios de bens?

O mandato parlamentar que serviria para sanar tais feridas peca gravemente por omissão quando conogressistas silenciam ao ver suas prerrogativas virar farinha soprada pelos ventos da tirania?

Torna-se oneroso e inútil o Congresso quando o Supremo legisla. Torna-se moralmente indigente o Senado quando o sistema de freios e contrapesos se transforma em mecanismo de proteção recíproca entre ele e o STF. Torna-se onerosamente inservível a Câmara dos Deputados que não protege a liberdade e as prerrogativas de seus membros e onde a regra do proveito próprio substitui o Regimento Interno e se sobrepõe à própria Constituição.

Nunca rezei tanto para estar enganado quanto o faço sobre minhas previsões em relação ao futuro Congresso. De quanto pude observar ao longo de décadas, as exceções, sempre notáveis, têm sido exatamente isso: notáveis exceções.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

18/12/2022

 

Percival Puggina      

        O inevitável senador pelo Amapá postulou e o intemperante ministro do STF por Michel Temer concedeu ordem para desmontar à força o acampamento a frente do Comando Militar em Brasília. “Ordem dada, missão cumprida”. É assim que no Brasil destes anos imoderados se faz política no Brasil. Sem modos e sem povo.

“Deus cria, o diabo espalha e eles por si se juntam”, constata o ditado popular. A História está cheia desses exemplos, como os de Mao Zedong e Zhou Enlai, Hitler e Goebbels. Às vezes se juntam e se separam como os três monstros da Revolução Francesa – Robespierre, Danton e Marat – ou Lênin e Trotsky.

Aqui no Brasil temos o recente caso da dupla Alexandre de Moraes e Randolfe Rodrigues. Um ministro do Supremo e um senador pelo Amapá que se tornou famoso em virtude do ritmo alucinante que, sozinho, consegue imprimir aos tribunais superiores da República. Ele é o cara que faz girar a roleta. E ganha sempre.  Moraes e Ranolfe parecem almas gêmeas, nascidas uma para a outra.

O senador alegou que o acampamento estava tumultuando a vida da capital do país e era necessário “puni-los exemplarmente”. É óbvio que os acontecimentos posteriores à prisão do cacique têm que ser investigados e as autores identificados e submetidos à lei. Se a investigação for feita como deve, certamente evidenciará que houve infiltração. Seja porque a conduta dos malfeitores é totalmente atípica em relação aos manifestantes acampados, seja porque, ao contrário, do que pensam o senador e o ministro, ela caracteriza um tipo bem conhecido de militância.

A Vice-Procuradora- Geral da República, Lindôra Araújo, em contestação à decisão, escreveu:

"O Ministério Público Federal requer, em caráter de urgência, o exercício do juízo de retratação pelo eminente Ministro Relator, reconsiderando-se a decisão agravada, com a consequente negativa de seguimento ao pedido incidental formulado por agente político e o desentranhamento dos autos deste inquérito, com arquivamento das petições, sob os fundamentos de falta de legitimidade ad causam, ausência de conexão, violação do sistema acusatório e ocorrência de “bis in idem", Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral da República.

A Vice-Procuradora afirma uma verdade que a dupla não se empenhou em buscar. A Justiça não pode funcionar desse jeito, na base do “ordem dada, missão cumprida” (“falta de legitimidade”), violando constantemente o sistema acusatório da competência da PGR, nem agir onde já existe inquérito funcionando “(bis in idem”).

Mas o Brasil está assim. O povo não gostou do modo como é tratado? Vá para casa e faça cara feia onde ninguém veja. Tal qual em Cuba, que conheço melhor do que o Lula (onde falei e falo com quem ele jamais falou) e certamente como na Venezuela e Nicarágua, que o Lula conhece melhor do que eu (mas na campanha eleitoral não se podia dizer).

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

17/12/2022

 

Percival Puggina

         Se você procurar uma imagem que retrate “austeridade” no Google, vai encontrar uma assustadora montanha de charges e mensagens, ditos e piadas depreciando essa virtude. Praticamente nada a favor! Vejam o estrago político que o corporativismo, o patrimonialismo e a manipulação das mentes produziram! Há um governo, ou coisa que o pareça, se formando em Brasília, com fila de embarque, e todos querendo dinheiro para gastar... Pensando a respeito, lembrei-me de dois fatos. Um deles é frequentemente mencionado. Do outro, poucos tomaram conhecimento e eu tive o privilégio de testemunhar.

Quando o general Castelo Branco era presidente, havia um projeto estacionado no governo aguardando decisão que beneficiaria a categoria funcional a que pertencia um irmão seu. Decidido o caso de modo favorável, os colegas cotizaram-se e o presentearam com um automóvel Aero Willys, em recompensa pelos supostos esforços que teria feito para obter do presidente a decisão que agradou a todos.

O assunto chegou ao conhecimento de Castelo Branco que chamou o irmão e o mandou devolver o veículo. Ante a recusa, o presidente o demitiu no ato, advertindo que restava decidir, apenas, se o mandava prender ou não.

Do outro fato, sou testemunha pessoal. Aconteceu pouco tempo depois e há, também, um Aero Willys na história. Eu tinha meus 23 anos, estava terminando o curso de Arquitetura e Urbanismo e trabalhava, às tardes, como oficial de gabinete do governador gaúcho coronel Walter Peracchi Barcelos. Certa feita, entrei no gabinete e o encontrei esbravejando. Ele tinha em mãos pedido encaminhado por dirigente de um órgão qualquer interessado em adquirir um automóvel Ford Galaxy para a própria locomoção e serviços ao seu gabinete.

O Ford Galaxy, para quem não conheceu, era a nave espacial da época. Um carrão no melhor estilo das grandes “banheiras” norte-americanas de então. À frente, um imenso motor V8 4.9 cilindradas; atrás, o porta-malas parecia uma suíte. Viajava-se nele pelas antigas estradas de terra, onde tudo sacolejava, sentindo o suave balanço de um navio em alto mar. Privilégio de poucos, e o tal funcionário queria um para seu uso.

“Está demitido!”, esbravejou o governador. “Imagina: eu uso um Aero Willys surrado e ele quer um Galaxy”. 

Eram outros homens, outros tempos. O que aconteceu de lá para cá? Não é mais possível ser austero? Os eleitores apreciam a ostentação das cortes? Se for assim, como parecem mostrar os acontecimentos destes dias, então regredimos, como sociedade, para antes das revoluções liberais dos séculos XVIII e XIX.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

14/12/2022

 

Percival Puggina      

         Foi o único momento sincero da cerimônia de diplomação de Lula. Por isso, e só por isso, saiu num sussurro captado pelo microfone do ministro que presidiu a solenidade.

Tudo mais me pareceu teatral, falso, forçado, pomposo. Nem as lágrimas de Lula foram sinceras porque, para que o fossem, seria necessário que houvesse nele um farelo de consciência, aquilo que nos leva, à noite, com a cabeça no travesseiro, ao juízo íntimo de nossas ações.

Fui ao Google às 07h49min de hoje, 14 de dezembro e procurei pela frase que faz a perfeita resenha do evento associando-a a outras que a identificassem com a situação em que foi pronunciada: nome do autor, diplomação, TSE, etc. As várias referências que encontrei constam de matérias de mídia digital. Ao que tudo indica, nenhum veículo do nosso “jornalismo” de companheiros, identificado pelo ministro orador da sessão como “imprensa tradicional”, considerou relevante tornar a frase conhecida de seu público. O silêncio, a omissão, também podem ser insinceros e desonestos.

Toda menção à democracia poderia ser entendida, isto sim, como sarcasmo! No discurso de Alexandre de Moraes esse substantivo e seus derivados aparecem 25 vezes. Ou seja, uma a cada 51 palavras que proferiu se referia à democracia, um regime político que, desde 2019, se fez ausente do país.

Digo e provo. Procurei nos meus apontamentos e não achei o dia em que esse Congresso eleito em 2018 ouviu e atendeu à voz das ruas em qualquer assunto. Entre meus achados estava sim, a constância do escancarado antagonismo “contramajoritário” do STF aos conceitos e propostas vitoriosos nas urnas. Estavam as escabrosas motivações que levaram à omissão do Senado e à submissão do Congresso Nacional, tornando inefetiva a representação popular.

No discurso de Lula, repete-se a situação e a proporção. Uma a cada 51 palavras (coincidências, às vezes, valem por um manifesto!) reproduz o vocábulo mais desperdiçado da noite.

Vou deixar de lado a insinceridade das palavras tão gentis quanto insinceras eventualmente dirigidas à nação pela dupla de oradores. Nada há de fofo em Alexandre de Moraes, nem quando para de mostrar os dentes e destilar ódio e furor persecutório contra as redes sociais que gostaria de desbaratar a golpes de caneta porque dizem verdades que a mídia tradicional oculta. Como ocultou a frase que dá título a este artigo. 

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

Percival Puggina

13/12/2022

 

Percival Puggina

         Haverá quem se sinta atingido com o que direi, no entanto, preciso desabafar: cansei de ler comentários afirmando que só escrever não adianta, ou que só falar não adianta, ou que só ir para a porta dos quarteis não adianta, ou que mostrar indignação a autoridades comprometidas com o escândalo em curso não adianta. A todos, afirmo: dizer que não adianta também não adianta, ora bolas!

A hegemonia esquerdista foi construída e ainda hoje se mantém influenciando a opinião pública mediante a aplicação de todos os meios materiais, humanos e de toda a ciência que foi desenvolvida com esse intuito. Como você imagina que se forma um eleitorado (não importa de quantos milhões) disposto a trazer uma organização criminosa inteira à cena do crime? Como você imagina que subsista, mundo afora, público para optar por uma ideologia incapaz de apresentar um único caso de sucesso entre suas 42 experiências concretas? Falam em justiça e entregam uma nova elite corrupta; falam em liberdade e entregam opressão e paredão; falam em sabedoria e entregam cartilha; falam em pluralismo e entregam histeria e sanção contra toda divergência; falam em prosperidade e entregam cartão de racionamento; falam em democracia e entregam o manjado totalitarismo de sempre; falam em amor e entregam filhos revoltados chamando fascistas os próprios pais.

Falam em estado de direito e democracia e chegam com isso que estamos vendo.

Depois de Georg Luckács, de Antonio Gramsci e da Escola de Frankfurt (Marcuse e Adorno), a renitente construção da desgraça precisa de todo o espaço cultural – música, teatro, cinema, literatura, artes plásticas. Precisa dos púlpitos, dos jornalistas e dos juristas. Precisa das salas de aula e, muito especialmente, das universidades. É por elas que passou a prepotente expulsão do conhecimento divergente (Luckács), a construção da hegemonia pela ação do intelectual coletivo (Gramsci) e a superação das resistências culturais (Escola de Frankfurt). Tudo isso adiantou, e muito, para sermos arrastados às aflições desta hora!

O despertar conservador e liberal brasileiro tardou demais! Acordou sob insultos e ameaças. É dito fascista porque a tanto são ensinados os jovens por professores que assim qualificam os pais de seus alunos e os que ousam divergir, ainda que a divergência se expresse em uma bandeirinha do Brasil.

Não deveríamos nunca esquecer que o Muro da Vergonha, o Muro de Berlim construído pelo estado comunista instituído na extinta Alemanha Oriental, era oficialmente conhecido como “Muro de proteção antifascista”, como se vê na placa comemorativa de seus 25 anos, em 1986 (AQUI).

A cerimônia de diplomação levada a cabo ontem transitou sobre longa e pavimentada rodovia que permite proclamar a legitimidade de absurdos mediante frenéticos aplausos da plateia e louvações da “imprensa tradicional” a discursos onde as palavras tomam direção oposta a seu sentido real. Lênin, Stalin, Hitler e Mussolini foram mestres nisso.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

12/12/2022

 

Percival Puggina

         Não sei por que, não me perguntem por quê, lembrei-me desse bom e velho filme de 1973. Nele, os jovens Paul Newman e Robert Redford, no papel de vigaristas, vingam-se de Robert Shaw, responsável pela morte de um parceiro aplicando-lhe brilhante golpe de mestre, em que nada é como parece ser.

Hoje, 12 de dezembro de 2022, o verão diz a que vem em Porto Alegre e a temperatura deve elevar-se a 34 graus. Em Brasília, nublada como os tempos atuais, será formalizada a entrega do atestado de óbito da moralidade em nosso país. É um ato necessário, preliminar às exéquias previstas para o dia 1º de janeiro.

Impunha-se a antecipação da formalidade ante as angústias suscitadas pela paciente e disciplinada pressão popular. No dizer da mídia adestrada, de pudor restrito, trata-se de pessoas “com cabelos brancos”, aposentadas, acomodadas em barracas e em cadeiras de praia. Ela os vê como desprezíveis mas perigosos vovôs e vovós falando de valores inconciliáveis com os destinos que ela, mídia adestrada, anseia para a nação.

Nada sei dos próximos dias. Mas penso saber mais do que suficiente sobre os últimos anos, meses e dias para entender o acontecimento funesto de hoje. Discursos não guardarão qualquer semelhança com a realidade. Tudo se passará como se o ato não fosse fúnebre. Afinal, o empossado fez discurso político até no velório da esposa. Por que não o fazer de modo festivo, com gratificados tapinhas no rosto, como corifeu da miséria moral, quando a virtude recebe seu atestado de óbito?

Fim do filme?

 

        

Percival Puggina

11/12/2022

 

Percival Puggina

         Telefonou-me o amigo jornalista Júlio Ribeiro, que apresenta o Boa Tarde Brasil na Rádio Guaíba de Porto Alegre. “Puggina, qual tua música brasileira preferida?”

A resposta estava na ponta da língua, mas eu precisava reler a letra e, nas horas seguintes, viajar em memórias e em reflexões sobre o desastre cultural brasileiro. “Aquarela do Brasil”, foi o nome que, por WhatsApp, enviei ao Júlio pouco depois. Talvez mais do que nunca, em tempos de tamanho desamor ao Brasil, o samba sinfônico de Ary Barroso vale por um manifesto.

Em duas ocasiões, jantando no exterior com minha mulher, noite romântica, música de fundo, aconteceu de ouvirmos os primeiros acordes de Aquarela do Brasil se difundirem pelo sistema de som ambiental. Aos poucos, as vozes foram calando, o silêncio se impondo reverente e os rostos se abrindo em sorrisos. Logo, todos marcavam compasso e balançavam os corpos numa celebração da brejeirice que é marca da cultura popular brasileira. Momentos de arrepiar, para um brasileiro “fora da base”.

A obra de Barroso fala do muito que maldosamente nos foi tomado depois. Há nela um saudável amor ao Brasil que se reforça (Brasil brasileiro), nação mestiça, do samba, do amor e de nosso Senhor.

Brasil meu Brasil brasileiro
Mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
Brasil, samba que dá
Bamboleio, que faz gingar
O Brasil do meu amor
Terra de nosso Senhor

Não se envergonha da história, mostra o multiculturalismo, venera a mulher.

Abre a cortina do passado
Tira a mãe preta do cerrado
Bota o Rei Congo no congado
Canta de novo o trovador
A merencória à luz da Lua
Toda canção do seu amor
Quero ver essa dona caminhando
Pelos salões arrastando
O seu vestido rendado

E canta as maravilhosas dádivas com que a Criação obsequiou esta porção do planeta.

Esse coqueiro que dá coco
Oi onde amarro a minha rede
Nas noites claras de luar
Por essas fontes murmurantes
Onde eu mato a minha sede
Onde a Lua vem brincar
Oh esse Brasil lindo e trigueiro
É o meu Brasil brasileiro
Terra de samba e pandeiro

Perdoe-me o leitor, mas que saudade me dá! E que tristeza me causa saber que hoje, brasileiros promovem mundialmente preconceitos e boicotes contra o Brasil; saber que amor à pátria é considerado defeito de caráter, mediocridade política e fanatismo “de direita”; que o desprezo à nossa história e origem é cultivado em salas de aula por professores que coletam o lixo histórico para construir narrativas que a tanto levam.  Quem vive politicamente de gerar conflitos internos não tem escrúpulo em criar conflitos externos contra o próprio país. E faz isso.

Estaremos mais bem servidos por apátridas bandeiras vermelhas? Parece que o presidente dos EUA sinalizou o caminho das rupturas ao autorizar o hasteamento da bandeira do orgulho gay ao lado da “Stars and Stripes”, como se uma bandeira nacional não fosse de todos e precisasse de anexos. 

A divisão de um reino contra si mesmo, nas palavras de Jesus em Mateus, faz com que esse reino não subsista. Como nos é oportuno tal ensinamento!

Faça um bem a si mesmo. Depois de ler este artigo, ouça Aquarela do Brasil e assuma consigo mesmo o amável compromisso que ela inspirará.

Nota do autor: este artigo reproduz o que escrevi em 25 de maio deste ano. Julguei conveniente fazê-lo quando vejo afeições ideológicas mandarem às favas todo senso de justiça, decência e amor à pátria.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.