• Luciano Pires
  • 01 Novembro 2016

(Publicado originalmente em http://www.portalcafebrasil.com.br/artigos/)


Assombrados com as cifras dos escândalos de corrupção e com aquela provinciana incapacidade de enxergar o que não se vê, os brasileiros contabilizam os prejuízos da gestão Lula/Dilma em números. Quantos bilhões foram desviados e perdidos, quantos milhões de desempregados, quantos bilhões devemos, etc. Só focamos naquilo que é possível representar em números, que não conseguem traduzir a complexidade de nossas vidas.

No Brasil, paralelamente ao desmanche fiscal, organizacional e institucional, sofremos ao longo dos últimos 13 anos (sejamos justos vá… foram 50 anos) um processo de lavagem cerebral quase imperceptível, que ganhou a superfície com a ascensão de Lula ao poder e, junto com ele, o que um dia chamei de “mínimo divisor comum”, um pastiche ideológico que nivela tudo pelo menor, mais baixo, mais ignorante, mais miserável. Foi a isso que chamei de “lulificação”.

Pronto. Caiu o disjuntor? Começou a gritar “e os outros partidos”? Fique calmo. A lulificação não tem a ver com o indivíduo Lula, mas com aquilo que ele representa: a ascensão de uma certa linha de pensamento ao poder, que trouxe para o primeiro plano e institucionalizou a cultura do “dá pro gasto”, da malandragem, da mentira e da esperteza. Que plantou a cizânia, que desdenhou do ensino e da cultura e rotulou de “elite” tudo aquilo que ultrapassasse o mínimo divisor comum, o medíocre. Se você hoje falar em “alta cultura” é imediatamente taxado de elitista, para usar o rótulo mais leve. Reduzimos nosso consumo cultural à baixeza em todos os segmentos, e resultado se vê por todos os lados. O que temos a oferecer para um dueto com Andrea Bocelli, por exemplo, são… Paula Fernandes e Anitta. Afinal, “dá pro gasto”, não é?

E assim nos contentamos com serviços medíocres, filas quilométricas, burocracia, incompetência, corrupção e falta de produtividade. Nos resignamos com os políticos que temos, há até quem defenda os que roubam em nome da “causa” ou do partido.Medimos a educação pela quantidade de escolas, de salas de aula, de professores e de alunos matriculados. Qualidade da educação? Ah, como você é chato! Discutimos o país exclusivamente pela ótica da economia. Leis são manipuladas pelos que deveriam por elas zelar, a corrupção é parte de nosso dia a dia, cada um quer tirar sua casquinha com o “tudo bem se me convém”. Na mídia, só damos audiência para gente em situações constrangedoras. O que são as pegadinhas, as videocassetadas, os masterchefs e os reality shows, afinal? Aplicando nosso tempo e energia na discussão de temas menores, não nos escandalizamos com 60 mil mortos por ano, todo ano, e, sem um norte moral, transformamos em herói o faxineiro que devolve a carteira perdida.

Desaprendemos a ler nas entrelinhas, a entender uma ironia, a apreciar um desafio intelectual. Não sabemos mais o que significa “opinião” e o grande argumento nas discussões é o kkkkkkkkkk. Comediantes limitados se tornam colunistas fracos e entrevistadores medíocres. E o pior: ganhamos palanques onde podemos expor, sem qualquer pudor, nossa ignorância e imbecilidade em público. As áreas de comentários das mídias sociais são o horror intelectual materializado.

E quem reclamar é taxado de fascista por quem não sabe o que quer dizer fascista.

Enfim, é nisso que a lulificação nos transformou: no país do “dá pro gasto”. O resultado pode ser apreciado em todas as áreas de atividade, do desastre ambiental à ciclovia que cai, da perda do grau de investimento aos 7 x 1 para a Alemanha. Nada disso foi por acaso, nada disso é acidente. São sintomas de um meticuloso trabalho de mestrado de obra social.

Precisamos virar a página, exorcizar Lula e seus fantasmas, como já fizemos com Dilma, e exigir mais, muito mais dos que aí estão.

A lulificação do Brasil é a verdadeira herança maldita, que precisará de muito, mas muito mais que um ajuste fiscal ou meia dúzia de bandidos na cadeia para ser vencida.

Que Deus nos ajude.

 

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  • Felipe G. Martins
  • 01 Novembro 2016

 

Não há modo mais rápido de quebrar as defesas mentais de uma pessoa, ou de uma sociedade inteira, do que aquilo que psicólogos behavioristas chamavam de estimulação contraditória. Sabendo disso e não tendo qualquer escrúpulo que pudesse limitá-la, a esquerda sempre apostou nesse mecanismo para avançar sua agenda cultural e conquistar mentes e corações, mas, com o advento do pós-modernismo e com a elevação do relativismo ao status de verdade última, o discurso esquerdista abandonou qualquer traço de coerência e partiu para a esculhambação total. Considerem alguns exemplos:

— Por um lado, não existe verdade e tudo é relativo; por outro, o relativismo é uma verdade que não pode ser contestada.

— Por um lado, todas as culturas são iguais e não há expressão cultural superior ou inferior; por outro, a cultura ocidental é maléfica, tóxica e a fonte de tudo o que há de errado com o mundo.

— Por um lado, valores são subjetivos e não há verdades morais; por outro, os valores tradicionais cristãos representam tudo o que há de preconceituoso e devem ser rejeitados a todo custo.

— Por um lado, a tolerância e a diversidade são boas; por outro, conservadores e qualquer um que ouse discordar da esquerda não devem ser tolerados.

Como podem notar, há um padrão aqui: ao subjetivismo e ao relativismo se segue alguma forma de absolutismo dogmático. O resultado disso é que, de um lado, todos os alicerces tradicionais da civilização são corrompidos e, de outro, os valores da esquerda são fixados — de forma quase inconsciente — como valores incontestáveis, como premissas ocultas das quais qualquer pessoa deve partir em seu discurso público. Sem tomar consciência desse mecanismo e desmascará-lo, a civilização estará fadada à ruína e todos nós seremos sufocados numa atmosfera turva de confusão, impotência e obediência servil. Eis o inimigo contra o qual lutamos.
 

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  • Alexandre Borges
  • 30 Outubro 2016

(Publicado originalmente na revista Vila Nova)

Esqueça o que disse aquele programa do SBT, Pedro II foi o maior brasileiro de todos os tempos.

Em 58 anos como imperador, desde a abrupta renúncia do pai quando tinha apenas 5 anos de idade até a destituição em 1889, Pedro II transformou um amontoado de vilarejos numa nação livre, próspera e exuberante. Sob qualquer ponto de vista, o Brasil parecia destinado a ser uma das principais nações do mundo ao final do séc. XIX. Pouco mais de cem anos depois, fica claro que o país saltou na estação errada do trem da história e não dá sinais de que tem qualquer idéia do que aconteceu e, principalmente, de como embarcar de novo.

O improvável imperador que foi admirado por Graham Bell, Charles Darwin, Victor Hugo e Friedrich Nietzsche, além de amigo de Richard Wagner e Louis Pasteur, era herdeiro do mulherengo e brigão Pedro I, que frequentava tabernas como o Henrique V de Shakespeare (havia até um Falstaff real, o Chalaça). Pedro II era o oposto do pai e, ao que tudo indica, uma cópia fiel da sua sofisticada e elegante mãe, a austríaca Maria Leopoldina, da casa dos Habsburgo, a família imperial que reinou por 700 anos na Áustria, o que incluiu o Sacro Império Romano-Germânico e o Império Austro-Húngaro. Maria Leopoldina foi também cunhada de Napoleão Bonaparte.

Maria Leopoldina foi desprezada por Pedro I e a causa da morte desta culta e cosmopolita imperatriz de uma das mais importantes famílias reais da Europa, grávida e aos 29 anos, ainda é controversa. Depois de 200 anos de rumores e polêmicas, seu corpo foi exumado por legistas da USP e o homicídio culposo, devido a uma agressão física atribuída ao imperador, foi descartado pelos legistas.

Mesmo que a causa direta da morte de Maria Leopoldina seja uma doença, o tratamento brutal e o assédio moral constante de Pedro I, as agressões verbais e as humilhações públicas com certeza não ajudaram seu estado de saúde. Durante as poucas semanas em que tivemos uma Habsburgo regendo o país, o Brasil se tornou independente de Portugal por um decreto assinado por ela em 2 de setembro de 1822. O marido foi avisado por carta em viagem à São Paulo e proclamou a independência cinco dias depois.

 Pedro II foi um monarca que deu uma amostra do que o país poderia ser se tivéssemos instituições e governança de inspiração conservadora ou liberal como as principais civilizações do Ocidente. Sob qualquer aspecto, seu longo mandato não deixa a desejar a qualquer um dos grandes estadistas do mundo contemporâneo e é uma lástima as escolas não darem ênfase suficiente a um dos poucos acertos da história do Brasil.

Preparado para governar desde a primeira infância, Pedro II pegou uma nação em frangalhos e devolveu uma das mais vibrantes, prósperas e livres do planeta. Cento e vinte e cinco anos depois da sua deposição, é preciso entender o que deu tão errado para que o Brasil se tornasse o constrangimento político, econômico e social que é hoje.

Os EUA enfrentam sérios problemas econômicos, mas a nação mais próspera e livre que a humanidade conheceu ainda não tem do que se envergonhar quando comparada às outras. Um americano que nasce hoje entre os 20% mais pobres do país tem mais chances de terminar entre os 20% mais ricos do que se manter onde está. Se um americano tem pelo menos o segundo grau, é casado e teve o primeiro filho dentro do casamento, sua chance de ser pobre é de apenas de 2%. Com apenas 5% da população do planeta, os EUA produzem mais de 20% do PIB mundial. Depois de mais de trinta anos importando princípios econômicos ocidentais e com mais de um quinto da população do mundo, a China não chega a produzir 10% da sua riqueza. É uma diferença abismal e que ainda não dá motivos para que os antiamericanos comemorem o fim da civilização ocidental.

Com três mandatos presidenciais consecutivos do PT, o Brasil está numa situação pouco invejável. Nos últimos quinze anos, o país despencou no índice de competitividade global da 34a posição para a 51aentre 60 países avaliados pelo Institute for Management Development (IMD), uma vergonha. No mais importante ranking de liberdade econômica que existe, da Heritage Foundation com o The Wall Street Journal, o Brasil está na 100a posição entre 177 nações medidas e foi classificado como “majoritariamente sem liberdade”, a segunda pior classificação possível.

É desnecessário repetir a relação entre liberdade econômica e prosperidade, basta consultar a própria pesquisa anual da Heritage Foundation para ver a razão direta e auto-evidente entre a lista dos países mais livres economicamente, com ênfase no império das leis, combate à corrupção, menos gastos governamentais e respeito aos direitos de propriedade, com o crescimento do poder de compra dos cidadãos, PIB per capita, investimentos externos e erradicação da pobreza.
Há explicações para todos os gostos sobre o que faz uma nação prosperar. Para o historiador escocês Niall Ferguson, seriam seis fatores: livre concorrência, compromisso com a inovação e a pesquisa científica, respeito à propriedade privada, medicina de ponta, economia estimulada pelo consumo e ética “protestante”, na visão weberiana, do trabalho. Para o escritor indiano Ibn Warraq, o que viabizou a supremacia e o sucesso da sociedade ocidental foram idéias revolucionárias como o racionalismo, a autocrítica, a busca desinteressada da verdade, o estado laico, o império da lei e a igualdade do cidadão perante o judiciário, a liberdade individual, os diretos humanos e a democracia liberal. Com a devida vênia aos especialistas que trataram do tema, fico com George Gilder, o autor preferido de Ronald Reagan. Segundo Gilder, em seu recente livro “Knowledge and Power”, para uma nação prosperar é preciso liberdade, compromisso com a inovação e previsibilidade institucional.

Além de liberdade e inovação, itens óbvios e sempre presentes nas listas de pré-requisitos para o desenvolvimento, a previsibilidade institucional é um item lamentavelmente subestimado. Sem regras claras e instituições sólidas e perenes, não por coincidência as bases do conservadorismo político, o desenvolvimento econômico pleno é quase impossível no longo prazo. Não custa lembra que o esporte mais popular do mundo, o futebol, tem um conjunto simples e inteligível de regras que quase não mudaram em 150 anos.

O Brasil republicano atacou a liberdade política sempre que pode, desde a destituição de um imperador popular e incomparavelmente bem sucedido, até as diversas revoluções e golpes de estado que criaram um ambiente de instabilidade institucional que afugenta investimentos privados de médio e longo prazos.

Quando um estadista, depois de quase seis décadas no poder, deixa o país mais rico, livre e próspero, como nunca se viu antes ou depois, é importante que o Brasil aprenda, de uma vez por todas, para que serve o estado: garantir a segurança dos seus cidadãos, os respeito às leis e aos contratos, para deixar que a sociedade possa, com liberdade e trabalho duro, inovar e atrair os investimentos produtivos.

O público do SBT elegeu Chico Xavier como o maior brasileiro de todos os tempos e deixou Pedro II em vigésimo sétimo. O programa original, “The Greatests”, foi criado pela BBC e, na sua versão original, o povo britânico elegeu Winston Churchill. Faz sentido. Os ingleses escolheram um estadista conservador, já o Brasil vai ficando para trás enquanto conversa com fantasmas à espera de um milagre.

Publicado originalmente na revista Vila Nova

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  • Fernando Gabeira, em O Globo
  • 30 Outubro 2016



Renan Calheiros, no passado, perdia cabelos mas não perdia a cabeça. Agora, ele ganhou cabelos mas perde a cabeça, com frequência. Recentemente, disse que o Senado parecia um hospício e afirmou que ajudou a senadora Gleisi Hoffman no seu embate com a Lava-Jato. Hoje, sabemos que ordenou varreduras em vários pontos estratégicos ligados aos senadores investigados pela roubalheira na Petrobras.

E Renan perdeu a cabeça de novo, chamando um juiz federal de juizeco e o ministro da Justiça de chefete de polícia. Sua polícia legislativa funciona como uma espécie de jagunços de terno escuro e gravata, a serviço de alguns coronéis instalados no Senado. Quando combatemos Renan e o obrigamos a deixar o cargo de presidente, os jagunços já estavam lá. Como o Brasil vivia num estado meio letárgico, tivemos de enfrentar a braço os jagunços de Renan para garantir a transparência de uma reunião sobre seu destino.

O sono brasileiro não é mais tão profundo como na época. Ainda assim, Renan sequer foi julgado pelos crimes de que era acusado na época. São as doçuras do foro privilegiado. Agora, ele quer que o foro privilegiado, que já era uma excrescência para deputados e senadores, estenda-se também aos seus jagunços. E que o espaço do Senado seja um santuário para qualquer quadrilha que tenha, pelo menos, um parlamentar como membro.

Talvez Renan esteja desesperado. Mas essa hipótese ainda precisa ser confirmada. Há sempre alguém que se acha o verdadeiro guardião das leis e se dispõe a defender Renan e o Senado, independentemente desse contexto bárbaro que presenciamos há anos. O próprio Gilmar Mendes, cujas posições são respeitáveis, saiu em defesa de Renan, sugerindo que a polícia não deveria entrar ali. Mas o que fazer quando a própria polícia do Senado comete uma delinquência? A resposta das pessoas que não foram atingidas pela Lava-Jato, mas se incomodam com o sucesso da operação, é sempre esta: falem com o Supremo. No caso do Renan, sob investigação em 12 processos diferentes, e sempre na presidência do Senado, o que significa falar com o Supremo?

Estamos falando com o Supremo há anos. Ele manda grampear senadores adversários, como fez com Marconi Perillo, orienta a agressividade e a truculência de seus jagunços contra deputados. Até hoje, para ele, o Supremo é apenas o cemitério de seus processos.

Renan, Gilmar Mendes e todos os defensores desse absurdo não conseguem me convencer que é preciso pedir licença ao Supremo para punir jagunços que usam equipamentos do Estado, diárias pagas pelo governo, para fazer varreduras na campanha de Lobão Filho, no Maranhão. Varreduras inclusive sob supervisão do genro de Lobão Filho, um homem chamado Marcos Regadas Filho, acusado de sequestro e mencionado no assassinato do blogueiro Décio Sá.

A diversão desse personagem para qual os jagunços trabalharam é usar o helicóptero para dar voos rasantes no Rio Preguiça em Barreirinhas, aterrorizando banhistas e pescadores.

— Foge, meu preto, que isso é vendaval — ouvia-se o grito dos pescadores

O halo protetor do Supremo não se limita aos bandidos do Congresso, mas aos seus jagunços e cúmplices regionais. A Lava-Jato não é infalível. Está sujeita a críticas como todas as atividades de governo. Não se deve usar o êxito da Lava-Jato com intenções corporativas, inclusive num momento de crise econômica como a nossa. Até aí, tudo bem. Mas negar à PF o direito de entrar no Senado quando o crime está sendo cometido pela própria polícia parlamentar, isso me parece um absurdo. O foro privilegiado tem sido uma espécie de escudo para os bandidos eleitos. Se o espaço onde atuam torna-se também um santuário para todos os que trabalham lá, teremos não só a impunidade de indivíduos mas a liberação de espaços especiais para o crime.

Nas campanhas que fiz contra Renan, desenhamos um cartaz dizendo: “se entrega, Corisco”. Isso foi há muito tempo. Seus crimes não foram punidos na época. Ainda me lembro das imagens das boiadas se deslocando no sertão para fingir Renan que era um grande criador. Os crimes não apenas deixaram de ser punidos. Aumentaram exponencialmente ao longo dos anos, ancorando-se inclusive na pilhagem da Petrobras.

Eduardo Cunha foi preso. Não tinha mais mandato. Se Renan continuar solto, é apenas porque tem um. É justo cometer crimes em série, sob o escudo de um mandato parlamentar? Renan está nervoso porque percebe o crepúsculo de um sistema de impunidade tecido pela audácia dos coronéis e a inoperância do Supremo. A evolução do país o levou a perder a cabeça, algo raro no passado. Espero que não chegue a arrancar os cabelos e ouça o meu conselho de anos atrás: se entrega, Corisco.
 

 

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  • Jayme Eduardo Machado
  • 30 Outubro 2016

 

       Não faz muito, assisti na TV um juiz eleitoral dizer que países como Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, etc. não adotam as urnas eletrônicas porque o sistema sai muito caro. A resposta faz todo o sentido, porque ajuda a entender que nações ricas – ao contrário das mais pobres - hesitam mais em gastar no que é prescindível.

        Os benefícios imediatos do sistema que adotamos residem na praticidade do votar e na agilidade do apurar. E também diminui o risco das fraudes possíveis com as cédulas e urnas tradicionais. Por isso - à parte teorias conspiratórias - um olhar desafetado de desconfianças permite observar que a votação eletrônica parece ser método mais seguro, embora não passe ao votante um recibo que lhe dê a certeza de que o diabo ainda não fez aliança com essas maquininhas.

Mas o que ganhamos em praticidade, com eleição e apuração em poucas horas, o próprio sistema põem a perder concedendo 30 dias de campanha para o segundo turno. O tempo excessivo dessas inserções em horários surrupiados aos órgãos de comunicação e seus ouvintes e telespectadores, se prestam, segundo os nobres objetivos da legislação, a equilibrar o tempo de exposição dos candidatos perante o eleitorado, o que não ocorre necessariamente no primeiro turno. No caso de Porto Alegre, trata-se de buscar, também, e democraticamente, uma isonomia capaz de neutralizar a vantagem natural de quem já é governo.

Mas, na prática, essa “democracia de mau uso” tem-se prestado ao empanturramento do eleitor com a tautologia das promessas improváveis e a vilania das acusações recíprocas, tornando-o refém de uma deformação cívica que estimula a malquerença.

Pois quem sabe essa tecnologia toda não permitisse, como ouvi dia desses numa entrevista de rádio, que a própria máquina nos poupasse desse longo calvário áudio-visual? Pois alguém falou que ao votar, o eleitor escolheria três dentre os candidatos inscritos, colocando-os numa ordem de preferência. Se ninguém alcançasse os 50 por cento dos votos válidos, a máquina – num segundo turno eletrônico - eliminaria, os que aparecessem mais vezes em terceiro e assim sucessivamente, até que um dos candidatos alcançasse a maioria absoluta dos votos restantes. Simples assim, não? Seria como aprender com a máquina que ela pode realizar a mesma democracia, mas de uma forma mais econômica e mais civilizada do que os próprios candidatos.
 

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  • Rodrigo Constantino
  • 29 Outubro 2016

(Publicado originalmente em rodrigoconstantino.com)

Os partidos de esquerda que defendem as "ocupações" nas escolas, que querem substituir a educação pela doutrinação ideológica, enxergam os jovens como massa de manobra[27/10/2016]

O ser humano nasce "prematuro", ao contrário dos animais, que já nascem prontos para repetir por instinto aquilo que sua espécie vem fazendo há séculos. É o mais complexo dos animais, com sua incrível ferramenta que é a razão, mas totalmente despreparado ao nascimento. Cheio de potencialidades, mas que precisam ser fomentadas.

Eis o grande papel da educação: formar o homem. Extrair de dentro dele tudo aquilo que ele pode ser, ajudá-lo a alcançar sua plenitude num voo solo, independente, nutrido pelo estoque de conhecimento acumulado por nossa espécie ao longo dos séculos. Nem anjo nem besta, mas com possibilidade de aperfeiçoamento.

Civilizar é justamente domesticar o animal homem, transmitir-lhe os valores incrustados nas tradições, que sobreviveram ao longo dos tempos. É criar freios aos seus apetites, para que suas ações possam ser refletidas, conscientes, e não apenas uma válvula de escape aos seus instintos mais selvagens.

Mas, por vários motivos, a vaidade talvez sendo o maior deles, muitos adultos se recusam a educar os mais jovens. Querem ser como eles, trocar de papel, numa esperança vã de não envelhecer. Querem idealizar o jovem como poço de sabedoria, ou usá-lo como massa de manobra para seus próprios anseios. Querem sonhar com a visão romântica do "bom selvagem".

Rousseau foi o pensador que mais alimentou essa ilusão. Ao mesmo tempo em que abandonou todos os seus filhos, pretendeu ensinar ao mundo como educar as crianças. O "filósofo da vaidade", como o chamava Burke, transferiu para o Estado a responsabilidade dos pais. E via os jovens como argila a ser moldada aos seus próprios desejos. Foi, em muitos aspectos, o pai do totalitarismo moderno.

Uma visão mais realista dos jovens pode ser encontrada em O Senhor das Moscas, de William Golding. Deixadas à própria sorte, eles não se tornam anjinhos, mas perigosos animais. E, pior ainda, quando são manipulados por oportunistas, podem se transformar num exército fascista. É o que mostra o filme alemão A Onda. Se o professor deixa de ser professor para se tornar guru de seita, ele pode facilmente seduzir os jovens e criar um ambiente coletivista onde as individualidades se anulam, dando lugar a uma massa monolítica e violenta.

Vale citar a descrição que Gustave Le Bon fez do fenômeno: "Uma massa é como um selvagem; não está preparada para admitir que algo possa ficar entre seu desejo e a realização deste desejo. Ela forma um único ser e fica sujeita à lei de unidade mental das massas. No caso de tudo pertencer ao campo dos sentimentos, o mais eminente dos homens dificilmente supera o padrão dos indivíduos mais ordinários. Eles não podem nunca realizar atos que demandem elevado grau de inteligência. Em massas, é a estupidez, não a inteligência, que é acumulada. O sentimento de responsabilidade que sempre controla os indivíduos desaparece completamente. Todo sentimento e ato são contagiosos. O homem desce diversos degraus na escada da civilização. Isoladamente, ele pode ser um indivíduo; na massa, ele é um bárbaro, isto é, uma criatura agindo por instinto".

Os partidos de esquerda que defendem as "ocupações" nas escolas, que querem substituir a educação pela doutrinação ideológica, enxergam os jovens como massa de manobra. Os militantes disfarçados de professores cometem um crime contra a juventude. E os pais que delegam a responsabilidade de educar são negligentes. Todos praticam um ato de covardia com os jovens.

Concluo com dom Lourenço de Almeida Prado: "Do velho se espera a reflexão e a medida, o discernimento mais perfeito entre o certo e o errado, a calma madura na ponderação da coisa a fazer, a sabedoria obtida na sucessão das surpresas e percalços de uma caminhada que já vai longe".

Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.
 

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