PAULO WAINBERG

18/04/2011
QUEREM PROIBIR O E-MAIL Paulo Wainberg, escritor http://paulowainberg.wordpress.com Li no jornal: O Deputado Federal Aldo Rabello, líder do novíssimo Partido Comunista, está fazendo um projeto de lei para proibir o uso, por escrito, de palavras estrangeiras no Brasil. Idéia magistral, como é que não pensei nisso antes? Como é que outros deputados e senadores não pensaram nisso antes, neste País? Há quinhentos e onze anos o Brasil vem incorporando essas horrorosas palavras em inglês, francês, alemão, japonês, italiano, causando gravíssimos danos à função social da língua portuguesa e ninguém fez nada! Como se sabe, a língua pátria é condição necessária para a formação de uma nação. Entretanto, ao longo dos séculos, invasores de língua querem retirar nossa identidade, introduzindo solertemente suas estrangeiras palavras em nossos textos, abalando de forma radical o nosso nacionalismo que, finalmente, graças aos ideais comunistas do ínclito deputado, será doravante salvo. Imaginem a alegria que sentiremos nós, brasileiros, quando formos proibidos de escrever Internet, substituindo o terrível termo pelo brasileiríssimo Entre a Rede. O Twitter será eliminado, pois não há palavra para ele, em português. E-mail? Minha querida, recebeste a correspondência eletrônica que te enviei ontem? Você nunca mais manejará um mouse e terá, para todo o sempre, um camundongo em sua mão. O locutor não gritará o horrendo gol, que será substituído por... por ?a esfera ingressou na área posterior às traves e o travessão?. Sua casa não terá mais ladrilhos e sim pequenos pedacinhos de pedra colorida. E isto que estou simplificando, há situações muito mais complexas que o nacionalismo deve proteger à todo o custo, quando se trata de defender a língua mãe. Ai de quem se atrever a digitar marqueting no trabalho de conclusão de concurso. Um bom e verdadeiro brasileiro substituirá a palavra alienígena por algo bem mais simples, como ?a estrutura de divulgação, interação, empatia e divulgação das atividades mercadológicas visando dar conhecimento de produtos e atividades específicas ou gerais?. Se um escritor como eu descrever a despedida de seu personagem francês com um ?au revoir?, será imediatamente preso! E não tomarei mais seu tempo com exemplos. Passo a identificar a motivação que levou o parlamentar à conceber um absurdo tamanho. A primeira coisa que me ocorre é que ele não tem mais nada para pensar. Absolutamente nada. E solidário com seus pares parlamentares, que também não pensam em nada além de negócios rendosos, resolveu ocupar-lhes a mente. Imagino nossas Casas Legislativas lotadas, em sessões solenes e intermináveis, onde nossas excelências debaterão a matéria à exaustão, estudando, vernáculo a vernáculo, o que pode e o que não pode ser escrito neste país. Pense nos puristas parlamentares, exultantes com o debate, revelando seu extraordinário pensamento, as linhas de raciocínio, os apartes pro bono (acabo de me arriscar, escrevendo em latim), os a favor, os contra, um espetáculo brasileiro de democracia, não importa que a corrupção corra solta e que mais de sete mil pessoas trabalhem para oitenta senadores, ganhando o salário pagos por nós, que odiamos palavras estrangeiras escritas por incultos professores, artistas, jornalistas, poetas, escritores, filósofos e outros entreguistas que assolam a Nação. Perceba a grandeza do projeto! Outro motivo que pode ter levado o velho Aldo à conceber a coisa pode ser a arteriosclerose, palavra que nem sei se brasileira é. Imaginando-se, por confusão mental, estar sob a influência (ou domínio) do Império Romano e percebendo que o Latim virou latim vulgar, aquele falado nos países conquistados, misturados com as línguas pátrias, entrou em crise de nervos. Esquecendo-se de que o Português deriva do latim vulgar, quer o nobre que preservemos, como se fôssemos uma raça, a pureza absoluta, abolindo da nossa escrita tudo aquilo que não for contemplado na língua de Virgilio. ?Mensalão?, por exemplo, é permitido? Você, garota, jamais seja fashion. Arrisca-se aos piores rigores da lei. Enfim! Um País como o nosso, sem problemas, onde as instituições funcionam como um relógio suíço, a honestidade é absoluta, escândalos não existem, crimes não são cometidos, a segurança é perfeita, as estradas são ótimas, a educação é a melhor do mundo, a Saúde Pública é maravilhosa, o sistema político é exemplar, o problema social não existe e a riqueza é distribuída com absoluta justiça, tem mesmo é que se preocupar com palavras estrangeiras. Eu, olhando aqui debaixo, já estou me preparando para nunca mais escrever non sense. Corro o risco de ser condenado a não sei quantos anos de prisão.

Percival Puggina

16/04/2011
Há pouco, o sino de uma igreja distante ecoou doze lúgubres badaladas, dando por encerrado o dia. Cai sobre a cidade um silêncio quase campeiro. Silêncio que faz milagres. Até os surdos ouvem o ruído da mais bem lubrificada dobradiça. Um pequeno objeto que caia faz rugir o travesseiro. Sim, sim, foi exatamente o que você ouviu. Alguma coisa caiu no chão e precipitar-se ao chão por conta própria não faz parte da natureza das coisas. Na escuridão da casa, no desprotegido abandono do leito, conheço a sensação que esse ruído causa, leitor. É bem assim: primeiro um calafrio se insere sob o pijama e percorre a coluna vertebral em velocidade vertiginosa imantando os cabelos da nuca, que se erguem em apavorada prontidão; imediatamente após, uma verdade alarmante se instala no seu cérebro: você é o homem da casa. Suas possibilidades são poucas. Pode, por exemplo, seguir a receita do Sarney, do Renan Calheiros e do governo federal. O governo federal, apenas para lembrá-lo, é aquela instituição que faz estatísticas de criminalidade. Conta armas, mortos, feridos e prejudicados. Atribui a mortandade de brasileiros à arma trancafiada na gaveta do cidadão de bem. Por fim, olha-se no espelho o governo, estufa o peito e proclama que a promoção de nossa segurança, em igualdade de condições com quem nos agride, deve ser monopólio dele, governo. Sua cidadania lhe impõe então, leitor, o dever de pegar o telefone e chamar a polícia. Fique tranquilo. Em questão de segundos sua casa será palco de uma verdadeira operação de salvamento. Não duvide: haverá PMs enfiando-se sob as portas e subindo paredes como lagartixas. O visitante noturno desejará ter nascido astronauta. Não, nem pense em pegar sua arma. Deixe-a onde está. Milhões, assim como você, cansaram da peregrinação que lhes impuseram para que pudessem ter e conservar armas legalmente havidas. Recusaram-se a ser achacados por mais e mais taxas, a correr atrás de renovações de licenças e a tirar negativas que vencem antes de saírem da impressora da repartição. Você não imagina o bode que vai dar se pegar aquela arma. Parta para outra. Repasse mentalmente tudo que aprendeu nos filmes de Bruce Lee, Van Damme e Chuck Norris. Afinal, se até o Steven Seagal, gordo como está, é capaz de surrar meia dúzia com uma mão nas costas, você muito provavelmente conseguirá dar um bom corretivo no invasor antes que ele tenha tempo de dizer Fui. Por pura coincidência eu estava em Brasília e assisti a sessão no dia em que Sarney propôs o tal plebiscito para rever a decisão tomada no referendum do desarmamento promovido em 2005. Renan Calheiros fez um infindável discurso de apoio, entrecortado por dezenas de apartes favoráveis à iniciativa. Tive vontade de implorar: Fala sério, Renan!. As únicas vozes discordantes foram as de Álvaro Dias e Roberto Requião. Se a impressão que colhi nos tapetes azuis do Senado se confirmar na Câmara dos Deputados, o plebiscito sai. Um mentecapto faz uma chacina no Realengo e a nação vai às urnas. Como se vê, não nos faltam oportunistas cercados de privilégios. Aqueles senhores todos têm posse e porte de armas, seguranças e veículos blindados. Nós pagamos por tudo. E agora querem nos mandar a fabulosa conta de um plebiscito que desejaria nos desarmar até dos dentes. Desde então tenho ouvido muita gente defender a proibição total da venda de armas portando sob o braço, neste país da tese pronta, o discurso segundo o qual, num assalto, a chance de sofrer lesão física é muito maior entre os que reagem do que entre os que não reagem. Não tenho dúvidas quanto a isso, porque na grande maioria dos casos a reação é estabanada e o fator surpresa corre a favor do assaltante. Em situações assim, evite mesmo reagir. Mas existem muitas outras em que as circunstâncias facultam à vítima essa vantagem, seja preparando-se ela para surpreender o agressor, seja espantando-o com um tiro de advertência. Só alguém muito ingênuo não percebe a quem convém a condição totalmente indefesa da população civil ordeira. No campo, serve aos invasores; nas cidades aos bandidos; e na vida social e política a quem controlar o armamento. Dê uma olhada na cena desse debate. Veja quem se mobiliza para impedir a legítima defesa dos cidadãos. E saiba: a ingenuidade nunca foi atributo deles. Quanta mistificação e oportunismo na ideia do plebiscito! Nos quartéis, todos andam armados e não ocorrem crimes. Nos presídios, praticamente não existem armas de fogo e a violência campeia. Não vou cobrar royalties por esta verdade cristalina: o crime organizado, o PCC, o Comando Vermelho, o governo federal e o governo gaúcho estão afinadinhos nessa campanha. ______________ * Percival Puggina (66) é titular do blog www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

16/04/2011
Eu sei, eu sei. A maior parte das pessoas tem adoração pelo nosso ex. Mas os primeiros dias do mês de janeiro, a mim, forneceram uma agradabilíssima sensação de alívio. Recuperei o hábito de assistir noticiários de televisão graças à certeza de não ser golpeado pelos pavoneios e jactâncias presidenciais. Livrei os tímpanos dos discursos messiânicos que me davam a impressão de viver ao lado de um megafone, desses de porta de fábrica, assumido pela mesma voz rouquenha. Mil vezes o silêncio da nova presidente, metida em seu gabinete, tratando dos assuntos do país e, ao que se percebe, procurando corrigir as demasias que acenderam incontáveis lâmpadas de advertência nos painéis de controle dos analistas da economia nacional. Quis entrar no tema das perspectivas que vislumbro ao novo governo falando de comunicação porque ela, a comunicação, certamente marca a mais visível diferença entre as personalidades de Lula e Dilma. E não hesito em afirmar: subimos alguns degraus na escada da seriedade com que devem ser tratados os assuntos de Estado. A nova presidente, menos destra no manejo dos auditórios, com muito menor carisma e sem vocação para as parlapatices de palanque, já deixou bem claro que está dedicada às exigências e atribulações inerentes ao posto. Não a imagino como frequentadora assídua de estrados de madeira, desfilando de um lado para outro, arrancando risos e aplausos da patuleia. Já escrevi muito sobre a importância do realismo na política. Ser realista não significa submissão absoluta à realidade como quer que ela se apresente, nem equivale a conceder alforria aos piores intuitos. Ser realista é operar no mundo dos fatos muito mais do que no mundo das ideias, é lidar com relações de causa e efeito, é atuar sobre os problemas com os pés no chão, com os números na ponta da língua e do lápis, tendo na cabeça ideias aplicáveis à realidade. Esse realismo se opõe ao idealismo daqueles que, instalados no mundo da lua de suas reflexões, mandam os fatos às favas e tratam de impor o que pensam independentemente das vítimas que tombem pelo caminho. Enquanto todos os totalitarismos nasceram desta última vertente, não se conhece na história, pelo viés oposto, um único estadista de fato que não tenha sido, de fato, um realista. Lula vinha de uma militância esquerdista que exigia milagres de quem estivesse no exercício do poder. Combatia quaisquer proposições que eles apresentassem e cobrava-lhes soluções arrancadas da mera vontade política. Parecia um idealista, no sentido filosófico da palavra. No entanto, quando chegou ao poder - surprise! -, Lula se revelou, essencialmente, um realista. Mas o realismo do ex-presidente foi um realismo que não se ensina aos próprios filhos, que ultrapassa irremovíveis barreiras morais e que se abraça a Mephisto se isso for estrategicamente proveitoso. O pacto Ribbentrop-Molotov e o governo do marechal Pétain na República de Vichy talvez sejam os melhores exemplos históricos de um tipo de abraço que a chamada Era Lula reproduziu com desconfortável frequência, tanto na política interna quanto na política externa. Há números que escancaram isso. De um lado, o realismo do presidente ao manter políticas que combateu duramente quando na oposição (tempo em que era dado a bravatas, como ele mesmo as definiu), somado a um consistente conjunto de talentos e a um cenário externo favorável, lhe conferiu consagradora aprovação por 87% da opinião pública. De outro, a cotação dos políticos nacionais bateu a oito centímetros do fundo do poço: 92% de rejeição! Na mesma escala, na mesma batida, na mesma medida em que subia o prestígio do ator principal, decrescia o do resto do elenco! Ora, como entender que não haja relação de causa e efeito entre uma coisa e outra na mesma peça? Ou seja, entre a cotação do grande líder da política nacional ao longo da última década e a dos políticos ao cabo de seu período? Será que aquilo nada tem a ver com isto? Perceber relações expostas a um palmo do nariz parece-me essencial ao realismo e à sabedoria que lhe é inerente. Lula foi o comandante da política nacional. Foi o cara, o polo de uma convergência de partidos e de um conjunto de práticas que operou, manteve e não agiu para mudar. Enquanto tocava seu mandato, o prestígio do Congresso Nacional se liquefazia numa sopa de interesses cujos ingredientes eram cozinhados naquele centro de poder e decisão sobre a administração, o governo e o Estado instalado no Palácio do Planalto. E a indispensável reforma das instituições, mais uma vez, não avançou uma polegada. Dilma é tão diferente de Lula que dela só se pode esperar uma gestão em outro tom. Lula teve Dilma, mas Dilma não terá Lula. Depois de oito anos sob a batuta de um self-promoter estamos sob a presidência de uma pessoa sem qualquer vocação para os arroubos publicitários. Ele subiu como um foguete na plataforma de Alcântara, malgrado os péssimos níveis dos três fundamentos de qualquer índice de desenvolvimento humano: educação, saúde e segurança. Ninguém neste país aplaude qualquer dos três. Mas todos aplaudem quem os comandou por quase uma década! Cabe à nova presidente, nesta largada de governo, adotar medidas duras, destinadas a corrigir as consequências e pagar as contas do ufanismo lulista. A ordem, sensata e coerente com a realidade, já foi energicamente emitida na primeira reunião ministerial: cortar gastos! Mas cortar gastos custa caro. É um paradoxo: cortar gastos causa desgastes. Dá prejuízo. Desgastes políticos geram furos no casco, determinam abandonos do barco. É tarefa complicada recuperar os trânsfugas quando sobem as águas, aumentam os ônus e rareiam os bônus. E convenhamos, a base do governo está muito mal acostumada. Não antevejo Dilma disputando essas partidas com os mesmos truques usados por Lula. Era muito fácil a vida com tais malabarismos e sob o manto da popularidade do ex-presidente. Teremos políticos adequados aos novos tempos e às novas realidades? ______________ * Texto publicado na edição de abril da revista da Fundação Milton Campos

Augusto Nunes

16/04/2011
ENTREVISTA COLETIVA DE DILMA NA CHINA No excelente texto abaixo transcrito, Augusto Nunes introduz os comentários que Celso Arnaldo Araújo teceu sobre a entrevista de Dilma Rousseff aos jornalistas brasileiros após a entrevista com o primeiro ministro chinês. Diz Augusto Nunes: O DILMÊS É MAIS COMPLICADO DO QUE O CHINÊS ?Essa resposta eu não respondo?, diz Dilma Rousseff no fim do vídeo que registra os principais momentos da entrevista coletiva concedida em Pequim. ?Responder respostas? nem o padrinho Lula consegue. O problema é que a afilhada não consegue responder também a perguntas, como constata o jornalista Celso Arnaldo Araújo em mais uma análise antológica do palavrório presidencial. Em grande forma, o implacável caçador de cretinices capturou, além de Dilma, a escolta formada por uma trinca de quinta categoria: Aloízio Mercadante, Fernando Pimentel e Edison Lobão. Sozinha, a entrevistada é capaz de deixar pálido de espanto qualquer jornalista. Consultando uma papelada e ouvindo cochichos, ela consegue piorar espetacularmente. O vídeo de 5 minutos adverte: o dilmês é mais complicado que o chinês. (http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=QkSvCvQ7h3I)

Agência Estado

11/04/2011
TARSO GENRO - NUNCA VI ALGUÉM MATAR POR TER USADO MACONHA E eu pergunto: quando foi que alguém chamou a maconha de erva assassina? Que tremenda tolice!Eis, abaixo, o que o governador gaúcho falou a respeito disso, segundo matéria da Agência Estado. *** Segundo Tarso, uma eventual liberalidade da sociedade com o tema dependeria também de estudos dos efeitos de cada droga. Eu acho que, por exemplo, as pessoas terem tolerância com a cannabis sativa é diferente do que com a heroína. A maconha, muitos especialistas dizem que faz menos mal que o cigarro. É o que dizem. Eu nunca vi alguém matar por ter fumado um cigarro de maconha, comentou o governador. Eu acho que tem que fazer uma distinção científica sobre o que é comprometedor efetivamente da saúde e da sanidade mental, para trabalhar essa questão de maneira equilibrada. Eu vejo dessa forma, não tenho nenhum preconceito. Durante seus comentários, Tarso também reconheceu que sua geração teve desejo de consumir droga. Na minha época, a gente não fumava maconha não por não ter vontade, mas porque as condições de segurança em que a gente vivia, na clandestinidade, adicionavam mais uma questão de insegurança que é a maconha, apenas por isso, narrou. Mas dizem que é muito saboroso.

Percival Puggina

09/04/2011
Zero Hora da última segunda-feira trouxe matéria sobre o que se passa aos domingos, na capital gaúcha, em certo trecho da rua Lima e Silva. Os episódios descritos são rotineiros e antigos. Se o desrespeito à lei não tropeça no rigor daqueles que a devem fazer cumprir, quem se estatela é a ordem pública. Quando os pais chutam o balde de suas responsabilidades, quando tantos religiosos evidenciam maior interesse pela questão fundiária e pela camada de ozônio do que pela salvação das almas, quando escolas e universidades confessionais acolhem professores que atacam a religião da instituição e seus valores, quando a impunidade começa em nome da proteção da infância e da adolescência e termina em prescrição para os marmanjos de gravata, quando a dignidade da pessoa humana é aviltada aos padrões da matilha, a sexualidade é desumanizada e os avoados do BBB são reverenciados como heróis nacionais, facilmente emerge aquilo que se retratou na reportagem de ZH. Deve haver quem, após muito promover o relativismo moral e a libertinagem, tendo debochado de tudo que tem valor e contribuído para a deformação das consciências, considere cumprido ali seu papel e se regozije ante o triunfo da matéria sobre o espírito, essa ficção dos crentes. Imagem e semelhança de Deus? Família? Virtude? Valores? Respeito? Honra? Que papo mais furado! Somos apenas repolhos evoluídos ou macacos que regrediram. Essa epifania da libertinagem fornece lições a outras realidades. A vida civilizada reprova moralmente a promiscuidade e a conduta de quem se concede o direito de exercitar, em nome da liberdade e da não discriminação, a espetacularização de suas fantasias, a propaganda de sua conduta sexual ou a exibição de suas inclinações. Quem assim procede, quer seja heterossexual ou homossexual, transgride os padrões exigíveis na vida social. Sexo pede, no mínimo, responsabilidade e intimidade. Dar vazão à libido em público, é desrespeito aos demais. Ninguém deve ser obrigado a trancafiar portas e janelas para não presenciar o desregramento alheio. Perseguição oficial aos homossexuais é conduta típica dos totalitarismos e está imposta, ainda hoje, nos países comunistas e fundamentalistas. Já nas sociedades livres, a discriminação é coisa própria de quem perdeu o sentido de respeito e convívio civilizado. Reprove-se, então, o preconceito. E se reconheça como valioso o esforço de muitos em superar as discriminações de que, obviamente, são alvo. Mas isso deve ser feito com seriedade. Não é aceitável que, em nome da não discriminação, se autorizem e financiem com recursos públicos paradas gays nas quais se encenam comportamentos que, com justo motivo, levariam ao xilindró qualquer casal que os exercitasse num banco de praça. É a mesma falsa lógica dos esbulhos à propriedade - se um invade, a polícia algema; se muitos invadem vira manifestação popular... Educação sexual não pode ser apenas instrução sobre fisiologia, segurança e saúde, mas, principalmente, formação para a responsabilidade e para o amor. Eis por que o PLC-122 (o projeto de lei que trata da homofobia) contém demasias. Uma coisa é promover campanhas de esclarecimento sobre os males da discriminação e impor sanções a determinadas condutas comuns hoje em dia. Outra bem diferente é retirar dos pais o direito de orientar moralmente seus filhos e de buscar escolas e Igrejas em consonância com os valores que desejam lhes transmitir. Não se pode dar ao Estado tamanho poder de intervenção na vida social. ZERO HORA, 10/04/2011

Percival Puggina

09/04/2011
Os comunistas brasileiros são renitentes. Foram os últimos a chorar quando Stalin morreu. O facínora russo estava paradinho dentro do caixão havia vários dias, entre archotes e com algodão nas narinas, como descreveria Nelson Rodrigues, e os comunistas brasileiros ainda não acreditavam que as notícias de sua morte expressassem um fato real. Menos ainda, uma realidade espiritual. Para eles, Stalin era um símbolo, uma instituição, uma entidade, espécie de messias, filho de um sapateiro e de uma lavadeira, nascido em Gori numa noite em que o luminoso céu da Geórgia fora riscado por uma estrela vermelha. Em 1989, quando caiu o Muro, alguns renitentes me acusaram de acreditar em boatos por ter comentado sobre as estátuas de Lênin que estavam sendo derrubadas no Leste Europeu, coisa que a revista Manchete estampara em fotos de meia página. Jogar ao chão estátuas do líder da Revolução de 1917 era mais do que um sacrilégio. Era uma impossibilidade material, tipo arremessar montanhas ao mar. Como católico, chego a invejar o tamanho dessa confiança. Veja, por exemplo, leitor, a mística expressão de fé incondicional contida na carta que D. Paulo Evaristo Arns mandou a seu queridíssimo Fidel em 6 de janeiro de 1989, por ocasião dos 30 anos da revolução cubana. Lá pelas tantas, o paparicado e purpurino cardeal arcebispo de São Paulo lascou assim: A fé cristã descobre, nas conquistas da Revolução, os sinais do Reino de Deus, que se manifesta em nossos corações e nas estruturas que permitem fazer da convivência política uma obra de amor. E mais adiante: Tenho-o presente diariamente em minhas orações, e peço ao Pai que lhe conceda sempre a graça de conduzir os destinos de sua pátria. Grandes defensores da democracia D. Paulo Evaristo e seus admiradores! Note-se que no mês anterior, em dezembro de 1988, uma delegação de bispos alemães havia estado em Cuba. Em matéria sobre a visita, publicada na revista 30 Giorni de jan/89, eles contaram que a Igreja cubana não tinha acesso à Educação, que todos os religiosos estrangeiros haviam sido expulsos, que o contingente de sacerdotes e religiosos reduzira-se a 15% do que já fora, que quem se proclamasse cristão ficara excluído da possibilidade de ascensão funcional e que, como consequência, apenas 1% dos cubanos frequentava a igreja. D. Paulo escreveu a Fidel em cima de tal fato. E foi acalentar no sono dos que são capazes de arder todo e qualquer bem na fogueira dessa ideologia malsã, a irresponsabilidade do que escrevera. Referia-se, então, ao mesmo regime que, vinte anos depois, como prova de benevolência, ainda liberta às pencas dissidentes políticos! Alguns bispos cubanos, felizmente, responderam a D. Paulo. A longa carta que lhe mandaram, entre outras coisas, relata esta grande novidade: Cuba sofre, já há trinta anos, uma cruel e repressiva ditadura militar, num estado policial que viola, constante e institucionalmente os direitos fundamentais da pessoa humana. Ao fim da dissertação, os três bispos que a assinam concluem: Deus queira que seu país nunca tenha que passar pela trágica experiência que nós estamos atravessando. Esse deve ter sido o trecho que mais desagradou D. Paulo, subtraindo-lhe, por instantes, o melífluo sorriso que adorna de falsidade suas manifestações. Afinal, reproduzir no Brasil a experiência cubana era tudo que ele mais desejava. Oh, raios! Como é que os bispos cubanos lhe esfregavam no rosto o fato de estarem rezando contra seus mais caros anseios pastorais? É provável que o leitor esteja duvidando. Não é razoável. Nada disso pode ser verdade. Um cardeal católico não poderia dirigir tal louvação a uma ditadura que tanto perseguia a Igreja e que já durava 30 anos. Pois é tudo exato e veraz, letra por letra, meu caro. Tenho em mãos cópia das correspondências, que à época li nos jornais. As duas foram transcritas na imprensa brasileira e a de D. Paulo foi reproduzida em espanhol no Granma, com grande destaque. Aliás, eu mesmo escrevi para o Correio do Povo, em 26 de janeiro de 1989, um artigo intitulado A epístola de Paulo, (o Evaristo), tecendo ironias sobre a falta de juízo do cardeal paulista, cujos olhos, ao reverso do apóstolo dos gentios, cada vez mais se revestiam de escamas. E acrescentei que a mesma carta a Fidel poderia ter sido enviada em circular, por D. Paulo, para os governos da Alemanha Oriental, Bulgária, Polônia, Hungria, Albânia e tantos outros. Afortunadamente vivíamos, então, os primeiros dias do ano da Graça (poderíamos dizer, sem exagero, o ano da Grande Graça) de 1989, quando começariam a desabar os regimes do Leste Europeu. Contados vinte e dois anos sobre aqueles episódios, seguiram para a Espanha, dia 7 deste mês de abril de 2011, mais 37 prisioneiros de consciência do regime cubano! Totalizam-se, assim, 126 libertações negociadas pelo Vaticano. O total remanescente nas masmorras, contudo, permanece desconhecido das organizações de Direitos Humanos e da opinião pública mundial. Duas perguntas se recusam ao silêncio: 1ª) se todos esses prisioneiros podiam ser libertados, por que estavam presos? e 2ª) se estavam presos porque era assim que deviam estar, em vista do bom Direito e da boa Justiça, por que foram libertados? A brutal malignidade do regime que D. Paulo reverencia e que tantos brasileiros cultuam evidencia-se muito mais nessas duas perguntas do que nas improváveis respostas que a elas sejam dadas. Não lhes falta, sequer, o despudor de apresentar o regime cubano como símbolo da autodeterminação, apesar de ser conduzido a grades de ferro pela determinação unipessoal de um tirano que aplaudiu o massacre da Tchecoslováquia pelas tropas russas e que interveio militarmente, com soldados de seu povo, em revoluções comunistas pelo mundo afora. Esse tirano que D. Paulo, Lula, Dilma, Zé Dirceu, Frei Betto, Chico Buarque e muitos outros veneram montou uma ordem social tão esquizofrênica e tão canalha que produziu este resultado sem igual na história do operariado mundial: quando, no ano passado, foi anunciada a demissão de uma quinta parte da força de trabalho cubana, mediante pagamento de um mês de salário por cada dez anos de atividade, a Central dos Trabalhadores de Cuba aplaudiu a providência! E eles continuam crendo. Continuam sonhando com jogar montanhas ao mar. E gostando do que veem em Cuba. São óbvias as tendências sádicas e a falta de caráter de quem louva e apoia um regime assim. ______________ * Percival Puggina (66) é titular do blog www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

01/04/2011
Não é a conduta do governo que causa estranheza. O governo segue a lógica do lobo, cujas razões nunca incluem o ponto de vista do cordeiro. Quando convém aos lobos, as águas do rio sobem encostas. Não há novidade nisso. O mundo é assim desde que pela primeira vez, num grupo humano primitivo, certo grandalhão decidiu que mandaria no pedaço. Surpreendente é que numa sociedade civilizada, em pleno século 21, tantos setores da mídia reproduzam para seus clientes - nós, os cordeiros - a retórica brutamontes do lobo. O governo Dilma anunciou, com semitons de generosidade, que a tabela do Imposto de Renda seria corrigida em 4,5%, representando, esse gesto de benevolência, renúncia fiscal de R$ 1,6 bilhão no atual exercício. O Google registra cerca de 20 mil reproduções dessa informação. E daí?, perguntará o leitor. E daí que estamos perante exemplo típico do que descrevi no parágrafo anterior. Que renúncia fiscal ocorre quando o governo corrige (inclusive em percentual inferior ao da inflação medida) a tabela do IR? A quase totalidade dos trabalhadores e aposentados do país, uma vez ao ano, tem reposto seu poder de compra mediante reajuste de salário ou provento em percentual mais ou menos equivalente ao da inflação ocorrida. Sobre o que recebe, paga imposto de renda. Se a tabela do tributo não é reajustada em conformidade com a inflação, o que ocorre pode ser definido de duas maneiras distintas. Numa, o governo está tributando a inflação pois obriga o trabalhador a pagar mais imposto pelo mesmo poder de compra. Noutra, ele está, por via indireta, ou seja, por omissão, elevando a alíquota. Portanto, falar em renúncia fiscal é um desaforo oficial. Vamos expor isso de outra forma. Suponha, leitor, que dona Dilma suba nos tamancos e proclame que acabou, para sempre, a renúncia fiscal. Não haverá mais qualquer reajuste na tabela do IR das pessoas físicas. Sabe qual a consequência? Ao cabo de 15 anos, admitindo-se uma inflação de 4,5% a.a., o governo terá tomado, por essa via tributária - é a aritmética que o prova - metade do poder de compra que a sociedade detinha no primeiro ano de aplicação da norma. Havendo inflação, congelar a tabela do IR é tão esbulho quanto congelar salários. A alcatéia, contudo, não se satisfaz com meros artifícios retóricos. Sofismas não engordam o caixa. Então, anuncia o governo - e os complacentes reproduzem ipsis literis - que, para compensar a tal renúncia fiscal, a alíquota do IOF incidente sobre compras feitas no exterior será aumentada. Pronto! Acabou a generosidade. A alcatéia dá de mão na tesoura. Lobo do século 21 não come cordeiros. É mau negócio. Acaba com o rebanho. Mais lucrativo é tosquiá-lo periodicamente. E retorna-se ao sofisma: os brasileiros estão gastando muito no exterior. De fato, do jeito que a coisa vai, gastaremos, neste ano, algo como US$15 bilhões fora do país. Na perspectiva do lobo, o brasileiro, esse perdulário, não pensa no bem da pátria. Em vez de gerar empregos aqui dentro, vai gerar empregos lá fora. O sofisma entra pela janela e chuta a razão pela porta. Até as pedras sabem que os brasileiros estão gastando no exterior porque está mais barato gastar lá do que aqui. Simples como isso, porque nossa moeda ficou excessivamente valorizada frente ao dólar. Aliás, as compras de viagem fora do país são parcela pequena na coluna das nossas despesas externas. Sobre o prejuízo maior, perguntem à indústria nacional. Perguntem aos exportadores de manufaturados. Muito mais do que os uísques e perfumes comprados em Rivera, ou as bugigangas de Miami, são as massivas importações de manufaturados feitas pelo mercado brasileiro que afetam negativamente nossa balança comercial e danificam o mercado de trabalho do país. O consumidor não sofisma. Não vive de discurso. O consumidor faz as contas e sabe que se tornou vantajoso fazer turismo no exterior. É mais barato lá do que aqui. E não por culpa dele, consumidor. Digam-lhe os lobos o que disserem. Se o governo não controla seus próprios gastos e precisa buscar dinheiro no mercado, elevando juros, atraindo dólares e derrubando a cotação dessa moeda, é ele e não a sociedade que está causando prejuízo grave às contas e à economia nacional. ______________ * Percival Puggina (66) é titular do blog www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

José Carlos Aleluia

01/04/2011
CARTA ABERTA AO REITOR DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA PROF.JOÃO GABRIEL SILVA, MAGNÍFICO REITOR DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA (José Carlos Aleluia é professor universitário, Membro da Comissão Executiva do Democratas e Presidente da Fundação Liberdade e Cidadania) Na condição de professor universitário venho perante Vossa Excelência manifestar a minha perplexidade ? e porque não dizê-lo?, indignação, diante da concessão do título de doutor honoris causa, pela instituição que ora Vossa Excelência representa, ao ex-Presidente da República do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. Tomando como referência o significado que tem, para nós brasileiros, a Universidade de Coimbra, entendo que a iniciativa destoa aberta e completamente de toda a sua tradição. Aprendemos que as personalidades que lideraram o processo da Independência e que assumiram os destinos do novo país ?a começar do Patriarca, José Bonifácio? formaram seu espírito na Universidade de Coimbra. Aplaudimos com entusiasmo a concessão daquele título a ilustres representantes da contemporânea cultura brasileira, a exemplo do saudoso Miguel Reale. Em eventuais excursões a Portugal, todo membro da comunidade acadêmica brasileira sente-se no dever de conhecer a instituição que consideramos parte integrante de nossa história. A concessão do mencionado título contraria frontalmente toda a idéia que nos fizemos da Universidade de Coimbra pelo fato, sobejamente conhecido, de que o ex-Presidente sempre se vangloriou de não haver freqüentado qualquer curso. Insistentemente, perante a nossa juventude, buscou inculcar a noção de que o sucesso pessoal independe de qualquer esforço no sentido de aprimorar o conhecimento. E, sobretudo, por uma administração desastrosa em matéria educacional. No plano estritamente político, notabilizou-se por institucionalizar a corrupção, alegando inclusive tratar-se de fenômeno arraigado, que não lhe competia combater. Esteja certo de que, com esse passo temerário, de um só golpe, a Universidade de Coimbra deu-nos uma clara demonstração de não ter qualquer compromisso com o respeito à memória que seus antecessores souberam construir. José Carlos Aleluia