O banditismo está progressivamente dominando expressivas áreas do território nacional aonde ninguém mais tem a tranquilidade de circular e a própria policia tem receio de entrar para coibir o crime. No caso do Rio de Janeiro tornou-se necessário intervir na segurança do estado destroçado, tal o nível de descontrole a que se chegou – uma antevisão do que poderá ocorrer com outros estados.
A gravidade desse fato social é uma ameaça à democracia, à paz das famílias, ao futuro do Brasil em termos sociais, políticos, juridicos e econômicos. Naturalmente chega-se a conclusão da necessidade de serem empreendidas, de imediato, ações justas, legais e eficazes de radical repressão ao crime.
A questão moral não está no uso da força necessária, matando se necessário, para que se restabeleça a ordem e o respeito às Leis – o estatuto jurídico da legitima defesa da vida e o princípio do bem comum e do bem comum maior, estão aí para sustentar as ações radicais que se fizerem necessárias. Os aspectos morais do problema da repressão encontram-se na continuada omissão das autoridades, da intelectualidade e de parcela da cidadania que se escondem por detrás de argumentações aparentemente acadêmicas, humanitárias e religiosas, como desculpas para a conivência com o crime, para com o despreparo das forças da lei, para com o oportunismo politico irresponsável e corrupto. Acusa-se de violência desnecessária, (algumas vezes com razão), quem reprime o crime, colocando em atitude de receio indevido as forças legais da ordem e da Lei, que passam a ser globalmente julgadas e condenadas pela opinião publica e pelas atuais “opiniões politicamente corretas”, desmoralizando e desestimulando quem está na linha de frente do combate aos bandidos, um expressivo majoritário numero de corajosos e honestos policiais.
O povo brasileiro precisa saber e entender que estamos numa guerra civil. O nosso ainda frágil Estado Democrático de Direito está correndo sério risco. Não há diálogo ou acordos com o mal.
O Brasil está se transformando no paraíso do crime organizado – um “narcoestado” – sejam os criminosos fazendo parte das classes econômicas, politicamente dominantes, sejam eles mais rústicos e truculentos espalhados por todo território nacional. Os primeiros estão sendo exemplarmente combatidos pela operação “Lava a Jato” e outras similares e os muitos envolvidos estão apavorados com as condenações e prisões que se sucedem. O povo apoia, entusiasmado, essas operações de limpeza dos altos escalões políticos e empresariais, mas se omite e se sobressalta quando acontecem tiros e mortes nas cidades.
A violência não se curvará a apelos morais ou religiosos de convivência. A sociedade não tem mais como esperar que politicas públicas, na linha da imprescindível educação de qualidade, da saúde publica e do emprego, venham fazer cessar a criminalidade. Politicas sociais levam, pelo menos, de cinco a sete anos para começarem a apresentar os primeiros resultados positivos.
Nas operações lava a jato encontramos um caminho de combater a corrupção na esfera politica e empresarial. Com o banditismo o caminho é, no curto prazo, a confrontação armada intensa e continuada. Os que sobreviverem certamente irão, depois de pouco tempo, se intimidar e recuar, possibilitando que as populações das cidades atemorizadas voltem a uma vida normal de poder sair para trabalhar, passear e se divertir com suas famílias, com tranquilidade e certeza de segurança publica.
As forças armadas e as policias não poderão, sozinhas, vencer esta guerra – nós o povo precisamos apoiar, pelo tempo que se fizer necessário, com a supervisão do Congresso Nacional a ser renovado, (a esperança que nos resta), agora em 2018.
*Eurico de Andrade Neves Borba, 77, aposentado, escritor, ex professor e Vice Reitor da PUC RIO, ex Presidente do IBGE, mora em Caxias do Sul.
** Publicado originalmente no Diário do Poder.
O STF segue fazendo o que pode para ser um lugar ‘horrível, mistura do atraso com a maldade, com pitadas de psicopatia’, que nos ‘envergonha e desonra a todos’
O Supremo não falha. Passou a tarde inteira decidindo se ia decidir, decidiu deixar a decisão para depois, mas decidiu deixar Lula livre até lá. Parece o baiano da anedota, que diz que não há dia melhor do que hoje para deixar para amanhã o que não se vai fazer nunca.
Por que adiou? Porque já estava tarde, e ministro do Supremo não pode trabalhar de noite, vira uma espécie de abóbora togada.
Ficou para o dia seguinte? Não, Marco Aurélio tinha que viajar. Mas sexta é dia de expediente no STF, o ministro tinha que ir para onde, fazer o quê? Para o Rio, assumir a presidência do conselho consultivo da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, compromisso tão relevante e inarredável que, ao ser anunciado, provocou frouxos de riso nos demais ministros. Será que paga bem, a ABDT?
Mais tarde, Marco Aurélio se queixaria de estar sendo “crucificado como culpado pelo adiamento do julgamento do habeas corpus do presidente Lula, porque sou um cumpridor de compromisso”. Excelência, o senhor foi crucificado por descumprir seu compromisso com a nação, que lhe dá um cargo vitalício com remuneração igual à do presidente da República, sem contar os penduricalhos. (A noção de compromisso e de espírito público de Marco Aurélio lembra a de alguns de nossos senadores, que, em vez de votar o destino de Aécio, foram passear nas rússias e nas arábias.)
A votação deveria ficar para hoje, mas não: como o feriado no STF começa na quarta (!), está na cara que não haverá ninguém lá nem hoje nem amanhã. É a suprema semana santa: vai da véspera do domingo de Ramos ao domingo de Páscoa. Um trabalhador normal seria descontado em nove dias, mas os ministros, que tanto se esfalfam, e têm apenas 94 dias de folga este ano, coitados, merecem um refresco. (Com um exemplo desses, não admira que os juízes federais façam greve para nos obrigar a lhes pagar o aluguel.)
Então ficou para segunda que vem? De novo, não. Só na quarta. O que os ministros têm para fazer na segunda e na terça? Vão estar se recuperando da esbórnia do superferiadão?
Muito bem. Diz que no dia 4, afinal, vão votar. Mas só dez deles, porque Gilmar deve estar em Portugal. Vai cuidar do 6º Fórum Jurídico de Lisboa, promovido pelo IDP, aquele instituto que criou já ministro, que recebe milhões de reais de empresas privadas e gera constrangimento para todo mundo menos para seu dono.
A tertúlia de Gilmar vai de terça a quinta da semana que vem, o que significa que, além desta semana, o ministro ia enforcar a próxima. Um dia de feriado, 16 dias corridos de ausência. Como é doce ser ministro.
Gilmar está pensando se interrompe seu colóquio para vir ajudar Lula. Em teoria, sua ausência é irrelevante: se Rosa votar contra o ex-presidente, nada o salvará; se votar a favor, Gilmar não é necessário, pois o empate beneficia o réu. Mas... vai que algum ministro viaja para dar uma palestra? Melhor não arriscar, Excelência.
Isso, claro, se houver mesmo votação, porque já estão dizendo que é capaz de alguém pedir vistas, e jogar a decisão para as calendas gregas.
O Supremo segue fazendo o que pode para ser um lugar “horrível, mistura do atraso com a maldade, com pitadas de psicopatia”, que nos “envergonha e desonra a todos”.
*Publicado originalmente em O GLOBO
O termo civilização é associado à ideia de abandono da violência e sua substituição por valores morais, regras de convivência e instituições de mediação dos conflitos entre integrantes de uma sociedade.
A civilização ocidental inventou a democracia liberal e a separação de poderes entre Executivo, Legislativo e Judiciário visando impedir a tirania dos governantes. Com todas as suas imperfeições a democracia liberal segue sendo a mais evoluída forma de processar decisões coletivas, governar a sociedade, criar leis e dirimir conflitos de forma pacífica e ordeira.
A Ordem Pública, a Paz Social e a correta administração da Justiça são os bens maiores de qualquer sociedade democrática. Sem Ordem, Paz e Justiça não há civilização. Há barbárie e violência; vigora lei do mais forte que impõe aos outros pela força a sua vontade e os seus interesses.
Em tese pelo menos, o papel das instituições jurídicas e políticas de uma democracia seria o de, em primeiro lugar, zelar por esses valores. Em se tratando de uma suprema corte então, mais ainda. Entretanto, não é o que se vê no Brasil.
A sociedade, em sua maioria, anseia por Ordem Pública, Paz e Justiça. Mas, o órgão máximo do Poder Judiciário brasileiro caminha na direção oposta. É o mínimo que se pode dizer da postura adotada pelos ilustres juízes do STF após as manobras absurdas para deixar impune o chefão do maior esquema de corrupção de que se tem notícia na história da democracia, e o principal responsável pela mais dura e longa recessão pela qual o Brasil já passou.
Destaco aqui, três ingredientes da cena política brasileira dos últimos tempos:
1 – O mainstream da mídia, do estabilshment político e do mercado vinham, até a pouco, defendendo a necessidade de construção de uma candidatura de centro capaz de remover do tabuleiro político um cenário de polarização entre extremos;
2 – Satisfeitos com o impeachment de Dilma, o início da reorganização da economia e a perspectiva da condenação e prisão de Lula e demais corruptos envolvidos nos escândalos do mensalão e do petrolão, os milhões de brasileiros que foram às ruas lutar pelo impeachment de Dilma Rousseff se recolheram para seus lares e trabalho;
3 – Por outro lado, tanto mais quanto mais a Justiça se encaminhava para fazer Justiça, condenando Lula e mandando-o para a prisão assim como já foi feito com centenas de condenados da Lava Jato, mais os brasileiros recompunham sua esperança nas instituições e mais as lideranças do PT e da esquerda em geral ameaçavam-nos com a conflagração e o uso da violência caso a Lei fosse cumprida e Lula fosse preso.
Ninguém dava importância às bravatas petistas, pois, há muito se constata que o petismo perdeu bases sociais reais e hoje mobiliza apenas sua militância doentia e incapaz de aceitar a verdade dos fatos.
No sistema político ninguém, nem mesmo a esquerda que se dividiu em diversas candidaturas presidenciais, operava com a possibilidade de que um condenado em órgão colegiado pudesse vir a concorrer às eleições presidenciais que se avizinham.
Tudo isso até o STF tomar a mais grave e controvertida das suas tantas decisões graves e controvertidas: a ameaça de deixar Lula livre e impune por seus crimes.
Essa decisão mudou totalmente o cenário político do país, jogando gasolina no tabuleiro de uma disputa eleitoral que se encaminhava para ser pacífica e tranquila, apesar de imprevisível.
Talvez o cidadão comum, que não tem por prática profissional monitorar as mídias sociais e o humor político do ativismo virtual ainda não tenha percebido, mas o STF despertou de novo os brasileiros que foram às ruas pelo impeachment de Dilma e que haviam voltado para casa, terceirizando para o Judiciário a missão de zelar pela aplicação da Lei e da Justiça nesse país. Esse ativismo saiu das ruas, mas permaneceu vivo e ativo nas mídias sociais.
O prazo até 04 de abril que o STF se concedeu para livrar Lula da cadeia, talvez contando com o feriadão da Páscoa para acalmar os ânimos e desmobilizar a sociedade, de fato, foi o tempo que precisavam os movimentos cívicos para convocar novas manifestações de rua na tentativa de fazer valer a democracia sob pressão das ruas.
Já que as instituições jurídicas e políticas da nação parecem voltadas para proteger Lula, o PT e a casta de corruptos a eles associados – todos eles, em benefício próprio, contando com que a liberdade do chefão leve a liberdade de todas as quadrilhas -, não resta outra saída ao povo senão voltar às ruas para garantir que a democracia seja respeitada e Lei seja cumprida.
Não é possível saber se essas manifestações serão fortes o suficiente para botar medo nos juízes comprometidos com as quadrilhas no poder, mas, uma coisa é certa, se Lula ficar livre, impune e fazendo campanha eleitoral, o ativismo cívico que promoveu o impeachment de Dilma Rousseff não voltará para casa durante a eleição.
Os entreveros que envolveram a caravana no Lula pelo Rio Grande do Sul e seguem acontecendo em Santa Catarina e Paraná, são apenas uma pequena amostra do ambiente que o STF está incentivando para o próximo período com a ameaça que faz à nação de deixar impune um condenado dessa magnitude e periculosidade. Lula não passou incólume pelas cidades do Nordeste também.
Mesmo com seus comícios esvaziados o petista foi hostilizado em inúmeros lugares por onde passou.
Deixando Lula impune e livre para fazer política, o STF não estará apenas incentivando uma polarização eleitoral de tipo tradicional, com bate-bocas e discursos inflamados de parte a parte. Assim agindo a corte suprema estará jogando no descrédito total (se é que ainda resta algum crédito) a esperança dos brasileiros de bem na capacidade de suas instituições garantirem a Ordem Pública, a Paz Social e a aplicação da Lei.
A liberdade de Lula por decisão do STF será a liberdade de todos os criminosos comuns e do colarinho branco já condenados em segunda instância. Sinais de gente partindo para fazer justiça com as próprias mãos já há de sobra em se tratando de crimes comuns. Teremos o mesmo na política?
* Cientista Político
** Publicado originalmente em http://emaconteudo.com.br
Num espetáculo indigno de uma Corte cuja função é ser obstáculo aos excessos do poder, a maioria de seus ministros aceitou prestar vassalagem ao chefão petista.
O Supremo Tribunal Federal apequenou-se perante Lula da Silva. Num espetáculo indigno de uma Corte cuja função é ser obstáculo aos excessos do poder, a maioria de seus ministros aceitou prestar vassalagem ao chefão petista. O Supremo, em sua atual composição, reafirmou assim sua vocação de cidadela dos poderosos com contas a acertar com a Justiça.
O cidadão comum, aquele que se submete ao pacto democrático na presunção de que a Justiça criada por esse arranjo será igual para todos, há de se perguntar, depois das vergonhosas sessões de quarta e quinta-feira passadas, se ainda subsiste alguma instituição do Estado que não esteja subordinada ao patronato político – do qual Lula, a despeito da sua apregoada identidade com a gente comum, é um dos maiores expoentes.
O demiurgo de Garanhuns não tem mais foro privilegiado, e no entanto foi tratado no Supremo como se tivesse. Mereceu a deferência de ter seu caso apreciado antes de muitos outros, não por coincidência às vésperas da provável rejeição de seu derradeiro recurso no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região contra a condenação a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.
Ou seja, o Supremo desmoralizou, numa só tacada, todo o bom trabalho de nove juízes – Sérgio Moro, que condenou Lula da Silva na 13.ª Vara Federal de Curitiba; os três desembargadores da 8.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, que confirmaram a condenação e aumentaram a sentença; e os cinco ministros da 5.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negaram o habeas corpus preventivo pedido pela defesa de Lula.
Para atingir esse fim, inventou-se uma liminar que, na prática, tem efeito de salvo-conduto, pois impede a prisão de Lula até que o pedido de habeas corpus feito pela defesa seja efetivamente julgado pelo Supremo. Esse julgamento do mérito foi marcado para o dia 4 de abril, mas nada impede que algum ministro invente criativo expediente para adiar o desfecho do caso indefinidamente, como tem acontecido com frequência no Supremo. (Veja-se o que o ministro Fux está fazendo com o desavergonhado auxílio-moradia.) Nesse período, Lula da Silva ficaria livre.
Chegou-se a esse remendo porque o Supremo foi incapaz de iniciar a apreciação do habeas corpus, entretido que estava em um debate sobre se era o caso ou não de aceitar discutir o pedido da defesa – debate este que incluiu até uma menção do advogado de Lula a Luís XVI, exemplo, segundo ele, de vítima da “volúpia do encarceramento”. Quando ficou claro que a sessão seria encerrada sem a votação do habeas corpus, a despeito da urgência do caso – um dos ministros alegou cansaço, outro disse que tinha viagem marcada –, a defesa pediu a liminar, que acabou aceita. Estava dado o salvo-conduto para Lula, válido pelo menos enquanto durar o longo feriado do Supremo em respeito à Páscoa. Isso é que é espírito cristão.
Não à toa, a decisão foi festejada por gente do quilate do senador Renan Calheiros, contra quem correm 17 inquéritos no Supremo. “Nenhuma condenação sem prova sobreviverá ao controle da constitucionalidade e ao princípio da presunção da inocência. Viva a democracia! Viva o respeito à Constituição!”, escreveu o multiencalacrado senador no Twitter, sob a hashtag “Lula Livre”.
Nada mais simbólico. Outra vez, o Supremo Tribunal Federal, que em quatro anos de Operação Lava Jato não julgou nenhum dos implicados com foro privilegiado, enquanto os tribunais ordinários já contabilizam 123 sentenciados, demonstra sua incapacidade de fazer os poderosos pagarem por seus crimes. Não espanta o empenho de muita gente para adquirir o direito de ser julgado ali, ainda que seja por vias tortas, como Lula. Outros condenados pela Lava Jato, presumindo que o ex-presidente escapará mesmo da prisão, já se preparam para explorar essa brecha. Seria o festim da impunidade.
A genuflexão do Supremo diante de Lula fecha com chave de ouro uma semana vergonhosa na história dessa Corte, que incluiu uma infame manobra para manter o auxílio-moradia para todos os juízes. Quando a Corte constitucional atenta contra a própria Constituição, para proteger quem tem poder, o futuro é inevitavelmente sombrio. Os brasileiros honestos já temem pelo que virá.
Eu quero agradecer, em meu nome e em nome de todas as pessoas comuns, cidadãos simples do meu país como eu, pelas últimas decisões tomadas pelo nosso Egrégio Supremo Tribunal Federal.
Sim, o Supremo fez de nós pessoas melhores do que pensávamos ser.
Quando olhávamos aqueles Ministros sob suas togas, com passos lentos e decididos, altivos, queixos erguidos, vozes impostadas ditando verdades absolutas e supremas, envoltos numa aura de extrema importância e autoridade, nos sentíamos pequenos, minguados e reles plebeus diante de uma Corte que beirava o sublime, o inatingível e o intangível.
Com essas decisões o Supremo conseguiu fazer com que a minha percepção sobre mim e sobre nós mudasse. Eles não são deuses. São pessoas tão pequenas e tão venais que qualquer comparação que eu faça de mim e de nós em relação a eles seria desqualificar-nos a um nível abissal. Tudo aquilo é fantasia, tudo aquilo é pose e tudo aquilo não passa de um teatro, mas nós somos reais.
Foi aí que eu vi o quanto somos mais importantes que eles! Enquanto as divindades supremas encarnam seus personagens de retidão e lisura, mas com suas decisões abduzem a moral e destroem o país (e de quebra a reputação do Judiciário), nós brasileiros comuns e sem toga trabalhamos arduamente dia e noite para construir o país, ou pelo menos para minimizar os danos que eles provocam.
Então... Como é que um dia eu pude vê-los como sendo superiores a nós? Eu estava enganado. Nós somos muito superiores a eles, mesmo sendo zés, joãos, marias, desde o pequeno ambulante ao médico ou engenheiro. Nós somos as verdadeiras autoridades, porque nossa autoridade não foi conferida por um político malandro capaz de tudo com uma caneta. Nossa autoridade nos foi dada pela nossa força de continuar tentando fazer um Brasil melhor.
Fico sinceramente com pena é dos advogados, que são obrigados a chamar esses ministros de Excelência, ainda que com a certeza de que não há excelência alguma nos serviços que eles estão prestando à nação, mas *excrescências* Acho que deve ser o mesmo sentimento de ser obrigado a chamar o cachorro do rei de "milord".
Agora eu sei o quanto somos bem maiores que eles, mesmo sem aquelas expressões em latim e doutrinas rebuscadas cheias de pompas e circunstâncias, que com toda máxima "data venia" no final significam apenas *passar perfume em merda*.
Se há alguém realmente importante no Brasil, esse é o Excelentíssimo Povo Brasileiro, que apesar de tudo é obrigado a sentir o mau cheiro que vem da grande Corte, e mesmo com náuseas e ânsia de vômito, tem que acordar as 5 da manhã pra fazer aquilo que eles não fazem: *Produzir* os impostos para pagar os mais caros salários e os adicionais como ajudas de custos, verbas de gabinetes/ indenizatórias e os agregados e polpudos auxílios funcionais (paletó, educação, moradia, viagens, combustível , veiculo, celular, vinho, petshop, canil, periquita e sogra).
Obrigado, Supremo, por nos mostrar que hoje o rei sou eu e o meu povo, porque não estou encastelado na ilha de Santa Helena.
Agora, podemos andar pelas ruas com liberdade e cabeça erguida sem temor de levar tomates e ovos dos súditos.
* O autor, Marcelo Rates Quaresma, escreveu este artigo em outubro de 2017, ante decisões então tomadas pelo "Pretório Excelso".
O STF é o melhor lugar do mundo para delinquentes top de linha
O Supremo Tribunal Federal já deixou, há muito tempo, de ter alguma relação com o ato de prestar justiça a alguém. O que se pode esperar da conduta de sete ministros, entre os onze lá presentes, que foram nomeados por um ex-presidente condenado a doze anos de cadeia e uma ex-presidente que conseguiu ser deposta do cargo por mais de 70% dos votos do Congresso Nacional? Outros três foram indicados, acredite quem quiser, por José Sarney, Fernando Collor e Michel Temer. Sobra um, nomeado por Fernando Henrique Cardoso – mas ele é Gilmar Mendes, justamente, ninguém menos que Gilmar Mendes. Deixem do lado de fora qualquer esperança, portanto, todos os que passarem pela porta do STF em busca da proteção da lei. Quer dizer, todos não — ao contrário, o STF é o melhor lugar do mundo para você ir hoje em dia, caso seja um delinquente cinco estrelas e com recursos financeiros sem limites para contratar advogados milionários. O STF, no fundo, é uma legítima história de superação. Por mais que tenha se degenerado ao longo do tempo, a corte número 1 da justiça brasileira está conseguindo tornar-se pior a cada dia que passa e a cada decisão que toma. Ninguém sabe onde os seus ocupantes pretendem chegar. Vão nomear o ex-presidente Lula para o cargo de Imperador Vitalício do Brasil? Vão dar indulgência plenária a todos os corruptos que conseguirem comprovar atos de ladroagem superiores a 1 milhão de reais? Vão criar a regra segundo a qual as sentenças de seus amigos, e os amigos dos amigos, só “transitam em julgado” depois de condenação no Dia do Juízo Universal?
Os ministros do STF, com as maiorias que conseguem formar hoje em dia lá dentro, podem fazer qualquer coisa dessas, ou pior. Por que não? Eles vêm sistematicamente matando a democracia no Brasil, com doses crescentes de veneno, ao se colocarem acima das leis, dos outros poderes e da moral comum. Mandam, sozinhos, num país com 200 milhões de habitantes, e ninguém pode tirá-los dos seus cargos pelo resto da vida. O presente que acabam de dar a Lula é apenas a prova mais recente da degradação que impõem ao sistema de justiça neste país. Foi uma decisão tomada unicamente para beneficiar o ex-presidente – chegaram a mudar o que eles próprios já tinham resolvido a respeito, um ano e meio atrás, quando declararam que o sujeito pode ir para a cadeia depois de condenado na segunda instância. É assim que se faz em qualquer lugar do mundo onde há justiça de verdade — afinal, as penas de prisão precisam começar a ser cumpridas em algum momento da vida. Para servir a Lula, porém, o STF estabeleceu que cadeia só pode vir depois que esse mesmo STF decidir, no Dia de São Nunca, se vale ou não vale prender criminoso que já foi condenado em primeira e segunda instâncias (no caso de Lula, por nove juízes diferentes até agora), ou se é preciso esperar uma terceira, ou quarta, ou décima condenação para a lei ser enfim obedecida. Falam que a decisão foi “adiada”, possivelmente para o começo de abril. Mentira. Já resolveram que Lula está acima da lei – como, por sinal, o próprio Lula diz o tempo todo que está.
O STF atende de maneira oficial, assim, não apenas a Lula, mas aos interesses daquilo que poderia ser chamado de “Conselho Nacional da Ladroagem” – essa mistura de empreiteiras de obras públicas que roubam no preço, políticos ladrões, fornecedores corruptos das estatais e toda a manada de escroques que cerca o Tesouro Nacional dia e noite. Para proteger essa gente o “plenário” está disposto a qualquer coisa. Ministros se dizem “garantistas”, como Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello, e juram que seu único propósito é garantir o “direito de defesa”. Quem pode levar a sério uma piada dessas? A única coisa que garantem é a impunidade. No julgamento do recurso de Lula, o ministro Ricardo Lewandowski teve a coragem de dizer que a decisão não era para favorecer o ex-presidente, mas sim “milhares de mulheres lactantes” e “crianças” que poderiam estar “atrás das grades” se o STF não mandasse soltar quem pede para ser solto. É realmente fazer de palhaço o cidadão que lhe paga o salário. O que uma coisa tem a ver com a outra? Porque raios não se poderia soltar as pobres mulheres lactantes que furtaram uma caixinha de chicletes e mandar para a cadeia um magnata que tem a seu serviço todos os advogados que quer? Tem até a OAB inteira, se fizer questão. À certa altura, no esforço de salvar Lula, chegaram a falar em “teratologia”. Teratologia? Será que eles acham que falando desse jeito as pessoas dirão: “Ah, bom, se é um caso de teratologia…” Aí fica tudo claríssimo, não é mesmo? É um mistério, na verdade, para o que servem essas sessões do STF abertas ao “público”. Depois que um ministro assume a palavra e diz “boa tarde”, adeus: ninguém entende mais uma única palavra que lhe sai da boca; talvez seja mais fácil entender o moço que fica no cantinho de baixo da tela, à direita, e que fala a linguagem dos surdos-mudos. Sem má vontade: como seria humanamente possível alguém compreender qualquer coisa dita pela ministra Rosa Weber? Ou, então, pelos ministros Celso de Mello, ou Marco Aurélio? É chinês puro.
O espetáculo de prestação de serviço a Lula veio um dia depois, justamente, de uma briga de sarjeta, na frente de todo o mundo, entre os ministros Luis Roberto Barroso e Gilmar Mendes. Entre outras coisas, chamaram-se um ao outro de “psicopata” ou de facilitador para operações de aborto. Por que não resolvem suas rixas em particular? É um insulto ao cidadão brasileiro. Por que precisam punir o público pela televisão (aliás, paga pelo mesmo público) com a exibição de sua valentia sem risco? Os ministros dão a qualquer um, depois disso, o direito de chamá-los de psicopatas ou advogados de abortos clandestinos – por que não, se fizeram exatamente isso e continuam sendo ministros da “Corte Suprema”? Dias ruins, com certeza, quando pessoas desse tipo têm a última palavra em alguma coisa – no caso, nas questões mais cruciais da justiça e, por consequência, da democracia. É o mato sem nenhuma esperança de cachorro, realmente. A televisão nos mostra umas figuras de capa preta, fazendo cara de Suprema Corte da Inglaterra e dizendo frases incompreensíveis. O que temos, na vida real, é um tribunal de Idi Amin, ou qualquer outra figura de pesadelo saída de alguma ditadura africana.
* • Publicado originalmente em Veja.com