Percival Puggina

25/07/2024

 

 

Percival Puggina

 

A omissão do bem é não menos reprovável que a comissão do mal. Plutarco, filósofo e historiador do 1º século.      

       O presidente do Senado brasileiro é professor emérito da cadeira de Omissões Políticas. Na semana passada, porém, ganhou as telas e telinhas manifestando sua concordância e apoio à proposta de emenda da Constituição que impede decisões monocráticas do STF sobre matérias aprovadas pelo Congresso Nacional. Falou bravamente, como resposta às críticas fortes dos ministros Luiz Roberto Barroso e Gilmar Mendes na abertura da sessão do STF subsequente à aprovação, pelo Senado, da PEC sobre o tema. A matéria seguiu para a Câmara dos Deputados onde, nas mãos do alagoano Arthur Lira, passará a integrar seu cacife de poder: só entrará na Ordem do Dia quando ele quiser.

Não é incomum que batatas quentes troquem de mãos na “cozinha” das relações entre Câmara e Senado. Este caso me fez lembrar de outro, anterior. Deu-se num tempo em que as corporações empresariais da nossa imprensa cumpriam um pouco mais ajuizadamente seu papel de informar e opinar sobre temas do interesse nacional. Criou-se, assim, amplo consenso sobre a necessidade de acabar com o tal foro privilegiado. Membros e ex-membros dos poderes, juristas e cidadãos esclarecidos identificavam e identificam a prerrogativa como causa de enguiço no sistema de freios e contrapesos determinado pela Constituição. Por conveniência ou conivência mútua, graças ao instituto do foro privilegiado, Senado e STF arrefecem ou, até mesmo, inativam o controle recíproco previsto na Constituição.

Foi assim que, em maio de 2017, atendendo clamor popular, o Senado aprovou a PEC 10/2013, extinguindo o que tecnicamente se chama “foro especial por prerrogativa de função”. O presidente da Casa era o senador Eunício de Oliveira e a aprovação (surpresa!) foi unânime. Contaram-se 70 votos a favor; uma senadora que se abstivera, logo após a totalização pediu que seu voto fosse registrado como favorável. A vitória repercutiu, a nação festejou e a PEC, em solene séquito de cavalos enfeitados por penachos (como descreveria Nelson Rodrigues), seguiu caminho para a Câmara dos Deputados, onde se deveria repetir a deliberação em dois turnos de votação. 

Nos meses restantes de 2017, nada aconteceu com a importante matéria. No ano eleitoral de 2018, uma Comissão Especial aprovou o fim do foro privilegiado. A PEC ficou, então, pronta para votação. Só que não. Semiaprovada, virou almofada na cadeira do presidente Rodrigo Maia. Entrou o ano de 2019 com grandes expectativas em relação à renovação do perfil do Congresso Nacional, mas Rodrigo Maia se manteve na poltrona. Periodicamente, ao longo da legislatura de 2019 a 2023, algum deputado, cioso de suas responsabilidades, solicitava a inclusão na pauta de deliberação. Em vão. Maia passou o bastão para Arthur Lira, e nada. Veio o pleito de 2022, a aparente vitória da direita na Câmara não durou 45 dias, Arthur Lira foi reeleito, lidera também o Centrão e há quase quatro anos a PEC é almofada da cadeira em que repousa sua consciência cívica.

Em tempos como os atuais, quando a nação percebe seus direitos e tem sua liberdade de expressão contida por quem convive mal com a divergência, é indispensável libertar as consciências no Poder Legislativo. A intimidação dos representantes convive com a dos representados, que hoje são reféns, em conjunto com cada preso político e com cada cidadão cuja liberdade de expressão é tolhida.

Quero muito estar enganado, mas tenho a impressão de que a imagem da batata quente trocando de mãos descreve a situação da PEC que limita as decisões monocráticas do STF contra matérias aprovadas pelo Congresso Nacional.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

21/07/2024

 

 

Percival Puggina

         Não o conheço pessoalmente, mas vou tratar aqui da representação política dos 140 mil eleitores desse deputado federal gaúcho, filiado ao Podemos (PODE/RS), cujo mandato foi cassado pelo TRE do Rio Grande do Sul.

Mediante decisão da qual cabe recurso ao TSE, o colegiado da justiça eleitoral sul-rio-grandense determinou que seus votos, bem como a totalidade dos votos de sua legenda fossem para a... lixeira, digamos assim. A matéria julgada é um recurso do PSD, principal beneficiário da deliberação. O fato que a motivou é uma suposta fraude com a inclusão de uma funcionária do partido na cota de 30% destinada às candidaturas femininas (tolice legislativa que cria mais constrangimentos do que soluções). Se for mantida a decisão, anulados os votos masculinos, femininos etc. conferidos para deputado federal ao PODE no Rio Grande do Sul, num passe de mágica judicial, um outro candidato, provavelmente do PSD, obterá a cadeira agora ocupada pelo deputado Marcon.

Enquanto a política como a queremos estertora em tempos tão pouco promissores ao surgimento de novas lideranças com o perfil de que a nação se ressente, é de se lamentar o que está acontecendo com o jovem e aguerrido parlamentar da Serra Gaúcha. Quem dera vivêssemos tempos mais sábios, com melhores legisladores, como são esses que vêm sendo expurgados! Não estaríamos testemunhando tais desatinos.

Salta aos olhos do mais desatento observador que se instalou em nossas instituições (inclusive nos próprios parlamentos) um desrespeito à representação parlamentar, eixo diretor do constitucionalismo democrático. Quando se toma o mandato de um deputado ou quando se censura um deputado, o ato incide sobre aqueles a quem ele representa! No caso do deputado Marcon, 140 mil eleitores perdem a voz; no caso do deputado Dallagnol, 345 mil eleitores tiveram seus votos jogados na lixeira para onde tantos, inclusive no TRE do Paraná, quiseram levar, também, os votos do senador Sérgio Moro. E viva a democracia servida à moda da casa! Viva a democracia do parlamento flácido! É de congressistas como Marcel, Nikolas, Gayer, Bia, entre outros, e também como Marcon e Dallagnol, que precisamos!

O voto proporcional, esse miserável, conta votos como se fossem objetos. Vejam a loucura. Em cada legenda, votos nominais que excedem o quociente eleitoral somam-se aos de outros candidatos e, se esse total não alcança um novo quociente, tais votos entram, despersonalizados, numa espécie de bacia das almas perdidas, esperando conhecer seu lugar na fila das médias por legenda. A legenda que tiver maior média é a primeira a se beneficiar dos sufrágios excedentes para completar mais um quociente e conquistar uma cadeira a mais. E assim é feito, sucessivamente, com as outras siglas e seus excedentes. Esse sistema, dito proporcional, é totalmente oposto aos méritos do voto distrital, majoritário, em que o representante eleito por um distrito representa todos os eleitores do distrito.

No Brasil inteiro, sob as regras do sistema proporcional, algo como 40% dos votos nominais se transviam da intenção dos eleitores por esse formulismo obtuso determinado pela legislação. As consequências são insanáveis e fazem vítimas entre eleitores, candidatos e à democracia representativa.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

18/07/2024

 

Percival Puggina

         Outro dia vi, na calçada, conhecido homem público. Ele, porém, não ia ou vinha, no mesmo fluxo dos demais cidadãos. Ele atravessava rapidamente o passeio, saindo da porta do carro para a entrada de um órgão público. Sua atitude era típica: corpo encurvado para baixo, olhando para o chão, numa sequência da posição usada para sair do carro e rapidamente cruzou pelo passeio na direção da porta que se abrira para o acolher. Eu o reconheci, mas não direi quem era.

Fiquei pensando sobre o quanto se pode aprender dessa conduta, principalmente quando a comparamos com a de outros políticos que frequentam locais públicos desfrutando de acolhida amável e calorosa. Vão às cafeterias, caminham pelas mesmas calçadas, usam as companhias aéreas e frequentam restaurantes recebendo, cordialmente, aqueles que os assediam. De muitos, recolhem o ambicionado galardão das democracias representativas, que se expressa na frase: “O senhor me representa”.

Quanta diferença entre os tipos retratados nos dois parágrafos acima! Ambos têm convicções e agem em conformidade com elas. As convicções do primeiro, que só anda em jatinhos da FAB (requinte do patrimonialismo) ou de algum amigo que lhe deve favores, estão norteadas pela manutenção do próprio poder, independentemente de seu custo à sociedade. As convicções do segundo estão referidas a princípios e valores morais que o orientam a agir com vistas ao bem. 

Por isso, meu conselho aos eleitores interessados em confiar a política a boas mãos: muito mais relevante do que ler a plataforma impressa por um candidato é saber o que o mobiliza, o que põe faíscas em seu olhar, o que ele ama com paixão e o que ele rejeita com todas as energias de seu ser, com quem ele poderá andar e de quem ele recusará a companhia, o que ele aprovará com determinação e o que ele reprovará com vigor. O número de temas sobre os quais um parlamentar ou governante decidirá ao longo de seu mandato vai muito além do que possa constar em uma plataforma impressa. Daí a necessidade desse outro conhecimento, mais profundo, sobre seu caráter e seus critérios de decisão.

Nosso sistema de governo e nosso modo de fazer as eleições são portas abertas para a hipocrisia que se vende aos incautos. A seguir, um breve escrutínio de manifestações desse trambique moral agora que temos presos políticos e a extrema esquerda está no poder.

  1. Onde estão os “garantistas” protetores de bandidos reais?
  2. Onde estão os que afirmavam “Prender não resolve!” e “No Brasil se prende demais!”?
  3. Onde estão os defensores do “desencarceramento”?
  4. Onde estão os que apelavam ao papel “contramajoritário”, da Justiça, tão ativos quando a direita governava?
  5. Onde estão os vigorosos inimigos das queimadas e do desmatamento da Amazônia?
  6. Onde estão os redatores e signatários do manifesto da USP?

Não surpreende que tenham uma vida tão encaramujada e só no exterior saiam da casca. E olhe lá!

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

14/07/2024

 

Percival Puggina

"Prometo manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro e sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil". Compromisso proferido pelos congressistas no ato de posse.

         A imensa parcela da nação que tem juízo, trabalha, paga impostos e respeita as leis se perturba ante a conduta de tantos deputados e senadores. Afinal, pronunciaram tais palavras perante seus eleitores, tendo por orgulhosas testemunhas os próprios familiares! A maioria deles, porém, jogou as promessas aos ventos e a Constituição jaz indefesa, no chão dos interesses políticos, mera caixa de ferramentas de um regime que se deformou e ficou irreconhecível.

E agora, senhores? Feitas as louváveis exceções depositárias de nossas esperanças, tendes os pés enfiados na lama do descrédito, depreciais a democracia, não defendeis a Constituição nem as leis que votais. Para escândalo da pátria, numa expiação às avessas, jogais no precipício as virtudes que ela civicamente reclama. O parlamento é o principal poder de Estado, representante legítimo do povo. Vossas omissões lesam gravemente a sociedade.

Nada diferente se espere do lado direito da Praça dos Três Poderes. Ali, o STF é um poder não eleito, cuja ampla maioria foi escolhida a dedo pelo poder instalado do lado esquerdo ao longo de muitos anos. Quando faz política, sempre excede os próprios limites.

Para o grupo dirigente do país, quanto pior, quanto mais nanico, quanto mais comercial for o parlamento (R$ 30 bi em emendas até as “democráticas” eleições de outubro), melhor para o Palácio do Planalto. Sabem por quê? Porque aquele poder, em tudo que realmente interessa, é igualmente nanico, reles e perdulário. O que tem ocorrido no Brasil é incompatível com um legislativo que se desse ao respeito.

Esse mal já contamina a nação. Poderosos veículos de imprensa, tendo perdido parcela importante de mercado e de anunciantes para o jornalismo que atua nas redes sociais, se tornaram dependentes do Estado como aqueles milhões do Bolsa Família cuja pobreza tanto a ele convém. Quanto maior for a censura às redes sociais, maiores os louvores dessa mídia ao Supremo e ao governo.

Como consequência, também, das omissões do Congresso, milhões de brasileiros escarnecem e riem tresloucados quando sabem que o Brasil tem mais presos políticos do que Cuba. Mas foi nessa toada que Clezão morreu, que uma jovem mãe de família, com filhos pequenos, está presa há quase 500 dias por haver escrito, com toco de batom, “Perdeu Mané” na estátua da deusa Têmis! Ela é acusada, perante o STF, de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. Tenha dó e não ria porque não tem graça!

Berram aos sentidos humanos a desproporção, a conduta perversa, a perda do senso de humanidade desses julgamentos pelo STF. Berra, também, a omissão do presidente do Senado e seus fiéis seguidores perante o que juraram fazer. Sabemos que o Senado é um paraíso onde não se entra de folha de parreira, mas de gravata. Como está vossa testosterona, senhores? Como estão vossos sentimentos maternos, senhoras? Cumpram o juramento que fizeram! Não subscrevam essa forma de “abolição violenta do Estado Democrático de Direito” através das instituições da República.

É o que está acontecendo pela anulação do Congresso e mediante o arbítrio e a violência praticados contra seres humanos reais, cidadãos comuns, pessoas humildes arrebanhadas nos dias 8 e 9 de janeiro do ano passado, que estão sendo julgadas, tratadas e condenadas de um modo desproporcional e cruel.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

11/07/2024

 

Percival Puggina

Mas é infâmia de mais!... Da etérea plaga

Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!

Andrada! arranca esse pendão dos ares!

Colombo! fecha a porta dos teus mares.

Castro Alves, Navio Negreiro

        As perguntas que farei perturbam meu sono e são comuns ao cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Como não ser assim, se a nação se dilacera e degenera, o sectarismo se empodera, a burrice impera, o crime prospera, a política se adultera, a Têmis se torna megera e os omissos somem ou dormem? Só eu acordo nas madrugadas pensando nesses motivos pelos quais 41% dos brasileiros (1), entre os quais 55% dos nossos jovens (2), só não desistem do Brasil por não terem condições financeiras de arrancar as folhas de um passado sem esperança e redigir seu futuro noutro lugar?

Os responsáveis por isso conseguem dormir? A nação se inquieta pela apatia de representantes omissos que tanto lhe custam. Como é insignificante, aliás, a relação custo/benefício, somados o mal que fazem e o bem que deixam de fazer! Como conciliam o sono e a culpa? A que destroços, a cupidez e a conveniência pessoal em condomínio com a injustiça reduziram tais almas? Elas simplesmente somem dos plenários quando, da tribuna, algum de seus pares lhes cobra pela apatia e a destruição das instituições!

No entanto, a realidade que vemos é sinistra. O Estado se agiganta perante a sociedade a que deveria servir. A juventude recebe uma educação de qualidade vexatória, últimos lugares nos rankings internacionais do PISA e da OCDE; a cultura nacional está degradada e o próprio QI dos brasileiros, por falta de estímulos, pode estar em regressão. Há décadas, os discípulos de Paulo Freire controlam e tornam cada vez mais sectária a educação nacional, transformando-a numa fábrica de ignorantes miseráveis, com as bênçãos do Estado. Quem escapa dessa máquina de moer cérebros prospera e vira réu no tribunal da desigualdade!

Resultado: chegamos a setenta e cinco milhões de seres humanos dependendo da assistência social do Estado. Do Estado? Sim, sim, o ente causador de todo esse mal aceita sem qualquer constrangimento posar de benfeitor. A pergunta que poucos fazem é: “Se o culpado não for o Estado, quem haveria de ser?”. Certamente a culpa não pode ser imputada a quem decide investir, correr riscos, gerar empregos, pagar salários e ser extorquido com impostos, taxas, contribuições. Essa pergunta derruba século e meio de mentiras sobre os sucessos do socialismo.

Eu quero o meu país de volta! Eu o vi antes, imperfeito, mas humano. Não era uma Suíça, mas era um país amável. O Brasil tinha boa reputação. Hoje é um país de má fama. Eu o quero moderno, mas com aqueles bens do espírito e naquele ânimo nacional que se comoveu e se moveu solidário quando as águas cobriram o abismo no Rio Grande do Sul. Eu quero de volta a energia inusitada que, durante oito anos, saudoso do “meu Brasil brasileiro, mulato inzoneiro”, me levou para cima dos carros de som a verberar corruptos, defender a liberdade e resistir à perdição de uma nação.

Impossível não evocar os versos finais de Navio Negreiro, esbravejados por Castro Alves, se vejo avançar o poder da Casa Grande, a se refestelar em folguedos e extravagâncias, enquanto garroteia direitos de cidadãos outrora livres.

  1. https://www.cnnbrasil.com.br/politica/polarizacao-politica-41-dos-brasileiros-mudariam-de-pais-se-pudessem-diz-quaest/
  2. https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2022/08/17/55percent-dos-jovens-brasileiros-deixariam-o-pais-se-pudessem-diz-pesquisa.ghtml

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

07/07/2024

 

Percival Puggina

         Estamos bem abastecidos de extremistas de esquerda nas posições de influência e poder na sociedade. Esse pessoal tem um grave problema: certo e legítimo, para eles, é o que eles querem, quando querem e enquanto querem, até mudarem de ideia e quererem o contrário.

Nos anos 60 e seguintes do século passado, os militares brasileiros, com apoio de parcela majoritária da opinião pública, lutavam contra o comunismo num período de enorme expansão guerrilheira e imperialismo comunista. Guerrilhas na América Latina e na África; imperialismo na Europa do Leste e na Ásia. Os militantes da luta armada, sem apoio popular, com treinamento e recursos buscados em Havana, Moscou e Pequim (bem como em sequestros e assaltos), buscavam implantar, à bala, o regime de sua preferência.

Estavam tão comprometidos com restaurar a democracia e as liberdades quanto Hitler com o fim do preconceito racial. Se vencessem, faltaria paredón no país.

Derrotados, passaram a cobrar, a partir de 1975, a aprovação de uma lei de anistia. O pedido motivou o presidente João Figueiredo a enviar ao Congresso o projeto de anistia de junho de 1979. Por excluir os crimes de sangue, a lei foi vista por militares e guerrilheiros como parcial e restrita. Importante lembrar o ambiente emocional do período. Havia mortos e feridos dos dois lados e, entre os combatentes, nenhuma vontade de perdoar ou esquecer. Anistia parcial não lhes servia.

Seguiram-se semanas de intensa mobilização social e popular. A nação não combatente, finalmente, concordava sobre algo: anistia ampla, geral e irrestrita, desde que os crimes tivessem sido cometidos em nome de uma “causa” política. Era como se o povo dissesse: “Sosseguem todos, esqueçam-se mutuamente e vamos trabalhar!”.

Não precisou muito tempo para que os anistiados da extrema esquerda, dando sequência à narrativa construída ao longo do período, passassem a pleitear a revisão da lei. Alegando querer justiça, desejavam restaurar o conflito político mediante a condenação de seus antagonistas. Com a insistência e persistência que lembra o Joãozinho da anedota, a extrema esquerda levou sua insatisfação à Constituinte. Queria condenar seus adversários na Constituição, mas não obteve êxito no Congresso Nacional, nem no STF. Tentaram, ainda, os extremistas, botar mais pressão com a ridícula Comissão da Verdade, escolhida a dedo por Dilma Rousseff, guerrilheira do período. Igualmente em vão o fizeram.

O senso de justiça e a história ensinam de modo amplo: anistia é um instrumento da política e não da justiça.

Também penso que não é justo deixar os vândalos sem punição. Também penso não ser justo manter impunes os que abusaram e abusam de seu poder atropelando o bom Direito, a Constituição e os códigos contra pessoas humildes e seus advogados. Não obstante, nosso problema não é de justiça num sentido moral, mas de política, num sentido prático: existem pessoas de quem a liberdade foi tomada enquanto no país se instala um poder diferente, exalando ameaças, prometendo raios e trovões de uma soberania judicial. O país precisa virar essa página! A credibilidade das instituições está em frangalhos.

As histórias tristes que nos são contadas sobre cidadãos de bem, presos na Papuda e na Colmeia, as penas desproporcionais a eles aplicadas deveriam ser motivo mais do que suficiente para ninguém, de consciência sã, se apresentar como adversário da anistia. Não em nome da representatividade dos omissos ou uma tal “justiça”, quando ela corre tão longe de seu leito moral.

*       Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

03/07/2024

 

Percival Puggina

         Circunstâncias especialíssimas empurraram Lula à presidência. “Circunstâncias?”, se espantará o leitor. Pois é, circunstâncias, entre elas as facultadas pelo transtorno psicológico delirante com que alguns protegeram o próprio poder e pela saudade que outros sentiam do dinheiro e dos negócios que a Lava Jato lhes tomara. Tudo se passou num período de tempo – você haverá de lembrar – em que a liberdade de expressão e a democracia começaram a ficar engraçadinhas no Brasil.

Havia, também, circunstâncias relacionadas a seus dois primeiros mandatos. Ao longo deles, Lula foi escolhido pela esquerda mundial para ser “o cara”, tipo laranja de amostra de um bem sucedido projeto de poder da extrema-esquerda que se apelida de progressista. Durante os 12 anos anteriores a sua primeira eleição, com o petismo azucrinando a vida de quem sentasse na cadeira que ele ambicionava, o Brasil fizera o duro dever de casa. Entre os fundamentos necessários, dois eram sólidos: a moeda forte (Real), à qual Lula e os seus se haviam oposto, e o agronegócio, cujos bons resultados nada devem à extrema esquerda, como se sabe. Para “o cara”, ficou a colheita farta e a repentina abundância malbaratada em seus delírios de Midas sonhando se tornar liderança mundial. Entre os objetivos de então contavam-se: tornar o Brasil membro permanente no Conselho de Segurança da ONU, abrir caminho para virar, um dia, secretário-geral ou presidente do mesmo organismo e o Nobel da Paz.

Hoje, sua tarefa mais comum, quando ocasionalmente no Brasil, é visitar algum lugar no interiorzão, organizar ali um ato em ambiente fechado e anunciar um presentinho qualquer – normalmente um programa de governo de pequena monta e aplicação restrita.

Lula vive disso e dos discursos que faz nessas ocasiões. No exterior, sua imagem desidratou e virou farelo moído por conhecidos malfeitos internos, péssimas companhias externas e declarações que fazem dele um Biden rouco e tagarela. No Brasil, seu governo não consegue ocultar a irresponsabilidade fiscal que se exibe no déficit horroroso das contas públicas (li hoje, 02/07, que liberará R$ 30 bi em emendas parlamentares antes das eleições de outubro). Esse dinheiro falso, que está derrubando o valor da nossa moeda, lhe permite lembrar-se de que tem algum poder e ainda pode arrancar aplausos dos auditórios quando, a portas fechadas, brinca de Papai Noel temporão entre os pobres depois de atender aos ricos.

Duvido que saiba o nome de seus ministros. Nem mesmo a mídia fiel, que vive a soldo consegue sublinhar, dentre os 40, um nome sequer que mereça destaque. Quando consegue arrebanhar uma parte desse grupo, Lula cobra resultados que, para ele, se traduzem em distribuir recursos públicos e não em gerar benefício concreto à nação.

Zero surpresa. Não quero aqui tripudiar sobre as escolhas de quem quer que seja. Mas o fato é que governo e economia afundam juntos e desse barco só os dólares têm o poder de sumir. Desculpem a franqueza, se os 40 ministros de Lula fossem escolhidos mediante sorteio nacional, com cupons grátis, ao sabor do acaso, sairia dessa coleta aleatória uma equipe melhor do que a selecionada por ele e pelos partidos que o apoiam. Ela parece buscada no mercado por um recrutador de recursos humanos brincalhão que, depois, abriu uma cervejinha e se acomodou no sofá para apreciar a confusão.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

        

Percival Puggina

30/06/2024

 

Percival Puggina

         Assim como o botão da flor é a própria flor em botão, assim também toda vida no útero materno é humana em diferentes e progressivos estágios de desenvolvimento. Alterações de forma não alteram a natureza, como qualquer idoso constata ao olhar a própria fotografia quando bebê, tão diferente na forma que só saberá ser sua aquela imagem se alguém de confiança lhe houver, um dia, informado isso. Um recém-nascido é mais semelhante ao feto que era do que com o idoso que será aos 90 anos.

Com graves consequências na vida social, a moralidade contemporânea se ajoelha em adoração perante as conveniências. A genuflexão da moral frutifica. Nasce a corrupção e explodem escândalos que se desfazem em fumaça tão rapidamente quanto as provas. Nasce o comércio clandestino das drogas e a restrição ao trabalho policial. Nascem o servidor público militante político e o professor redutor de cérebros. Nascem as narrativas e suas sequelas. Nascem a sexualização precoce, a gravidez das adolescentes e nasce o aborto como “direito da mulher”. Dessa genuflexão nasce até a vigarice que chama o projeto de Lei do Aborto de “Lei do Estupro”.

Os legisladores que despenalizaram o aborto em três casos, entre eles o de estupro, não fixaram o número de semanas a partir do qual o procedimento seria vedado. Entendo a dificuldade: a partir de quantas semanas se torna “humana” uma vida que é humana desde a concepção? Para evitar o pior, uma regra subsidiada pelo caso Amillia Taylor (bebê norte-americano nascido em 2006 com 21 semanas e seis dias de gestação) limitava a 22 semanas o tempo a partir do qual o feto tinha possibilidades de viver fora do útero materno. Matar um bebê que poderia viver fora do útero materno ficava parecido demais com homicídio.

Embora se saiba que mesmo antes disso, o procedimento abortivo causa sofrimento ao feto, o Conselho Federal de Medicina, com a autoridade que lhe confere a lei, proibiu o aborto após a 22ª semana de gestação. Contra isso se insurgiu o PSOL, alegando que a lei que autoriza o aborto em caso de estupro não estabelece “marco temporal” (em relação às terras indígenas, a Constituição estabelece o marco temporal, mas esse não convém aos partidos de esquerda). Os princípios andam de mãos dadas com a conveniência, ou, no dizer do comediante Grouxo Marx: “Esses são meus princípios, mas se não lhe servirem, tenho outros”.

A prefeitura de São Paulo informou recentemente ao ministro Alexandre de Moraes que seus hospitais realizaram 68 abortos em 2024, sendo três em bebês com 22 semanas e um com 30 semanas de gestação. Sete meses! Ao que noticiou O Globo, houve um caso, no hospital municipal de Campo Limpo, onde uma mulher, por duas vezes, teve negado o atendimento por estar com 24 semanas de gestação, serviço “não oferecido pelo hospital”. Está formado o rolo.

Atenção, senhores e senhoras congressistas cuja moralidade não se curva às conveniências! De uma vez por todas, votem lei impondo limites a essa barbárie sustentada por quem se compraz com atender conveniências mediante lixeiras hospitalares recheadas de pedaços de pequenos seres humanos. Ponham um freio nessa loucura sinistra!

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

27/06/2024

 

Percival Puggina

         É fácil, muito fácil, compreender a inimizade que nossa Suprema Corte nutre em relação às redes sociais. Os ministros Luiz Fux e André Mendonça, mais o primeiro do que o segundo, acabam de romper a cortina de silêncio e autolouvações com que o STF vinha tentando eclipsar seu litígio com dezenas de milhões de brasileiros incomodados pelo ativismo esquerdista da Corte. Embora o ministro Dias Toffoli se sinta “representante” de cem milhões de votos (na curiosa soma dos votos dados ao presidente que o indicou com os votos dos senadores que o aprovaram), nesse sentir ele é um “trans” – um não eleito que se sente consagrado nas urnas. O poder dos ministros não deriva de representação popular.   

Aliás, aproveitando a analogia: o sentir de alguns membros do Supremo, produz um efeito “trans” reverso na sua percepção sobre conservadores e liberais. Cidadãos com apreço à cultura ocidental e seus fundamentos judaico-cristãos são vistos, percebidos e tratados, como “de extrema direita”, suscitando rejeição por se oporem ao falso progressismo tão ativo no topo do judiciário brasileiro.

Todos temos observado, ao longo dos últimos anos, partidos de pouco voto nas urnas e, por consequência, nos plenários, subirem no banquinho de uma estatura política também ela “trans” para se autoproclamarem os únicos representantes das aspirações populares. Sentindo-se assim, bem impressionados consigo mesmos, mas derrotados nas deliberações de plenário, a toda hora correm e recorrem ao STF para buscar lá, entre 11, a maioria que não tem entre seus 513 pares de legítima representação popular. E funciona...! 

Em 2019, o ministro Barroso, hoje presidente do STF, proferiu palestra na Universidade de Columbia. Matéria do Estadão sobre o evento, publicada no dia 25 de abril daquele ano, reproduziu uma série de vigorosas afirmações de S. Ex.ª, entre as quais destaco duas. 1ª) “Uma Corte que repetidamente e prolongadamente toma decisões com as quais a sociedade não concorda e não entende tem um problema". 2ª) Depois de esclarecer que tal não era sua opinião, mas fato, afirmou que na percepção da sociedade "alguns ministros demonstram mais raiva dos promotores e juízes que estão fazendo um bom trabalho do que dos criminosos que saquearam o país".

Em março, mês anterior ao referido evento, fora instalado o inquérito 4781 (das Fake News) e uma semana antes, ocorrera a censura ao site O Antagonista e à revista Crusoé. Os problemas de maior porte estavam apenas começando.

É normal que a opinião livre expresse contrariedades. Perguntem à sociedade onde vê mais inverdades, mistificações, falsidades, narrativas, sofismas e omissões. Será nas redes sociais? Ou nos poderes políticos? Ou na velha imprensa? Combater o debate popular autônomo nas redes sociais e na mídia digital é um disparate pois as razões para fazê-lo valeriam contra tudo e contra todos. É muito bom que o cidadão possa dizer o que pensa e isso alcance a muitos. Ele pode fazer soar a campainha do celular no bolso do deputado, acessar suas páginas nas redes, opinar em seus vídeos, falar ao presidente. Qualquer indivíduo pode propagar suas ideias em espaços próprios, em páginas, perfis e canais. Pode criticar seu vereador e seu senador; seu prefeito e seu governador. Pode criticar o Papa. E ninguém dirá que isso é agir para descrédito das instituições. Aliás, esse desabono, quando ocorre, é gerado dentro dos poderes. Não é a crítica que causa o descrédito, mas o descrédito que a motiva.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.