Percival Puggina
08/09/2015
(O título deste artgo é a Manchete de capa de O Estado de São Paulo, edição de hoje, 8 de setembro)
O jornal cita integralmente trecho da fala presidencial: "As dificuldades e os desafios resultam de um longo período em que o governo entendeu que deveria gastar o que fosse preciso para garantir o emprego e a renda do trabalhador, dar continuidade dos investimentos e dos programas sociais".
Agora, só falta a cúpula da CNBB e sua assessoria fazerem o mesmo ato de contrição. Quero lembrar, para não parecer implicante, que, dois meses depois de o Santander ter demitido aquela assessora de investimentos que anunciou a crise que estava por vir, a assessoria da CNBB serviu à Conferência um parecer no qual afirmava textualmente o seguinte:
"A sensação de um clima inflacionário espalhado pela mídia, baseando-se sobre os gastos ditos excessivos, sobretudo sociais, visa difundir um temor da volta da inflação, temor que é responsável por uma difusão da inflação. Entretanto, a taxa de inflação de agosto pode ficar mais baixa ou próxima daquela de julho (0.01%), contrariamente às previsões dos analistas do mercado financeiro. A aproximação das eleições acirra a disputa econômico-financeira entre governo e especuladores. A imprensa não está contribuindo para o debate político-econômico, substituindo a informação pela ideologia da crise permanente. A mídia, porta-voz das elites financeiras, informa que o Brasil está indo à falência. As manchetes dos jornais (impresso e TV) não param de denunciar erros na política governamental que teriam provocado ondas de desconfiança."
Os assessores da CNBB que subscreveram esse bestialógico não foram demitidos. E duvido que reconheçam o que Dilma reconheceu em sua manifestação do dia de ontem. A cúpula da CNBB que três dias antes das manifestações do dia 15 de março foi ao Planalto afirmar não haver qualquer indício que pudesse justificar pedido de impeachment da presidente, tampouco mudou de opinião. Ou seja: a CNBB está mais fechada com o governo do que o próprio governo.
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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
08/09/2015
As cenas que vi, com cercas e tapumes metálicos, faziam lembrar um campo de concentração, onde as autoridades se protegiam no lado de dentro e a população era mantida no lado de fora. Foi um Dia da Pátria em estilo neopetista. Com efeito, durante décadas, o Partido dos Trabalhadores vendeu-se como um partido popular e diferente dos tradicionais. Pé no barro e cheiro de povo.Você lembra? Pois é, acabou.
Não preciso descrever, aqui, a vertiginosa ascensão social das lideranças do partido. Quanto mais habilmente escalavam o pau de sebo da prosperidade, mais tênue se tornava a relação do partido com a sociedade. E à medida que se faziam conhecidas as escabrosas formas de subvenção dos interesses partidários e pessoais do grupo governante e seus associados, firmou-se a convicção de que o PT era um partido diferente. Diferente demais.
Se formos pesquisar além dos equívocos ideológicos, dos usos e abusos do populismo e do patrimonialismo, das más companhias; se deixarmos de lado o péssimo recrutamento dos próprios quadros entre setores corrompidos do sindicalismo; se esquecermos o deslavado aparelhamento das instituições de Estado e da administração pública, veremos um partido que se afogou em banheira de champanhe. Sim, o borbulhante PT dos anos dourados, até a segunda metade do governo Lula, acreditou que as vacas seriam sempre gordas, os ventos favoráveis e o povo sempre parvo. Creu, o partido do senhor Lula, que a China cresceria eternamente, que o petróleo jamais perderia preço, que a política era um grande negócio. E vice-versa. Convenceram-se, nossos governantes, de que o país enriquecera e de que para acabar com a pobreza bastava, então, distribuir dinheiro aos pobres. Ora, nem o mais piedoso pároco acredita nisso. Após 13 anos de governo, o PT nada fez do que prometera. Encheu a banheira de champanhe e afundou na miserável abundância dos anos de esbanjamento.
Surgiu, assim, a governança em estilo neopetista. É uma governança que se esconde, que não sai às ruas. Lula importou ao custo de R$ 28 bilhões o brinquedinho da Copa de 2014. E não compareceu a um único jogo porque não quis se expor ao que aconteceu com Dilma. É uma governança que cumpre a solenidade do Sete de Setembro por dever de ofício, de cara amarrada, que se oculta do povo, dos fatos, das notícias. O estilo neopetista não dá entrevista, não fala à nação, se reúne nos porões e confabula. Dá a vida por um grande acordo que o sustente. É uma governança que, embora se esconda, cedo ou tarde acaba encontrada pelos oficiais de justiça.
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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
04/09/2015Culpado conforme as acusações, o petismo quebrou o Brasil e, em quatro anos levou junto o Rio Grande do Sul. Nenhum contador, auditor, economista, desconhecia aquilo que Sinara Polycarpo Figueiredo, assessora de investimentos do Santander, anunciou em circular a seus clientes em junho do ano passado. Aliás, o referido documento afirmava obviedades antigas, que só eram desconhecidas pelos assessores da CNBB e pelos publicitários do governo. Os primeiros emitiram, na mesma época, uma Análise de Conjuntura na qual afirmavam que a inflação estava diminuindo e que uma entidade maligna chamada mercado semeava insegurança para desestabilizar o governo. Os segundos propagavam que o Brasil era e continuaria sendo uma ilha de prosperidade, pleno emprego e desenvolvimento social. A assessora do Santander foi demitida. Os da CNBB permanecem firmes em seus postos. E os publicitários do governo? Estes aprenderam que a mentira é a própria alma de seu negócio. Afinal, é preso ao fio produzido por essas mentiras que balança e se sustenta o indescritível governo da presidente Dilma.
A irresponsabilidade fiscal, que sempre foi bem vista pelo petismo, quebrou o Brasil. Levou-nos ao descrédito internacional. Pôs sob risco o grau de investimento do país. Constrangeu o governo a apresentar ao Congresso um inédito orçamento deficitário para o ano de 2016. Com isso, está obrigando-se a buscar novas fontes de receita (leia-se "tomar-nos mais dinheiro pela via tributária").
Pois é nesse contexto que eu acabo de ler, no Estadão de hoje, 4 de setembro, que a "Petrobrás corta viagens e festas para poupar R$ 12 bilhões". No conteúdo da matéria vê-se que os cortes não atingirão apenas viagens e festas, mas incluem, entre outros, aulas de idiomas, brindes, programas de visitas, uso de veículos para necessidades não operacionais, participação em congressos, seminários e fóruns. E nem uma palavra sobre as periódicas e inúteis enxurradas publicitárias que inundam os grandes meios de comunicação. É também nesse contexto que, no mesmo jornal, lendo editorial com o título "O irrealismo do judiciário", fiquei sabendo que o STJ e outros sete Tribunais Regionais do Trabalho encaminharam ao Conselho Nacional de Justiça anteprojetos que criam 1,5 mil cargos de natureza técnica e outro tanto em funções comissionadas! Nada diferente dos aumentos e regalias autoconcedidos. E nada diferente do ânimo criador de caso que tem levado a Câmara dos Deputados a aprovar projetos que elevam sobremaneira o gasto público. O governo, por conta própria, fez tudo que estava ao seu alcance para afundar o país. Não precisa de sugestões nem de auxílio da oposição.
Eis o que me leva ao título deste artigo. Beberam? Cheiraram? Não podem, as instituições da República, estar em seu estado normal. Poupem-nos de seu convívio. Vão se tratar e voltem quando estiverem restabelecidos.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
03/09/2015
Uma das consequências mais graves da apropriação do Estado por um partido político, como faculta nosso modelo institucional em sua irracionalidade, é o alinhamento do Itamaraty ao departamento de relações internacionais do Partido dos Trabalhadores. Não estou falando de uma hipótese ou de mera possibilidade. Nos últimos 13 anos, o que afirmo se expressa em longa lista de eventos. Dívidas perdoadas, contas não cobradas, financiamentos em condições especialíssimas, contratos sigilosos, acordos, extradições e por aí vai. O convênio que permitiu a vinda de médicos cubanos, por exemplo, é um caso escandaloso de superfaturamento, cujo objetivo visava mais à saúde financeira da empresa Castro&Castro Cia. Ltda. do que à saúde da população brasileira.
Mesmo que os financiamentos do BNDES sejam vistos como operações comerciais de interesse do mega-empresário pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva, ainda assim sobram exemplos para comprovar a influência petista nas relações externas do país. Nelas, sempre e sempre, a conta vem para nós, pagadores de impostos. O Brasil petista é o rei do camarote na América Ibérica.
O mesmo não se pode dizer das relações do governo com os Estados e municípios da Federação. Aqui as condições invertem, as torneiras se fecham, as contas são cobradas e a pontualidade nos pagamentos sai do calendário e vai para o relógio. Para a virada do ponteiro, como acaba de acontecer com o Rio Grande do Sul. Por quê?
O motivo é simples. Basta ter lido o Manifesto Comunista. Não precisa, sequer, dar-se à canseira de ler nosso marxista de exportação, Michael Löwry. O que está dito no Manifesto explica muito da história do movimento comunista internacional. Para Marx, o capitalismo era apátrida e o comunismo também deveria ser. Por isso, ele ensina que "o proletário não tem pátria" e o Manifesto se encerra com a consigna: "Proletários de todos os países! Uni-vos!". Para Rosa de Luxemburgo, o internacionalismo bolchevique era prova de inteligência política. Eis por que as manifestações de rua favoráveis ao governo são vermelhas. Eis a razão de existir do Foro de São Paulo. Está aí a função da Unasul e a "Pátria Grande". Quando o governo brasileiro concede favores a Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia, Nicarágua, Argentina, não é ao povo de cada um desses países que tais favores se dirigem, mas à unidade ideológica que interliga os respectivos governantes. É um apoio aos Castro, a Chávez e a Maduro, à Rafael Correa, a Evo Morales, aos Kirchner e a Daniel Ortega. Danem-se os respectivos povos e suas liberdades! Danem-se como se danaram os paraguaios quando o parlamento daquele país deu um "basta!" a Lugo, o bispo vermelho e sacripanta.
Estas reflexões são motivadas pelo transcurso da Semana da Pátria. Ela, como objeto de reverência, não entra nas reflexões de quem governa o país desde 2003. Eis o motivo pelo qual o imenso transatlântico chamado Brasil foi jogado irresponsavelmente contra os rochedos onde naufraga a esperança que um dia se anunciou vencedora do medo. Dane-se, também, o povo brasileiro, se isso for necessário para conquista e permanência no poder. Danem-se a ética, a responsabilidade, a competência, a credibilidade. Não é o Brasil e seu povo que interessam. É Lula. É Dilma. É o partido. É o poder. E viva o acordão!
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
01/09/2015
Pergunta-me um leitor: como é possível que em plena vigência da Lei da Ficha Limpa tantos congressistas estejam envolvidos em ruinosos e ruidosos esquemas de corrupção? A pergunta faz muito sentido e admite pelo menos três explicações corretas.
Primeira. A lei exige, como condição para inelegibilidade, a existência de sentença condenatória, em decisão proferida por órgão colegiado (Tribunal de Justiça, Tribunal Regional Federal ou mesmo Tribunal do Júri). Ora, podem decorrer vários anos entre a prática de determinado crime e a correspondente condenação por órgão colegiado. Um candidato inidôneo, com bom advogado, disputará e exercerá vários mandatos antes de ser enquadrado na condição de inelegibilidade imposta pela lei.
Segunda. Em fevereiro de 2012, quando o Congresso Nacional aprovou essa lei de iniciativa popular, escrevi um artigo com o título "Fichas limpas num modelo ficha suja". É dele o texto transcrito abaixo:
E eu temo que a Lei da Ficha Limpa produza como resultado apenas uma renovação dos quadros corruptos do país. Estaremos trocando corruptos de ficha encardida por corruptos com ficha novinha em folha. Quando digo isso, as pessoas me olham com incredulidade. Estão convencidas de que é a maldade humana que corrompe nossas "primorosas" instituições. A modelagem institucional do país não entra no foco de suas análises. O cidadão brasileiro, via de regra, pensa em nomes, em pessoas, em indivíduos. Quando avança um pouco mais pensa em ideias, princípios, valores. Mas raramente se detém a examinar nossas instituições. Por esse motivo, estamos sempre tentando consertar as consequências e desatentos às causas dos problemas. É como se proclamássemos: "Abaixo as consequências! Longa vida às causas!"
Terceira. Muitos dos congressistas envolvidos na operação Lava Jato eram participantes do mensalão. Durante aquele julgamento não houve colaboração premiada e as condenações atingiram apenas os líderes dos partidos integrantes do esquema, os quais mantiveram sigilo sobre os pagamentos feitos aos seus liderados. Como consequência desse sigilo, da lei da camorra, dezenas de parlamentares, cuja fidelidade ao governo era comprada a peso de ouro, puderam disputar a eleição de 2014 ostentando como tecnicamente limpa uma ficha efetivamente repulsiva.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
31/08/2015
A descriminalização da posse de pequenas quantidades de drogas me parece mais um assunto de aritmética elementar: a soma das pequenas frações em que se divide um todo é exatamente igual ao todo. Além de ser entendida como liberação e estimular o consumo, a descriminalização vai ampliar o exército dos pequenos traficantes que trabalharão comercializando porções menores.
Interessado no tema, assisti, pela TV, à sessão do STF que iria deliberar sobre a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei de Drogas. Após o voto de Gilmar Mendes, favorável à descriminalização, um pedido de vistas sustou o julgamento. Enquanto ouvia o ministro, na condição de relator, falar em "interferência no direito de construção da personalidade dos usuários" e em "uma conduta que, se tanto, implica apenas autolesão", caiu-me a ficha: naquele plenário, não há um único magistrado - umzinho sequer! - que se possa identificar como conservador, ou seja, que reflita os valores compartilhados pela maioria da sociedade.
Não estou defendendo, aqui, cadeia para portadores de pequenas quantidades, mas a manutenção do tipo penal, com aplicação das sanções alternativas já previstas. Tampouco estou afirmando que os ministros devem pensar como eu em questões referentes a costumes e valores. Se nem os parlamentos devem estar constritos a uma regra de representação proporcional compulsória das opiniões manifestas na sociedade, menos ainda estará o STF.
Não obstante, é manifestamente um problema não haver, entre os 11 ministros, um único conservador. Como é possível faltar contraponto aos ditos "progressistas"? Não raro, a apresentação do contraponto fica por exclusiva conta de quem defende o ponto. É o que acontece quando, ao emitir seu voto, o julgador analisa o contraditório, afirmando que se pode antepor tais e tais argumentos ao que ele está sustentando, mas que esses argumentos não se aplicam em virtude de tais e quais razões. Assistindo isso, sinto falta de quem diga: "Pode deixar, excelência, que minha posição defendo eu". Mas não há quem o diga, nem quem defenda tal posição. Ao menos não em igualdade hierárquica, nem com direito a voto.
Haverá quem se escandalize com este texto. Existem pessoas que veem com muita naturalidade magistrados garantistas soltando bandidos, ministros do STF inegavelmente partidários, socialistas, marxistas, ateus, agnósticos, "progressistas", politicamente corretos ou sejam lá o que forem. Mas conservadores? Conservadores não, que absurdo! Com posições econômicas liberais? Também não, imagina! E assim, os 11 vão tornando a política e o pluralismo um luxo ocioso, levando o país para onde apontam seus narizes.
Zero Hora, 30 de agosto de 2015
Percival Puggina
28/08/2015
Certa feita, no ano de 2004, em um dos tantos debates que já mantive com lideranças do PT, ironizei a continuidade que o governo Lula vinha dando às políticas tucanas que combatera tão intensamente e com tanto sucesso eleitoral. Mostrei, uma a uma, as contradições. O abominável Plano Real estava mantido com inteiro rigor. O superávit fiscal, tão execrado pelo petismo, havia atingido, com Lula, o maior valor dentro da série histórica. Os programas de renda mínima, que Lula acusara de serem uma forma de fazer votos graças à fome de quem vota com a barriga, haviam mudado de nome e recebido mais recursos. E por aí fui, até ser interrompido por meu interlocutor que me disse exatamente o seguinte: "Puggina, não se muda a direção de um transatlântico com guinada brusca" e ilustrou o que dizia com o braço desenhando um longo arco. A mudança de rumos estava em curso e seria gradual.
Ele pertencia à alta hierarquia de seu partido e estava bem informado. O tempo o comprovou. O PT destruiu os fundamentos macroeconômicos então vigentes (responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e meta de inflação). Exibiu, pouco a pouco, sua vocação para o totalitarismo. Empenhou-se na armação da luta de classes, forçando o divisionismo dentro da sociedade. Ensaiou várias tentativas de controlar a mídia. Levou o revanchismo até onde pode. Concebeu várias agendas socialistas. Aliou-se aos piores vilões da política nacional e internacional. Não lhe faltaram tentativas de impor absurdos, mediante decretos felizmente rejeitados pela opinião pública e pelo Congresso. Tais foram os casos do PNDH-3, que fazia gato e sapato em nome dos direitos humanos, e do decreto Nº 8.243 (decreto dos sovietes), que pretendia uma desabilitação do poder legislativo. O partido viria, como de fato veio, contaminar e aparelhar o Estado em conformidade com um desígnio totalitário. Tudo para alterar a trajetória do transatlântico.
Na política, tudo ia bem. Os corruptos prosperavam. Não faltava dinheiro à mídia chapa branca, nem capitanias hereditárias aos partidos e aos políticos da base. O crescimento chinês empurrava a economia para a frente, mais ou menos como as elevações da taxa de juros engordam os lucros dos bancos sem que os banqueiros precisem sair da poltrona. O petróleo a mais de US$ 100 viabilizava qualquer estripulia na Petrobras e o pré-sal era portentosa mina, a ser drenada ainda antes de gotejar. A megalomania, os delírios de poder e de riqueza, os projetos faraônicos, o messianismo característico dos partidos e movimentos totalitários recebiam injeções de adrenalina na veia. No limite das aparências, Lula era um Midas. Além das aparências, uma bomba de efeito retardado.
Só agora, concluída aquela curva descrita pelo meu interlocutor no debate acima referido, veem-se todas as dimensões do estrago. O desvio de rota jogou o país contra os rochedos, de modo desastroso. Lula e Dilma, que sequer se animam a aparecer em público, fazem lembrar o rápido e furtivo desembarque do comandante Francesco Schettino após jogar o Costa Concórdia contra os arrecifes junto à ilha de Giglio.
A direção pretendida quando a grande curva foi desenhada chegou onde inevitavelmente haveria de chegar, porque nunca foi diferente o resultado de tais políticas. E se há muita incerteza, hoje, sobre o futuro do país, se os comandantes se escondem mas não desembarcam, ninguém duvida de que o desvio de rota e a megalomania os condenaram à insignificância.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
24/08/2015
No ano de 2007, o sucesso subira à cabeça de Lula. O hoje rejeitado filho de Garanhuns era aclamado nacional e internacionalmente como "o cara". Era o cara que teria acabado com a miséria no Brasil, o cara que projetara o país como o primeiro da fila de espera para ingressar no Primeiro Mundo, o cara que ansiava por uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU, o cara que se julgava capaz de resolver qualquer encrenca internacional, o cara que tornava o Brasil autossuficiente em petróleo, o cara de quem Obama disse, textualmente: "I love this guy! The most popular politician on earth". Te mete! Lula podia tudo. Embora muitos ao seu redor tivessem tombado, saíra incólume do mensalão. Frustrando as expectativas dos que esperavam enfrentá-lo exangue em 2006, colocara no peito a segunda faixa presidencial.
Nesse jogo, porém, Lula tinha muito a agradecer e pouco a oferecer. A prosperidade da economia brasileira, que permitiu saltos na arrecadação, no mercado de trabalho, nas exportações tinha tudo a ver com o espetacular crescimento do mercado chinês, que elevou o preço das nossas commodities. E nada a ver com competência administrativa. O governo, sabe-se agora, era uma versão institucional do Gran Bazaar, lugar de muitos e rentáveis negócios, cuja alma, como sempre em tais arranjos, era a publicidade. O presidente não tinha qualquer das virtudes necessárias a um bom gestor. Sempre foi, isto sim, um político conversador, populista e oportunista. Deveria agradecer aos que, antes dele, assumiram o sacrifício político de colocar o país nos trilhos da responsabilidade fiscal. Mas não.
Ah, se Lula tivesse sido um bom gestor! Com os recursos de que dispôs, com o apoio popular que soube conquistar, com o carisma que Deus lhe deu, teria preparado as bases necessárias a um desenvolvimento sustentável. Nenhum outro presidente, em mais de um século de república, navegou em águas tão favoráveis. Contudo, do alto de sua vaidade, embora fosse apenas um mero e pouco esclarecido barqueiro, ele acreditou ser o senhor dos mares e das marolas. "Vaidade! Definitivamente meu pecado favorito", confessa o personagem representado por Al Pacino em O Advogado do Diabo. E a vaidade de Lula jogou o Brasil no inferno em que hoje ardemos sob o governo de Dilma.
É bom lembrar. Em 2007, tamanha era a euforia de Lula que ele importou, assim como Collor faz com carros esportivos, esse luxo extravagante que foi a Copa de 2014. Consumidor insaciável de manchetes, nesse mesmo ano começou a negociar a aquisição, para o Rio de Janeiro, da sede dos Jogos Olímpicos de 2016. A Copa, na hora da bola rolar, se tornara algo tão fora do contexto, despesa tão despropositada, que ele sequer teve coragem de comparecer a qualquer dos jogos! E sua herdeira foi hostilizada de modo constrangedor na solenidade inaugural.
O jornal O Estado de São Paulo de ontem, 23 de agosto, divulgou um relatório de custos dos Jogos Olímpicos. O mais recente levantamento disponibilizado pela prefeitura do Rio informa que, faltando contabilizar algumas despesas de menor monta, os Jogos (que beneficiarão quase exclusivamente a capital carioca) custarão ao povo brasileiro R$ 38,67 bilhões. Se somarmos essas duas extravagâncias lulopetistas, chegaremos a R$ 66 bilhões e a um conjunto de elefantes brancos. Quantas aplicações mais úteis ao país seriam possíveis com tais recursos! Num ano em que o governo corta quase R$ 12 bilhões da área de Saúde e se agrava o caos do setor, corta R$ 9,42 bilhões da Educação e universidades fecham as portas por não disporem de recursos para dar continuidade ao ano letivo, a gestão temerária do lulopetismo continua jogando dinheiro fora para apresentar outro show ao mundo. Gestão temerária se caracteriza por conduta impetuosa, imponderada, irresponsável ou afoita. Não é uma descrição perfeita dos acontecimentos aqui mencionados? O prefeito de um pequeno município já foi condenado por isso.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
22/08/2015
Há alguns meses, uma dupla de vagabundos me encostou uma pistola na barriga e exigiu a chave do carro. Ainda sob o impacto do acontecido, fomos, minha mulher e eu, à delegacia mais próxima relatar a ocorrência. Era o que se impunha fazer naquele momento e esperávamos, ademais, que a notificação urgente possibilitasse - quem sabe? - recuperar o que nos haviam roubado. Mas isso não aconteceu.
Estou convicto de que tivemos um comportamento normal. É o que se faz em tais circunstâncias. Reage-se indo à polícia. Espera-se que os criminosos sejam apanhados. Exige-se que as quadrilhas sejam trancafiadas.
Diante do que acabo de descrever, impõem-se inquietante questão: por que, diabos, quando na condição de cidadãos que veem o país ir à gaita, tantos se recusam a admitir que estão sendo roubados? Por que, após serem ludibriados com mentiras, muitos se mantêm defendendo os mentirosos? Que síndrome de Estocolmo (1) social e economicamente sinistra é essa que ainda sai às ruas, assina colunas de jornais, esgrima comentários no rádio e na tevê e se entrincheira nas redes sociais para defender o governo? Agem como vítimas que, após o dano sofrido, saem conversando amavelmente, abraçadas com quem as prejudicou - "Bye, bye, voltem sempre!". (1) Essa síndrome designa o vínculo emocional com os sequestradores, desenvolvida pelos sequestrados durante um roubo a banco na capital da Suécia em 1973.
Recebi, ontem um levantamento segundo o qual, somando-se os filiados ao Partido dos Trabalhadores com os militantes do MST, Via Campesina, MTST, UNE e ONGs financiadas pelo governo federal, acrescidos dos blogueiros, MAVs pagos pelo partido e titulares de cargos de confiança, chega-se a umas 15 milhões de pessoas, ou seja a 7% do eleitorado. E esse seria, portanto, o piso da aprovação ao governo.
No entanto, os números parecem um pouco inflados. Há gente que não se enquadra em qualquer dessas categorias e se conta entre os tais 7%. Quando milhões saem às ruas em centenas de cidades do país, expressando a natural indignação de quem se percebe roubado, ludibriado e vítima de estelionato eleitoral, os protetores do governo tratam de desqualificar suas admiráveis manifestações. Afirmam que são mobilizações exclusivas da classe média, como se um governo que fez mais da metade dos votos e em poucos meses cai para 7% de aprovação, não tivesse perdido apoio de todas as classes sociais.
Nestes dias, o petismo busca salvação no andar mais elevado dos poderes de Estado, reunindo homens da estirpe de Lula, Sarney, Renan, Jucá, Barbalho. Janta com ministros do STF! Encontra-se secreta e casualmente com Lewandowsky na cidade do Porto. Usa e abusa dos nossos recursos, aumentando os gastos com a publicidade oficial para domar a mídia e distribuindo favores aos currais eleitorais do Norte e do Nordeste.
E tem buscado, inutilmente, arregimentar apoios, também, no andar térreo, convocando os "exércitos" de Stédile (MST) e de Vagner Freitas (CUT). Que fiasco! Para cada cem manifestantes do dia 16, o governo conseguiu, no dia 20, transportar e colocar nas ruas uns 4 ou 5 gatos pingados, que se moviam em visível constrangimento e com a animação de velório de monge budista. Não é humano, não é natural, não é normal, aplaudir corrupção, inflação, desemprego, carestia, recessão e incompetência. Quando isso acontece, ou há interesses em jogo, ou é síndrome de Estocolmo.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.