• Percival Puggina
  • 07/09/2023
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Eu já tinha visto isso.

 

Percival Puggina

         “Hoje é dia de concentração na praça", disse-me a senhora. "Começa às 17 horas, mas os policiais do presidente chegam antes e usam essa sacada para observação de segurança. Talvez o senhor se sinta melhor se retornar depois do fim do evento”. Prontamente respondi que sim. Preferi chegar depois, porque, no mínimo, teria que me identificar para poder permanecer e, se ficasse, certamente não poderia usar a sacada. 

Eu estava em Havana e tinha, nessa vez, alugado uma parte do apartamento de uma professora (quarto, banheiro e sala, enquanto ela usava a cozinha e uma outra dependência com acesso particular). O prédio estava muito bem localizado, junto à Praça da Tribuna Anti-imperialista, e o apartamento tinha a tal sacada a que se referia minha hospedeira. Professora de História, era pessoa de confiança do regime e, graças a isso tinha “permiso” para alugar o imóvel a turistas. Com a sala, deu-me acesso à sua biblioteca (pouco mais de um metro de livros em espanhol e em russo). Explica-se o conteúdo em russo pelo fato de se haver graduado em Moscou, na Universidade da Amizade dos Povos, conhecida como Patrice Lumumba.

Então, por volta das 16 horas, desci para a praça e assisti aos atos que se seguiram. Eles consistiram numa sequência de discursos voltados ao enaltecimento do Comandante Fidel, da Revolução e dos admiráveis êxitos do regime tanto na Economia quanto na Educação e na dignidade do povo cubano. Tudo, claro, embrulhado, por todos os oradores, no invólucro comum: o dever patriótico de espinafrar o imperialismo e os “guzanos” (vermes), cubanos que se atiravam ao mar e iam para Miami, num fluxo contínuo, desde 1960.

Como eu descera cedo, pude apreciar a chegada do distinto público. Eram trazidos em ônibus, em grupos cuja afinidade se podia perceber tão logo desciam pois tagarelavam entre si. Alguém, mais tarde, me explicaria que provinham dos locais de trabalho e eram acompanhados por um “compañero” que representava os olhos e os ouvidos do Estado.

Nesse dia, Fidel não apareceu, o que deve ter representado um alívio para aquela pequena multidão, pois quando o tirano comparecia, falava, e quando falava proferia aqueles discursos que ficaram famosos, não pelo conteúdo, mas pelo muito que lhe custava colocar um ponto final nas arengas que duravam horas.

Por que este relato? Porque o público, raro e ralo, presente à solenidade deste dia 7 de setembro em Brasília, por quanto a TV mostrou, era muito semelhante ao daquela tarde/noite na Tribuna Anti-imperialista. Funcionários públicos, sindicalistas e companheiros de partido, convocados pelo governo, cumprindo ordens e portando bandeirinhas numa estranha mistureba do verde e amarelo com convenientes detalhes vermelhos no vestuário. A Pátria passava muito bem sem essa.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

        

 

 


Manoel Luiz Candemil -   08/09/2023 13:35:54

Como no Brasil! Pessoas não eleitas mudando pra pior o País, contrariamente à vontade dos cidadãos, com um congresso omisso, parecendo inexistente!

IGNÁCIO J A MAHFUZ -   08/09/2023 11:10:03

Puggina, Caro Mestre Percival. SALUD Y PAZ! Como sempre, "acertas na mosca" - o que viveste em Havana, capital da "ilha paraíso", é o que vamos vivenciar/sofrer aqui na REPÚBLICA POPULAR BOLIVARIANA DO BRASIL... É a desgraça chegando a galope - fruto do DESGOVERNO PETELHO. Fraternal abraço, Ignácio Mahfuz

João Carlos Carvalho -   08/09/2023 10:45:25

Resido em Brasília há 44 anos porque passei em concurso público ! Nesses anos todos eu nunca vi um desfile de 7 de setembro com tão pequena presença do povo e tão sem empolgação !

João Jesuino Demilio -   08/09/2023 10:41:45

Sim...vivemos numa ditadura....Mudam só os detalhes que nos faz se identificar as vezes com Cuba, as vezes com a Venezuela, as vezes com a China...VIVEMOS NUMA DITADURA!!

MARCO ANTONIO GEIB -   08/09/2023 10:00:36

Mestre um verdadeiro FIASCO, era de se esperar. Fizemos campanha contra a participação no desfile em Brasília, mas para ter argumentos passamos uma vista d´olhos no Evento. O que mais nos enojou foi a foto de um Brigadeiro do Ar, de um Almirante de Esquadra e General de Exército, Comandantes das "FFAA" de mãos dadas com o Descondenado. Montaram o Desfile cívico/militar como se faz um Circo, não vamos postar como foi, pois seu artigo esclarece o realizado. A ausência do Presidente da Câmara, Deputado Arthur Lira, chamou mais atenção do que a presença da "caterva" de altos mandatários da Praça dos Três Poderes que lá estiveram...um RECADO ?!?

Armando Micelli -   08/09/2023 08:10:09

Muito bem Percival. Ótima comparação. Cada artigo escrito nos esclarece, une e reforça. É uma extraordinária e corajosa forma de resistência. Abraços. Parabéns.

Constatação -   08/09/2023 06:20:26

O lema oficial do PT para este 7 de setembro: "soberania, democracia e união". Lamento não termos imagens deste Brasil, porque fica em Marte.

José Leopoldo nedel -   07/09/2023 20:30:34

Circulando na rede. Pessoal com camisa vermelha no desfile comendo cachorro quente servido pelo digno exército brasileiro. Desta vez não foi pão com mortadela. Brasil em franco e acelerado "progresso". Vivemos tempos interessantes. Olhei na globo fotos do desfile. No caso o povo é só um detalhe. Principalmente pela falta.

Menelau Santos -   07/09/2023 19:05:02

Maravilhosa comparação, Professor. Tudo na esquerda não tem alma.