Percival Puggina

27/11/2010
Há mais de três décadas, contando com tratamento social e político irresponsável, o crime organizado vem consolidando seu poder sobre as zonas de favela dos grandes núcleos urbanos do país. E sublinhe-se: em relação ao processo em curso, o Rio de Janeiro tem sido, apenas, o exemplo mais notório porque dispõe de maior visibilidade nacional e internacional. Mas não é caso isolado. Não é mesmo! Preferiria não ver minha opinião confirmada a golpes de fatalidade na bigorna dos fatos. Mas o que assistimos nestes dias estava sendo incubado nos acordos de convivência celebrados entre as autoridades e o mundo do crime, no tolo romantismo pacifista do movimento Viva Rio, na justificação ideológica da bandidagem pela esquerda, no relativismo moral e na perda de religiosidade. Foi ganhando força com a banalização da violência nos meios de comunicação, com o desfazimento da instituição familiar e com a generalização da canalhice. Avançou graças à brandura do nosso código penal, às remansosas e sinuosas curvas por onde fluem os processos, às facilidades concedidas ao crime e às dificuldades impostas ao seu combate. Consolidou-se na consequente impunidade e na insuficiência qualitativa e quantitativa dos nossos estabelecimentos penais. E por aí vai (inclusive, que fique claro para quem já está de dedo em riste querendo pedir um aparte, no vasto conjunto dos problemas sociais acumulados em nosso país). Mesmo depois de oito anos de Lula - viu aí, aparteante de dedo em riste? No Rio de Janeiro, sucessivos governos fecharam os olhos para o que acontecia. A dupla Anthony e Rosinha Garotinho herdou de Brizola a tendência de achar que era exagero tudo que se dizia sobre a criminalidade no seu Estado. Para ambos, a única coisa anormal, por lá, era o César Maia. Anos a fio, eventos triviais como, por exemplo, a corridinha a beira-mar promovida por um sarado grupo de favelados, a cordial saudação a um veículo de transporte coletivo feita com rajada de metralhadora, o periódico intercâmbio de munição entre policiais e traficantes, o enlutado fechamento do comércio do morro quando falece algum empresário da Câmara Setorial do Pó, apenas por ocorrerem no Rio de Janeiro, eram maliciosamente apresentadas à opinião pública como arrastão, chacina, tiroteio e estado paralelo. Muita má vontade! Criaram um monstro, leitor, e agora resolveram espaná-lo morro acima. Enquanto o faziam, a nação, no camarote do sofá, boquiaberta, queixo apoiado no colo, assistia às cenas da guerra. No fundo, cá entre nós, muita gente fugindo e quase ninguém sendo preso. Bastante fumaça e pouco resultado para os riscos da operação. Me fez lembrar a diferença entre o espanador e o aspirador de pó. O poder público agia como espanador, mas a situação estava a exigir um aspirador. Os bandidos simplesmente mudavam-se de um lugar para outro, qual poeira sacudida, levando suas armas e suas bagagens. De mala e cuia, como se diz no Rio Grande do Sul. Em todo caso, fica-nos a lição. O mesmo mal, repito, está sendo incubado em todas as grandes metrópoles brasileiras. Se não for enfrentado com aspirador, vai ficar igualzinho ao Rio. E você não precisará ligar o televisor. Bastará abrir a janela para assistir a guerra. Saia do sofá, leitor. E acorde o seu governante. ______________ * Percival Puggina (65) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

videVERSUS

21/11/2010
FALA MINISTRO, FALA. DIZ ALGUMA COISA Presidente do STJ cala sobre demissão violenta de estagiário videVERSUS O presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, mandou dizer por meio de sua assessoria, nesta segunda-feira, que não vai se pronunciar sobre o episódio da demissão violenta e humilhante do estagiário, Marco Paulo dos Santos. O ministro preferiu ficar em silêncio. O estagiário Marco foi ?humilhado? e em seguida demitido pelo fato de estar imediatamente atrás do presidente do Tribunal, na fila, no momento em que o ministro usava um caixa eletrônico, localizado no interior da Corte. Incomodado com a proximidade de Marco, Pargendler disparou: ?Você quer sair daqui por que estou fazendo uma transação pessoal? Marco: ?Mas estou atrás da linha de espera?. O ministro: ?Sai daqui. Vai fazer o que você tem quer fazer em outro lugar?. Marco tentou explicar ao ministro que o único caixa para depósito disponível era aquele e que por isso aguardaria no local. Diante da resposta, Pargendler perdeu a calma e disse: ?Sou Ari Pargendler, presidente do STJ, e você está demitido, está fora daqui?. Após o episódio, Marco deu queixa na 5ª Delegacia da Polícia Civil do Distrito Federal. O boletim de ocorrência, que tem como motivo ?injúria real?, recebeu o número 5019/10. Ele é assinado pelo delegado Laércio Rossetto. Por não ter ?competência legal? para investigar o caso, o delegado enviou o Boletim de Ocorrência ao Supremo Tribunal Federal. Mas, segundo assessoria do Supremo, existem dois caminhos: 1) é designado um ministro relator que pode determinar abertura imediata de inquérito para que sejam ouvidos os envolvidos; 2) o ministro relator encaminha o caso diretamente à Procuradoria Geral da República para que seja dado um parecer. Ainda de acordo com a assessoria do Supremo, caso seja configurado crime contra a honra de Marco, o ministro Ari Pargendler receberá uma notificação. E terá a opção de se retratar ou não. Caso opte por não pedir desculpa, segundo o Supremo, nada acontece ao ministro, e o caso fica por isso mesmo. Não é mesmo uma maravilha? Agora pense ao contrário: imagine ofender e humilhar um juiz?

Percival Puggina

21/11/2010
Ensopei o lenço. Engasgo-me em soluços. A oposição brasileira morreu, coitada. Falência múltipla de órgãos. Foi encontrada num terreno baldio, tendo um cusco sarnento como solitária e silenciosa testemunha. A notícia ainda não alcançou as redações e, por isso, somos poucos os que estamos inteirados dessa perda, que não chega a ser grande, porque a falecida já definhara, mas é triste. Gente fina, a oposição. Eu gostava dela. Mas que se há de fazer? Agora é ver se encontramos, para os ofícios de praxe, um padre ou bispo que não vá xingar a defunta de neoliberal. Era previsível. Resistir à concentração de poderes que gravitou em torno do carisma de Lula era coisa para pouca gente. A história fornece exemplos assim, nos quais o governo alcançou tal popularidade que se permitiu todas as demasias. E a massa foi tão conivente que a oposição sucumbiu. O fato de que, com esse passamento, tenha sumido também a democracia foi um detalhe cuja relevância depende do ponto de vista perante a história. Muitos italianos, alemães e venezuelanos ficaram felizes quando isso aconteceu. Depois foi o que se viu. Lula, por exemplo, julga ter convivido com uma oposição feroz, implacável, inimiga da pátria como nunca antes neste país. Não tem espelho em casa, o Lula. Vai mandar uma caçamba com terra para ajudar no sepultamento. Estão com o governo - conte aí nos dedos, leitor - os banqueiros e os bancários. Pode? Os empreiteiros e os operários. Os professores e os alunos. A esquerda e a direita vendida. A turma do Bolsa Família e a turma da bolsa Louis Vuitton. Os mais ferrenhos inimigos da Igreja e a CNBB. O materialismo histórico e o marxismo santarrão. Estão com o governo, até mesmo, os sempre inconciliáveis integrantes da cozinha dos meios de comunicação (ali onde opera o esquerdismo das sutilezas, inculto mas militante e vigilante) e os donos de influentes empresas do setor. Estão com o governo os petistas mais austeros. Falo daqueles de cenho cerrado, que sequer se permitem rir porque o riso é expressão de alienação burguesa, que quando falam em ética fazem tremer os lustres, lançam chispas pelos olhos e ganham aquele tom arroxeado, prenúncio de vulcânicas erupções de moralidade. Paradoxo: se olharem ao redor, esses moralistas de microfone reconhecerão, como parceiros, todos os políticos cuja ficha, digamos assim, não sai limpa nem de um tanque com creolina. Estão com o governo os grandes e os pequenos interesses. Está com o governo a massa de prefeitos e de governadores, ávida pelas migalhas que caem da mesa do poder. Bom, eu cansei de avisar. É de uma imprudência inconcebível colocar nas mesmas mãos a chefia do Estado, do governo e da administração. É uma temeridade conferir a essa mesma pessoa a iniciativa exclusiva em relação às leis mais importantes, o direito de emitir medidas provisórias, a indicação de ministros aos tribunais superiores. É loucura proporcionar-lhe 65% por cento do bolo tributário, a liberação de emendas parlamentares (mecanismo usado para gratificar o adesismo congressual), a autorização para operar emissoras de rádio e tevê e, a par disso, as maiores verbas publicitárias do país. Não existe um único mal intencionado que admita viver longe desse poder e grana! Juntos nos governam, sem oposição. E 43 milhões de eleitores, à luz de velas, sem rumo cívico, pranteiam a falecida. Zero Hora, 21/11/2010

Percival Puggina

21/11/2010
Tenho sob os olhos quatro documentos: 1) o Programa Nacional de Direitos Humanos ? 3 (PNDH-3); 2) a declaração da CNBB sobre o tal programa, datada de 15 de janeiro deste ano; 3) o manifesto subscrito por mais de duas centenas de entidades que integram a Campanha pela Integralidade e Implementação do PNDH-3, lançado no dia 20 de maio; e 4) o discurso proferido pelo Papa Bento XVI aos bispos da Região Centro-Oeste no dia 15 deste mês de novembro. O primeiro, o PNDH-3, é um bolo de pretensões ideológicas coberto com merengue de direitos humanos. Muito já escrevi sobre ele, apontando suas agressões a verdadeiros direitos da pessoa, como vida, liberdade e propriedade. O documento sofreu forte rejeição de vários setores. Mesmo assim, o PT o referendou de fio a pavio em seu Congresso Nacional realizado no mês de fevereiro deste ano. No entanto, com a aproximação da campanha presidencial, o bolo foi posto no freezer à espera de dias mais adequados para o retorno à vitrina da confeitaria petista. O segundo, a declaração oficial da CNBB sobre o PNDH-3, só falta pedir desculpas por ter que discordar dele em quatro pontos. Aliás, bem contadas, das 572 palavras dessa declaração, apenas 100 podem ser lidas como expressão de divergência. As demais são de louvor e endosso àquele horroroso e mal concebido calhamaço. A entidade chega ao cúmulo de se desdobrar em elogios à ?tão sonhada democracia participativa? (artimanha petista de lamentáveis resultados no Rio Grande do Sul, onde ficou tão desacreditada que saiu de pauta para nunca mais voltar). Mas até aí nada que surpreenda. A gente sabe que o coletivismo beato adora essas coisas. O terceiro, o manifesto da Campanha pela Integralidade e Implementação do PNDH-3 é firmado por mais de duas centenas de organizações, em sua maioria pertencente ao segmento de gays, lésbicas, travestis e transgêneros. Sai em ardorosa defesa do programa, que deseja ver implantado sem alterações. Não há surpresa alguma em seu conteúdo, mas no fato de estar subscrito por organismos vinculados à mesma CNBB que apontou senões ao PNDH-3. Ali estão, por exemplo, entre os signatários do apoio, os bem conhecidos Conselho Indigenista Missionário e a Comissão Pastoral da Terra. Ali está, também, a Comissão de Justiça e Paz de São Paulo. E para completar o enrosco, também o subscreve o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil, o CONIC, do qual faz parte ? adivinhem quem! ? a própria Igreja Católica. Se você entrar no site do CONIC verá que a primeira e maior das cinco igrejas que integram aquele conselho é a Igreja Católica, representada por Dom Geraldo Lyrio Rocha, presidente da CNBB e signatário daquela declaração de discordância a que me referi acima. Pode uma coisa dessas? Ser contra e a favor? Pode. Na CNBB pode. Para ampliar o paradoxo, o manifesto da Campanha pela Integralidade e Implementação do PNDH-3, lá pelas tantas, afirma textualmente o seguinte: ?Desde que foi lançado, em dezembro de 2009, no entanto, o PNDH-3 vem sofrendo duros ataques de setores conservadores de nossa sociedade ? sobretudo da Igreja (sic), dos donos da mídia, de setores antidemocráticos do Exército e de latifundiários. Esses segmentos não reconhecem o processo de construção participativa que resultou no Programa Nacional de Direitos Humanos ...?. E lá vai a assinatura do CONIC, arrastando consigo não apenas a CNBB, mas a própria Igreja Católica em nosso país a falar mal de si mesma. Durma-se! Por essas e por muitas outras, cada vez que Bento XVI se reúne com bispos brasileiros nas tradicionais visitas ad Limina Apostolorum, lá vem um sermão focando os desvios que tantas e tantas vezes tenho apontado na conduta da CNBB. Agora foi a vez dos senhores bispos do Centro-Oeste, recebidos no dia 15 de novembro, saírem com as orelhas ardendo. Ciente dos abusos cometidos em nome da entidade, por seus dirigentes, seus assessores e por alguns de seus organismos vinculados, que pintam e bordam em nome da CNBB e da Igreja, o Papa usou palavras firmes que, muito provavelmente, chegaram, mais uma vez, a ouvidos moucos. Disse Sua Santidade, entre outras coisas: a) Trata-se em definitivo de buscar que a Conferência Episcopal, com seus organismos, funcione cada vez mais como órgão propulsor da solicitude pastoral dos bispos, cuja preocupação primária deve ser a salvação das almas, que é, além disso, a missão fundamental da Igreja; b) Ao mesmo tempo é necessário lembrar que os assessores e as estruturas da Conferência Episcopal existem para o serviço dos bispos, não para substituí-los; e c) Esse organismo deve evitar colocar-se como uma realidade paralela ou substituta do ministério de cada um dos bispos nem constituir-se em intermediário entre o bispo e a sé de Pedro. Quando é que a maioria dos bispos brasileiros, sensatos e fiéis, vai ouvir o Papa e fazer o que precisa ser feito na entidade que os congrega? Quando vai rever suas assessorias, instituições vinculadas e essas associações esdrúxulas a ponto de a tornarem esquizofrênica, como se viu acima? ______________ * Percival Puggina (65) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

www.zenit..org/

12/11/2010
PAQUISTÃO: MULHER CRISTÃ É CONDENADA À MORTE POR BLASFÊMIA http:www.zenit..org///article-26508?l=portuguese ISLAMABAD, quinta-feira, 11 de novembro de 2010 (ZENIT.org) - Asia Bibi, operária agrícola de 37 anos e mãe de duas crianças, é a primeira mulher condenada à morte no Paquistão sob a acusação de blasfêmia. A mulher foi acusada de ter ofendido o islã durante uma discussão no trabalho, na qual algumas mulheres haviam tentado convertê-la, segundo informou a agência AsiaNews. A sentença, emitida por um tribunal de Punjab no último domingo, refere-se a uma discussão que ocorreu em 2009, na localidade de Ittanwali. No transcurso da discussão, frente à insistência das colegas a que renunciasse ao cristianismo, Asia Bibi falou como Jesus morreu na cruz pelos pecados da humanidade e perguntou às demais mulheres o que Maomé havia feito por elas. A norma do código penal paquistanês castiga com a prisão quem ofende o Alcorão e com a morte a quem insulta o profeta Maomé. As colegas muçulmanas bateram em Asia Bibi e a trancaram em um quarto. Segundo explica a organização caritativa Release International, uma multidão se reuniu no local dos fatos e começou a insultar, tanto ela como seus filhos. O diretor de Release International, Andy Dipper, afirmou que, ao condenar uma mulher à morte por blasfêmia, o Paquistão passou dos limites. A Asia Bibi também foi imposta uma multa equiparável a dois anos e meio do seu salário.Com relação a esta sentença, o secretário executivo da Comissão Nacional Justiça e Paz, da Conferência Episcopal do Paquistão, Peter Jacob, declarou à agência Fides que os cristãos estão sob ataque pelo uso instrumental da lei antiblasfêmia. Os casos de falsas acusações são vários e estamos muito preocupados: já foram pelo menos 5 nos dois últimos meses, explicou. Infelizmente, não há mudanças à vista: o governo não considera em absoluto uma revisão ou uma abolição da lei - lamentou. E isso é muito grave. A condenação de Asia Bibi é um autêntico ultraje à dignidade humana e à verdade - denunciou. Faremos todo o possível para que o veredicto seja desmentido e revocado em apelação. As normas sobre a blasfêmia, segundo recorda o LOsservatore Romano em sua edição de hoje, foram introduzidas entre 1980 e 1986 para garantir o respeito à religião muçulmana. Com base nesta normativa, também foram censurados alguns sites da internet. Segundo dados publicados pela Comissão Nacional Justiça e Paz, de 1986 a 2009, 964 pessoas foram presas por terem profanado o Alcorão ou Maomé. A lei sobre a blasfêmia é utilizada em geral como pretexto pelos fundamentalistas para atacar as minorias religiosas, que no Paquistão constituem 4% da população. O Pakistan Christian Congress (PCC), que promoveu várias conferências, tanto no âmbito nacional como internacional, para pedir a derrogação das normas sobre a blasfêmia, expressou sua preocupação pela sentença de condenação à morte de Asia Bibi e lançou um apelo ao presidente do Paquistão para garantir justiça para a mulher.

Percival Puggina

06/11/2010
Domingo passado, o Dr. Sérgio da Costa Franco postou aqui mais um de seus importantes artigos - Pelo mau exemplo - reprovando o presidente Lula por haver abandonado a estatura do cargo e se convertido em cabo eleitoral de subúrbio. Na mosca. Dia seguinte, participando de programa em emissora da Capital, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF e do TSE, que falou por telefone, fez críticas severíssimas à conduta adotada pelo chefe de Estado brasileiro durante a campanha deste ano. Apontou-a como o fato mais deplorável da eleição. De fato, nunca antes neste país, um presidente foi tão longe no uso do cargo para favorecer estratégias eleitorais. Ao longo dos últimos meses, impudente e imprudentemente, em tempo integral, Lula só não fez para favorecer sua candidata a presidente e seus candidatos nos Estados o que não lhe ocorreu porque, objetivamente, fez e falou quanto lhe veio à cabeça. E ele pode quase tudo. Como diz meu filho, nos últimos três degraus da escada do poder alinham-se, em ordem ascendente os juízes de futebol, Lula e Deus. Mas Lula vem buzinando e dando sinal de luz. Às ilustres opiniões do Dr. Sérgio e do ministro Marco Aurélio, somam-se incontáveis outras, que me dispenso de alinhar porque todo mundo viu o que aconteceu. Lula transitou pelo país sentado num trono de nuvens, apartando os bons e os maus, anunciando o paraíso em caso de vitória dos seus, o inferno em hipótese oposta e distribuindo favores. Que um candidato faça isso já é exagero. Que um chefe de Estado assim proceda é coisa inominável. Todas essas críticas, contudo, parecem presumir um presidente magistrado, chefe de Estado, espécie de poder moderador, alinhado transitoriamente entre os símbolos da pátria. Todavia, o modelo institucional brasileiro, não é assim, como sabemos. No sujeito com a faixa presidencial fundem-se três funções de mando. Ele é chefe de Estado, do governo e da administração. Dessa mistura convergem para si as possibilidades operacionais da administração, do governo e de boa parte do Estado, das quais Lula usou e abusou para favorecer seu projeto sucessório. Em resumo: Lula fez o que fez porque as instituições brasileiras permitem! A Constituição lhe provê os meios! Essa é a razão pela qual só infringiu a lei quando atuou antecipando-se a prazos legais. Iniciada oficialmente a campanha, todas as cartas do poder foram manipuladas por ele, que as embaralhava, distribuía e jogava de mão. O sistema que favoreceu a conduta imprópria de Lula é ainda mais reprovável do que o que ele fez! No nosso sistema, o presidente não exerce um poder moderador. Bem ao contrário, é titular de um poder imoderado! É titular de um poder excessivo que está na origem de nossas disfunções institucionais. O presidente encontrou a porta aberta e foi com tudo influenciar a eleição. Bem antes, essa porta, pela qual ele interveio na eleição, já depreciara nossos partidos, o Congresso Nacional, o Poder Judiciário, já aviltara a política, e só faz crescer a população de mariposas em torno das luzes (digamos assim) desse imoderado poder central. É ele que desfigura a democracia brasileira e transforma as práticas políticas nacionais num catálogo de condutas repulsivas. Zero Hora, 07/11/2010

Érico Valduga

06/11/2010
RECEITA CRESCEU 2 CPMFs MAS VERBA NÃO FOI PARA A SAÚDE Érico Valduga Governo Lula usou ganhos para ampliar Bolsa Família e pagar aposentadorias; gastos na saúde apenas oscilaram na mesma média ao longo da década A receita do governo federal cresceu, ao longo do governo Lula, o equivalente a duas vezes a arrecadação da CPMF, mesmo com a derrubada, pelo Congresso, da contribuição sobre movimentação financeira. Praticamente nada desse ganho, porém, significou aumento do gasto em saúde, que, ao longo desta década, apenas oscilou em torno de uma mesma média. Não houve alta antes nem queda depois da extinção do tributo, hoje novamente cogitado como solução para o financiamento do setor. Segundo levantamento da Folha, o Tesouro Nacional absorvia em 2003, primeiro ano de Lula, 21% da renda nacional, por meio de impostos, taxas, contribuições e outras fontes. Em 2011, com Dilma Rousseff, a proporção deverá se aproximar de 24%. Não fosse uma escalada de despesas públicas (sobretudo as vinculadas ao salário mínimo) em ritmo intenso, a expansão das demais receitas teria compensado com folga a extinção do antigo imposto do cheque, que rendia algo como 1,4% do Produto Interno Bruto ao ano. A primeira gestão petista trabalhou para elevar as contribuições sociais, cujos recursos são destinados à previdência, à assistência social, ao seguro-desemprego e à saúde. Criou-se a contribuição previdenciária dos servidores inativos e elevaram-se alíquotas da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Os programas de transferência de renda absorveram a maior parte dos recursos adicionais devido ao lançamento do Bolsa Família e, principalmente, aos reajustes do salário mínimo, piso de aposentadorias, pensões, auxílios e benefícios deficientes e desempregados. Já as verbas da saúde seguiram a regra, instituída em 2000, que fixa aumento correspondente ao crescimento da economia: com isso os recursos ficaram estáveis, com pequenas variações para cima ou para baixo, em torno de 1,7% do PIB. No início do segundo mandato de Lula, durante as negociações para prorrogar a CPMF, o governo prometeu elevar o orçamento da saúde - que, com a contribuição de Estados e municípios, fica em 3,6% do PIB, metade do padrão do Primeiro Mundo. Com a derrota no Congresso, os planos foram abandonados, embora a arrecadação tenha continuado em alta. Elevaram-se o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), mas os maiores ganhos vieram da expansão da renda, da formalização de empregos e empresas. Para o ano que vem, o Congresso chega a estimar uma receita na casa dos 25% do PIB, ou R$ 985 bilhões. O comportamento da arrecadação neste ano, entretanto, aponta para algo mais próximo dos 24%. (Por Gustavo Patu, na Folha de S.Paulo, 6-11-2010)

Percival Puggina

06/11/2010
O poderoso Conselho Nacional de Educação (CNE) decidiu emitir uma notificação de censura ao livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, que seria distribuído à rede de ensino do país. A conselheira Nilma Lino Gomes leu a obra e viu nela preconceitos contra a África e racismo. Exigem, então, os conselheiros, que o texto venha precedido de uma reprovação de seus desalinhos ideológicos com a nova realidade nacional. Tenho certeza de que não faltará quem se habilite a produzir esse importante prefácio corretivo. Seja qual for a estupidez, sempre há quem se considere capaz. Dei uma investigada no Sítio do Pica Pau Amarelo, uma lida no livro e venho em socorro do Conselho: Caçadas de Pedrinho é politicamente incorreto de capa a capa! O sítio inteiro, aliás, está a exigir cuidadosa inspeção do Ministério Público Federal. Em primeiro lugar porque, há muito tempo, era para estar desapropriado (atenção, Incra!). Que negócio é esse? Uma propriedade rural com utilidade apenas ... literária? Péssimo exemplo para estar sendo apresentado à uma juventude que se quer cidadã e comprometida com as causas sociais. Tem mais, conselheira Nilma. Cadê a certidão de propriedade do sítio? Alguém já a viu? E não me venha o branquela do seu Monteiro Lobato com uma simples trintenária julgando que seja suficiente. Não no Brasil moderno! Quem pode assegurar que Tia Anastácia não fosse quilombola? Detentora dos direitos culturais históricos protegidos pelos artigos 215 e 216 da Constituição Federal? Ou dos muito prováveis direitos de posse mencionados no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Hum? É admissível que uma republicação de Caçadas de Pedrinho, em tempos de Lula e Dilma, deixe de mencionar tais avanços da sociedade brasileira? Na pesquisa que fiz, encontrei uma foto da negra Anastácia, datada de 1913 (está disponível na wikipedia). Era magra, de meia idade. Na imagem, aparece tendo ao colo o menino Guilherme, filho de Monteiro Lobato. O autor, reiteradas vezes, admitiu publicamente, que essa Anastácia, essa pobre e infeliz Anastácia, havia inspirado a criação da personagem Tia Anastácia! Basta fazer as contas para perceber que a desventurada senhora foi, ela mesma, escrava. Fugida ou liberta, não importa. E acabou, mais uma vez, sendo explorada pelo patrão branco que promoveu o uso gratuito de seus evidentes direitos de imagem. Pode o Conselho Nacional de Educação silenciar sobre tal iniquidade? Referendar obra que escarnece valores tão significativos? Anota essa outra aí, conselheira Nilma. Quer mais, o CNE? Debruce-se sobre o personagem Visconde de Sabugosa. Pondere, leitor. O visconde é um personagem da nobreza. Encarna saber e coragem física. Tantas vezes morresse, tantas vezes era ressuscitado com a simples troca do sabugo que compunha seu corpo. É ou não uma exaltação simbólica da elite nacional e de sua perpetuação através dos tempos? Pode haver algo mais antidemocrático e elitista do que um imortal representante da nobreza, além de tudo apresentado como encarnação da sabedoria e do destemor? Eu, hein! E para finalizar: cadê a autorização do Ibama para a Caçada do Pedrinho? ______________ * Percival Puggina (65) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

01/11/2010
Nos últimos meses circulou muito na internet a parábola da tartaruga que apareceu em cima de um poste. Ninguém entende como ela chegou lá. Todo mundo sabe que não subiu sozinha, que ali não é o lugar dela e que aquilo não vai terminar bem. Pois neste melancólico final de tarde do dia 31 de outubro de 2010, a tartaruga está no poste. Ou melhor, posta no poste. Teoricamente, na eleição finda, o eleitor brasileiro tinha que escolher entre governo e oposição. Teoricamente. Na prática a coisa era um pouco diferente. Governo queria dizer Lula em qualquer versão que ele ungisse para o substituir e oposição queria dizer José Serra - uma das menores vocações oposicionistas que a política brasileira já produziu. Serra tem sido bom no governo, mas é um péssimo líder oposicionista. E a tartaruga acabou em cima do poste. Não se espante, leitor. E admita: o candidato de Lula poderia ter sido o próprio poste. Ganharia também. Por quê? Porque estavam dadas as condições para que isso acontecesse, a saber: uma oposição sem liderança visível e totalmente desorganizada; uma decadência da capacidade de análise política; a cooptação pelo oficialismo de praticamente todas as estruturas e instituições da sociedade; a gastança dos recursos públicos com fins eleitorais que dá luz verde para qualquer candidatura, mas já acende luz amarela em todos os indicadores da economia brasileira. E por aí vai. Acrescente suas próprias observações. Elas, por certo, serão pertinentes. A tartaruga está em cima do poste e muitos analistas da grande mídia se interrogavam, hoje à tarde, num assomo de discernimento, num surto de curiosidade que se manteve ausente durante a campanha eleitoral, se o futuro governo seria de Dilma, de Lula, de José Dirceu, do PT ou do PMDB. Interrogações póstumas, como se percebe, perante as quais não há resposta boa nem menos pior. Precisamos de um milagre. Ou melhor, de dois. O primeiro para que o futuro governo contrarie as expectativas pessimistas da minoria que o rejeitou nas urnas. E o segundo para que surja no país, em curto prazo, uma liderança oposicionista competente e confiável. Por isso, daqui para frente, muita oração pelo bem do Brasil. Santa Rita (das causas impossíveis) e Santo Expedito (das causas justas e urgentes) são bons intercessores para a atualidade nacional. ______________ * Percival Puggina (65) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.