Quando o colunista Ricardo Noblat anunciou na tarde desta quinta-feira que o presidente Michel Temer ia renunciar, sabia exatamente o que estava dizendo. É amigo íntimo do chefe do governo, um dos poucos que ligam para Temer e ele atende ou dá retorno, da mesma forma como faz com outro jornalista de O Globo, Jorge Bastos Moreno.
Quem deu esta informação exclusiva a Noblat foi o próprio Temer, que estava em débito com o jornalista desde que o levou a um erro brutal no caso da nomeação de Alexandre de Moraes para o Supremo… Justamente por isso, Noblat tinha certeza absoluta de que, desta vez, Temer não iria recuar sem avisá-lo previamente. Portanto, foi com total convicção que o jornalista anunciou que o presidente ia renunciar e comunicaria esta decisão em cadeia nacional. Mas aconteceu exatamente o contrário.
Em tradução simultânea, Temer queria mesmo renunciar. Mas não contava com a pressão que seria exercida pelos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretária-Geral), com apoio de toda a entourage do Planalto. Noblat estava certo. O presidente ia abandonar o cargo, mas o inesperado fez uma surpresa, como diria o compositor Johnny Alf.
No desespero pela possibilidade de perderem o foro privilegiado, Padilha e Moreira fizeram uma pressão absurda sobre o presidente. Argumentaram que Temer lutara muito para manter o PMDB unido depois da morte de Ulysses Guimarães; após anos de esforços, conseguira levar o partido ao poder; estava fazendo um governo de recuperação nacional destinado a ficar na História; os primeiros resultados já começam a aparecer; o Brasil precisa que Temer leve sua obra até o final, etc. e tal. (Leia integralmente texto, aqui: http://www.tribunadainternet.com.br/)
Além da ação junto ao Tribunal Superior Eleitoral, onde há risco da cassação do mandato presidencial e decretação de inelegibilidade, recentes acontecimentos ensejaram pedidos de impeachment do presidente da República. Diante disso, alguns cenários podem ser delineados.
Para o caso de cassação, o TSE dispõe de dois caminhos: determinar o afastamento imediato de Michel Temer e a posse do presidente da Câmara dos Deputados para que convoque uma eleição suplementar ou atribuir efeito suspensivo a eventual recurso até que o Supremo Tribunal Federal se pronuncie definitivamente sobre os fatos.
Se houver a renúncia do presidente, algo que tem sido especulado em função da gravidade da imputação que lhe é encetada, esta deverá ser formalizada mediante documento escrito e lido pelo presidente do Congresso Nacional, e não da Câmara dos Deputados, eis que aquele é o chefe do Poder Legislativo. Ato contínuo, declarado vago o cargo presidencial, o presidente da Câmara dos Deputados é chamado à interinidade na presidência da República e, de acordo com o §1º do art. 81 da Constituição Federal, convoca eleição indireta, a qual deve ser realizada em até 30 dias a contar da vacância.
Noutra hipótese, caso algum pedido de impeachment prospere e resulte no afastamento do presidente, inicialmente por 180 dias, o interino nesse período será o presidente da Câmara dos Deputados, nos termos do art. 80 da CF. Consumado o afastamento definitivo pelo Senado Federal, repetem-se o rito e a convocação da eleição indireta. Rejeitado o pedido, reassume a presidência.
A eleição indireta no Brasil é obscura, embora disponha de regulamentação através da Lei Federal nº 4.321. Aludida regra é datada de 7 de abril de 1964, portanto estabelecida conforme as determinações e, sobretudo, limitações da Constituição de 1946. Seu texto é perigosamente omisso em aspectos essenciais. Primeiro e fundamentalmente, quando alija o TSE do registro das candidaturas. Segundo, que estabelece o voto secreto, algo incompatível com a CF/88. Terceiro, que não esclarece sobre a possibilidade de coligações e apoios. Quarto, que não prevê a necessidade de desincompatibilizações. Quinto, que silenciou sobre quem pode ou não concorrer. Sexto: não há previsão de fiscalização alguma. O Congresso Nacional negligencia na atualização de tema tão relevante. Alea jacta est.
* Advogado e professor de Direito Eleitoral
NOTA : Quando os irresponsáveis causadores do caos nacional, da tempestade perfeita, corneteiam expectativas de vitória e rufam tambores de guerra é bom fazer um registro sério sobre esses avanços (Percival Puggina)
Não gosto do fisiológico PMDB, e nunca votei em Michel Temer, que era vice-presidente na chapa com o PT, eleito, portanto, pelos próprios petistas. Mas isso não me impede de tentar ser justo na análise, imparcial, deixando os fatos falarem mais alto do que minha antipatia pessoal. Até porque há por aí uma forte tentativa de emplacar a noção de que “são todos iguais”. São mesmo?
Comecemos pela questão da corrupção, que é a principal causa dessa “tese”. Já cansei de mostrar que o PT não é “apenas” corrupto, e sim uma quadrilha criminosa que tentou tomar o estado inteiro de assalto. Ou seja, tinha um projeto totalitário de poder, sistematizou a corrupção, encara, como todo movimento marxista, a roubalheira como um meio aceitável para seus “nobres fins”.
O cinismo do PT, sua aliança a grupos terroristas, criminosos e ditatoriais, a forma como institucionalizou a corrupção e tentou aparelhar todo o estado, nada disso encontra paralelo nos demais partidos, à exceção de suas próprias linhas-auxiliares na extrema-esquerda, que se tivessem o mesmo poder fariam igual. Mas não dá para comparar essa mentalidade revolucionária com PMDB, PSDB e DEM. Não dá mesmo.
A narrativa petista tentou vender o impeachment de Dilma como um golpe das “elites” que iria acabar com a Lava Jato. Acabou? Não, apesar do STF. Ela continua avançando, e Lula foi réu depoente pela primeira vez. Se Dilma ainda fosse presidente, Lula seria ministro, não vamos esquecer! O impeachment não acabou com a Lava Jato; ele a salvou.
Agora vamos deixar a corrupção um pouco de lado e falar da economia, pois os 14 milhões de desempregados têm pressa. Bastou trocar o comando da economia, tirar os “desenvolvimentistas” (inflacionistas) da Unicamp e colocar gente mais séria, que o choque de credibilidade foi automático, as expectativas voltaram a ficar ancoradas, e a inflação cedeu.
Como expliquei aqui, ao contrário do que o “Bom Dia Brasil” disse, não foi por causa da recessão que a inflação despencou, tanto que ela já existia antes, era mais grave ainda, mas a inflação não caía, como não cai na Venezuela, cuja economia se encontra completamente destruída. A economia está finalmente parando de piorar, depois de quase 10% de queda na atividade, e agora a inflação cedeu para valer. Caiu de 9% para 4% nos últimos 12 meses.
Nada mudou com o impeachment? Sério? Vamos falar das estatais também, que foram o foco dos esquemas petistas no mensalão e petrolão. A Petrobras, por exemplo, vinha sendo completamente destruída pela gestão petista. Ainda precisa ser privatizada, claro, mas vejam a diferença em trocar o comando, colocando gente séria em vez de petista:
A Petrobras registrou lucro líquido de R$ 4,449 bilhões no primeiro trimestre deste ano. O resultado veio acima do esperado pelo mercado, que projetava ganho de R$ 2 bi. O número reverte prejuízo de R$ 1,2 bilhão do primeiro trimestre do ano passado.
A estatal destacou ainda que houve aumento de 72% nas exportações, que atingiram 782 mil barris por dia, com preços médios de petróleo mais elevados. Houve ainda redução de 27% nas despesas com vendas, gerais e administrativas, além da redução de 11% nas despesas financeiras líquidas e as menores despesas com baixa de poços secos e/ou subcomerciais e com ociosidade de equipamentos.
Segundo Pedro Parente, presidente da Petrobras, o lucro líquido foi muito importante para a companhia.
— Houve um aumento de 19% na geração de caixa, o ebitda ajustado, atingindo R$ 25,25 bilhões. É um recorde histórico. É o maior da história da empresa. Tivemos um fluxo de caxa livre de R$ 13,3 bilhões. É um resultado positivo pelo oitavo trimestre consecutivo — destacou Parente.
O presidente da empresa lembrou que houve redução de 4% da dívida líquida, para R$ 300 bilhões.
Em resumo: Petrobras reverte prejuízo em lucro de R$ 4,45 bi e tem maior Ebitda da história. Dívida líquida caiu, apesar de ainda ser astronômica, como herança maldita do PT: R$ 300 bilhões. Continuo convicto de que ela deve ser privatizada o quanto antes, mas sou honesto para reconhecer que, na derivada, a melhoria salta aos olhos. Foi só parar de sangrá-la tanto como o PT vinha fazendo.
O mesmo ocorreu no BNDES, com Maria Silva Bastos no lugar de Luciano Coutinho, o nacional-desenvolvimentista que, desde a década de 1980, quer selecionar por meio do governo os “campeões nacionais”. O BNDES pisou no freio, tem liberado bem menos crédito subsidiado, motivo pelo qual se falou até em “fritura” da presidente, o que foi negado pelo governo. O “capitalismo de compadres” precisa do BNDES para respirar, e, durante o governo Temer, essa molezinha ficou mais rara. Pontos para ele.
Há, ainda, a reforma trabalhista e a da Previdência, que estão finalmente saindo do papel. É verdade que estão muito aquém do que necessitamos, mas é preciso ser justo aqui: o governo de transição, a “pinguela” em meio ao mar revolto deixado pelo PT, ao menos avançou, coisa que os petistas não fizeram em 14 anos no poder. Só a aprovação dessas duas reformas justificaria mil impeachments, pois sem elas o Brasil afunda de vez.
Existem muitos outros pontos que poderiam ser mencionados também, como a reversão do aparelhamento na TV Brasil (que deveria ser simplesmente fechada), a mudança de postura com os ditos “movimentos sociais” (o que explica a tentativa de intimidação dessa turma mafiosa), o isolamento da Venezuela no Mercosul etc.
Na propaganda oficial do governo para as reformas, até a capa do meu livro Privatize Já foi utilizada! O que demonstra que o governo de transição de Michel Temer já representa um “upgrade” e tanto em relação ao PT, convenhamos. O PT usaria meu livro apenas para fazer uma fogueira, com petistas pintados e nus fazendo “uga-uga” em volta e batendo tambores.
É perfeitamente legítima a sensação de que “nada presta” na política nacional. Há boa dose de razão nessa indignação generalizada. Mas precisamos ter muita calma nessa hora. Pois, por mais que todos os corruptos mereçam punição, só o PT tem “bandidos preferidos” e chama de “guerreiro herói do povo brasileiro” notórios safados. Só o PT idolatra corruptos e quer impunidade para os seus.
Por mais que PMDB, PSDB e DEM estejam bem longe da direita liberal, representam uma mentalidade menos ideológica, menos intervencionista, e até por senso de sobrevivência estão fazendo coisas certas, importantes, cujos resultados já podemos ver. Não é nenhuma Brastemp, mas ao menos é um refrigerador, não um caldeirão infernal.
Se Dilma ainda estivesse no poder, não só seríamos torturados com seus discursos desconexos, como o Brasil estaria muito próximo da realidade venezuelana, cujo governo ditatorial ainda conta com o apoio dos petistas. Logo, por mais que Temer e o PMDB/PSDB mereçam inúmeras críticas, não podemos cair na estupidez de repetir a narrativa petista de que “são todos iguais”. Não são, como ficou claro.
O PT é uma bomba atômica lançada contra o Brasil. Os demais são medíocres, em muitos casos corruptos, mas não chegam nem perto desse potencial de destruição. Basta deixar a ideologia e o preconceito de lado para reconhecer: houve avanços impressionantes com Temer no poder, e o “presidento” não completou nem um ano de gestão.
Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal
BRAZIL FORUM UK 2017
Para não perder o FOCO volto a escrever sobre a nossa falida e injusta PREVIDÊNCIA SOCIAL. Desta vez faço minhas as palavras do ministro do STF, Luís Roberto Barroso, durante a palestra que proferiu na conferência de abertura do -BRAZIL FORUM UK 2017-, na semana passada, em Londres.
AFIRMAÇÕES IMPORTANTES
Barroso, que antes de tudo é -socialista-, afirmou com absoluta convicção que a REFORMA DA PREVIDÊNCIA é tardia e, portanto mais do que necessária: é inadiável. Além disso, o ministro falou sobre a necessidade de restringir o foro privilegiado, anotando que serviria como poderoso instrumento de combater a corrupção.
TIROU DAQUI...
Quando Barroso explicou que "O setor previdenciário brasileiro é uma imensa transferência de renda dos pobres para os ricos, porque os 30 milhões de pensionistas no INSS custam um pouco mais do que 1 milhão de aposentados no setor público e todo o resto da sociedade financia essa transferência de renda", imaginei que o ministro tirou tais palavras do Ponto Critico. Só pode...
TRISTEZA ENORME
A minha convicção ganhou ainda mais força depois de que o ministro do STF disse: - "Quando vejo um pobre contra a reforma da Previdência me dá uma tristeza enorme, porque ele não sabe que está pagando a aposentadoria de um sistema que é feito para tirar dinheiro dele. Se pobre estiver sustentando rico, o sistema é perverso e injusto, portanto tem que mudar".
Pergunto aos leitores: - Vocês já não leram isto aqui? Certamente que sim!
REFORMA POLÍTICA
Para completar a sua conferência, Barroso atacou outros graves problemas pendentes de solução no nosso empobrecido Brasil, como: 1-a necessidade de uma reforma política, com a diminuição do custo da eleição, e uma ampla restrição ao foro privilegiado para combater a corrupção no Brasil.
ENXUGANDO GELO
Ao finalizar, Barroso emendou: "O sistema político brasileiro reprime o bem e potencializa o mal", disse o ministro, que complementou dizendo: "Sem mudar o sistema político, toda a energia que gastamos vai se dissipar em nada, pois ficamos num sistema onde o direito penal fica enxugando gelo".
LIDO, OUVIDO E COMPREENDIDO
Deixo bem claro que não simpatizo nem um pouco com o ministro Barroso por várias questões. Entretanto, não posso deixar de elogiar o que pensa e diz sobre estes graves problemas ou injustiças que atacam o nosso país por todos os poros. Tomara que seja lido, ouvido e bem compreendido pelos nossos Congressistas.
(Publicado originalmente em http://blog.kanitz.com.br)
A esquerda sempre precisou de dinheiro, de muito dinheiro para se sustentar. A direita por sua vez, não. Isso porque a direita é composta de adolescentes que estudaram quando estudantes, trabalharam quando jovens, pouparam quando adultos, e portanto se sustentar não é um grande problema.
A direita progride, enquanto a esquerda protesta nas Ongs e nos cafés filosóficos. esquerda sempre viveu do dinheiro dos outros. Karl Marx é o seu maior exemplo, sempre viveu às custas de amigos, heranças e do companheiro Friedrich Engels.
Não conheço um esquerdista que não viva às custas do Estado, inclusive os empresários esquerdistas que votam no PT e PSDB e vivem às custas do BNDES. Nos tempos áureos a esquerda tomou para si até países inteiros. China, União Soviética, Cuba, por exemplo, onde a esquerda se locupletou anos a fio com Dachas e Caviar.
Essa esquerda gananciosa foi lentamente sugando a totalidade do Capital Inicial usurpado da sua direita, até virar pó. Foi essa a verdadeira razão do fim do muro de Berlim. A esquerda faliu os Governos que eles apoderaram.
No Brasil, a esquerda também aparelhou e tomou Estados e Municípios, e também conseguiu quebrá-los. Socialistas Fabianos como Delfim Netto, FHC, Maria da Conceição Tavares ainda vivem às custas do Estado com duas ou mais aposentadorias totalmente imorais. Só que o dinheiro grátis acabou.
Sem dinheiro, a esquerda brasileira começou a roubar, roubar e roubar com uma volúpia jamais vista numa democracia. Mas graças à Sergio Moro, até esse canal se fechou para a esquerda brasileira. Sem a Petrobras, as Estatais, o BNDES, o Ministério da Previdência, o Ministério da Educação, a esquerda brasileira não tem mais quem a sustente.
O problema da esquerda hoje é outro e muito mais sério. Como esquerdistas irão se sustentar daqui para a frente? Como artistas plásticos, professores de Filosofia e Estudos de Gênero da FFLCH, apadrinhados políticos, vão se sustentar sem saberem como produzir bens e produtos que a população queira comprar?
Que triste fim para todos vocês que se orgulhavam de pertencer à esquerda brasileira!
NOTA DO EDITOR: O professor Ricardo Bergamini oferece à reflexão dos leitores este excelente texto de Roberto Campos sobre empresas estatais (1985). Chamo a atenção para a sabedoria da explicitação do que sejam, na vida real, os setores público e privado.
"A coisa mais importante para os governos não é fazer as coisas que os indivíduos já estão fazendo, ou fazê-las um pouco melhor ou pior; e sim fazer aquelas que no presente ninguém possa fazer" (Lord Keynes).
Para o começo de conversa precisamos de uma revolução semântica. A expressão "setor privado" inspira uma conotação de egoísmo e apropriação. A expressão "setor público" transmite a ideia de generosidade. Isso é injusto e inadequado. Mais correto seria, como sugere o economista paulista Rafael Vechiatti, chamarmos o setor público de "setor coercitivo", e o privado de "setor voluntário".
Sempre que se fala em desestatização, surge logo a indagação: de onde virão os recursos para o setor voluntário comprar as empresas do setor coercitivo? Uma resposta complexa é explicar que: 1) o governo não gera recursos e sim administra os recursos hauridos do setor voluntário por tributação ou tarifas; 2) que a poupança do governo é hoje negativa e que seu déficit é coberto mediante sucção da poupança privada; 3) que, na medida em que o Governo corte suas despesas, liberando a poupança privada, esta poderia comprar as empresas do "setor coercitivo". Estas, aliás, não nasceram do nada e sim de tributos pagos pelo "setor voluntário". A velocidade de geração de recursos para a privatização dependeria assim apenas da velocidade da redução do déficit público e da liberação das poupanças do setor voluntário.
Num sentido fundamental, entretanto, o problema é simples e não exige qualquer despesa. Basta uma revolução conceitual, que pode ser feita por definição legal. O importante, num primeiro estágio, é separarmos o conceito de propriedade, do direito de gestão, diferenciando-se "ações de propriedade" de "ações de gestão". O Governo é gestor das despesas públicas. Mas não precisa ser seu proprietário. As empresas públicas devem ser do público.
É esse o objetivo do projeto de lei número 139 que apresentei ao Senado Federal, em junho de 1983, e que há dois anos ali dorme o sono dos justos, pois as ideias simples são em princípio escandalosas. Nesse projeto se prevê que o governo devolva aos cidadãos a propriedade das poupanças deles arrecadadas, mediante a transferência gratuita de ações integralizadas – boas ou más – que sejam de propriedade da União, suas autarquias e entidade públicas, a um grande fundo de repartição de capital. Todos nós, contribuintes do INPS ou IPASE ou Funrural receberíamos gratuitamente frações ideais desse fundo. Os dividendos eventualmente resultantes seriam creditados aos cotistas, vale dizer, ao universo dos contribuintes, cujos impostos financiaram originalmente a criação dos elefantes estatais. As ações ficariam em custodia num organismo central, que poderia ser a Caixa Econômica Federal, ou qualquer outro órgão suficientemente computadorizado, que manteria escrituração da carteira de ações dos beneficiários. Enquanto mantidas em custódia, essas ações seriam de propriedade, porém não de gestão. O poder de voto e de gestão continuaria, como no presente, nas mãos dos administradores governamentais, até que essas ações doadas se transformassem em ações vendidas ou negociadas, através dos mecanismos normais de Bolsas de Valores ou de licitação de ações. O projeto de lei acima citado prevê que a alienação das ações ou a retirada da custodia se faça gradualmente (à razão de 5% ao ano), a fim de na se congestionar o mercado de valores.
Se a privatização da propriedade pode ser resolvida, resta o problema da privatização da gestão, indispensável para aumento da produtividade global do sistema. Esta continuaria a ser buscada através dos programas correntes de desestatização, por venda em bolsa ou licitação. O importante seria abandonarmos a ideia – usada pelos estatizantes para sabotar a desestatização – de que o Governo tem que reaver integralmente o capital investido. Em muitos casos, os investimentos foram superdimensionados, com custos financeiros tornados proibitivos pela lerda execução, de sorte que seria irrealista esperar vendê-las senão pela rentabilidade real ou esperada do patrimônio, aferida segundo as regras do mercado.
O programa de "repartição do capital" inauguraria imediatamente o capitalismo do povo. O programa de "desestatização" aumentaria gradualmente a eficiência de gestão, além de trazer receitas, que o Governo utilizaria para sanar aflitivas carências básicas – analfabetismo, endemias e epidemias, desnutrição e insuficiência dos serviços básicos de infraestrutura. Não faz sentido o governo ter postos de gasolina quando não tem postos de saúde, ou competir na fabricação de computadores quando não tem dinheiro para cuidar da malária...
Se há hoje uma constatação universal é a da falência do Estado-empresário. Até mesmo os regimes socialistas estão sentindo a rigidez e o desperdício dos sistemas centralistas. No universo das estatais brasileiras, o julgamento da eficiência é dificultado porque, contrariamente ao previsto no Art. 170, Parágrafo 20 da Constituição Federal, elas desfrutam de privilégios de mercado ou vantagens fiscais inacessíveis às empresas privadas. A Petrobrás, por exemplo, é lucrativa, mas desfruta de um monopólio que impede a aferição de eficiência. O Banco do Brasil é lucrativo, mas recebe recursos trilionários da Conta de Movimento do Tesouro a juros simbólicos, e coleta depósitos compulsórios de entidades públicas, sem ter que pagar os altos custos de captação. A Vale do Rio Doce e Usiminas, que operam superavitariamente e sem subsídio, em mercados competitivos, figuram talvez entre as únicas empresas sobre cuja eficiência não pairam dúvidas. Os grupos Telebrás e Eletrobrás não podem ser julgados porque operam em condições monopolísticas, caso em que o lucro pode resultar de manipulação tarifária e não eficiência competitiva.
O importante é acentuar que o Ministro Dornelles e Roberto Gusmão, que pregam a privatização por sentirem na carne os abusos dos elefantes enlouquecidos do setor coercitivo, não precisam se preocupar inicialmente com a carência de recursos para a privatização. Podemos privatizar imediatamente a propriedade por transferência gratuita, e, mais gradualmente, o voto e a gestão, pela venda convencional das ações à medida que o mercado as absorva. Mas mesmo o primeiro passo tem consequências psicológicas importantes. Sentindo-se proprietário, ainda que em frações minúsculas, das empresas públicas, os contribuintes se interessariam em fiscalizá-las, na esperança de algum dividendo, e para isso se organizariam em associações civis, a fim de se manifestarem nas assembleias gerais. Os gestores, sentindo-se também coproprietários, ainda que microscópios, talvez deixassem de considerar os dinheiros públicos um bem de ninguém. E o lucro da empresa passaria a ser considerado o que realmente é, um prêmio do desempenho e não uma secreção de cupidez capitalista. É uma perfeita imbecilidade dizer-se que não se pode privatizar as estatais porque elas são "patrimônio do povo". Precisamente por isso é que devem ser privatizadas, na forma indicada no projeto de lei número 139. Para que sejam do povo. Hoje são dos tecnocratas, que às vezes delas abusam, ou dos políticos, que as desfiguram. O povo não tem vez....
*Defensor apaixonado do liberalismo. Economista, diplomata e político também se revelou um intelectual brilhante. De sua intensa produção, resultaram inúmeros artigos e obras como o livro A Lanterna na Popa, uma autobiografia que logo se transformou em best-seller. Foi ministro do Planejamento, senador por Mato Grosso, deputado federal e embaixador em Washington e Londres. Sua carreira começou em 1939, quando prestou concurso para o Itamaraty. Logo foi servir na embaixada brasileira em Washington, e, cinco anos depois, participou da Conferência de Bretton Woods, responsável por desenhar o sistema monetário internacional do pós-guerra.