Percival Puggina

19/08/2015

 

 A jornalista Miriam Leitão, em sua coluna no jornal O Globo, há cerca de dois dias, levantou um tema instigante. Sob o título "Razão de existir", ela afirmou que "se o TCU nos servir uma pizza é o caso de se pensar sobre a razão de sua existência". E mais adiante, cobrando uma definição precisa do órgão de contas, escreveu: "O que Dilma fez não pode ser feito". Note-se: Miriam Leitão não guarda qualquer afinidade com a oposição ou com a direita ideológica.

 O fato é que há um grave problema envolvendo muitos Tribunais em nosso país. O que acontece no TCU não é diferente do que se verifica, frequentemente, nos níveis superiores do Poder Judiciário. O aparelhamento é a regra em curso. Todos os governantes e líderes políticos de expressão procuram ter magistrados, julgadores, ministros de contas que possam chamar de seus. E para isso usam a caneta, ou o poder de indicar, com olhos postos em si mesmos, no próprio partido e jamais no interesse público que estará pendente das decisões emitidas pelos seus apadrinhados. Nos legislativos federal e estaduais não é incomum funcionar um rodízio em que os maiores partidos alternam entre si o direito de apontar os novos membros dos tribunais de contas em casos de vacância. Tais postos são muito ambicionados pela estabilidade e outras prerrogativas que proporcionam. O mais comum é que os indicados sejam parlamentares ou ex-parlamentares com vários mandatos e relevantes serviços prestados às respectivas legendas. Existem valiosas e louvadas exceções, mas são exatamente isso.

 A ideia que patrocina a existência de um quadro julgador das contas públicas formado por ilustres personalidades, com prerrogativas vitalícias, é assegurar sua autonomia e liberdade de consciência. A sociedade paga por isso e paga caro. Tribunais custam muito e seus quadros são bem remunerados. Então, quando a gente olha para o TCU e começa a suspeitar de suas decisões; quando se pensa no STF sob comando de um fraterno amigo do casal Lula e Marisa Letícia; quando uma eleição presidencial é dirigida por Dias Toffoli; quando Dilma se encontra secreta e "casualmente" com Lewandowsky na cidade do Porto; quando Dias Toffoli pede transferência para o grupo de ministros que vai julgar os réus da Operação Lava Jato; quando o TCU concede prazos e mais prazos para o governo "arreglar" e justificar suas lambuzadas contas, cabe, sim refletir sobre o que está posto no título acima: vale a pena pagar tão caro por algo que parece ser, gasta como se fosse, mas não é?

 O TCU, como bem salienta a jornalista mencionada no primeiro parágrafo deste texto, não estará deliberando sobre a continuidade do mandato de Dilma (essa é uma tarefa de outros poderes). Isso ele não faz nem pode fazer. Mas não se admite que feche os olhos para o que todo mundo vê: a presidente fez o diabo, também, nas contas pelas quais pessoalmente responde.

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

17/08/2015

Nosso jornalismo, há muitas décadas, foi tomado de assalto pelos que chamo "pedagogos da opinião pública". Por sua visibilidade, do alto de suas posições nos meios de comunicação, sentem-se como mestres em salas de aula, praticando contra a opinião pública o mesmo abuso mental que tantos professores praticam com os alunos, mediante influência e poder. Uns e outros, pedagogos da opinião pública e professores militantes, operavam antes de o PT nascer e prepararam dedicadamente seu caminho ao poder. Era na base do nós e eles. Simples assim: a esquerda era o bem e, fora dela, nada haveria que prestasse.

 Algumas coisas sobre si mesmos eles já compreenderam, ao longo dos últimos meses. Seu prestígio despencou junto com o daqueles a quem emprestavam ou vendiam apoio. Seus discípulos já lhes viram as costas. São formadores de opinião que não formam opinião alguma e cujas manifestações exigem enorme esforço mental. Não é fácil parecer que não fazem exatamente aquilo que estão fazendo, mas "pegaria mal" se fizessem.

 Exemplifico. Os pedagogos da opinião pública não são contra as passeatas. Mas ensinam que "Impeachment-já!" recusa o ritmo constitucional que aponta para a sequência crime, acusação, julgamento e (só então) impeachment. Entenderam? Segundo eles, os manifestantes deveriam sair às ruas, Brasil afora, levando faixas mais ou menos assim: "Impeachment, se possível, quando possível!". Quem carregaria uma peça dessas? Animados com uma candura e uma doçura que exige um canavial inteiro propõem "menos ódio" nas manifestações. Engraçado, não é mesmo? Que fim levou a boa e velha indignação pela qual tanto cobravam quando serviam ao PT oposicionista? Agora, a justa indignação virou ódio? Sentimento maligno, politicamente hediondo, pimenta que arde no olho?

 Eles nos ensinam, também, que o "Fora Dilma!" é frase autoritária. Diagnosticam que ela fere a legitimidade do mandato da presidente. Como pode alguém dizer "Fora Dilma!", seis meses depois de a presidente ter sido eleita com maioria de votos?

É a pedagogia da conformidade bovina. Se for assim e para isso, a gente fica em casa assistindo um filmezinho, que é exatamente o desejo por trás dessa pedagogia para boi no cercado.

Falemos, então em legitimidade, jornalista pedagogo militante. De que legitimidade falas quando te referes ao atual mandato da presidente? Da legitimidade alcançada com votos atraídos pelo festival de mentiras, mistificações e falsidades que se derramou pelo país em 2014? Da legitimidade via votos comprados com bilhões de nosso dinheiro? Da legitimidade alcançada com ameaças de que um festival de desgraças se abateria sobre o país em caso de vitória da oposição (para logo após a adotar aquelas mesmas medidas contra as quais verberava)? Da legitimidade via urnas eletrônicas? Via Smartmatic? Via apuração sigilosa? Da legitimidade de quem agora não arregimenta mais do que 7% dos eleitores?

O povo não estaria nas ruas se não se sentisse enganado, ultrajado e furtado! Aprendam isso e aprendam a ouvir o povo, em vez de apenas falar-lhe. Aproveitem do caráter, este sim pedagógico, das manifestações dos últimos meses. E com o que ainda lhes reste de consciência, arrependam-se do que ajudaram a produzir no país. O preço desse constrangedor serviço está sendo pago com corrupção em proporções jamais vistas, com recessão, inflação, desemprego, carestia, perda de credibilidade nacional e humilhação perante as demais nações. Está de bom tamanho?

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

16/08/2015

 

 O Brasil é um navio sem rumo nem prumo. Não está apenas à deriva. É um navio cuja tripulação joga as culpas do extravio no estaleiro, nas estrelas, nos ventos, nas ondas e, claro, nos passageiros de olhos azuis. O que nos reduz alternativas a essa crise é estarmos sob um governo alheio aos males que causou. Somos governados por quem chegou ao poder mentindo sobre o passado, mentindo sobre o presente e, agora, mente sobre o futuro. E é um navio sem prumo, o Brasil, porque adernou com o peso do Estado. Nada que não viesse sendo anunciado desde os tempos em que Lula, na metade de seu segundo mandato, decidiu que a manutenção do poder valia qualquer irresponsabilidade. Então, irresponsabilidade e meia: apontou como sucessora a companheira Dilma, gerentona, mãe do PAC e seu alegado braço direito. Pedra cantada para dar no que deu.

Muito já escrevi e falei sobre o conforto das instituições. A nação ia sem rumo nem prumo e as instituições só estavam interessadas em ampliar vantagens. Desatenção ao leme e maior peso agregado ao Estado. Deus, porém, escreve direito por linhas tortas, mesmo num barco desaprumado. E eis que surgem, da vastidão continental e populacional do país, ali, na capital do Paraná, um juiz, alguns promotores e policiais federais. Eles se recusam à zona de conforto e começam a fazer o que devia estar sendo feito há dez anos. Tiveram o mérito de perceber mais risco em nada fazer do que na missão que abraçaram. Já são quase três dezenas de colaborações premiadas (e olha que uma não pode repetir o que qualquer outra já tenha relatado!).

Há muitos anos, muitos mesmo, o Congresso Nacional dava sinais de morte cerebral. Ou de ser uma casa onde cada um cuidava de si e o Tesouro Nacional cuidava de todos. Pois a operação desencadeada em Curitiba levou o povo às ruas em 15 de março e desacomodou o parlamento. Queiramos ou não, ainda que com tanta presença constrangedora, ali está o coração, debilitado mas ainda vivo, daquilo que, como extensão do conceito, talvez se possa chamar de democracia brasileira. É ao parlamento que o Brasil, de todas as cores, falará nas manifestações de hoje. Porque, como escreveu alguém, cujo nome gostaria de saber: "A bondade que nunca repreende não é bondade: é passividade. A paciência que nunca se esgota não é paciência: é subserviência. A serenidade que nunca se desmancha não é serenidade: é indiferença. A tolerância que nunca replica não é tolerância: é desumanidade." O futuro do Brasil não passará na tevê. Não acontecerá no sofá. Estará se manifestando pacífica e civicamente nas ruas, neste domingo.
 

Especial para Zero Hora, 16 de agosto de 2015

Percival Puggina

14/08/2015

 Quem optar pelo sofá da sala em vez de participar da manifestação do próximo domingo, 16 de agosto, estará escolhendo sofrer a história em vez de contribuir para um futuro melhor.

 Inúmeras articulações vêm ocorrendo em Brasília. Um dia a presidente convidou para jantar em comemoração ao Dia do Advogado altas personalidades do mundo jurídico e dos tribunais superiores, inclusive do STF (três compareceram!). Vêm-me à mente que o 11 de agosto é tradicionalmente conhecido como "Dia do pendura", um antigo costume pelo qual estudantes de Direito iam aos restaurantes e mandavam pendurar a conta. Qual a conta que se pretendeu pendurar no jantar do dia 11? No dia seguinte, Lula se reuniu com Temer, Sarney, Renan Calheiros e lideranças do PMDB no intuito de "enfrentar a crise". Enfrentar a crise, para esse específico grupo, significa conseguir que tudo fique como está, que é exatamente como tudo não pode ficar. Na sequência, a presidente foi distribuir benefícios no Nordeste. E, ontem, reuniu-se com lideranças dos movimentos sociais. Foi durante esse ato que ela ouviu, sentada e calada, o presidente da CUT chamar seu exército às armas. Que armas?

 As forças do conformismo interesseiro se movimentam nos bastidores. Suas preocupações com a situação nacional não são perceptíveis a olho nu.

Vivêssemos sob as mesmas regras adotadas nas democracias estáveis, o governo já teria caído em novembro do ano passado quando se tornaram evidentes as mentiras e mistificações da campanha eleitoral. A suposta "legitimidade" do mandato presidencial é fruto de embustes que fizeram de bobo o eleitor.

As mesmas forças políticas que hoje chamam impeachment de golpe forçaram a renúncia de Collor, que deixou o cargo no dia 29 de dezembro de 1992. Menos de quatro meses depois, em 21 de abril de 1993, por determinação das disposições transitórias da Constituição de 1988, ocorreu o plebiscito sobre sistema e forma de governo. Jamais esquecerei a figura do militante ator Milton Gonçalves, na telinha da tevê, durante a campanha sobre o tema, afirmando que "No presidencialismo, você põe, você tira". Era uma gigantesca inversão da realidade. É no parlamentarismo que se pode tirar o mau governante. O que ocorrera com Collor fora uma quase inacreditável exceção à regra. Mas era uma exceção ainda bem presente na memória das pessoas. Mentindo, fizeram o eleitor de bobo. Pois é, também, graças àquela fraude publicitária de 1993 que Dilma está amarrada ao cargo com uma aprovação de apenas 7% que só lhe proporciona vaia e panelaço.

Aqueles que recusam a legitimidade ao impeachment como um processo constitucional, também recusaram legitimidade, poucos anos passados, ao que aconteceu nos impeachments de Manuel Zelaya em Honduras e de D. Fernando Lugo no Paraguai. Anseiam por parlamentos comprados, submissos, abastardados. Devem avaliar de modo muito positivo os legislativos de Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina, dos quais jamais se ouve falar porque aceitam a focinheira que lhes impõem os respectivos governos.

Não podemos deixar que convençam ou vençam. Munidos do que lhes falta - respeito à ordem, amor à paz, civilidade e compromisso com o bem do Brasil e de seu povo - vamos todos às ruas neste domingo!

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

11/08/2015

 

 O economista e auditor Darcy Francisco Carvalho dos Santos tem sido um apóstolo da responsabilidade fiscal no Rio Grande do Sul. Há anos vinha alertando para a crise que adviria neste horizonte de 2015 como inevitável ponto de chegada para quem se abraçasse à estupidez de crer, diante da contabilidade pública em vermelho, que "o governo tem a obrigação de dar um jeito e arrumar dinheiro". Como se o governo tivesse um real que pudesse chamar de seu! E como se todo centavo arrecadado não saísse dos nossos bolsos!

 Suas advertências caíram no vazio do mais solene desprezo. A velha irresponsabilidade não silencia sequer diante da destampada dureza de um Estado que não dispõe de recursos para pagar pontualmente seus servidores e que, a cada dia, precisa fazer a escolha de Sofia dentre as muitas e justas demandas de custeio e de seus fornecedores. "O governador tem que dar um jeito" é a frase que pretende ser expressão de sumo saber administrativo e fiscal. E ai de quem ouse propor soluções! Imediatamente recebe o rótulo de neoliberal, como vem acontecendo com o economista e auditor Darcy Francisco, autor de três livros sobre a crise fiscal do RS.

 Na resposta que enviou a um jornalista da praça que lhe pespegou o mencionado rótulo para desqualificar as propostas contidas em seus livros, ele alinhou, mais uma vez, o conjunto central de suas sugestões. Vale a pena reproduzi-las e trazê-las à reflexão da sociedade e dos líderes políticos do RS. A lista de providências, que sintetizo abaixo, é antecedida pela pergunta: "Estas propostas são 'neoliberais'?".

• Reforma da previdência, visando a corrigir o problema das aposentadorias precoces, sendo a metade com 50 anos de idade mínima e ¼ sem sequer essa exigência. Nos países ricos, sociais-democratas, as pessoas estão se aposentando com 65 ou 67 anos;

• Adotar novos critérios da pensão por morte. Hoje, uma pessoa jovem com todas as condições para trabalhar pode ficar até 50 anos ou mais, dependendo da situação, recebendo uma alta remuneração paga pelo contribuinte;

• Alterar o plano de carreira do magistério, um plano da década de 1970, o mais velho do País, anterior à vigência de LDB, que define carreiras que não existem mais e que só vai pagar um salário melhor para o professor no final de sua carreira, quando ele está deixando a sala de aula.

• Adotar plano de aposentadoria complementar, providência que o Estado mais rico do país, São Paulo, e a União, já adotaram, sendo que a União adotou essa providência em pleno governo petista.

• Alterar o acordo da dívida, visando pagar menos e zerar o saldo devedor;

• Rever os altos salários iniciais e algumas categorias, como condição para pagar melhor outras que recebem muito pouco;

• Extinguir a licença-prêmio, um privilégio vergonhoso do servidor público, já revogado na União, e que muitos órgãos de elite no RS pagam em dinheiro;

• Alterar as regras das incorporações das funções gratificadas na aposentadoria, passando para a média em vez da última. Isso é uma regra aprovada pela reforma previdenciária de 2003, do presidente Lula.

• Evitar a concessão de reajustes salariais reais. Se o Estado não está conseguindo dar nem a inflação, como vai dar aumentos reais?

• Conter o crescimento das outras despesas correntes. Para quem não sabe, isso é economizar no consumo, exatamente como fazemos na nossa casa, quando o dinheiro escasseia.

• Mudança no pacto federativo, visado melhorar a distribuição das receitas.

Ser contra isso significa ser a favor da velha irresponsabilidade e do caos fiscal porque foram essas (e outras) políticas demagógicas e populistas que levaram o RS à vexatória situação atual.
 

Percival Puggina

08/08/2015

Então, no novo perfil da mídia brasileira, a coisa fica assim. Alguns, diante desse erro descomunal que foram os governos petistas, vão além das aparências e abandonam o barco porque percebem as causas. Entre muitas, saliento estas, bem evidentes: o poder como objetivo ao qual tudo se sacrifica; a justificação dos fins pelos meios; o cultivo da insegurança pública como instrumento da luta de classes; o fracasso humano e social do assistencialismo vitalício como política de Estado; a impossibilidade técnica de se produzir desenvolvimento econômico e social sem economia de mercado; a apropriação indébita dos poderes de Estado, da administração pública e da política externa por um partido político, seja qual for.

 Outros, no entanto, continuam convencidos de que fora dos fracassos estrondosos da esquerda não há salvação para a humanidade. Apoiaram e votaram sempre no PT e se empenharam em preservar-lhe a imagem muito mais do que os líderes do partido. Aliás, enquanto estes trocavam os pés pelas mãos e enfiavam os quatro nos mais pantanosos negócios, eles cuidavam de espalhar o ônus moral de tais condutas sobre uma linha de tempo que, se a gente deixar, acabará remontando à criação do Reino de Portugal no século 12.

Se há algo que abala os formadores de opinião é constatar que quanto mais escrevem e falam, menos opinião formam. Então, com a credibilidade da presidente caindo para um dígito, ainda por cima quebrado, já não se encontram mais, na mídia, prosélitos com disposição de exaltar as virtudes do petismo reinante. Para os obstinados, porém, o passado ainda pode ser requentado. Tal é a aposta, por exemplo, do sempre oculto Foro de São Paulo (que antes diziam não existir e, agora, afirmam estar morrendo...).

Não havendo condições propícias ao proselitismo puro e simples, resta à mídia esquerdista e seus agentes dois meios de ação. No primeiro, obedecem à regra segundo a qual o contra-ataque é uma forma de defesa na qual dificilmente se passa vexame, porque sempre haverá o que atacar. Então, atacam quem ataca para defender quem não mais se atrevem a defender. No segundo, aí sim, agarram-se no Estado de Direito para proclamar a intangibilidade do mandato da presidente. A esse coro ela mesma aderiu em suas últimas manifestações: "Ninguém vai tirar a legitimidade que o voto me deu", afirmou a presidente, falando em Roraima no dia 7 deste mês.

Dilma está, neste caso, defendendo a legitimidade da mentira como instrumento de ação política e eleitoral. Com efeito, ela foi eleita em 2014 mentindo à nação sobre a realidade nacional e atribuindo a seu adversário os flagelos que ela trazia a tiracolo para enfrentar a macabra situação que seu governo produzira. Nada que não tenhamos visto e não estejamos vendo. Assim, a presidente e os formadores de opinião que a acompanham, ao falarem em "legitimidade" no cenário atual, consagram a soberania do Pinóquio e promovem o linchamento do Grilo Falante.

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

06/08/2015

 Plenário e galerias costumam manter, nos parlamentos, uma relação sinfônica. Raramente a voz das galerias não repercute no plenário. Aliás, a concepção do espaço é democrática: o "povo" na parte superior e os parlamentares no andar de baixo. Desde cima, o "povo" grita, aplaude, apupa e, lá embaixo, a sensibilidade política afina os ouvidos e os discursos.

Escrevo "povo" assim, entre aspas porque raras, raríssimas vezes, vi galerias ocupadas por pessoas interessadas na defesa do bem comum, do interesse público. Na maior parte dos casos, nas mais agitadas mobilizações, o "povo", na verdade, é formado por corporações defendendo com veemência seus próprios interesses. O povo, assim, sem aspas, estava sempre longe dali, tratando de ganhar a vida, trabalhando mais de cinco meses por ano só para pagar impostos ao poder público. Esse povo, pagador das contas, está sistematicamente desinformado a respeito dos maliciosos eventos em que, às suas costas e custas, são assumidos encargos que aumentarão sua conta com o fisco. Ou desqualificarão os serviços que recebe.

Aliás, não existem três possibilidades. Elas são apenas duas. Como o governo não tem um único real que possa, legitimamente, chamar de seu, toda elevação do gasto público significa necessidade de arrecadação maior ou redução de qualidade e/ou quantidade nos serviços prestados.

Galerias satisfeitas, com demandas atendidas, significam votos na urna para seus entusiasmados benfeitores no andar de baixo. Há alguns anos, o Congresso Nacional descobriu um filão que permite aos congressistas sair do varejo e promover essas operações eleitoreiras no atacado. Refiro-me às conhecidas emendas à Constituição que estabelecem pisos salariais ou estabelecer isonomias entre as categorias mais numerosas ou politicamente mais ativas do serviço público. Tais propostas invadem as competências dos Estados e municípios, cujos estreitos orçamentos são abalados por decisões federais que lhes impõe encargos insuportáveis. Verdadeiros atentados à Federação!

Por essas e por outras, muitas outras, o RS, por exemplo, não consegue implementar o piso nacional do magistério. Seu proponente foi Tarso Genro, quando ministro da Educação. Meses mais tarde, coube-lhe, como governador eleito, pagar a conta. Não conseguiu. Criou um contencioso multibilionário com a categoria. Ao que se sabe, Tarso governador rompeu relações com Tarso ministro a ponto de negar-lhe cumprimento.

A mais recente versão dessa demagogia com o dinheiro do povo é a PEC que vincula os salários das carreiras da Advocacia-Geral da União e de delegados civis e federais a 90,25% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Também estão incluídos procuradores de estado e de municípios com mais de 500 mil habitantes. O custo total chega a R$ 2,4 bilhões por ano. O "povo", é claro, lotava, na noite de ontem, as galerias da Câmara dos Deputados que, sinfonicamente, aprovou o texto-base da PEC com votos favoráveis de 445 deputados. Apenas 16 deputados votaram contra por considerar que essa despesa é incompatível com a crise econômica e fiscal em que o governo petista afundou o país. Trata-se, realmente, de uma pauta-bomba, que vai estourar no nosso colo, agravando a situação financeira da União, dos Estados e dos municípios.

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

04/08/2015

Tenho acompanhado as manifestações de petistas sobre a nova prisão do empresário José Dirceu, um dos mais bem remunerados consultores do país. Verdadeiro fenômeno, o Zé! De militante comunista a exilado em Cuba; de dono de uma loja de roupas masculinas no interior do Paraná a deputado federal pelo PT; de ministro Chefe da Casa Civil a condenado pivô do mensalão; da Papuda à magnata no mercado de consultoria. Nessa atividade, alcançou tamanha competência que muitas das maiores empresas do país fazem fila para depositar em suas contas, remunerando com cifras que se avolumam aos milhões os bons serviços prestados. Nada mau para um ex-militante da Ala Marighela do PCB e do Agrupamento Comunista de São Paulo (AC/SP). De comunista a capitalista. Da devoção à estrela vermelha à adoração do bezerro de ouro.

 Seu partido, a cada aparição, certamente lembrando seus tempos de militante comunista e dirigente partidário, festeja-o como "guerreiro, herói do povo brasileiro!". Hoje, sua influência no mundo dos negócios, sua qualificação como consultor para empresas de variados ramos de atividade, unidas pelo fio condutor dos interesses nos recursos públicos, o credencia a condição de benfeitor de malfeitores no mundo empresarial brasileiro.

A operação Lava Jato vem desbravando incontáveis trilhas, através das quais, ininterruptamente, desde 2003, vem drenando dinheiro do povo para os aparelhos partidários da base do governo. Enquanto o prestígio deste rola escada abaixo, a sociedade vai compreendendo que foi vítima de um assalto à caneta e maleta. Caneta para assinar ordens de pagamento e maleta para carregar dinheiro. Dinheiro nosso, repito, porque o Estado não tem um real que possa chamar de seu. Todos os recursos do Estado são gerados na sociedade, a ela pertencem e a ela deveriam servir.

No entanto, até hoje, não vi rubor em face petista. Ninguém sussurrou, ainda, um pedido de desculpas. Ninguém baixou os olhos encabulado ante o dano proporcionado ao país e o prejuízo causado à nação. Ao contrário, "companheiros" do partido, "camaradas" do partidão, revoltados adolescentes septuagenários, jornalistas a soldo, militantes em ambientes virtuais (os MAVs), tomados de falsa indignação, dedicam-se às seguintes e constrangedoras tarefas diárias: combater as manchetes, destratar as notícias, criticar as críticas e julgar o juiz.

Sua única preocupação e ocupação consiste em proteger o PT e os petistas envolvidos em escândalos. Tal conduta os qualifica como cúmplices e deixa muito claro ao observador atento a intenção de pôr um fim nas investigações para que possam dar continuidade ao que vêm fazendo, com as canetas e com as maletas.

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

02/08/2015

 

 

 Minha resposta, quase diária a quem me faz essa pergunta é: "A presidência da Sra. Dilma Rousseff já acabou, c'est fini". E isso corresponde aos fatos. Temos um governo no qual muitos mandam e onde a pessoa que deveria por ordem na casa só aparece para falas em que sujeitos, predicados e complementos trocam empurrões sem saber seu lugar na frase nem qual a ideia que deveriam expressar.

 Se tudo balança, é muito improvável que algo não caia. E a presidente é, nesse sentido, a possibilidade mais viável. O presidencialismo, mesmo em tempos de normalidade, precisa de liderança. E Sua Excelência está na situação do sujeito que abriu uma empresa registrando como ativo um patrimônio que não tinha. Foi anunciada ao povo como o braço direito de Lula, a mãe do PAC, a gerentona, a mestre em economia. Conseguiu esticar a validade desse suposto legado até a contagem dos votos no dia 26 de outubro do ano passado. Já no Dia de Todos os Santos, nem Franklin Martins e João Santana, juntos, conseguiam o milagre de ocultar à opinião pública o fato de que os sucessivos governos petistas haviam construído, com caprichosa irresponsabilidade, um caos perfeito.

Luiz Inácio Lula da Silva, hoje, é um conhecido corretor da praça. Outrora exerceu a presidência da República e desde então escolheu seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, para a função de gabarito com o qual periodicamente se mede. Sempre com vantagem, desde seu ponto de vista. Pois ao sugerir um encontro reservado com o antagonista preferido, o corretor Lula emite sinais muito claros de que a casa do PT, há bom tempo instalada no Palácio do Planalto, balança perigosamente. Se Lula quer negociar é porque percebeu a depreciação. Hora de vender.

Ele sabe que Dilma será a coveira de suas ambições se continuar no cargo até 2018. Em mais três anos ela acaba com suas pretensões, com o próprio partido e com o país. Portanto, vejo como muito possível que, em algum momento, o fim da presidência de fato levará ao fim da presidência de direito. Muitos já tratam desse tema. Ele está na pauta do Congresso e é falado nos corredores do TCU e do STF. Estará na pauta das mobilizações populares, a partir do dia 16 de agosto. E entrou na pauta do corretor Lula. Ele tem consciência de que uma parcela imensa da sociedade, do clube de bridge à rinha de galo, foi afetada pela barafunda ideológica e pelos aparelhamentos que o levaram ao poder. E não terá o menor escrúpulo, o corretor Lula, em usar a seu favor o que venha a acontecer até 2018. Nesse maldito presidencialismo de compra e venda, o perigo continuará rondando o Brasil.