• Bruno Braga
  • 01 Maio 2015

 

Schopenhauer sentenciou: "Toda vida é sofrimento" [1]. Com algo bem parecido, São João Maria Vianney advertiu os que se consomem em lamentos: "Queiramos ou não, temos que sofrer" [2]. Afirmações tão próximas sobre a existência, contudo, disfarçam os horizontes completamente distintos que os dois contemporâneos tinham dela.

Um ateu convicto, Schopenhauer emergiu de um mergulho no sujeito com a crença de ter achado no seu interior mais profundo a revelação da essência de todos os fenômenos: o mundo é Vontade. É um querer cego, obscuro e insaciável, que faz do mundo um imenso campo de batalha, manifestando nele o caráter do seu ser. Violência, dor, miséria, tormento. Prazer e satisfação são instantes fugazes e passageiros; o sofrimento é predominante e inevitável. Todos lutam contra todos. Um conflito generalizado, que exibe a sua face mais terrível e assombrosa quando o homem se torna o lobo do homem (homo homini lupus).

Para o padre Vianney, o mundo não é expressão de um ímpeto voraz de eterno descontentamento. Ele é criação sim de um Ser onipotente, mas justo e misericordioso. O mundo e o homem são obras de Deus. Sofrimentos e dores são degraus de uma escada que leva ao Céu. É o caminho da cruz, apontado pelo próprio Deus que se fez carne: "Se alguém quer me seguir, negue-se a si mesmo e tome a sua cruz" (Mc 8, 34) - Jesus Cristo, que revelou: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (João 14, 6).

"Mas, que 'vida'?!" Esbravejaria Schopenhauer. Dela, todos têm a certeza da derrota definitiva, qualquer esforço é inútil diante da morte. Se é possível algum consolo durante o trajeto penoso, rumo ao abismo do qual ninguém pode se desviar, ele depende da graça de uma intuição. É quando o sujeito se reconhece como "filho" da Vontade demoníaca que o atormenta, que rege o mundo e se manifesta também naquele que padece à sua frente. Neste ato de identificação, em vez de impor mais dores e sofrimentos ao outro - de fincar os dentes na própria carne - o sujeito renuncia a afirmação da sua própria vontade, ele recolhe suas armas. Para o filósofo de Danzig, esta compreensão é o que fundamenta a justiça e gera as boas ações. É ela que alimenta os santos e guia o Cristo. Divindades e eventos extraordinários são frutos da imaginação, uma fantasia criada e disseminada pela religião - uma "metafísica popular".

No entanto, o padre Vianney foi, ele mesmo, a prova inequívoca para confirmar o que Schopenhauer pensava ser apenas superstição e crendice. Trabalho intenso, mortificações, alimentação restrita. Durante muito tempo, o santo de Ars comeu apenas batatas bolorentas. O médico que o assistia assegurou: "Em vista da sua maneira de viver, tal como a conheci, considero-lhe a existência como extraordinária e naturalmente inexplicável" [3]. Encontros com a Santíssima Virgem Maria, curas e conversões - "se não tivesse morrido, teria convertido a França inteira" [4] - a luta contra o demônio. Fé que não era uma ficção, e sim um conjunto de realizações concretas - fartamente atestadas [5] - que pavimentaram o caminho da cruz e exibiram a verdade da promessa de Jesus Cristo.

É impossível reduzir a filosofia de Schopenhauer ao tamanho de um breve artigo. Como é disparatada qualquer tentativa de sintetizar - não conceitos e teses - a vida de obras e feitos do padre Vianney. Porém, não há dúvida de que - apesar de falarem sobre o sofrimento em termos semelhantes - eles tinham perspectivas absolutamente distintas a respeito da sua consequência final. Para o filósofo alemão, o abismo. Para o santo da Igreja Católica, o sofrimento é o sinal de esperança dado pelo Filho do Homem. A cruz cravada na terra para indicar o caminho da salvação, e para anunciar que a morte não tem a palavra final.


Referências.

[1]. SCHOPENHAUER, Arthur. "O mundo como vontade e como representação". Trad. Jair Barboza. Editora UNESP: São Paulo, 2005. p. 400.

[2]. MONNIN, Alfred. "São João Maria Batista Vianney": o Cura d'Ars. Editora Petrus: São Paulo, 2013. p. 87.

[3]. TROCHU, Francis. "O Santo Cura d'Ars": São João Batista Maria Vianney. Editora Líttera Maciel: Contagem-MG, 1997. p. 368.

[4]. GUÉON, Henri. "O Cura d'Ars". Quadrante: São Paulo, 1998. p. 08.

[5]. Cf. referência [3].
    

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  • Milton Pires
  • 30 Abril 2015

No dia primeiro de maio de 1886, em Chicago, Estados Unidos, um grupo de sindicalistas, reformadores, anarquistas, socialistas e aquilo que hoje a história chama de “trabalhadores comuns” tomou as ruas da cidade. O movimento não era local nem regional. Em todo país lutava-se, entre outras coisas (mas principalmente) por uma jornada diária de trabalho de 8 horas. Três dias depois, na chamada Haymarket Square da mesma cidade, eclodiu um conflito entre operários e policiais que faria a confusão de ontem em Curitiba parecer bobagem.

É curioso observar, como através do tempo, muda-se o significado da História e dos seus fatos principais conforme a vontade de quem faz o discurso. Dia do Trabalhador hoje, no Brasil, passou a significar algo muito diferente daquilo que se pedia em 1886. A distância é tão grande que até mesmo a definição do evento menciona (como vocês viram acima) a presença de “trabalhadores comuns” entre os manifestantes de Chicago, não é?


Eu fico aqui pensando: quem seriam hoje, no Brasil, esses trabalhadores “comuns” e me atrevo, eu mesmo, a responder – trabalhadores “comuns” no nosso país são 99,9% dos brasileiros ! São a maioria gigantesca da nossa população que amanhã, se Deus quiser, NÃO vai estar nas ruas misturada com a ralé da esquerda brasileira...são os médicos que vão estar atendendo em emergências imundas do SUS, são policiais que vão estar trocando tiros com traficantes que trouxeram para o nosso país a cocaína das FARC, são professores que vivem com salário de fome e não cobrem o rosto para invadir a Assembleia Legislativa em Curitiba ! Eles, junto com milhões de operários, caminhoneiros, lavradores, faxineiras, garis...eles e tantos outros que começaram, desde crianças, a ajudar a sustentar suas famílias JAMAIS precisaram de sindicalistas alcoólatras, de guerrilheiras que assaltam bancos nem de padres comunistas para saber quais são, em primeiro lugar, os deveres de um trabalhador e, em decorrência deles, quais os direitos que lhes são devidos.

Não sou “getulista”. Não tenho idade para ter visto o Governo dele. Não o tenho como ídolo nem como vilão mas conheço história – foi com ele, e mais ninguém, que se construiu a luta pelos direitos dos trabalhadores nessa Nação. Getúlio Vargas pode ser acusado de qualquer coisa; menos de ter sido “comunista”. Causa nojo ver o PT apresentar-se como um partido dos “trabalhadores”. Causa espécie ver essa elite que compra deputados, que mata prefeitos, que destrói a PETROBRAS, que corrompe a nossa infância dizer-se representante daqueles que construíram e que sustentam esse país.

Soube que amanhã Dilma não vai discursar em cadeia nacional de televisão. Que ironia ! Uma presidente inventada por um sindicalista quase analfabeto, uma “combatente pela democracia” (como ela gosta de se dizer) dos anos 60 e 70 ter tanto medo de um panelaço nacional que precise limitar-se às redes sociais para dirigir-se ao Brasil. A solução que ofereço aqui é simples: dirija-se aos trabalhadores cubanos, presidente Dilma! Foi dinheiro gerado pelos brasileiros que a senhora entregou, através de empréstimos que até agora tem seus termos mantidos em segredo, para eles reformarem seus portos e aeroportos ! Cumprimente os trabalhadores da Bolívia – país cuja dívida a senhora e seus asseclas perdoaram ! Fale ao povo do Território Palestino – seu ex-ministro e traidor da profissão médica, Alexandre Padilha, empenhou-se em construir centros de tratamento e diagnóstico lá enquanto nossos pacientes morrem no chão ! Se a senhora e seus comparsas disserem que assim escrevo por pertencer a uma elite, que assim a ataco por “ser médico”, lembre-se que foram vocês petralhas que passaram a nos chamar de “trabalhadores da saúde” como todos os outros ! Encerro, pois, dizendo que aqui não é o médico nem o cidadão que a vocês se dirige agora – é o pagador de impostos, é mais um “trabalhador” brasileiro que nesse primeiro de maio tem, como a gigantesca maioria da nossa sociedade, o mesmo orgulho de ser trabalhador e, graças a escória do Partido de vocês, cada vez mais VERGONHA de ser brasileiro ! Quando a História se referir aos petistas, poderá dizer que fizeram qualquer coisa; menos trabalhar de verdade !

Porto Alegre, 30 de abril de 2015. 

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  • Ricardo Orlandini
  • 28 Abril 2015

(Publicado originamente em RicardoOrlandini.net)

Pela primeira vez desde que assumiu a Presidência da República, Dilma Rousseff não discursará em rede nacional de rádio e televisão no 1º de Maio, Dia do Trabalho.

E também não lembro há quanto tempo um presidente deixa de se manifestar no Dia do Trabalho.

Edinho Silva, o atual ministro da Comunicação Social, afirmou nessa segunda-feira (27) que o objetivo é usar outros "modais de comunicação" e que no 1º de Maio Dilma dialogará com a sociedade pelas redes sociais.

Segundo o ministro "A presidenta não precisa se manifestar apenas pela cadeia de televisão", acrescentando que Dilma utilizará transmissões de pronunciamentos em cadeia nacional "quando for necessário".

O ministro negou que a decisão, tomada por unanimidade na reunião realizada nesta segunda-feira, em Brasília, tenha sido resultado do panelaço promovido em várias cidades do país contra a presidente durante a transmissão do seu pronunciamento no Dia Internacional da Mulher, em março.

É sr. ministro, só esqueceram de combinar com os Russos.

Fontes palacianas dão conta de que a presidente Dilma vinha considerando seriamente não fazer nenhum discurso no Dia do Trabalho, por conta dos protestos ocorridos em suas últimas falas na TV. Dilma teria mudado de ideia e agora vai se comunicar pela internet pois, quem sabe, vai se livrar dos panelaços.

Pois é...

Nem na televisão ela pode falar sossegada!

Que povinho mal educado esse nosso, não é mesmo!

Vale lembrar que é a direita associada à mídia golpista que promove esses protestos e manifestações antidemocráticas.

Os protestos só podem ocorrer quando forem contra a direita, o FMI, FHC, o PSDB de Aécio Neves e, é lógico e claro, contra o golpista maior e chefe da CIA, Barack Obama.

O ministro enfatizou que "a presidente não teme nenhum tipo de manifestação, ela só está valorizando outro modal de comunicação.”

É ministro, eu acredito no senhor. Como também acredito em Papai Noel, Coelhinho da Pascoa, Saci Pererê e tudo o mais.

Só quem não acredita é a “maioria silenciosa” dos incrédulos brasileiros.

Mas muito cuidado, ministro.

A internet é muito traiçoeira e pode reverberar de outra maneira, muito mais contundente, muito mais barulhenta.

Então vamos ver no que vai dar!

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  • Josias de Souza
  • 27 Abril 2015

(Oublicado originalmente na Folha)
27/04/2015 04:54

O que os políticos dizem espontaneamente em público nunca é tão importante quanto o que você ouve sem querer atrás da porta. Repare no que acaba de acontecer com o presidente do PDT, Carlos Lupi. Discursando para filiados do partido, em São Paulo, Lupi golpeou o petismo e os governos Lula e Dilma Rousseff abaixo da linha da cintura. Foi escutado pela repórter Isadora Peron, que obteve uma gravação do discurso.

Lupi disse coisas assim: “O PT exauriu-se, esgotou-se. Olha o caso da Petrobras. A gente não acha que o PT inventou a corrupção, mas roubaram demais. Exageraram. O projeto deles virou projeto de poder pelo poder.”
Ou assim: “A conversa com o PT, com o meu amigo Lula e com a presidente Dilma, é qual o naco de poder que fica com cada um. Para mim, isso não basta. Eu não quero um pedaço de chocolate para brincar como criança que adoça a boca. Eu quero ser sócio da fábrica, eu quero ajudar a fazer o chocolate.”

Ou ainda: “A gente não quer ser um rato, que foge do porão do navio quando entra a primeria água, mas também não queremos ser o comandante do Titanic, que ficou no barco até ele afundar.”

Quanto à corrupção, Lupi conheceu-a por dentro. Ex-ministro de Lula e Dilma, foi varrido da pasta do Trabalho pela presidente sob variadas acusações de desvios. Portanto, é melhor não discutir com um perito no assunto.

Sobre o rateio que Lula e Dilma fizeram da Esplanada, Lupi participou gostosamente das conversas —mesmo depois de ter sido expurgado do ministério. Avalizou a nomeação do atual titular do Trabalho, Manoel Dias. Vá lá que não quisessem apenas adoçar a boca como criança. Mas precisava sumir com o chocolate?

Por último, como qualquer outro oportunista, Lupi tem o direito de escolher a melhor hora para saltar da embarcação. Mas convém não fazer pose de navio que abandona os ratos. Pode irritrar a turma da terceira classe.

A notícia sobre as manifestações de Lupi veio à luz na noite de sábado. Algumas pessoas aguardaram pela reação indignada do PT. E nada. Imaginou-se que Lula e Dilma reagiriam. Nem que fosse com uma cara de nojo. E nada. Noutros tempos, costumava-se perguntar: onde essa gente pretende chegar? Hoje, convém indagar: onde irão detê-los?
 

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  • Gilberto Simões Pires
  • 27 Abril 2015

DE ENCHER OS OLHOS - DE TRISTEZA

no jornal Zero Hora de ontem, domingo, me deparei com uma entrevista concedida pelo economista Luiz Carlos Bresser Pereira, que já foi ministro da Fazenda, no governo Sarney, e ministro da Ciência e Tecnologia, e da Administração Federal, no governo FHC.

MUITA TRISTEZA

Pois, praticamente tudo que Bresser disse, na longa conversa que manteve com o jornalista Leandro Fontoura, de São Paulo, foi de encher os olhos. Só que -de muita de tristeza-. O que mais impressiona é que o ex-ministro, como professor emérito da FGV, instrui seus alunos da forma equivocada como pensa. Se é que pode-se dizer que Bresser realmente pensa.

PROFESSOR EMÉRITO DA FGV (???)

É curioso que depois de ter ocupado cargos relevantes nos governos Sarney e FHC, Bresser Pereira não conseguiu entender minimamente as CAUSAS que levam o Brasil a apresentar enormes (quase eternas) dificuldades para se desenvolver e/ou crescer por períodos longos. O que não é possível compreender é que ainda por cima Bresser é professor emérito da FGV... Pode?

MATRIZ BOLIVARIANA

Como prova de que não aprendeu a pensar, o entrevistado ainda se mostra apaixonado pelo governos Lula e Dilma. Isto significa que é a favor da Matriz Bolivariana, pois repete várias vezes na entrevista que o neoliberalismo (???) foi o grande responsável pelo insucesso econômico do país. Ou seja, para Bresser, quanto maior a presença do Estado na economia, melhor para o país. Pode?

LIBERDADE

Ora, para quem já foi ministro da Fazenda, no mínimo deveria saber é que quanto maior for a liberdade econômica mais o país se desenvolve. Por conseguinte, quanto menos empresas sob o controle do Estado menor a taxa de corrupção e melhor a sua gestão. Quanto à Petrobras, ao invés de pregar a sua privatização, Bresser condena quem pensa assim.

MERCANTILISMO

Mais: Bresser, depois de ter chegado aos 80 anos ainda não aprendeu o que é capitalismo. Tanto é verdade que lá pelas tantas diz: a classe capitalista teme a democracia. Para controlá-la desmoraliza o Estado e o político. Ora, Capitalismo é Liberdade. Como o Brasil carece de liberdade, não há como dizer que há capitalismo por aqui. Como professor da FGV, que já tive oportunidade de ministrar aulas, deveria saber que no Brasil se pratica, desde sempre, o cruel Mercantilismo Feudal.

 wwwpontocritico.com

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  • Carlos I.S. Azambuja
  • 26 Abril 2015

Louis Aragon, poeta oficial do Partido Comunista Francês, ao verificar o desmoronamento do socialismo real, simplesmente constatou: “Perdi meu tempo”.


Quando alguém examina livros, revistas e folhetos comunistas verifica um fato surpreendente. Em nenhuma parte da interminável verborréia que pretende abordar o político-social se encontra qualquer referência ao indivíduo.

Página após página, encontramos os termos massas, proletariado, burguesia, mercenários do capitalismo, reformistas, revisionistas, renegados e sempre, em toda a parte, referências à vanguarda revolucionária do proletariado. Isto é, ao partido.

Sempre que se refere a qualquer membro do partido, ele é esterilizado psicologicamente e tirada a sua individualidade: é convertido no companheiro, kamarada ou quadro.

Não é, porém, por acidente que o ser humano está ausente dos escritos comunistas. O indivíduo não tem cabimento na teoria e no programa dos partidos comunistas. A ideologia só se interessa pelo homem como membro de uma classe e, no que se refere ao programa, os indivíduos são manejados como massa.

Na medida em que o indivíduo siga sendo ele mesmo, diz-se que está animado por interesses e esperanças pessoais: é sensível às dúvidas e ao otimismo; é capaz de ser tocado pelo mistério da vida; torna-se imprevisível e capaz de ater-se às suas próprias opiniões.

As mesmas qualidades que fazem dele um indivíduo o desqualificam para os fins partidários. Tende demasiado a não ser facilmente convencido, a mostrar-se cético, a aborrecer-se pelas reiteradas abstrações próprias da ideologia comunista, a duvidar do método, a manter uma opinião ainda mesmo depois de se ter convertido à linha partidária e a simpatizar ou antipatizar com seus semelhantes sem permissão do Comitê Central.

Em conseqüência, não é confiável. Necessita ser desenvolvido e integrado às massas, a fim de que o partido cumpra a sua missão histórica.


De acordo com a doutrina científica, todos os aspectos do ser humano que não se prestem à sua politização são burgueses.
 

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