• Miguel Tedesco Wedy
  • 06 Maio 2016

(Publicado originalmente em ZH 05/05/2016)

José Sarney assumiu o poder com a morte de Tancredo Neves. Padeceu sem legitimidade. Perdeu a guerra contra a inflação. Mas, aos trancos e barrancos, respeitou o processo constituinte e fez a transição democrática. Com seus muitos defeitos, deixou um legado: a democracia e a liberdade.

Itamar Franco assumiu sob os escombros do governo Collor. Demorou até acertar e enfrentar a inflação. Mas, enfim, apoiou com firmeza o Plano Real e deixou o seu legado: a sua integridade pessoal e um plano que domou a inflação. Fernando Henrique enfrentou crises internacionais, modernizou estruturas estatais com as privatizações, manteve o real e o controle da inflação. Deixou o seu legado: a estabilidade econômica.

Lula se elegeu com grande legitimidade popular e com desconfianças do mercado. Com notável sagacidade política, fez um ministério de respeito, deu autonomia prática ao presidente do Banco Central, enfrentou a crise de 2008, manteve a estabilidade e aprofundou os programas sociais, mesmo sem ofertar uma saída aos seus beneficiários. Saiu do governo com altos índices de popularidade. Teria deixado o seu legado: a inclusão social de milhões de brasileiros. Porém, cometeu o maior erro de sua vida: ungiu Dilma Rousseff como sucessora e continuou tentando governar, até solapar a sua própria reputação com as empreiteiras do "petrolão".

Em cinco anos, o governo Dilma destruiu aquele que seria o legado de seu mentor, atirou no desemprego mais de 10 milhões de brasileiros, descumpriu leis e mergulhou na corrupção. Mas não só, o desastrado governo ameaça os legados de Fernando Henrique e Itamar Franco, ao desconsiderar as regras mais comezinhas de racionalidade econômica. E, como se não bastasse, despreza o legado de 1988, ao instigar e fomentar, de maneira populista, ataques contra a liberdade de imprensa, o Congresso e o Judiciário, instituições essenciais para a democracia. A História registrará que o governo Dilma, embriagado de soberba e da ausência de compreensão do processo democrático, que exige o permanente e desgastante diálogo entre governo e oposição e entre o governo e seus próprios aliados, deixou apenas um trágico legado de cinzas. Será, talvez, o pior e mais irresponsável governo desde que o marechal Deodoro montou em seu cavalo e proclamou a República.
 

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  • André Burger
  • 06 Maio 2016

 

(O autor é membro do Grupo Pensar+. O texto foi publicado originalmente em pontocritico.com)

Detalhe: Burger escreve -dilma- sempre com letra minúscula. Eis:

CENÁRIO CALMO
O cenário dos investimentos no Brasil está calmo. Calmo até demais! Seja pela incerteza gerada por uma economia em recessão, seja pela expectativa da troca de governo, pois sai uma facção política que espantou os investidores, entra uma que pode, insisto no pode, atraí-los.

INCERTEZA E INSEGURANÇA
São dois os principais componentes para afastar investidores: a INCERTEZA e a INSEGURANÇA. Incerteza temos demais, principalmente com esta indefinição política. Insegurança, também estamos bem servidos. Seja econômica: qual a política fiscal, cambial e de juros de longo prazo? Seja jurídica: qual respeitabilidade aos contratos privados?

PRÓDIGO
O Brasil viveu, a partir do governo dilma, como um pródigo, gastando mais do que arrecadava e com políticas econômicas e sociais iguais ao do governo Lula, onde havia um superávit fiscal, mas as condições econômicas não se repetiram com dilma.
A consequência dessa política temerária foi um crescente endividamento público, que geraram os CRIMES FISCAIS, que os brasileiros acharam melhor chamar de -pedaladas fiscais-. O sinal de perigo para os investidores, notadamente os estrangeiros, foi a perda do tal grau de investimento. Ou seja, quem aqui investir reconhece que o risco é elevado. Somos terra para especuladores. Recuperar isso levará tempo.

O QUE ACONTECE?
O que acontece com a saída de Dilma e sua desastrada política econômica?
1- O Brasil não amanhecerá com suas contas em dia, num ambiente favorável aos negócios.
2- Ainda levaremos 107 dias para abrir uma empresa e 2.600 horas para cumprir as obrigações tributárias.
3- Os juros ainda serão elevados, contratar funcionários continuará oneroso e ainda seremos junk para os investidores internacionais.

INVESTIMENTOS
Investimentos, vale lembrar, são decididos com base nas expectativas de retornos futuros. O Brasil continua sendo uma economia grande com um enorme mercado consumidor. Um pouco empobrecido, é verdade, mas segue tendo um PIB superior a todos os demais países da América do Sul somados. O PIB de São Paulo equivale ao da Argentina. O do RS, a soma da Bolívia, Paraguai e Uruguai. Ou seja, há mercados e consumidores. Historicamente recebemos mais investimento estrangeiro, proporcionalmente ao PIB, que os demais países que formam o BRICS e isso desde 1996.
Conversando com investidores externos e gestores de fundos de investimento (private equity), suas expectativas estão alinhadas a esses parâmetros: potencial do Brasil a longo prazo, o tamanho do mercado brasileiro e as vantagens comparativas frente a outros países e regiões, especialmente no agronegócio. Ou seja, há uma potencial reversão da situação de investimento privado no Brasil. Em o próximo governo garantindo os 3 Cs: coerência, constância e comprometimento, é viável uma retomada do investimento e do crescimento.

Mas isso é o setor privado. Pelo lado do governo, uma retomada dos investimentos deverá demorar muito mais. Até porque o endividamento do setor público (União, estados, municípios e as empresas estatais) atingiu um nível tal que não há como promover qualquer investimento.

Se o governo pós dilma for minimamente responsável deverá reduzir as despesas correntes antes de se aventurar novamente a promover investimentos. Decorre daí um cenário auspicioso: a falta de recursos do governo pode obrigá-lo a privatização e orientar menos os investimentos através dos bancos públicos, cabendo ao setor privado com sua lógica de mercado investir.

Essas duas ações levam-nos a investimentos de acordo com o que o mercado busca, portanto, em caso de prejuízo, o ônus não é dos pagadores de impostos.

Devemos, naturalmente, vigiar atentamente o novo governo. A tentação de se tornar populista, emitir moeda, criar déficits fiscais é sempre muito grande. Soma-se a isso que a futura oposição, que se não é majoritária, sabe armar protestos, fazer barulho e cuspir.

Vimos que o caminho para uma economia estável é demorado e difícil. Quantos anos levamos para conquistar o tal grau de investimento e quão rápido foi perdê-lo. Ou ainda, em apenas 15 anos um país rico, a Venezuela, se torna um dos mais pobres da América Latina. Ou seja, o desvio para o fracasso é rápido. Imaginar que o governo é a solução, apenas precipita isso.

 

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  • Everardo Maciel
  • 05 Maio 2016

 

(Publicado originalmente no Diário do Poder)

O governo de Michel Temer enfrentará grandes turbulências, enquanto perdurar o julgamento do impeachment no Senado.

Qualquer erro será fatal, tendo em vista que, a despeito do afastamento da Presidente Dilma, os partidos que a apoiam e suas linhas auxiliares farão uso de qualquer meio, sem nenhum limite, para incomodar a interinidade de Temer.

Algumas sugestões ao novo governo: a) é indispensável a consciência que se trata de uma transição, sob pena de não conseguir aglutinar o indispensável apoio político; b) as ações devem, em primeiro plano, ter em conta a superação dos grandes problemas conjunturais e somente tratar das questões estruturais, quando reunir suficientes credibilidade popular e apoio político, ainda assim sem pretensões megalomaníacas que podem suscitar conflitos de razão; c) apoiar ostensivamente a Operação Lava-Jato, sem dispensar iniciativas próprias de investigação de outros focos de corrupção; d) anunciar disposição de colaborar na resolução da crise fiscal dos Estados e Municípios, cuja dramaticidade é tamanha que tem sido capaz de interromper o pagamento dos aposentados e o funcionamento da rede pública de saúde; e) ampla divulgação dessas medidas, com absoluta transparência.

A transição não será bem-sucedida, entretanto, sem o imediato enfrentamento da crise fiscal, cuja verdadeira dimensão somente será conhecida depois de contabilizadas as medidas irresponsáveis, adotadas nos estertores atual governo, e identificados os esqueletos fiscais espalhados nos bancos oficiais e empresas estatais.

Nesse enfrentamento, há os que se apressam em proclamar a inevitabilidade do aumento de tributos, no pressuposto de que gastos obrigatórios inviabilizam a redução de despesas.

A obrigatoriedade das despesas, entretanto, não decorre de édito divino ou de cláusula pétrea constitucional, mas de normas sujeitas à revisão.

Alega-se que é difícil, politicamente, proceder-se à revisão da obrigatoriedade. Retruco dizendo que essa dificuldade política também se aplica à elevação de tributos.

A Desvinculação de Receitas da União (DRU), como prevê emenda constitucional prestes a ser promulgada, é um exemplo de que é possível afastar-se a obrigatoriedade.

Outra providência recomendável seria a vedação à indexação de gastos sociais ao salário mínimo, o que facultaria uma maior focalização na atenção à pobreza.

Há, além disso, gastos não obrigatórios que poderiam ser reduzidos ou eliminados, a exemplo das verbas de publicidade, subsídios a forças auxiliares de partidos políticos - autodesignadas "movimentos sociais" -, cancelamento de restos a pagar de despesas não executadas, fechamento de representações diplomáticas sem relevância política ou econômica, etc.

Ainda com o objetivo de reduzir despesas, deveria ser implementado um programa de eficiência na administração pública, tendo como símbolo inicial a redução do número de ministérios.

A alienação de participações acionárias em empresas públicas, a intensificação das concessões e permissões em projetos de infraestrutura, e a revisão das regras de exploração do pré-sal são medidas que produzem receitas e dinamizam a economia.

Os incentivos fiscais devem ser reavaliados, inclusive para detectar os previsíveis casos de corrupção.

Na União, os créditos inscritos em dívida ativa se elevam a R$ 1,4 trilhão, aos quais se acrescentam R$ 590 bilhões em discussão administrativa.

Não parece crível que não se possa conferir liquidez a 10% desse montante, o que implicaria resolver o déficit fiscal deste ano. Para isso é necessário recorrer a soluções não convencionais, como transações que envolvam a construção de regimes tributários de transição ou o perdão de multas, condicionado a um bom comportamento fiscal futuro.

A lei relativa à regularização de ativos no Exterior é complexa, tem vícios de inconstitucionalidade e traz insegurança para os virtuais destinatários, em desfavor da expectativa de receitas extraordinárias. Não hesitaria em refazê-la integralmente, em regime de urgência.

Everardo Maciel foi secretário da Receita Federal.

 

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  • Prof. Paulo Moura
  • 05 Maio 2016


(O autor é membro do grupo Pensar+. O texto foi publicado originalmente em pontocritico.com).

Na política, a expressão “lua de mel” caracteriza o período imediatamente após a eleição de um governante, momento em que as expectativas do eleitorado, mesmo da fatia que não votou no eleito, focam-se no desejo de que o governo dê certo, pois isso viria em benefício de todos. Assim, o eleito ganha um “crédito” para tomar as medidas sem ser cobrado por resultados imediatos, permanecendo um tempo em “estado de observação”.

A duração desse clima varia conforme a capacidade de o governante acertar, produzindo resultados positivos que correspondam à expectativa gerada. Se errar encurta ou interrompe a lua de mel e começa a sofrer adversidades políticas. No caso de Temer, fatais. Daí o título: Lua de Mel de Motel.

As circunstâncias que limitam de forma extrema a latitude e o tempo de Temer para agir sem espaço para errar são de natureza política e econômica.

Do ponto de vista político é inescapável constatar que o PMDB é sócio do desastre produzido pelo PT. Além disso, Temer, vice de Dilma, tem o nome citado em delações da lava jato e herda significativas desconfianças. Inevitável desconhecer, também, o processo que tramita no TSE contra a chapa Dilma/Temer, que, se prosperar, terá o poder de abreviar seu já breve mandato. Pobre Brasil.

Convém ter em conta que boa parte das medidas necessárias para correção estrutural da economia têm potencial de municiar a oposição de esquerda recém desalojado do governo, com um discurso e com um poder de mobilização que, se não forem neutralizados, liquidam Temer na largada.

Do ponto de vista econômico as dificuldades não são menores. Segundo o especialista em contas públicas, Mansueto Almeida no Painel Globonews desse fim de semana, nosso rombo fiscal é de R$ 120 bilhões sem considerar-se os juros da dívida, e de R$ 640 bilhões se incluído esse custo. Para ele, será necessário reduzir o custo da dívida em cerca de R$ 250 bilhões em cerca de dois anos e meio para voltarmos a ter sustentabilidade.

Nessa conta, não estão incluídos os aportes de capital do Tesouro nas estatais. No caso da Petrobrás o aporte poderá girar acima de R$ 70 bilhões, sem considerar o impacto das condenações da petrolífera na Justiça dos EUA, estimados em US$ 98 bilhões a serem desembolsados em cerca de dois anos. Há rombos ainda não estimados na Eletrobrás, na CEF, no BB e no BNDES, que somente serão conhecidos após auditoria que Temer vem anunciando.

Mansueto Almeida sustenta que não vê como inverter esses números apenas cortando gastos e sem aumentar a carga tributária. Eduardo Gianetti alegou que não temos fôlego para mais impostos. Zeina Latif contestou Mansueto. Ela acha que se Temer conseguir criar expectativas positivas invertendo a direção do vento na largada, cria-se um cenário de curto prazo capaz de ampliar a latitude de jogo e dilatar o espaço de tempo que Temer teria para sua lua de mel com o eleitorado. Concordo. Essa equação é política, portanto. Sem sintonia fina com a opinião pública e o mercado nada dará certo. A condução que Temer está dando ao processo revela que ele tem consciência disso e condições de acertar.

A primeira decisão a tomar é com relação à equação do ajuste, com ou sem aumento de impostos. Mansueto alega que mesmo com aumento, se conseguirmos reequilibrar as contas, chegaremos em 2018 no patamar em que estávamos em 2011. Bem, a pergunta que não lhe foi feita é: dada a asfixia fiscal atual dos pagadores de impostos e conhecido o impacto da chamada curva de Laffer, extorquir ainda mais os produtores de riqueza aumentará a arrecadação? Intuo que o resultado será o inverso.

Não sou economista, mas, acrescento que um eventual aumento de impostos também tirará de Temer apoios imprescindíveis (da classe média que foi às ruas e da FIESP, por exemplo), já na largada. Se eu fosse conselheiro do rei, diria: não faça! Sua credibilidade e seu apoio popular atuais não comportariam essa perda imediata, cujos ganhos de médio prazo são, no mínimo, duvidosos.
Onde há oxigênio? Na atração de capitais externos. Exceto pelo petismo, que não conta, parece haver consenso sobre essa alternativa: privatizar e flexibilizar os marcos regulatórios tornando as concessões de portos, aeroportos, estradas, ferrovias, energia, exploração de petróleo e tudo o que puder atrair investidores de forma agressiva. Em sentido oposto às concessões tardias e fracassadas de Dilma, é preciso acenar com rentabilidade e segurança jurídica aos investidores, mesmo que o Brasil esteja barato.

O caso do petróleo é emblemático dado o prazo de validade dessa matriz na economia mundial e a queda do preço que tornou os investimentos menos interessantes. Além de desfazer o que o PT fez no pré-sal, talvez seja necessário flexibilizar mais, até mesmo o marco regulatório tucano para as demais áreas de exploração, tornando o investimento atraente ao pondo de interessar potenciais investidores que já perdemos para outros competidores (México, por exemplo).

O agronegócio, maltratado pelo petismo, é outro setor que demanda um carinho especial e que, pela competitividade combinada ao real desvalorizado, se incentivado com medidas corretas, pode atrair divisas com rapidez.

Medidas como essas, mesmo que anunciadas e implementadas em curtíssimo prazo, requerem algum tempo para produzir efeitos, ainda que na frente externa já estejamos colhendo os frutos da desvalorização do real. Mais uma vez, o que se espera desse tipo de medida não é o resultado econômico imediato, mas sim a reversão de expectativas visando reconstituir o otimismo.

Conviria a Temer fazer acompanhar essas medidas de máxima publicidade às descobertas que virão à tona sobre o descalabro da gestão pública sob desmando petista. O objetivo aqui seria mais o rebaixamento de expectativas visando ampliar o crédito para aceitação de medidas incontornáveis como corte de gastos. A virtual sensação de alívio posterior, ainda que psicológica, seria mais facilmente sentida pela população quando o resultado positivo começar a acontecer, tanto mais quanto mais grave for percebida, agora, a herança maldita do PT.

Supondo-se o sucesso inicial na direção aqui apontada e tirado o paciente da UTI para a sala de recuperação, haveria condições para avançar medidas estruturais incontornáveis como a Reforma da Previdência? No curto prazo? Nem pensar! Se não vejo como aumentar impostos sem atrair a ira das ruas, muito menos mexer nas aposentadorias. Nesse terreno, o máximo que dá para fazer é aprofundar o debate sobre a gravidade da situação, preparando o terreno para medidas futuras. Não esqueçamos que Temer já é acusado de querer cortar os gastos sociais que Dilma está cortando. Esse ônus já está precificado e é inescapável.

Onde antevejo margem para alguma alteração estrutural capaz de ser assimilada sem maiores resistências e com potencial sobre a geração de empregos é na medida que prevê a sobreposição à Lei dos acordos trabalhistas entre empregados em empregadores, trocando preservação ou geração de empregos por redução de custos de contratação e demissão. A Justiça Trabalhista (absurdo!), tem anulado esse tipo de acordo alegando desrespeito à legislação. Dado o cenário de recessão e desemprego, há espaço para avanços nessa área, sem que o debate se perca na chicana das desonerações seletivas implementadas pelo PT e anuladas pela própria ineficácia e obtusidade da ótica econômica petista.

Assim, passo a passo, testando cada possibilidade antes de agir, medindo no milímetro o eventual avanço e o microcrédito político conquistado junto à opinião pública e o mercado no curtíssimo prazo, Temer poderia ir criando as condições para algumas ousadias moderadas à medida em que, se acertar mão, o povo for lhe concedendo a possibilidade de curtir mais algumas noites no motel. O povo, em seu próprio benefício, deseja que Temer acerte. O Brasil precisa que Temer acerte.

Assim agindo fecharemos as contas das planilhas de Mansueto Almeida? Não sei. Mas, a Economia e a Política são ciências do comportamento. E, para fechar as contas nessa matemática política, impõe-se criar um ambiente favorável para que os especialistas em planilhas trabalhem em condições de conduzir os números ao devido lugar.
 

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  • Ives Gandra da Silva Martins
  • 03 Maio 2016


(Publicado originalmente no Estadão de 02/05/2016)

Em meus artigos, raramente falo de pessoas, preferindo discutir ideias, em uma democracia em que o contraditório é a constante. Todos os políticos que defendem “teorias abrangentes e excludentes de outras” são vocacionados à ditadura. Os que defendem “teorias não abrangentes e sujeitas ao debate” têm vocação para a democracia, como expunha John Rawls, em sua obra “Justiça e Democracia”.

Em meu livro “Uma breve teoria do poder”, mostro que as democracias crescem com oposições fortes, que limitam o nível de arbítrio dos detentores do poder. Quando são fracas, aqueles que governam tendem a tornar-se ditadores, como vimos com Fidel e Raul Castro, ditadores declarados, e seus aprendizes, Chavez, Morales e Correa. Não cuido de Maduro, pois sua incompetência e vocação ditatorial são tão desastradas, que conseguiu arrasar a terceira economia da América do Sul. É assegurado no poder, apenas por força de um Judiciário fantoche, formado na undécima hora para enfraquecer o Legislativo eleito.

A presidente Dilma, que sempre esteve fascinada pela mais sangrenta ditadura das Américas (Cuba) e por tiranetes dos países bolivarianos, tem, ultimamente, após ser fragorosamente repudiada pelo Legislativo popular - a Câmara é Casa do Povo, e não o Senado -, reiterado que “impeachment” é um golpe.

É de se lembrar que o Senado é a Casa da Federação, ou seja, da representação dos Estados. Por isto, os eleitores votam em um ou dois candidatos. Para Câmara, não. Há uma variedade enorme de opções. O próprio Senado surgiu, nos EUA, por imposição das Colônias do Sul, a fim de impedir a abolição da escravatura, que poderia ocorrer pela maior população do Norte, se houvesse uma única Casa Legislativa. Uma Casa em que a representação de cada Colônia fosse idêntica, independentemente da população, permitiu a promulgação da Constituição de 1787 e a ideia de uma Confederação de 13 países foi substituída por uma Federação de 13 Estados. Os Estados do Sul conseguiram, assim, atrasar em 80 anos a abolição da escravatura.

Ora, após sua fragorosa rejeição por mais de 70% na Câmara dos Deputados, representantes reais do povo, as declarações da presidente, de rigor, transformam-na em golpista contra as instituições brasileiras. Foi vencida, tendo a Câmara seguido, sem qualquer alteração, o rito definido pelo Supremo Tribunal Federal. Entende, agora, que o Supremo Tribunal Federal e a Câmara dos Deputados foram golpistas!!! A conclusão é que seu próprio criador, o ex-Presidente Lula, foi, em sua peculiar visão, também golpista, quando liderou o “impeachment” do Presidente Collor. Hospeda, por outro lado, a tese de que a Constituição Brasileira teria 248 artigos democráticos e dois golpistas, ou seja, os artigos 85 e 86. Para a Presidente da República, o Supremo Tribunal Federal é golpista, por cumprir a Lei Maior. Mas ela não o é, apesar de pretender desmoralizar os outros dois Poderes da República.

Vejamos porque é golpista a Presidente. Em primeiro lugar, deu um golpe na nação, ao mentir espetacularmente na campanha eleitoral, alardeando que o país estava bem em 2014, quando já estava falido. Este estelionato eleitoral permitiu que, por margem mínima de votos, superasse seu opositor, que teve quase os seus 54 milhões de votos. A mentira presidencial, desventrada nos primeiros dias de seu segundo governo, tornou-se mais clara, quando o Tribunal de Contas descobriu as pedaladas fiscais, que mascararam, no ano eleitoral, o orçamento. Feriu, pois, os artigos 165 a 169 da Lei Suprema e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mentiu para os eleitores que as contas públicas estavam sob controle, quando já estavam absolutamente desorganizadas.

Deu, também, um golpe na economia. Em seu desastroso governo, prevê-se queda de 10% do PIB, nestes dois primeiros anos. Um outro golpe foi desferido no controle inflacionário, permitindo que a inflação chegasse a 10%. Deu ainda golpe fatal no emprego, gerando 10 milhões de desempregados. Na sequência, deu um golpe no dinheiro dos contribuintes, ao permitir que seu governo fosse o mais corrupto da história do mundo. Deu, por fim, um golpe na credibilidade de seu cargo, ao prometer juros baixos e mantê-los em nível que consome mais de 500 bilhões de reais por ano, para seu giro. O mais grave, todavia, reitero, é o golpe às instituições, ao desqualificar a atuação da Suprema Corte e do Parlamento brasileiro, chamando-os de golpistas. Neste quadro, o que torna o golpe pior no comportamento da Presidente, é procurar enganar governos de outros países - como enganou o eleitor, em 2014 - na busca de apoio de outras nações às suas teses insubsistentes. Pretende que governos bolivarianos imponham sanções ao Brasil. Apenas estes dados são suficientes para mostrar que, se seu “impeachment” não passar, não terá a menor condição de governar. Seu espírito guerrilheiro do passado, em que pretendia uma ditadura cubana para o Brasil, parece renascer. Felizmente, começa a ser impedida pela Casa do Povo. Se sobreviver ao “impeachment”, levará a nação ao mesmo destino da Venezuela.

Mas, as instituições estão funcionando no país, e o golpe institucional, econômico, político que pretende dar está sendo barrado pela Suprema Corte e pelo Congresso Nacional. Nada obstante a crise provocada por seu deletério e corrosivo governo, elas continuam funcionando bem. Nenhum destes Poderes é golpista. O Brasil possui uma Lei Suprema, que tem sido valorizada pelos Poderes Judiciário e Legislativo. Merecem, todavia, seus atos e declarações serem examinados à luz da Lei 7.170/83, que cuida dos crimes contra a segurança nacional. Pode ter incidido em alguns deles. Parece-me, pois, que a Presidente Dilma é a única verdadeira golpista contra as instituições.
 

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  • João Cesar de Melo
  • 03 Maio 2016

 

(Publicado originalmente em http://www.institutoliberal.org.br/

Talvez a maior de todas as falácias ruminada pelos socialistas seja a que diz que desigualdade é um mal em si mesmo e está diretamente relacionada à pobreza.

Da revolução comunista até o final da década de 1970, a China foi um país extremamente igualitário. Tão igualitário quanto a atual Coreia do Norte. O governo protegia a população das “desgraças” do capitalismo, mas não da fome. Pesquisadores apontam algo entre 40 e 100 milhões de mortes por inanição naquele período. O cenário começou a mudar logo depois que o capetinha capitalista assoprou no ouvido dos líderes chineses, aconselhando abrir o mercado, reestabelecer o direito a propriedade privada e ao lucro. De lá pra cá, 800 milhões de chineses saíram da pobreza.

Pergunto: Devemos preferir a igualdade que vigorava antes da abertura de mercado na China ou a desigualdade que veio depois?
Façamos, então, a clássica comparação entre os Estados Unidos e Cuba.
Os americanos vivem imersos na desigualdade. Os ricos moram em pequenos palácios, ostentam joias e carros de luxo, vestem roupas de grife, jantam em restaurantes chiques. Muitos ganham milhões de dólares por ano. Alguns acumulam bilhões em fortuna.
Trabalhando para eles está a grande parcela da população que é identificada como pobre, o que significa, de acordo com os critérios americanos, uma pessoa com renda anual abaixo de US$ 11 mil – lembrando que o Banco Mundial identifica como pobre quem ganha menos de US$ 400 por ano. Nos Estados Unidos, profissões pouco glamorosas como pedreiro, manicure e faxineira rendem de US$ 3 mil a US$ 4 mil dólares por mês e é considerada de classe média a pessoa com rendimentos anuais entre US$ 50 mil e US$ 500 mil, grupo que representa 37% da população.
Segundo a Heritage Fundation, 99% dos americanos residem em bairros com infraestrutura e saneamento completos, 95% têm televisão; 92% têm forno-microondas, 88% têm telefone; 71% têm automóvel, 70% têm ar condicionado/aquecedor, mais de 60% têm TV a cabo e 42% moram em residências próprias.

Na desigualdade americana, assim como na de qualquer país desenvolvido, o pobre só não tem condições de usufruir do luxo e das extravagâncias dos ricos. Um balconista não ganha o suficiente para ter um Porsche.
Vejamos o grande modelo de igualdade social na América Latina. Em Cuba, a maioria da população usufruiu de um mesmo padrão de vida. O governo oferece a todos os cidadãos péssimas moradias, péssima infraestrutura urbana, péssimas escolas, péssimos hospitais, péssima alimentação e o mesmo programa cultural moldado pela ditadura. Quase não há diferença salarial entre as profissões. Um médico ganha menos de US$ 50 por mês, o que não lhe dá condições de ter a grande maioria dos itens que compõem a vida de um favelado brasileiro. Um ventilador é artigo de luxo na ilha.

Estou enrolando. Eu poderia citar apenas o índice GINI, que mede a desigualdade no mundo. Nele, fica explícito que a desigualdade não representa necessariamente pobreza. No índice, o Timor Leste é tão desigual quanto o Canadá, o Iraque é tão desigual quanto a Coreia do Sul, a Guiné-Bissau é tão desigual quanto a Nova Zelândia e a Nicarágua é tão desigual quanto os Estados Unidos.
Precisamos compreender alguns pontos sobre a desigualdade:
1 – Diversidade cultural.
Nas profundezas do índice GINI vemos que das quinze cidades mais igualitárias do Brasil, doze são gaúchas e de origem alemã, com índices semelhantes aos da Dinamarca. Essa constatação repete-se ao compararmos os índices do interior do nordeste brasileiro com o do Japão. Isso indica que um povo moldado por uma mesma cultura tende à igualdade. Não por acaso, as cidades mais desiguais são aquelas que acolhem os maiores níveis de diversidade cultural e religiosa.

2 – Contrastes urbanos.
Ao contrário do que a mídia e a militância socialista tentam nos fazer crer, as imagens de favelas logo ao lado de condomínios de classe média-alta revelam que os pobres estão melhorando de vida. “As cidades não criam pobres. Elas atraem pobres, (…) justamente porque fornecem o que eles mais precisam — oportunidade econômica”, diz o Edward Glaeser, professor de Harvard, especialista em economia das cidades. O que o economista quer dizer é que o estilo de vida dos mais ricos sustenta a rede de empregos que possibilita que pessoas deixem os bolsões de extrema miséria do interior para viverem numa pobreza urbana que pode lhe alçar a uma condição de vida melhor na medida em que migram de um emprego para outro.
Eu, particularmente, conheço muitas pessoas que percorreram esse caminho, dentro e fora de minha família.

3 – O papel do estado.
Marcelo Medeiros e Pedro Souza, ambos do Ipea, publicaram em 2013 a pesquisa Gasto Público, Tributos e Desigualdade de Renda no Brasil, na qual analisaram todas as movimentações financeiras do governo e calcularam o impacto delas no coeficiente de Gini brasileiro. Concluíram que um terço da desigualdade é diretamente relacionada ao pagamento de benefícios do funcionalismo público. Como o maior peso dos impostos incide sobre a produção e o consumo, os mais pobres acabam sustentando os altos salários e as aposentadorias especiais de uma verdadeira classe de privilegiados.

A concessão de estabilidade de emprego e de patrocínios a projetos culturais também contribui com a desigualdade, pois oferece a determinados grupos uma renda sustentada por todo o resto da sociedade, a despeito de quaisquer circunstâncias econômicas.

4 – Incentivos econômicos.
Os empréstimos especiais que os governos destinam aos grandes empresários não apenas encarecem o empréstimo para os pequenos, mas alimentam a dependência de setores da economia. Essa foi a essência da política econômica do governo petista.

5 – Regulações de mercado.
Todos os carteis e monopólios são protegidos por leis que beneficiam os empresários já estabelecidos no mercado enquanto dificultam a inserção de outros. Ao sustentar o cartel dos taxistas, por exemplo, o governo dificulta que uma massa de pessoas se inclua no mercado.

O fato ignorado sistematicamente pela mídia é que a pobreza está sendo diminuída com cada vez mais velocidade e que não são governos, nem ações humanitárias, nem os discursos socialistas os responsáveis por isso. Quem está acabando com a pobreza é o mercado. Pessoas e empresas visando o lucro fazendo chegar produtos e tecnologias aos lugares mais distantes. Na África, como já escreveu a documentarista queniana June Arunga, enquanto os governos não exercem as funções que eles mesmos se dão, os “malditos” capitalistas fazem chegar aos africanos computadores, celulares, internet, geladeiras, aparelhos eletrônicos, geradores de energia, motores de barcos, máquinas, ferramentas, motocicletas, automóveis e materiais de construção que, em conjunto, é o que vem permitindo que milhões de africanos empreendam pequenos negócios e se afastem da miséria.

É sempre bom nos lembrar do resultado da pesquisa feita pela ONG Data Favela (e que já foi tema de outroartigo), na qual 96% dos moradores das 63 favelas pesquisadas afirmam que NÃO foi o governo o responsável pela melhoria da qualidade de vida. Para 14%, a família foi a causa, para 40% foi Deus o responsável e para 42% a melhoria de suas vidas foi obra tão somente de seus próprios esforços.

Aos que gostam de citar o pequeno grupo de pessoas que concentram a maior parte da riqueza mundial, lembro que apenas um terço delas herdou sua fortuna, a outra parte construiu por si mesma; e também que esta mesma lista mostra-se diferente de década em década, demonstrando mobilidade até entre os bilionários. Dez anos atrás, Eike Batista despontou com um dos homens mais ricos do mundo. Onde ele está agora?

A mensagem que o desenvolvimento humano deixa é muito clara: Quanto mais liberdade as pessoas tiverem para comercializar seu tempo, seu trabalho e seu talento, mais elas se distanciarão da pobreza.

 

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