Percival Puggina
O jornalista Alexandre Garcia é um clássico do jornalismo brasileiro. Não é uma voz sensacionalista nem faz a notícia maior do que o fato. Milhões de brasileiros o distinguem com a percepção de ser um dos raros, raríssimos, pedagogos nacionais sobre a história estudada e a história vivida. Nesse e em muitos outros sentidos, é um sinal de contradição em relação aos males que acometeram nosso periodismo com a enxurrada de militantes despejados nas redações por nossos aparelhos universitários.
Gaúcho como eu, Alexandre Garcia recebeu informações locais sobre a catástrofe ocorrida no Rio Grande do Sul na semana passada. Tem familiares em Taquari, cidade que periodicamente visita, situada à margem do rio de mesmo nome e principal cenário do sinuoso e arrasador percurso daquela onda de cheia. Nunca antes ocorrera algo semelhante.
Sei disso por experiência própria. No início da minha vida profissional como arquiteto, nos anos 70, trabalhei no projeto de um entroncamento multimodal localizado na cidade de Estrela. O local foi escolhido por ser o mais elevado da margem do Taquari, junto à rodovia e à ferrovia. Mesmo assim, estava praticamente no nível da cheia máxima da região, ocorrida no ano de 1941 e nunca mais reproduzida ao longo do meio século que se seguiu à implantação do projeto.
Era natural, portanto, que as comunidades buscassem explicações para o fenômeno da semana passada e que os olhos se voltassem para as três barragens. Elas eram os fatos novos na hidrologia da região. Prefeitos das cidades devastadas mencionaram a possibilidade. A suspeita circulou intensamente nas redes sociais. Alexandre Garcia referiu o fato num comentário durante o programa Sem Filtro.
Leio hoje em O Globo, naquele estilo sibilino que conduz o leitor para fora do fato que noticia, matéria com o seguinte título: “Lula repete Bolsonaro e usa AGU e Ministério da Justiça contra jornalista”. Ou seja, Lula fez algo que não se faz, mas repetiu Bolsonaro porque este também teria feito coisa semelhante. A matéria tem 1134 palavras; 395 se referem à ação do governo Lula contra o jornalista e 739 se referem ao governo anterior...
A própria matéria transcreve entre aspas o que Alexandre Garcia disse, dando causa ao corre-corre do lulismo ensandecido: "no governo petista foram construídas, ao contrário do que recomendavam as medições ambientais, três represas pequenas, que aparentemente abriram as comportas ao mesmo tempo. Isso causou uma enxurrada". Ou seja, uma reprodução do que era voz corrente no Rio Grande do Sul, acrescido do cuidadoso advérbio de modo: “aparentemente”. Era o que parecia, que dava para pensar diante de algo tão inusitado.
Constranger e impor silêncio à divergência já não é mais novidade no Brasil. Novidade continua sendo a resistência de uns poucos aos meios pelos quais se constrange e restringe a liberdade de expressão no Brasil.
Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
Constatação - 13/09/2023 12:14:05
O objetivo das ratazanas vermelhas e de seus asseclas parece bastante simples: perseguir, intimar, calar ou prender (quando não dirigir todas estas opções contra alguém) as lideranças e vozes contrários a seu esquema sórdido, e se manterem no poder. Todo o resto, provisoriamente, não lhes interessa.Menelau Santos - 13/09/2023 11:25:20
Agradeço ao Sr. por ter nos enriquecido com mais detalhes sobre essa questão contra o nobre jornalista, Alexandre Garcia, nesse (mais um) nefasto episódio. O que é deplorável e ao mesmo tempo irônico é esse fetiche do governo atual e seus asseclas midiáticos têm em relação ao Presidente Bolsonaro. Lembra a Dona Bella, personagem da Escolinha do Professor Raimundo, "só pensa naquilo". A criatividade deles em conectar o presidente anterior ao que é ruim e desconectá-lo ao que é bom é de uma criatividade verniana.