(Publicado originalmente por Terra)
De certo modo, tudo o que nos cerca hoje é subproduto da Revolução Cultural dos anos 1970, década de onde emergiu o "politicamente correto" e praticamente todas as políticas públicas que marcam a gestão social no Ocidente.
Um dos seus principais mentores ideológicos foi o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) que fundiu numa extravagante doutrina inspirada no anarquismo com as concepções de Nietzsche.
Instituições: espaços de opressão
Para Foucault, as instituições que nos governam ou que nos assistem, sejam as dedicadas à saúde pública (hospitais, manicômios ou asilos), ao sistema prisional (casas de correção, reformatórios, presídios e cadeias), na recuperação de viciados (clinicas especializadas, ambulatórios de desintoxicação, etc.), ou voltadas para a educação (orfanatórios, seminários, escolas, universidades, centros técnicos, etc.) nada mais são do que "espaços de opressão" controlados por equipes dirigentes.
Para ele, o objetivo maior dessas instituições não é a defesa da sociedade, mas criar mecanismos que permitam exercícios do poder, o poder de humilhar, reduzir e oprimir o próximo que por uma desdita qualquer é obrigado a ficar confinado ou constrangido numa das suas edificações (o asilo, a prisão, clínica ou ginásio).
Deste modo, no entender dele, o quartel não existe para a defesa da pátria, mas para o oficialato exercer o mando sobre a tropa; o colégio não funciona para o ensino, mas para que o corpo docente sujeite os estudantes, e assim por diante. Da mesma maneira, o existir do hospício serve para que os clínicos psiquiátricos se excedam sobre os lunáticos e nos hospitais convencionais os médicos e enfermeiros se unam para dominar os corpos dos pacientes a pretexto de submetê-los a tratamentos. Não há boas intenções na sociedade que nos cerca. Nada mais é senão que uma questão de poder.
Com suas próprias palavras ele sintetizou o fenômeno: "os tribunais, as prisões, os hospitais psiquiátricos, a medicina do trabalho, as universidades, os órgãos de imprensa e de informação: através de todas estas instituições e sob diferentes máscaras se exprime uma opressão que no fundo é política", escreveu. Também concluiu que "os encarregados de distribuir justiça, saúde, saber, informação começam a sentir no que fazem a opressão de um poder político".(cit. Por Didier Eribon ¿ Michel Foucault, pág. 212)
Este sistema, ampla rede de corporações profissionais que cobre larga parte das sociedades atuais, emergiu na Idade da Razão (entre os séculos 17 e 18), quando a política iluminista gradativamente foi implementada no Ocidente.
O caso da loucura é um exemplo. Durante a Idade Média, os alienados conviviam com o restante da população, sendo inclusive, por vezes, considerados seres portadores de dons especiais quando não sagrados. Isto era assim porque eles eram participantes do poder da miséria, sendo amparados pela caridade medieval.
A razão contra a loucura
Todavia, essa situação se alterou com o desaparecimento da lepra que até então era o alvo da política medieval da exclusão. Sem muita demora fruto da emergência de uma nova sensibilidade, a sociedade criou outra forma de confinamento, escolhendo para tanto o lunático. A miséria deixou de ser percebida como algo pertinente à sociedade, e sim como castigo por deficiências e destemperos morais, consequentemente encerrou-se a indulgência para com a insânia.
Ora, a loucura ofendia a razão, era sua antítese. Precisava-se, pois, abandonar a condescendência e enclausurar os tresloucados em prédios especiais, surgindo assim o moderno manicômio ou hospital de alienados. Na transição dos séculos 17 e 18, época da consolidação do Estado Absolutista, todas as regras controladoras surgiram quase que ao mesmo tempo, sendo elas incrivelmente semelhantes, anunciando a emergência da sociedade disciplinar com a exigência primeira de por fim à ociosidade e ao parasitismo.
Na concepção de Michel Foucault não há necessariamente uma "classe dominante" ao estilo marxista. O que existe é um denominador comum que ele denomina como episteme, que perpassa por todas as instituições como uma espécie de "gênio maligno" que as orienta e modela. O poder não está concentrado nas mãos dos produtores e dos proprietários, mas acha-se difuso nas mãos das corporações profissionais que as controlam.
A escola, o orfanatório, a universidade, o sanatório, o hospital, a prisão e a caserna passaram a funcionar dentro da mesma dinâmica com praticamente os mesmos regimentos internos contendo objetivos de contenção e domesticação dos seres humanos, ainda que por vias diferentes. A vara, a palmatória, a camisa-de-força, o choque elétrico, a medicação, o castigo corporal, e os rigores da instrução militar,
formam uma constelação de instrumentos opressivos que estão à disposição das corporações dominantes e servem como afirmação do poder delas na tarefa de sujeição dos indivíduos.
O sistema prisional, por sua vez, reproduz a ideia da fiscalização permanente. O panóptico, excêntrico projeto de Jeremias Bentham, não era senão que o grande olho do poder atento 24 horas por dia na sua função de vigilância. O individuo tinha sua intimidade sistematicamente devassada, totalmente exposta ao carcereiro (invento que foi o precursor do que hoje encontramos nas ruas, lojas e nas praças vigiadas por atentas câmeras de controle 24 horas por dia).
Do alto da torre, o guarda controlava qualquer movimento ou gesto do prisioneiro. Para Foucault, este procedimento de patrulhamento sistemático engendrou o Estado Totalitário moderno, narrado ficcionalmente no livro de George Orwell 1984 , no qual Winston Smith, um cidadão comum, é controlado o tempo inteiro pela imagem do "Big Brother" na televisão.
A prisão, junto com o manicômio, formou os espaços mais extremistas e cruéis da opressão humana, servindo como modelo para as estruturas superautoritárias que surgiram ao longo do século 20. A partir desta constatação, Foucault enumerou então as instituições que considerava como "intoleráveis": "os tribunais; os policiais; os hospitais e asilos; a escola, o serviço militar, a imprensa, a televisão e o Estado" (ver Didier Eribbon ¿ Michel Foucault, pág.208).
A tolerância com a droga
Michel Foucault pertenceu a uma geração de intelectuais que demonstrou outra receptividade para com as drogas e o vício em geral. Em parte, inspirados na obra de Aldous Huxley, As portas da percepção ( The doors of perception , de 1954), que relata as experiências do escritor com a ingestão de mescalina, LSD, entre outras, e os efeitos que nele provocou, muitos escritores e ideólogos começaram a reverter as posições que os esquerdistas históricos tinham em relação ao problema das drogas.
Primeiramente criticadas como uma alienação, senão que uma filistina fuga da realidade, ou ainda algo de consumo restrito à boemia e aos parasitas sociais, elas passaram a ser entendidas tanto como um meio de exploração de outras amplitudes da mente - uma abertura do espírito a desconhecidas possibilidades de percepção - como um protesto individual à sociedade capitalista e burguesa com seus ditames regidos pelo lucro e pelo consumismo. Na sua versão mais radical, o consumidor de alucinógenos ou de heroína se furtava de servir "ao sistema".
Drogar-se, de alguma forma, passou a ser exaltado como uma reação individual e afirmativa de repulsa ao status quo, uma contestação, uma "transgressão positiva", senão que um ato "pré-revolucionário".
Essa situação consolidou-se durante a Era de Protestos, desencadeada nos Estados Unidos pela oposição à Guerra do Vietnã (1965-1975). No entendimento da Contracultura, movimento dos anos 1960 de aberta crítica aos valores tradicionais, recorrer aos estupefacientes era "quebrar os paradigmas". Significava simultaneamente opor-se à continuidade da guerra e desaforar o modo de vida americano (tido como o responsável maior pelo espírito agressivo e destrutivo das operações militares dos Estados Unidos no sudeste asiático).
Do mesmo modo que o jovem americano convocado negava-se a se apresentar às juntas de conscrição para cumprir o serviço militar, aquele que aderia às drogas (fosse maconha, cocaína, heroína ou qualquer outra do gênero) o irmanava no protesto.
Droga como contestação
Expoente desta adesão à toxicomania, particularmente ao LSD (Ácido Lisérgico Dietilamida), foram os psicólogos de Berkeley e Harvard (1959-1963), Timothy Leary e Richard Alpert, integrantes da elite acadêmica americana, que chegaram a criar um espaço especial no Instituto Castalia em Millbrook, em Nova York, atraindo para lá estudantes para suas experiências sensoriais com doses psicodélicas e cogumelos alucinógenos (prática importada dos costumes indígenas mexicanos).
Não tardou para que Leary e sua ¿Liga da Descoberta Espiritual¿ obtivesse a simpatia e aberto apoio do poeta Allen Ginsberg, que se tornou um dos arautos da contracultura, entendendo a recorrência às drogas como uma forma de "abrir" as pessoas para novas possibilidades que a moral convencional impedia de alcançar.
Outro o escritor, William Burroughs, definiu-o como "um verdadeiro visionário do potencial da mente humana e do espírito", enquanto o irreverente novelista Tom Robbins classificou-o como "O Galileu do nosso tempo".
O consumo de alucinógenos passou a ser visto entre os círculos requintados da inteligência americana como um traço de sofisticação intelectual, de desafio às convenções opressivas, um "ligar-se" a outro universo apartado das exigências da religião e do consenso comum e medíocre da sociedade capitalista.
Aquilo que até então estava associado aos socialmente decaídos, aos boêmios perdidos ou aos desgraçados de todas as procedências, viu-se "enobrecido" pela adesão de escritores, artistas, acadêmicos, personalidades do show business e líderes de movimentos de contestação. Consumir estupefacientes passou a ser "chique", "ousado", "avançado", "progressista", enquanto que criticá-los foi entendido como "reacionário", "atrasado", etc.
O mesmo foi estendido às questões do sexo. Michel Foucault saiu em busca de relações homo-sadomasoquistas, frequentando com desembaraço a Meca da Sodomia, que é a cidade de San Francisco, na Califórnia. Se a droga abria as mentes, a transgressão sexual foi percebida como a "liberação do corpo" das injunções da moral cristã repressora e da retórica conservadora da contenção. "Abrir o corpo" tornou-se comum a quem desejava romper com ou ignorar as fronteiras morais.
A reforma das instituições
Entrementes, no transcorrer das décadas de 1960 e 1970, as ideias dele de "desconstrução" das instituições formais ganharam adeptos no meio acadêmico americano. A nova geração que saiu dos bancos das faculdades de Direito, de Sociologia e de Psicologia, da Costa Leste ou da Califórnia, sofreu forte influencia doutrinaria dos professores seguidores de Michel Foucault, um pensador que não acreditava existir na sociedade instituição alguma que não estivesse à disposição da teia do jugo da coerção e da lógica do poder. Antes de se processar a "dissolução do homem" por ele anunciada era preciso desmantelar as instituições.
Na verdade, elas eram grandes máquinas de adestramento criadas para "vigiar e punir", para amansar e domesticar os seres humanos postos a serviço da "economia do poder". Aquilo que Louis Althusser veio a denominar de "aparelhos ideológicos do Estado". Assim, o louco, o drogado e o contestador social, formavam uma frente em comum de revolta e repudio à ordem vigente.
Gradativamente, o resultado disso se fez sentir no surgimento das leis antimanicomiais (com o fechamento dos hospícios e das clinicas psiquiátricas), da revisão das leis penais (com a gradativa abolição da pena de morte e a redução das sentenças mais severas, seguidas do embaraçamento da atividade policial), e da nova pedagogia que visou o constrangimento da competência disciplinar dos docentes.
Se as instituições serviam acima de tudo como "espaços da opressão" e afirmação do poder, era preciso alterar sua substância, esvaziando a sua razão de ser. O psiquiatra, o carcereiro, o policial e o professor, símbolos genéricos da autoridade, viram-se podados por múltiplos regulamentos aprovados em série e rapidamente difundidos em boa parte do Ocidente. Liberou-se o louco do manicômio, o drogado da clínica, o criminoso das longas penas, e o estudante da disciplina e do compromisso.
Com a abolição ou contenção da autoridade é possível que Michel Foucault pensasse abrir caminho para a verdadeira revolução que surgiria no porvir, liberando os seres humanos de qualquer amarra. Em termos freudianos, a neutralização do superego com seus rigores e impedimentos, proporcionaria aos indivíduos um novo horizonte de possibilidades não-repressivas.
Tudo isso foi acompanhado por uma radical mudança da linguagem com a adesão ao "politicamente correto". As palavras consideradas infamantes ou inadequadas pelas minorias (mulheres, homossexuais, negros, índios, deficientes mentais e físicos) foram substituídas por outras tidas como convenientes ou mais apropriadas (como por exemplo, pederasta por homossexual ou gay; negro por afro; aleijado por cadeirante; louco por deficiente mental; delinquente juvenil por jovem infrator; mongolóide por portador da síndrome de Down; pervertido por pedófilo; prostituta por garota programa; e assim por diante). É como se outro significado surgisse da desconstrução das antigas expressões e do vocabulário até então aceito.
Com isso, a esquerda não-comunista pensou em cumprir assim a sua missão histórica como emancipadora. Se não fora possível libertar o operário do poder do capital, como era a proposta do marxismo clássico, pelo menos, seguindo Michel Foucault, ela ajudaria a libertar milhões de indivíduos dos preconceitos, emancipando-os da moral convencional.
Bibliografia
ALTHUSSER, Louis - Aparelhos Ideológicos de Estado . Rio de Janeiro: Graal, 11 ª Ed.
Eribon, Didier - Michel Foucault , São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
FOUCAULT, Michel. A História da Loucura na Idade Clássica . São Paulo: Perspectiva, 1997. FOUCAULT, Michel - Vigiar e punir: História da Violência nas Prisões . Petrópolis: Editora Vozes, 2000.
FOUCAULT, Michel - O nascimento da clínica . Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 6ª Ed., 2004.
Gorffman, Erving - Manicômios, Prisões e Conventos . São Paulo: Editora Perspectiva.
Kremer-Marietti, Angèle - Introdução ao pensamento de Michel Foucault . Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.
LEARY, Timothy, Flashbacks - LSD: a experiência o que abalou sistema . São Paulo. Brasiliense, 1989.
LEARY, Thimoty - Jail Notes . Nova York, Douglas Corporation Book.
MARCUSE, Herbert - Eros e Civilização, uma interpretação filosófica do pensamento de Freud . Rio de janeiro, Jorge Zahar, 1978.
ROSZAK, Theodore. Contracultura: reflexões sobre a sociedade tecnocrática e a oposição juvenil . Petrópolis, Vozes, 1972.
Szasz, Thomas - Ideologia e doença mental . Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1980.
O último Ministro do Exército e ex-comandante da Força Terrestre, General Gleuber Vieira, hoje na reserva, me disse o outro dia que o Ensino é a jóia da coroa do Exército. Deduzo que graças a esse ensino que dá conhecimento e formação, a Instituição não se afeta pelas turbulências políticas e sociais do país e muito menos pela decadência moral que nos destrói. Um ensino sempre atualizado, moderno e firme, com princípios e disciplina - que, aliás, é condição para êxito em qualquer atividade humana.
Esse espírito está presente, entre outros e além dos quartéis, nos colégios militares, na preparatória de Campinas, na Academia Militar das Agulhas Negras, nos institutos como o Militar de Engenharia, o CEP(Centro de Estudos de Pessoal), as escolas de sargentos, a de Saúde, a de Administração, a de Aperfeiçoamento de Oficiais, a de Comando e Estado-maior, a Escola Superior de Guerra. Outro dia visitei a AMAN e fiquei encantado. Escolas de ponta e de excelência na formação. Basta ver os resultados das avaliações em escolas públicas; os jovens dos colégios militares estão sempre à frente. O mérito está presente sempre. Quem chega ao topo da carreira é porque é muito bom.
Isso se passa no mesmo Brasil que tem escolas públicas quase abandonadas, desde a municipal do ensino básico até a universidade federal - e a droga presente em todo currículo, tão atuante quanto a militância política-partidária docente. Os resultados, em geral, são sofríveis e medíocres. Pesquisa recente do Movimento Todos pela Educação, entre o ensino médio, com jovens de 15 a 19 anos, mostrou que a maior preocupação dos alunos não é estudar, como se espera, mas com segurança: 85,2% dos entrevistados responderam que a aspiração deles na escola é ter segurança. Com 81,3% das respostas, outro atributo relevante na escola é ter professores sempre presentes.
Segurança e professor presente é algo óbvio e uma necessidade inexistente no ensino militar brasileiro. Ou na escola pública do Uruguai, do Chile, de Portugal, só para citar alguns próximos na geografia e na cultura. A diferença acontece no mesmo país, com o mesmo povo brasileiro. Por que não é possível que o ensino público civil tenha as mesmas características do ensino público militar? Falta de vontade? Falta de percepção, preguiça, ou intuito deliberado de não combater a ignorância para convencer mais facilmente o eleitor? Se o ensino fosse a jóia da coroa do Brasil, seríamos um país com o mesmo cerne da instituição militar, a mesma força moral. O índice de confiança da Fundação Getúlio Vargas aponta as Forças Armadas em primeiro lugar. Será por quê? A resposta é: o Ensino que as forma.
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(Publicado originalmente em http://www.folhadelondrina.com.br/)
A guerra do Brasil tem basicamente dois lados: a elite política e o povo. Atualmente, quase todas as instituições públicas, com maior ou menor fidelidade, prestam serviços à máfia que nos governa há três décadas. Uma das poucas forças institucionais que se identificam com os anseios da população e os valores da Pátria é a Operação Lava Jato. Mesmo ela, no entanto, foi dividida em dois setores antagônicos, tão diferentes quanto a água e o óleo.
Hoje temos duas Lava Jatos: a de Curitiba e a de Brasília. A de Sergio Moro e a do STF. A de Dallagnol e a de Janot. A que os filhos do Brasil gostam e a que os filhos da CUT gostam. Na verdade, as operações mereceriam dois nomes distintos: Lava Jato e Trava Jato.
A Lava Jato é apoiada pela população. A Trava Jato é apoiada pelos políticos. A Lava Jato prende figurões. A Trava Jato deixa os figurões em liberdade. A Lava Jato botou o maior empreiteiro do País na cadeia. A Trava Jato libera Joesley para passear em Nova York. A Lava Jato prende figuras de todas as tendências ideológicas (até o Cunha!). A Trava Jato prende só alguns, e solta rapidinho. A Lava Jato passa o Brasil a limpo. A Trava Jato de vez em quando acerta — como fez ao revelar as conversas sombrias de Temer e Aécio —, mas está longe de possuir a operacionalidade de sua coirmã curitibana.
Eu diria que a Trava Jato e a Lava Jato são tão diferentes entre si quanto Caim e Abel, Esaú e Jacó, Dr. Jekyll e Mr. Hyde. Joio e trigo. Água e óleo. Brasília e Curitiba. O Estado e o povo brasileiro. O empresariado honesto e o empresariado que vive de sugar o dinheiro público.
Diante da fuga do réu da Trava Jato para curtir as delícias da Broadway e do Central Park, eu só tenho um sentimento: vergonha. Vergonha que é expressada nas palavras do jurista João Carlos Biagini: "No plano econômico, o grupo de Joesley há tempos estava prejudicando o mercado ao estabelecer, com a ajuda governamental, um monopólio nacional da carne, com a eliminação, através da compra com dinheiro do BNDES, de quase todos os concorrentes. E, agora, tomamos conhecimento de ter se tornado internacionalmente o maior operador no mercado da carne, portanto com o dinheiro dos contribuintes brasileiros". À vergonha de origem econômica, somou-se a vergonha moral da gravação feita nos porões do Jaburu, na calada da noite.
A última da Trava Jato foi provocar a demissão de um jornalista que, goste-se ou não dele, teve publicamente exposto o diálogo com uma fonte — no caso, a irmã de Aécio Neves —, numa clara tentativa de intimidação da imprensa. É como se as "otoridades" estivessem dizendo: "Aqui não, violão!".
Há uma luta de vida ou morte entre a Lava Jato e a Trava Jato. E dessa guerra depende a sobrevivência do País.
(Publicado originalmente em pontocritico.com)
DESTINO!
Quando alguém se dispõe a viajar, ou se locomover, certamente tem na cabeça o destino. Quem não tem destino definido é porque resolveu andar à toa, sem se preocupar com que encontrará pela frente desde o ponto de partida.
SAÍDA???
Pois, o que mais chama a atenção neste nosso cada dia mais pobre Brasil, é que muita gente, quando percebe que estamos em maus lençóis, só faz uma pergunta: - QUAL É A SAÍDA? Ora, não estamos em busca de uma SAÍDA, mas de um DESTINO.
DANOS ECONÔMICOS
Vejam, por exemplo, o que neste momento em que a crise política atingiu um novo patamar, produzindo DANOS ECONÔMICOS ainda mais sérios (como se isto fosse possível depois de uma queda de quase 9% do PIB nos últimos três anos), são raros os brasileiros que têm mostrado preocupação com o DESTINO a ser alcançado.
TRÁGICO
Volto a afirmar, por pura reflexão técnica e matemática, carregadas de total bom senso e muito discernimento, que a viabilidade econômica no nosso país (mesmo que muito tímida) depende das REFORMAS que estão tramitando no Congresso.
REFORMAS
Isto significa, para maus e bons entendedores, de forma absolutamente irrefutável, que sem estas REFORMAS (Trabalhista e Previdenciária) o destino do Brasil é TRÁGICO. Em termos comparativos, é o mesmo que a VENEZUELA experimentou, cujos resultados (lamentáveis) estão aí para serem vistos e muito bem compreendidos.
PASSO IMPORTANTE
Deixo bem claro que não defendo governos e muito menos governantes. Defendo planos econômicos decentes e promissores. O fato é que presidente Temer, ainda que esteja numa situação complicadíssima politicamente, deu um passo importante ao livrar o Brasil da Matriz Econômica Bolivariana e, a partir daí encaminhar REFORMAS mínimas para tentar uma recuperação econômica.
FUTURO DO BRASIL
Como as forças contrárias às REFORMAS (notadamente o exército formado por 15.007 sindicatos, que não querem apenas a saída de Temer mas, principalmente, a volta de Lula) resolveram entrar de cabeça nesta luta política, visando, objetivamente, restaurar a MATRIZ DO ATRASO. Caso saiam vitoriosos o futuro do Brasil é NEGRO.
COMPRA DO INGRESSO
Gostem ou não, o fato é que os brasileiros que estão sendo seduzidos pelas propostas arquitetadas pelo Foro de São Paulo, que apoia a volta de Lula e seus parceiros, o que menos querem é uma SAÍDA. Estão, isto sim, adquirindo o ingresso para o MESMO DESTINO escolhido pela Venezuela. Será um encontro e tanto, não?
(Publicado na edição impressa da Exame)
Qual a importância que terá para os brasileiros, daqui a um ano ou um ano e meio, a agonia política desesperada dos dias de hoje? E lá, entre maio e outubro de 2018, que estará sendo decidida a questão verdadeiramente essencial: o que o Brasil pretende ser não no próximo mandato presidencial ou no seguinte, mas em que tipo de país seus cidadãos vão viver no futuro, e por muitos anos. O primeiro interrogatório do ex-presidente Lula pelo juiz Sérgio Moro, as ameaças que suas tropas fazem todos os dias à Justiça, a derrama sem limites de mentiras que definem o debate político de hoje - tudo isso estará longamente esquecido e o jogo para valer, a eleição presidencial de 2018 entrará em sua fase realmente decisiva. Os eleitores vão resolver, então, se o Brasil continuará sendo uma colônia do século 18, saqueada sistematicamente por uma máquina pública a serviço de escroques, ou se tem a aspiração de tentar algum outro futuro.
Nos dois mandatos de Lula e nos dois de Dilma Rousseff, o último deles interrompido por seu impeachment e sucedido por um bando de políticos atordoados, sem autoridade e com medo de tudo, o Brasil do atraso, da trapaça política e do roubo permanente ao Erário viveu seu grande momento na história deste país. Ameaçado agora como nunca foi antes, vai fazer de tudo para continuar agarrado ao cofre público. Se a coisa for por aí, pode-se deixar de fora qualquer esperança. Os últimos dias são uma amostra do que o bloco dos parasitas, da intolerância ao ponto de vista alheio, da adoração ao “Estado” quer fazer com o Brasil. Chamam a si próprios de forças “progressistas”, “populares” e “de esquerda” e assim são considerados pela mídia em geral e pela ciência social vigente. Chamam todos os demais de “fascistas”. Não são nada disso - como não são malfeitores sociais, maus brasileiros ou inimigos da democracia os que têm pontos de vista diferentes dos seus. Hoje em dia, mais do que nunca, a separação verdadeira é entre os que precisam mandar numa máquina pública cada vez maior, mais invasiva e mais cara, para sobreviver, prosperar e acumular privilégios; e os que trabalham para manter o bem-estar dos primeiros, pagando em impostos 40% ou mais do que ganham.
Tudo a que se assiste agora são os primeiros movimentos da guerra política que vem aí no próximo ano. O campo “popular-progressista” sabe que não vai sobreviver sem Lula na presidência da República. Não tem absolutamente ninguém que disponha de 1% de sua capacidade eleitoral e de sua liderança; corre o risco de tornar-se irrelevante no Brasil durante anos a fio. Lula, por sua vez, sabe que, se não for presidente, não será mais nada - e terá de passar o resto da vida metido com a pilha de processos por corrupção que tem contra si, numa luta miserável para ficar fora da cadeia. Para se salvar, entretanto, ele precisa vender ou jogar para frente as questões penais a que responde no presente momento; do contrário não poderá ser candidato. É nisso que se concentra tudo o que interessa hoje ao Brasil e ao seu futuro. O cidadão poderá fazer considerável economia de seu próprio tempo se esquecer toda essa conversa de braveza indignada que ouve diariamente ao lado de Lula. O ex-presidente não vai mandar “prender” ninguém se voltar ao cargo que tinha. Não vai fazer caravana nenhuma “pelo Brasil afora” para juntar o povo em sua defesa. Não está em “julgamento político” - não quando em todos os processos que tem contra si não é acusado de nenhuma ideia, discurso ou proposta, mas, sim, de atos concretos de corrupção a serviço de empreiteiras de obras públicas. Não levou multidões a Curitiba para enfrentar “o Moro” em seu interrogatório.
Todos os problemas de Lula se resumem a ganhar prazo para não ser condenado antes de validar sua candidatura e, depois, convencer a maioria dos eleitores a lhe entregar de novo o Brasil, que virá junto com a Petrobras, as empreiteiras e tudo o mais que se sabe. São problemas dele e de todos.
(Publicado originalmente em http://opiniaolivre.com.br)
O verdadeiro terremoto causado pela delação da JBS possui várias particularidades, dignas dos melhores (ou piores) romances policiais, como se já não bastasse aquilo que foi revelado através do departamento de propinas da Odebrecht. Para engendrar plano tão sofisticado é necessário que se entenda que os envolvidos são pessoas extremamente capazes, inteligentes e com grande propensão para assumir riscos.
Para melhor compreender os movimentos adotados é necessário retroceder ao inicio dos anos 2000, quando desde a ascensão ao governo, o PT (Partido dos Trabalhadores) adotou como política de Estado o investimento maciço nos chamados campeões nacionais, cujo objetivo era, ao final, obter ganhos através do aumento de escala para competir internacionalmente. Como toda política engendrada dentro de gabinetes desconectados da realidade, todos os mais notórios ensinamentos gestados há décadas na teoria econômica foram solenemente ignorados, deixando um rastro de destruição e prejuízos sem precedentes da história do país.
Assim, para analisar a estratégia utilizada pelos “Esley Brothers” (Joesley e Wesley, donos da JBS) torna-se essencial entender um dos mecanismos fundamentais do campo da economia da informação que trata do risco moral, que se antecipa ao jogo perpetrado pela dupla de escroques internacionais, neste momento sediada em local seguro, fora da jurisdição criminal brasileira.
A política de campeões nacionais, inaugurada desde o início do governo Lula da Silva, cuja continuação nos governos Dilma foi ainda mais incrementada, ofereceu gigantescos recursos públicos, via BNDES, aos privilegiados com relações íntimas com os círculos do poder. O negócio comandado pela dupla de irmãos cresceu exponencialmente no mercado brasileiro, regado fartamente com recursos baratos e que, obviamente, serviam para alimentar a teia de propinas de políticos envolvidos nas operações criminosas da empresa.
Tudo ia bem até o momento em que a Lava-Jato chegou e começou a puxar o fio da corrupção de forma metódica e precisa, atingindo então o esquema montado pelos escroques da JBS.
Neste momento, quando se tornou evidente que as investigações chegariam inevitavelmente ao topo da administração do esquema, os irmãos “Esley”, de forma inteligente e estratégica, se anteciparam em anos para o advento desta possibilidade.
Antes de procurar as autoridades, utilizaram a montanha de dinheiro ofertado pelo BNDES para estabelecer solidamente suas operações em outras terras, assegurando assim, a continuidade e lucratividade dos negócios.
Os números das operações do grupo JBS não deixam dúvidas: mais de 80% de todo o seu negócio é gerado atualmente nos Estados Unidos, deixando o Brasil como moeda de troca neste jogo sujo. Este movimento de utilizar recursos públicos para financiar empregos e postos de trabalho no exterior é explicado pela atitude inadmissível, ou talvez criminosa, do BNDES, em conceder empréstimos sem garantias para evitar o risco moral, ou seja, o uso espúrio de cláusulas contratuais à revelia do interesse do órgão financiador.
Depois de feita esta engenharia corporativa, os “Esley Brothers” começaram a jogar com as autoridades acordos de cooperação, antevendo a possibilidade da investigação chegar no topo do comando da JBS, o que de fato veio a acontecer.
Aqui vem a novidade em termos de teoria dos jogos.
Os controladores da JBS não tinham e não têm nenhuma estratégia dominante. Ou seja, segundo as regras do jogo legal, leia-se colaboração premiada e acordo de leniência, eles não tinham nenhum poder de barganha para se livrar do inevitável fim. Só restava a estratégia minimax, ou seja, tentar minimizar as perdas inevitáveis usando um movimento suicida de colocar todos no mesmo saco e entregar todos os envolvidos, em face do conjunto de informações privilegiadas que dispunham.
Tal negociação foi feita com grande antecipação, quando as autoridades ainda não tinham a dimensão completa do descalabro, o que permitiu à empresa tempo suficiente para transferir quase a totalidade dos seus negócios para os Estados Unidos.
Como a literatura é farta neste tema, não existe crime perfeito.
Ao assumir riscos suicidas os Esley Brothers abriram a caixa de pandora das consequências imprevisíveis. Uma destas é não ter como controlar eventos fora do âmbito do jogo que estavam jogando na delação, como por exemplo, o uso criminoso de informação privilegiada para se beneficiar da flutuação do câmbio quando da divulgação dos termos da delação.
Pode-se prever que neste exato momento, as autoridades brasileiras, tendo conhecimento da vastidão de ilícitos cometidos pelos manos mafiosos, estão preparando o contra-ataque neste jogo que está longe de terminar. Podemos esperar que entre os próximos movimentos estará um mandato de prisão internacional em face dos crimes cometidos, ironicamente, fora do âmbito da delação, portanto, fora do manto protetor da imunidade.
* Luiz Marcelo Berger é doutor em administração e especialista em Teoria dos Jogos