"Eu sei, não, eu sinto que Deus existe."
(Jorge Luis Borges)
O que nós sabemos, não, sentimos é que o nosso país está deixando de existir. Não aquele que se indignou por Marta Rocha, por causa de duas polegadas a mais na cintura, não ter sido eleita Miss Universo. Que projetou seu orgulho nos campeões Eder Jofre, Garrincha, Pelé e Maria Ester Bueno. Que construiu Brasília e conquistou o mundo com os acordes e o ritmo da bossa nova e sua poesia intimista, sofisticada na fusão de Debussy com o jazz, assim promovendo o samba que descia do morro a uma expressão musical universal.
Não, aquele país fincou suas raízes numa geração que não existe mais. Dela só restou a lembrança que vai se apagando com o tempo. E se esvai a cada mito que Deus seja servido de convocar para o infinito. E com eles nos também morremos um pouco. C'est la vie!
Quem dera nosso país também deixasse de existir assim, naturalmente, como a aurora de nossa vida na infância e juventude! E hoje debruçasse sobre o peitoril de uma janela que descortina o passado a esperança que nos consola em nossos filhos, netos e nos que ainda haverão deles descender, herdando a pátria e a civilização que para eles edificamos. Mas o país que está deixando de existir não é o nosso. É o deles. Não é o que o tempo levou, mas o que ele não poderá trazer. Porque hoje estão no poder aqueles que não suportam a realidade. Que é feita de passado, presente e perspectiva de futuro. Uma contingência com a qual eles, sendo revolucionários, não podem se conformar. Seu tempo só se conjuga no futuro. Sempre. Somente nele seu ideal de abolir o passado e exterminar o presente poderá ser julgado. Conceito este que os redime eternamente de qualquer crime que tenham cometido, pois o futuro sempre andará um passo à frente da justiça, que só examina o pretérito ou o presente.
Genial, não?
É claro que esse absurdo só pode ser encenado na mente de um psicopata. Ou de um belo cafajeste que não perderia essa oportunidade de se livrar do que ainda lhe possa pesar o que restou da sua consciência. O cidadão comum, que é honesto desde o camponês, o operário, o comerciário, o autônomo, até o agricultor, o industrial, o comerciante e o profissional liberal não cuida que está sendo vítima do sequestro da sua dignidade. Sem a qual ele será órfão da sua origem e natureza divina.
Mais, muitíssimo mais do que o assalto praticado nestes treze anos do PT no poder, a pátria comum e tudo que nos identificava como um povo, a partir do amor que nosso lar nos infundiu e dos primeiros passos de nossa catequese cristã, o que nós perdemos foi o Brasil. Um país perdido no futuro. Talvez para sempre.
(Publicado originalmente no Diario do Comércio)
Chavões, frases-feitas, clichês, estereótipos ou como se queira chamá-los existem para que o sujeito que não pensou num assunto possa obter a concordância imediata de outro que também não pensou. Onde quer que você ouça ou leia um desses maravilhosos substitutivos do pensamento, pode ter a certeza de que está assistindo a um encontro de dois corações que se apóiam e se reforçam mutuamente sem nenhuma interferência do objeto sobre o qual fingem estar conversando.
Por exemplo, quando um cidadão afirma: “Esquerda e direita são conceitos superados”, o que ele quer dizer é: “Eu sou superior a essas coisas.” O ouvinte, mais que depressa, responde: “Eu também.” E saem os dois muito contentes da sua superioridade, enquanto as duas forças inexistentes continuam a disputar o governo, xingar-se uma à outra, boicotar-se mutuamente e até trocar tiros, como se existissem.
A verdade é que nenhum fato ou coisa deste mundo, por pequeno e modesto que seja, se deixa apreender na linguagem dos chavões. Estes não têm nada a ver com a descrição de realidades, mas apenas, na mais bem sucedida das hipóteses, com a expressão da harmonia ou desarmonia entre as almas do falante e do ouvinte. Isso é assim pela simples razão de que nenhuma realidade vem junto com a linguagem pronta que a expressa, mas em cada caso a sua descoberta requer a invenção da linguagem apropriada para expressá-la. É por isso que os autores de grandes descobertas na filosofia são também inventores de linguagens originais. Conforme o talento literário de cada um, elas podem ser límpidas e claras como as de Platão ou Leibniz, ou então abstrusas e indecifráveis como as de Kant ou Heidegger, mas sempre originais, únicas e adequadas aos seus fins.
O chavão é, por excelência, a linguagem do auto-engano que busca transmutar-se em engano alheio, se possível em engano geral. É a linguagem de quem fecha os olhos ao objeto e os arregala para ver a reação do ouvinte. O pobre do objeto, do assunto, da questão, fica fora da conversa como um mendigo que espia pela janela do Ritz.
Se voltamos ao exemplo acima e, em vez de participar da deliciosa harmonia entre o falante e o ouvinte, voltamos os nossos olhos ao objeto da conversa, em cem por cento dos casos notamos que ele é bem diferente do que o imaginam aqueles que nem mesmo tentaram imaginá-lo, mas se limitaram a usá-lo como pretexto de um intercâmbio social.
Desde logo, se há pessoas que se dizem de esquerda ou de direita e que agem politicamente sob essas bandeiras, é evidente que esquerda e direita existem como agrupamentos políticos reais que sob esses nomes se reconhecem e por eles distinguem os “de dentro” e os “de fora”. Se suprimimos os nomes teremos de designá-los por outros da nossa própria invenção, nos quais os dois grupos não se reconhecerão e que só servirão para complicar o vocabulário.
Como autodenominações de grupos políticos e símbolos da sua identidade, os termos “esquerda” e “direita” não estão superados de maneira alguma. Expressam uma realidade sociológica inegável.
Faz um pouco mais de sentido dizer que seus respectivos discursos ideológicos foram ultrapassados pelo desenvolvimento crescentemente complexo do estado de coisas, que nenhum deles expressa corretamente. Teremos, com isso “superado os conceitos” de esquerda e direita? De maneira alguma, pois essa acusação é a mesma que a esquerda e a direita se fazem mutuamente, e, se não percebemos nem mesmo isso, é que ignoramos o estado de coisas ainda mais profundamente do que as duas juntas, e nós é que estamos superados. O sapientíssimo se revela um bobo na hora mesma em que tenta posar de superior.
Deveria ser óbvio para todo mundo, mas para muitos é quase um segredo esotérico inacessível, que a qualidade boa ou má, a veracidade ou falsidade das idéias de um grupo não tem nada a ver com a sua existência ou inexistência como grupo. Argumentar que duendes não existem não prova que inexistam grupos que acreditam em duendes.
Ainda mais bobo é aquele que afirma desprezar toda “retórica ideológica” e, em vez disso, examinar somente os interesses materiais malignos por trás da aparente disputa de ideologias, acreditando com isso estar firmemente assentado no terreno dos fatos e a salvo de idéias ilusórias. Mas, em primeiro lugar, apontar interesses materiais por trás de um discurso ideológico é precisamente o que as ideologias inimigas fazem umas com as outras. E o fazem quase sempre com razão, porque toda ideologia, como já a definia Karl Marx, é um “vestido de idéias” (Ideenkleid) costurado para encobrir um interesse material, um projeto de poder, uma ambição mundana. Por outro lado, é certo que, se esses interesses se apresentassem nus e crus, sem a embalagem ideológica, seriam imediatamente desmoralizados e não enganariam a ninguém. A ideologia, portanto, é parte integrante do projeto maligno, que não pode ser compreendido sem referência a ela. Por fim, também é certo que, se um discurso ideológico, uma vez formulado, serve de símbolo verbal da identidade de um grupo, o qual sem essa identidade estaria privado da possibilidade de agir em conjunto, o conteúdo desse discurso não será nunca totalmente alheio à conduta real do grupo, que em certa medida será obrigado a ajustar suas ambições de poder às promessas e valores do discurso. A tensão entre a identidade do grupo e os interesses materiais em jogo é um elemento permanente da vida político-ideológica, e fazer abstração da ideologia para enfocar somente os interesses materiais isolados é condenar-se a não compreendê-los de maneira alguma.
Um exemplo característico é o chavão mais em moda hoje em dia, segundo o qual o sr. Lula não é comunista nem esquerdista, apenas um político sem filiação ideológica que enriqueceu ilicitamente. Esse chavão soa agradável em diferentes áreas do espectro ideológico. Para o esquerdista, ele é a fórmula mágica para isentar de toda culpa pelos crimes do PT a corrente política que o criou, que o incensou, que lhe deu a hegemonia e que, se ele for para o buraco, pretende continuar no poder sob outros nomes quaisquer. Para o direitista, fornece um poderoso argumento retórico: “Estão vendo como na esquerda ninguém presta, como são todos uns ladrões e salafrários?” E, para o homem “superior a ideologias”, é mais uma prova da sua superioridade sublime. Todos os pretextos servem, portanto, para o interessado se fazer de bonito mediante a supressão de pelo menos duas perguntas:
1) Se o Lula é apenas um ladrãozinho sem compromisso com o comunismo, por que distribuiu tanto dinheiro a ditaduras e partidos comunistas, quando podia guardá-lo para si mesmo?
2) Por que as FARC o homenagearam por ter salvado in extremis o comunismo continental, em vez de acusá-lo de usar o comunismo em benefício próprio?
Que o sr. Lula seja apenas um ladrãozinho egoísta sem vínculo ou compromisso com o comunismo internacional é uma das idéias mais estúpidas e indefensáveis que já passaram por um cérebro humano. De um lado, há o fato incontestável de que ele é aceito e celebrado por todos os governos e partidos comunistas do mundo não só como um parceiro e irmão leal, mas até como uma espécie de herói, de salvador providencial. Se ele alcançou essa posição sem nada fazer pelo comunismo e agindo sempre somente no interesse próprio, então ele enganou a todos os líderes e governos comunistas do universo, incluindo os serviços secretos de Cuba e da China, tidos como extraordinariamente eficientes e maliciosos, só não logrando tapear o tirocínio superior dos comentaristas brasileiros de mídia. De outro lado, resta o fato igualmente incontestável de que nenhum espertalhão logrou jamais utilizar-se do comunismo em benefício próprio sem beneficiar ainda mais algum governo ou partido comunista -- pelo menos não logrou fazê-lo sem pagar com a vida. Willi Münzenberg, que era um milhão de vezes mais esperto que Lula, foi simplesmente acusado de tentar fazer isso, e já o assassinaram antes que alguém pudesse verificar se fez ou não. Não é humanamente concebível que um movimento que condenou à morte cem milhões de pessoas pudesse poupar generosamente a vida de um vigarista que o ludibriasse de forma tão humilhante ante os olhos da humanidade inteira. Muito menos concebível é que depois disso continuasse a aplaudi-lo e paparicá-lo como o fazem os governos de Cuba, da China, da Venezuela etc. Essa hipótese é tão absurda, tão monstruosamente inverossímil, que acreditar nela mesmo por um minuto e em segredo já seria prova de uma imbecilidade descomunal. A desenvoltura ingênua com que tantos no Brasil a alardeiam sem a menor inibição é a prova definitiva de que algo no cérebro nacional não vai bem.
Erros monumentais como esse não aparecem sozinhos. Provêm de uma ignorância estrutural, profunda e dificilmente reversível, quanto à natureza e função das ideologias em geral. Os palpiteiros que superlotam a mídia e as cátedras imaginam que ideologia seja algo como uma crença religiosa, que exija a adesão profunda e sincera das almas. Nessa perspectiva, um comunista, por exemplo, poderia ser um “verdadeiro crente” ou um mero oportunista sem crença nenhuma. Essa diferença pode ter existido em outras épocas, quando a URSS baixava as Tábuas da Lei e condenava como heréticos os trotskistas, os revisionistas etc. De fato, não pode existir “verdadeiro crente” sem um texto canônico obrigatório para todos. Mas já faz três décadas, pelo menos, que nada disso existe no movimento comunista. A concepção eclesiástica do Partido como guardião da doutrina infalível foi substituída pela flexibilidade de um pluralismo ilimitado onde todos os discursos ideológicos são bons, desde que seus adeptos consintam em agir segundo uma estratégica unificada. Concomitantemente, a antiga hierarquia vertical foi trocada por uma organização mais flexível sob a forma de “redes”, onde as palavras-de-ordem não despencam das alturas olímpicas de um Comitê Central mas se espalham quase anonimamente, como se fossem meras exigências do senso comum em vez de ordens do Camarada Fulano ou Beltrano. A substituição da unidade ideológica pela unidade puramente estratégica, concebida nos anos 80 do século passado e testada com sucesso espetacular na guerrilha de Chiapas, México, em 1994 – chamada por isso “guerrilha pós-moderna”--, permitiu que o movimento comunista não somente sobrevivesse incólume à queda da URSS, mas multiplicasse sua força e capacidade de ação. A esquerda mundial está hoje muito mais unificada e organizada do que sessenta ou setenta anos atrás. Ganhou em força de atuação conjunta o que perdeu no debate ideológico. Quem não percebe isso não merece ser ouvido em matéria de política.
Para tornar as coisas ainda mais incompreensíveis aos sábios iluminados, resta o fato de que “esquerda” e “direita” só são entidades simetricamente opostas nos dicionários. Na vida real, “esquerda”, hoje, não é um “rótulo ideológico” e sim um movimento unificado e organizadíssimo sem nenhuma ideologia definida, ao passo que “direita” é na melhor das hipóteses o nome de um amálgama confuso de discursos ideológicos inconexos, ao qual não corresponde nenhuma organização ou movimento unificado nem mesmo em escala nacional, quanto mais mundial. Não são espécies do mesmo gênero. Aquele que assim as concebe para fazer-se de superior a ambas, como um domador que cavalga simetricamente dois cavalos com um pé em cada um, é na verdade um acrobata impossível com um pé num cavalo de carne e osso e o outro no conceito abstrato de um cavalo hipotético.
LULA REFOGADA EM FOGO BRANDO; OU, COMO PRENDER O CHEFÃO
(Publicado originalmente em http://professorpaulomoura.com.br/)
O apoio que Lula tem junto ao petismo é o último baluarte de sustentação do governo Dilma. A presença do PT no governo é o último baluarte do poder que o petismo ainda tem. Sem a sustentação de Lula, Dilma cai. Sem a presença no governo o PT definhará. Viciados na droga do poder, o petismo não sobreviverá à síndrome de abstinência dos cargos públicos.
Enquanto alguns comentaristas e editorialistas da imprensa alardeiam que Lula desejaria ir para a oposição e entregar a gestão da crise que ele criou para um adversário, o chefe do PT movimenta-se freneticamente para impedir o impeachment de Dilma e melar a operação Lava Jato.
Por um lado, há a tentativa de tirar o julgamento dos acusados pela operação Lava Jato das mãos do juiz Sérgio Moro, distribuindo-o para outros juízes e soltando indiciados mantidos presos em Curitiba há meses.
Por outro, Lula manda o PT atacar Eduardo Cunha com a mão esquerda, ao mesmo em que estende a mão direita para o presidente da Câmara, oferecendo-lhe proteção para preservar seu mandato e o foro privilegiado, e sabe-se lá, que compensações pela perda do dinheiro que mantinha em suas contas recém descobertas na Suíça.
Os movimentos de Lula, ao mesmo tempo em que conferem fôlego ao governo Dilma e problemas à condução da operação Lava Jato pelo juiz Sérgio Moro não estão imunes ao contra-ataque. Observe-se, por exemplo, como Moro reagiu à soltura de Alexandrino de Alencar encaminhando novo pedido de prisão de Marcelo Odebrecht e antecipando-se à virtual tentativa de soltá-lo.
Ao mesmo tempo, tudo indica, Moro prepara, a resposta mais decisiva e importante que poderia dar às artimanhas do petismo para livrar Dilma do impeachment e os réus da Lava Jato da cadeia: a prisão de Lula.
Por que, com tudo que já se sabe, Lula ainda não foi preso?
Essa é a pergunta que se fazem onze entre dez cidadãos que têm ido às ruas em defesa da liberdade, da democracia e do impeachment de Dilma.
Porque esse é um tiro que o juiz Sérgio Moro não pode errar. Ou seja, para avançar essa peça decisiva no tabuleiro da Lava Jato, Moro precisa ter provas e certezas sobre sua consistência. Mas, isso não tem sido problema para o juiz do Paraná.
A questão principal não é esta. A prisão de Lula tem pelo menos duas implicações de enorme significado e importância.
A primeira delas reside no fato de que ao prender o principal líder do PT, que foi um presidente da República extremamente popular, Moro o fará para provar que, ao contrário do que argumenta a abancada do PT no STF, todo o esquema de assalto aos cofres públicos envolvendo a Petrobrás, a Eletrobrás, o BNDES, e, provavelmente todo o governo federal sob gestão petista, é prática de uma e somente uma quadrilha, que tem um e somente um chefão.
A segunda decorre do fato de que, não obstante as provas e evidências abundantes que jorram do noticiário todos os dias sobre as práticas criminosas do petismo no poder, Lula é objeto de uma devoção religiosa e irracional por parte de expressiva parcela dos seus devotos. E não estou falando aqui dos beneficiários do Bolsa Família. Falo de petistas que passaram pelos bancos escolares, inclusive de universidades, e que, simplesmente, se recusam a aceitar a realidade.
Gente assim, acredita que Sérgio Moro e os procuradores e delegados da Polícia Federal que conduzem a Lava Jato não passam de conspiradores a serviço do PSDB; que a imprensa livre que noticia os crimes do petismo integra uma conspiração da elite branca contra o partido que permitiu aos pobres andar de avião; que os crimes da Lava Jato não existem ou que, no mínimo, se justificam, pois se tratava de forma legítima de financiar a causa. Gente assim pode reagir de forma irracional e violenta à prisão de seu ídolo.
A prisão de Lula representará um golpe definitivo no petismo, tanto por razões jurídicas e policiais, como por razões políticas. Portanto, todos os cuidados e precauções que o juiz Sérgio Moro tiver na condução desse movimento decisivo para o sucesso do seu trabalho se justificam. E, quero crer, nos aproximamos do momento em que Moro decretará a prisão do capo do PT.
Por que? Porque há algum tempo já, a imprensa vem sendo abastecida com informações sobre as nebulosas relações de Lula com as empreiteiras da Lava Jato. No início a imprensa revelava os contratos de Lula como palestrante, seus valores e informações sobre eventual prática de tráfico de influência do ex-presidente, que teria usado seu poder sobre órgãos do governo Dilma para arrancar financiamentos do BNDES para seus clientes ou vender decisões governamentais em benefício de empresas ou segmentos empresariais que sustentam seu poder em troca de favores.
Mais recentemente as revistas e jornais começaram a revelar pagamentos suspeitos aos filhos e à nora de Lula. Igualmente soube-se que em seu depoimento ao Ministério Público de Brasília, Lula teria admitido que repassou a um ministro do governo Dilma, uma carta do governo cubano solicitando financiamento ao BNDES, revelando que as alegações do chefe do PT, de que atuava apenas como palestrante a serviço das empreiteiras pode não ser bem assim.
Não é de todo improvável que, os vazamentos gradativos de informações cada vez mais graves sobre a forma como Lula fazia seus negócios, obtinha contratos milionários e se remunerava por suas “palestras”, façam parte de uma inteligente estratégia para acostumar a opinião pública e os fiéis devotos de Lula com a ideia de que a prisão do chefe do PT é inevitável.
Não é de todo improvável, também, que, para estar vazando informações sobre repasses feitos a um sobrinho, aos filhos e à nora de Lula e sobre a atuação de José Carlos Bumlai, amigo íntimo e possível operador do ex-presidente, os investigadores da Lava Jato já tenham evidências e provas bem mais consistentes sobre o eventual envolvimento do próprio Lula no comando central do maior assalto aos cofres públicos de que sem tem conhecimento na história das democracias ocidentais.
A prisão de Lula, como se vê, não é algo simples. É uma medida que requer cuidados técnicos na condução do inquérito e suas investigações, mas, também, cuidados políticos. Além de produzir provas consistentes, faz-se necessário acostumar a sociedade e o petismo com a ideia de que a prisão do chefão é decorrência natural, óbvia e incontestável de seu envolvimento nos crimes investigados. E, tudo indica, Sérgio Moro está fazendo a coisa certa.
Quem pensa que o PT acabou está muito enganado. Quem subestima o inimigo perde a guerra. E não é impróprio usar o termo inimigo para classificar o partido que arruinou a economia, corrompeu as instituições, falsificou dados financeiros, mentiu aos eleitores, aniquilou valores e fez a opção pelo atraso que se evidencia na quebradeira da indústria, no descalabro da Saúde, na ruina da educação, na trava do comércio internacional com países que trariam vantagens e progresso ao País.
O mal foi entronizado pelos eleitores e está disseminado, empesteando a máquina administrativa com incompetentes que se agarram aos cargos com unhas e dentes. E o mal se avantajou e se fortificou pela inexistência de oposições, notadamente do PSDB sempre pronto a apoiar o PT, além da idolatria tucana por Lula da Silva.
Em outra vertente, na tentativa de recompor a fracassada experiência soviética e a derrocada do comunismo no mundo foi constituído o Foro de São Paulo, que congrega organizações de esquerda e dá diretrizes para a América Latina onde o atraso e a desigualdade social é terreno propício para as pregações de ditadorezinhos travestidos de socialistas, mas que vivem como nababos usufruindo das delicias do capitalismo.
Para exemplificar o caminho traçado pelo Foro de São Paulo tomemos a Venezuela ainda sob o comando de Hugo Chávez, outro que destruiu seu país e que mesmo morto continua a governar através de seu genérico, Nicolás Maduro. Chávez primeiro tentou um golpe. Não deu certo. Em outra etapa logrou se eleger. Posteriormente dominou o Legislativo, o Judiciário e as Forças Armadas. A partir daí fez uma constituição á sua imagem e semelhança e governou despoticamente até morrer, chamando-se de democrata.
Voltemos ao Brasil. No mensalão ficou evidente como é fácil comprar o Legislativo. E não só com dinheiro se adquire uma base para o PT chamar de sua. Cargos também servem. Rousseff tentou agora salvar-se do impeachment com sua desastrada reforma ministerial.
O Judiciário surpreendeu com o ministro Joaquim Barbosa, que logrou por na cadeia figurões do PT e pessoas endinheiradas. Outro destaque foi o juiz Sérgio Moro que desbaratou o cartel de empreiteiros e desmascarou diretores da Petrobras que recolhiam propinas para irrigar campanhas, notadamente as do PT. Eles foram presos e condenados pelo juiz.
Moro, porém, teve suas asas cortadas quando o Ministro do STF, Teori Zavascki, decidiu que ele só poderia atuar no âmbito da Petrobras, em que pese as mesmas quadrilhas agirem em outras entidades estatais.
No momento, as delações premiadas apontam para os crimes de várias autoridades do Executivo e do Legislativo, além Lula da Silva e sua família, mas parece haver só um grande corrupto da República: o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Só ele tem contas na Suíça. Só ele recebeu propina. Destaque na imprensa que devassa suas contas e documentos ele está sob ataque seletivo do Procurador-Geral da República. O PSDB pede seu afastamento. Deputados valentes pedem sua cassação e já se falou até em prisão.
Por que só ele? Porque o presidente da Câmara é quem abre o processo de impeachment. E ele o fez. Contudo, os ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, a pedido de fiéis emissários do PT, muito oportunamente concederam três liminares que suspenderam as regras de tramitação determinadas por Cunha e Rosa Weber, em “juridiquês”, impediu através de uma dessas liminares que o presidente da Câmara retomasse o rito do impeachment. Com isto o governo ganhou um tempo precioso para acabar com Eduardo Cunha. Sem ele cessa o perigo do impeachment, pois não se pode esperar nada da chamada oposição. Terá, então, havido uma ingerência entre Poderes? Um fato muito grave como o é um rompimento institucional?
Outro acontecimento dá o que pensar: Os comandantes das Forças Armadas tiveram seus poderes subtraídos e passados para o Ministro da Defesa. Isso foi feito por um decreto, cuja iniciativa partiu de uma senhora que é secretária geral do ministério da Defesa e que vem a ser mulher do segundo na hierarquia do MST. O atual ministro é o comunista Aldo Rebelo. Dizem que quando precisam de alguém muito incompetente o chamam.
Em recente declaração à Folha de S. Paulo, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, disse ver risco de a atual crise virar uma “crise social” que afetaria a estabilidade do País. Segundo o general isso diria respeito ás Forças Armadas e cita a Constituição mostrando que as FFAA “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos Poderes constitucionais e, por inciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”, sob autoridade presidencial. Fiquei na dúvida se o general se preocupa em defender o povo ou a autoridade presidencial, em caso de crise social.
Com tanto poder o PT pode salvar Rousseff. Ela continuaria até fim do mandato ensacando vento e conduzindo o País ao agravamento da crise econômica, cujas dimensões dão medo aquilatar.
* Socióloga.
Originalmente publicadoa em www.pontocritico.com
GRAU DE CONHECIMENTO
É importante ter em mente que quando vai às urnas para eleger seus representantes e sistemas de governo, o povo brasileiro age como se estivesse prestando um EXAME que identifica o grau de conhecimento adquirido, na vida e, principalmente, nas escolas que frequenta ou já frequentou.
INGENUIDADE
Vejam que não é preciso olhar com demasiada atenção os resultados dos pleitos, para perceber o que a nossa DEMOCRACIA-ELEITORAL revela: além de ser muito baixo o nível de educação e compreensão do nosso povo, a maioria é dotada de enorme ingenuidade. O que explica a facilidade que o povo tem para ser enganado. Principalmente, por governantes populistas, sempre atentos e muito bem treinados.DEMOCRACIA
A democracia, como bem diz o pensador (Pensar+) Percival Puggina, "é um regime medíocre, que só conseguiria deixar de ser medíocre numa sociedade de homens bons e sábios. Fora isso ela será tão medíocre quanto a sociedade onde for adotada".
"O problema é que todos os outros regimes são piores, embora possam apresentar, pontualmente, indicadores de resultados positivos (caso Pinochet e China atual, por exemplos), em meio a condutas perversas e moralmente inaceitáveis".
TRAJETÓRIA
Este baixo grau de educação do povo, que muita gente já vê como política estratégica-governamental, explica muito bem a trajetória do nosso pobre país.
Vejam, por exemplo, que depois de se manter, com muito orgulho, como país de TERCEIRO MUNDO por mais de 450 anos, o povo, sem ser consultado, viu o Brasil passar para a categoria de EMERGENTE, com chances de chegar ao PRIMEIRO MUNDO.
VIAGEM DE RETORNO
Pois, para provar o quanto a educação dos brasileiros está caminhando, celeremente, no sentido da imbecilização, que o Brasil, com o comando do PT, carimbou o passaporte e decidiu que fazer uma viagem de retorno, sem escala, para que possamos conviver novamente com países de TERCEIRO E QUARTO MUNDO.
DEMOCRACIA MEDÍOCRE
Atenção: nada do que estou dizendo pode ser visto como surpresa. Afinal, quando a maioria dos eleitores fazem questão de manter o PT por tantos anos no Poder, sem dar a devida importância para a CORRUPÇÃO E MÁ ADMINISTRAÇÃO, é porque sabe muito bem o que quer e o que está fazendo.
O Brasil, infelizmente, aos olhos dos que ainda raciocinam com lógica, nada mais é do que uma DEMOCRACIA MEDÍOCRE.
A ordem do dia é esculpir um Brasil descontaminado de heranças europeias
Renato Janine, o Breve, transitou pela porta giratória do MEC em menos de seis meses. No curto reinado, antes da devolução do ministério a um “profissional da política”, teve tempo para proclamar a Base Nacional Comum (BNC), que equivale a um decreto ideológico de refundação do Brasil. Sob os auspícios do filósofo, a História foi abolida das escolas. No seu lugar, emerge uma sociologia do multiculturalismo destinada a apagar a lousa na qual gerações de professores ensinaram o processo histórico que conduziu à formação das modernas sociedades ocidentais, fundadas no princípio da igualdade dos indivíduos perante a lei.
O ensino de História, oficializado pelo Estado-Nação no século XIX, fixou o paradigma da narrativa histórica baseado no esquema temporal clássico: Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna, Idade Contemporânea. A crítica historiográfica contesta esse paradigma, impregnado de positivismo, evolucionismo e eurocentrismo, desde os anos 60. Mas o MEC joga fora o nenê junto com a água do banho, eliminando o que caracteriza o ensino de História: uma narrativa que se organiza na perspectiva temporal. Segundo a BNC, no 6º ano do ensino fundamental, alunos de 11 anos são convidados a “problematizar” o “modelo quadripartite francês”, que nunca mais reaparecerá. Muito depois, no ensino médio, aquilo que se chamava História Geral surgirá sob a forma fragmentária do estudo dos “mundos ameríndios, africanos e afro-brasileiros” (1º ano), dos “mundos americanos” (2º ano) e dos “mundos europeus e asiáticos” (3º ano).
O esquema temporal clássico reconhecia que a mundialização da história humana derivou da expansão dos estados europeus, num processo ritmado pelas Navegações, pelo Iluminismo, pela Revolução Industrial e pelo imperialismo. A tradição greco-romana, o cristianismo, o comércio, as tecnologias modernas e o advento da ideia de cidadania difundiram-se nesse amplo movimento que enlaçou, diferenciadamente, o mundo inteiro. A BNC rasga todas essas páginas, para inaugurar o ensino de histórias paralelas de povos separados pela muralha da “cultura”. Os educadores do multiculturalismo que a elaboraram compartilham com os neoconservadores o paradigma do “choque de civilizações”, apenas invertendo os sinais de positividade e negatividade.
A ordem do dia é esculpir um Brasil descontaminado de heranças europeias. Na cartilha da BNC, o Brasil situa-se na intersecção dos “mundos ameríndios” com os “mundos afro-brasileiros”, sendo a Conquista, exclusivamente, uma irrupção genocida contra os povos autóctones e os povos africanos deslocados para a América Portuguesa. A mesma cartilha, com a finalidade de negar legitimidade às histórias nacionais, figura os “mundos americanos” como uma coleção das diásporas africana, indígena, asiática e europeia, “entre os séculos 16 e 21”. O conceito de nação deve ser derrubado para ceder espaço a uma história de grupos étnicos e culturais encaixados, pela força, na moldura das fronteiras políticas contemporâneas.
A historiografia liberal articula-se em torno do indivíduo e da política. A historiografia marxista organiza-se ao redor das classes sociais e da economia. Nas suas diferenças, ambas valorizam a historicidade, o movimento, a sucessão de “causas” e “consequências”. Já a Sociologia do Multiculturalismo é uma revolta reacionária contra a escritura da História. Seus sujeitos históricos são grupos etnoculturais sempre iguais a si mesmos, fechados na concha da tradição, que percorrem como cometas solitários o vazio do tempo. Na História da BNC, o que existe é, apenas, um recorrente cotejo moralista entre algoz e vítima, perfeito para o discurso de professores convertidos em doutrinadores.
Na BNC, não há menção à Grécia Clássica: sem a Ágora, os alunos nunca ouvirão falar das raízes do conceito de cidadania. Igualmente, inexistem referências sobre o medievo das catedrais, das cidades e do comércio: sem elas, nossas escolas cancelam o ensino do “império da Igreja” e das rupturas que originaram a modernidade. O MEC também decidiu excluir da narrativa histórica o Absolutismo e o Iluminismo, cancelando o estudo da formação do Estado-Nação. A Revolução Francesa, por sua vez, surge apenas de passagem, no 8º ano, como apêndice da análise das “incorporações do pensamento liberal no Brasil”.
Sob o sólido silêncio de nossas universidades, o MEC endossa propostas pedagógicas avessas à melhor produção universitária, que geram professores “obsoletos” em seus conhecimentos e métodos. Marc Bloch disse que “a História é a ciência dos homens no tempo”. Suas obras consagradas, bem como as de tantos outros, como Peter Burke, Jules Michelet, Perry Anderson, Maurice Dobb, Eric Hobsbawm, Joseph Ki-Zerbo, Marc Ferro, Albert Hourani, Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda e José Murilo de Carvalho, não servem mais como fontes de inspiração para o nosso ensino. A partir de agora, em linha com o decreto firmado pelo ministro antes da defenestração, os professores devem curvar-se a autores obscuros, que ganharão selos de autenticidade política emitidos pelo MEC.
Não é incompetência, mas projeto político. Num parecer do Conselho Nacional de Educação de 2004, está escrito que o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana “deve orientar para o esclarecimento de equívocos quanto a uma identidade humana universal”. Equívocos! No altar de uma educação ideológica, voltada para promover a “cultura”, a etnia e a raça, o MEC imolava o universalismo, incinerando a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A trajetória iniciada por meio daquele parecer conclui-se com uma BNC que descarta a historicidade para ocultar os princípios originários da democracia.
Doutrinação escolar? A intenção é essa, mas o verdadeiro resultado da abolição da História será um novo e brutal retrocesso nos indicadores de aprendizagem.
Demétrio Magnoli é sociólogo e Elaine Senise Barbosa é historiadora