Percival Puggina

02/01/2023

 

Percival Puggina

         Os totalitarismos se alimentam dos próprios fantasmas. Corra a lista dos tiranos e vai encontrar o medo desses espectros comandando a violência do Estado totalitário. Num circuito fechado e crescente, o medo do tirano gera violência e a consciência disso aumenta-lhe o medo e ele intensifica a violência.  Não é preciso que algo ocorra para que os tiranos instalem snipers nas coberturas, tenham calafrios ante uma espingarda de pressão, controlem o pensamento e sua exposição ao convívio social, liberem suas matilhas e riam sardonicamente do próprio poder.

Mais de cem milhões de cadáveres contam os períodos mais brutais dessa história comum. E se você acha muito, lembre-se que se eleva a bilhões o número de vidas humanas que, por esses mesmos motivos, foram vividas sem o usufruto do maravilhoso dom da liberdade. Ah, os males que a covardia dos tiranos provoca!  

Totalitarismos armam o Estado e desarmam os cidadãos. Tiranos cercam-se de guarda-costas robustos, fortemente armados e treinados em artes marciais. São lobos! E querem viver entre ovelhas... Exigem que os cidadãos sitiados por centenas de milhares de criminosos soltos em nossas ruas e estradas deponham ante o Estado as armas necessárias ao exercício do direito de defender a si mesmos e do dever de defender suas famílias.

Sim, no primeiro caso é um direito; no segundo, é um dever. Eu me defendo se quiser, mas proteger minha família é um dever ao qual não posso renunciar. E convenhamos, nada mais cretino do que imaginar o Estado cumprindo essa tarefa na hora da necessidade, no lugar dos fatos. Se lhe pedirem para provar a necessidade de possuir uma arma de defesa pessoal, mostre sua identidade e diga: “Sou brasileiro, delegado!”.

Independentemente de quem hoje andar com a faixa no peito, a esquerda conseguiu, ao correr dos anos, produzir uma legislação protetiva da criminalidade e a transformou num fenômeno de proporções demográficas. Este é um severíssimo divisor de águas! Principalmente quando, incluído nas primeiras medidas de um governo, revela suas prioridades. A direita, conservadora ou liberal, jamais defenderá qualquer brandura que amplie o número de criminosos em liberdade; jamais favorecerá ações de Estado que tornem altamente rentável e de baixo risco a vida criminosa, jamais subscreverá qualquer discurso que busque razões sociológicas para justificar a expansão da criminalidade. Essas razões são as proporcionadas pelas políticas sociais e econômicas, bem como pelas estratégias psicossociais com que a esquerda trabalha politicamente nesses círculos.

O leitor destas linhas sabe muito bem quem vitimiza o bandido, criminaliza a vítima e não quer nem ouvir falar em cumprimento de pena após condenação em segunda instância. E o leitor sabe por quê.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

31/12/2022

 

Percival Puggina

         Passei o dia de ontem, 30 de dezembro, lendo discussões nas redes sociais entre cidadãos cujas opiniões se dividiam sobre a quem atribuir responsabilidades e culpas pelos acontecimentos que sobrevirão à posse de Lula e seu séquito de malfeitores.

Existem as culpas indiscutíveis. A culpa dos que, no juízo das “maiorias de circunstâncias” (palavras indignadas de Joaquim Barbosa), extinguiram o cumprimento de penas após condenação em 2ª instância, acabaram com a colaboração premiada e sepultaram a Lava Jato. Quatro mil e novecentas rolhas de espumantes espoucaram nos presídios do Brasil! Há a culpa dos ministros que, passados três anos, num instante de arrebatamento “iluminista”, mudaram o endereço dos processos em que Lula et caterva foram condenados. E a não esquecer: há a culpa dos ministros que – com criminosa informação de um hacker – exigiram de Sérgio Moro a isenção que alguns deles costumam deixar em casa quando a pauta do STF é de interesse político – porque os manés têm que perder, porque missão dada é missão cumprida, porque poder a gente toma e porque um tapinha carinhoso no rosto é o reconhecimento facial dos justos...

A estas, somam-se as imensas culpas das duas casas do Congresso Nacional, colegiados da representação política onde a falta de virtude prende aos próprios vícios o bem do povo brasileiro. E há a culpa dessa coisa horrorosa em que se transformou nossa “imprensa tradicional”, verdadeira massaroca de fatos, versões, narrativas, ocultações explícitas e fins implícitos.

O objeto real das discussões que acompanhei, porém, era outro. Envolvia possíveis responsabilidades das Forças Armadas e do próprio presidente Bolsonaro. Vejo essas altercações como uma armadilha criada por nós mesmos para nos capturar e dividir quando tanto iremos precisar de unidade.

Há muito trabalho pela frente! Objetivos a alcançar, tanto para frear os abusos de que temos sido vítimas quanto para sustar as ameaças e planos sinistros anunciados e já acionados por ministros do STF e pelo governo por instalar-se na virada da folhinha. Há um imenso dever de casa que nunca foi feito! 2018 foi o ano em que conservadores e liberais, ceguinhos e descuidados, acharam um vintém. Só por milagre, cegos acham vinténs. Há que vencer em 2026 por méritos, não por sorte ou milagre. A presidência de Bolsonaro mostrou-nos um quadriênio em que o bem realizado foi extraído a fórceps, de contexto adversário, que a toda hora quebrava regras e comandava o jogo.

O tema desta crônica, no entanto, era a busca de responsáveis pelo desastre de amanhã nos bate-papos de ontem nas redes sociais.

Neles não li uma única palavra sobre a responsabilidade por omissão dos 31 milhões de eleitores que ficaram em casa num dia como o 30 de outubro de 2022! Nem sobre outros quase 6 milhões que compareceram, mas votaram branco ou nulo!

Se um em cada dez desses cidadãos tivesse um pingo de juízo, o resultado da eleição seria outro. Sim, porque eleitores petistas, eleitores de esquerda, gente que acredita em mentiroso, que vai esperar o vale-picanha com cervejada, que precisava, por essas e outras, “trazer os criminosos de volta ao local do crime” (se o Alckmin pode, eu também posso), foram ávida e esperançosamente para a fila da seção eleitoral.

Uma pequena fração do bloco dos omissos daria ao Brasil outro 1º de janeiro. Enorme responsabilidade cabe, sim, à turma de “nojinhos” e comodistas a quem tanto escrevi e com quem tanto debati sempre que apareceu a oportunidade. Cidadãos que só votarão quando surgir candidato tão perfeito quanto eles mesmos; então, sobre as ruínas de sua omissão, comparecerão, vaidosos de si mesmos, às sessões eleitorais. Cidadãos que não gostam dos modos de Bolsonaro e com esse elevado critério viabilizaram números que “deram” vitória aos “modos” de Lula e seus comparsas. Quanta tristeza! Bastaria que pequena fração desse enorme contingente tivesse usado a consciência e a cabeça para que não estivéssemos, agora, às portas do nosso inferno astral, prometido pelo petismo e jurado por Xandão.

Com o que vem por aí, esse imenso grupo e os futuros congressistas são nosso campo prioritário de trabalho e conscientização cívica.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

30/12/2022

 

Percival Puggina

         Enquanto há vida, há esperança. Vá que se abra o céu e o Altíssimo decida intervir diretamente? Nunca se sabe, mas já aconteceu antes. São intervenções do tipo – “Até aqui deixei rolar, mas assim, também, já é demais. Esse povo bom não merece isso”.

Para efeitos didáticos, contudo, convém dar uma olhada no ministério escolhido por Lula. O Estado brasileiro foi submetido a um trabalho de açougueiro, de retalhista, dividido em cortes e recortes e agora cada um trate de puxar brasa para seu assado.

Espero que os leitores entendam que esse é o adicional de custo a pagar pelo tipo de “democracia" que nos disponibilizam: um modelo político corruptor e por um governo que já mostrou o quanto pode andar por esse caminho. Duas dúzias de ministérios não compram base de apoio no Congresso para um grupo político que, chegando, vem com a legitimidade carunchada. É preciso, no mínimo, o dobro para que partidos e parlamentares sorriam com agrado e a sociedade seja emudecida pela gratificada desfaçatez de seus representantes.

É assim que funciona a democracia à brasileira: às costas do povo, em conchavos de mesa de restaurante, hotéis no exterior, jatinhos e eventos cabulosos. Por vezes, imagino uma conversa quase de alcova entre um congressista e um ministro do STF: “Temos que parar de nos encontrar desse modo, Excelência...”.

Montada a máquina, com as empresas estatais gastando bilhões para publicizar sua atividade monopolista, ou seja, transferindo dinheiro direto para o caixa da tal “imprensa tradicional”, a única ponta infeliz da história é o povo pagador da conta e predeterminada vítima da tragédia. Mas o povo, bem sabemos, é um detalhe a ser mantido em silêncio obsequioso porque, afinal, o Estado brasileiro, quando posto diante do espelho, sabe que ele existe, principalmente, para proteger as próprias prerrogativas e se defender da sociedade.

Retomando o fio da meada e encerrando: se você examinar os 37 ministérios e seus titulares à luz do que sabe sobre o petismo e sobre a esquerda, entenderá que não só o Estado brasileiro está ali retalhado – os bens nacionais também o estão. Há ministérios para expropriar território nacional, bens privados, soberania popular, direitos dos cidadãos, liberdades individuais, autonomias federativas, garantias constitucionais dos indivíduos e, claro, fazer a cabeça dos tolos.  

Nunca vivi um fim de ano assim. Mas, vá que se abra o céu...

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

26/12/2022

 

Percival Puggina  

         Sobre as muitas incertezas referentes ao último pleito presidencial, há um dado de aparência consistente, presente em todas as pesquisas de opinião: “quanto mais pobre o eleitor, maior sua tendência a votar no candidato de esquerda”.  No entanto, o dado pesquisado mostra outra coisa: sociedades esquerdistas empobrecem. O esquerdismo gera miséria e não por acaso os estados mais pobres do Brasil são governados pela esquerda.

Não é difícil imaginar o motivo. Eu mesmo me encontrei com esse dado sempre que, em campanha eleitoral ou em debates, entrava em pauta a chaga social da pobreza. Sobre esse tema, como se verá a seguir, o esquerdismo tem um discurso redondinho, uma explicação simples que leva seu público alvo diretamente ao cativeiro da pobreza e da dependência.

Todo brasileiro que passou por uma sala de aula ouviu de alguns militantes travestidos de professores que os pobres são pobres por culpa dos ricos; ou na versão mais safada, que os ricos são ricos graças à pobreza dos pobres. Isso, porém, é falso, como mostra a experiência dos países de economias livres.

As causas reais da pobreza são:

  1. a carga tributária em que o Estado se apropria de mais de um terço de toda a renda nacional;
  2. a turma da corrupção ativa e passiva e das empresas gigantes nacionais que se abasteceram durante década e meia diretamente do PIB;
  3. os países satélites do nosso BNDES, usado para financiar essa parceria ideológica esquerdista a fundo perdido;
  4. nossos gravíssimos problemas institucionais que facultam ao Estado toda sorte de abusos;
  5. o fato de nossa Constituição, em vez de proteger os cidadãos do Estado faz o inverso e protege o Estado dos cidadãos;
  6. o patrimonialismo, o populismo, os corporativismos e os supersalários, o culto ao estatismo e os múltiplos desestímulos ao emprego formal;
  7. a má qualidade da educação oferecida aos nossos jovens em geral e aos segmentos de baixa renda em ainda pior padrão paulofreireano;
  8. a publicidade enganosa segundo a qual a salvação possa vir da mão grande do Estado.

De modo muito especial, a relação erótica da esquerda com o Estado induz a leituras erradas de nossos problemas sociais. Não, eles não se resolvem com mais Estado! Tal rumo afasta um elemento altamente humanizador, omite conhecimento precioso sobre a natureza e solução dessa chaga que é a pobreza persistente: naquilo que somos está nosso maior potencial e nossa maior alavanca para resolvê-la.  

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

          

 

Percival Puggina

22/12/2022

 

Percival Puggina

         Recentemente participei de uma reunião em que se debatia o tema da “independência” no relacionamento conjugal. Assunto interessante porque em torno dele se tem estabelecido grande confusão, sendo muitos os que consideram coisa desejável, no casamento moderno, uma recíproca e absoluta independência entre os pares.

Não existe isso em qualquer instituição humana. As instituições, assim como todas as sociedades, se compõem precisamente porque as pessoas dependem uma das outras; uma sociedade de membros totalmente independentes seria algo tão atomizado e disperso quanto inútil.

Na vida conjugal, e em especial nas relações onde o amor se impõe como elemento vinculante fundamental (embora não único), essa interdependência dos membros pode levar - e com frequência leva - ao sacrifício. Qualquer pai, mãe, marido ou mulher sabe que o amor cobra capacidade de renúncia, e a exige, especialmente nos momentos de crise pessoal, nas enfermidades, e sempre que há fardos a serem compartilhados.

Um dos maiores problemas que atingem a instituição familiar e sua estabilidade nos dias de hoje está localizado nessa fobia cultural à renúncia e ao sacrifício, entendidas pelo avesso - como elementos destruidores da natureza humana - e não como construtivos e constitutivos de sua maturidade.

O Natal de Jesus, e é sobre isso que desejo escrever, exemplifica com muita clareza que, no plano de Deus, o amor é inseparável da doação e da renúncia. O Natal não é apenas uma bela história - a mais bela das histórias - como afirma recente comercial na TV. Ele é também um drama real, convivido nas duas cidades, a de Deus e a dos homens: Deus se faz homem para estabelecer uma “nova e eterna Aliança” com a humanidade a que ama. E seguindo a lógica do amor, vai ao sacrifício de si mesmo.

Esse “dar-se” resiste, no ensinamento cristão, contra a dimensão comercial que cada vez mais domina as festas de fim de ano onde as relações se tornam crescentemente materiais, numa sequência que começa com o simples “receber”, passa pelo “trocar” e talvez chegue ao “dar alguma coisa”, mas raramente cogita do “dom de si”, que é a essência do Natal. Espero que este Natal de 1996 seja para cada um, em cada família, ocasião de refletir sobre as exigências do amor, segundo o exemplo de Jesus de Nazaré.

Nota do editor: Este artigo replica o publicado no Natal de 1996. Ele mostra que, passados 28 anos, persistem os problemas humanos e a perenidade da mensagem cristã.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

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21/12/2022

 

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         Meninos, eu vi. Eu vi deputados furiosos com a intromissão do Supremo em assunto que estava sendo objeto de negociação na Câmara dos Deputados. Vale dizer, no dinheiro das emendas.

Se ministro do Supremo prender deputado, eles dizem: “Dane-se, não gosto dele!”. Se aplicarem tornozeleira, tudo bem. Se desarmarem deputado, eles assistem. Se cortarem o acesso de parlamentares às redes sociais, ninguém se importa. Façam os “supremos” o que fizerem contra a governabilidade do país ou contra as liberdades de expressão e o direito de ir e vir dos cidadãos – a Casa do Povo a tudo assiste com cara de paisagem. Rodrigo Maia, depois que largou a presidência da Câmara, foi ser secretário de Estado em São Paulo e abandonou a política. Seu sucessor, Arthur Lira, também largou a política. O que ele faz é outra coisa, parecida, mas não é política, na perspectiva da sociedade. Tudo isso a Casa tolera, com as raras, notórias e brilhantes exceções (que por poucas, todos conhecem).

Vou usar a palavra tolerância, mas não no sentido que o leitor está pensando. Direi que a tolerância do Congresso tem um limite e esse limite atende pelo nome vulgar de “grana”. Mexeu na grana das emendas e até quem está em casa de cuecas, veste as calças e se manda para Brasília expressar indignação. E pasmem: imediatamente começaram a falar em excessos do Judiciário, em ativismo judicial, em desprestígio do parlamento e até na indignação dos cidadãos...

Sim, sim, sei. Não precisa explicar. Eu só queria, mesmo, entender.

Como aluno atento do mestre Alexandre de Moraes, aprendi dele algumas “categorias criminais” novas, de criação própria, desenhadas à perfeição para aplicar restrição de direitos conforme seu gosto. São categorias fluidas, gasosas, tais como, entre outras, atos antidemocráticos, fake news, militância digital, desordem informacional.

Na mesma batida, eu alinho algumas condutas igualmente etéreas, aplicáveis ao descomunal protagonismo do STF agora percebido pelo Poder Legislativo brasileiro. Ele pode começar a reagir usando as seguintes “categorias criminais”: ativismo judicial, militância cartorial, desordem hierárquica, agilidade punitiva em contradição com a morosidade processual.

Se precisarem de outras, eu arrumo aqui.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

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20/12/2022

 

Percival Puggina

         As palavras de Gustavo Gayer em sua diplomação como deputado federal eleito pelo estado de Goiás repercutiram nacionalmente. Mais bem ainda fariam se pronunciadas como parte de um discurso inteiro. No entanto, serviram como clarão nas trevas, como um flash de irresignação perante as anomalias da hora presente.

Quem manda é o STF!”, completou ele enquanto deixava o palco tendo o diploma pelo qual tantos se empenharam tanto. Sei bem o que ele pensava. Qual a serventia desse documento que certifica nossa legitimidade para o exercício da representação popular se essa missão nos é tomada pelo poder sem voto que resolveu “furar o teto” de suas competências? Não são subtraídas pelo simples querer, ou enfado, ou desagrado de um ministro do Supremo, as prerrogativas constitucionais como as que asseguram a total liberdade de expressão dos parlamentares?

Durante muitos, muitíssimos anos, li e ouvi, dissertações em que o orador, falando sobre tiranias, citando Ruy Barbosa, afirmava desde os altiplanos de um saber histórico: “A pior tirania é a do Judiciário porque dela não há a quem recorrer”. Lá dos baixios de minha ignorância eu sempre me perguntava: onde, raios, uma coisa horrorosa dessas pode acontecer?

Agora eu sei. Está em curso diante dos nossos olhos, fazendo vítimas ao nosso redor. Aliás, já estamos todos fustigados pelo seu chicote no ciberespaço ou na restrição de liberdades. Quantos já têm medo de escrever ou falar, ou trazem no lombo os vergões desses chicotes causados por multas, silêncios obsequiosos e bloqueios de bens?

O mandato parlamentar que serviria para sanar tais feridas peca gravemente por omissão quando conogressistas silenciam ao ver suas prerrogativas virar farinha soprada pelos ventos da tirania?

Torna-se oneroso e inútil o Congresso quando o Supremo legisla. Torna-se moralmente indigente o Senado quando o sistema de freios e contrapesos se transforma em mecanismo de proteção recíproca entre ele e o STF. Torna-se onerosamente inservível a Câmara dos Deputados que não protege a liberdade e as prerrogativas de seus membros e onde a regra do proveito próprio substitui o Regimento Interno e se sobrepõe à própria Constituição.

Nunca rezei tanto para estar enganado quanto o faço sobre minhas previsões em relação ao futuro Congresso. De quanto pude observar ao longo de décadas, as exceções, sempre notáveis, têm sido exatamente isso: notáveis exceções.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

18/12/2022

 

Percival Puggina      

        O inevitável senador pelo Amapá postulou e o intemperante ministro do STF por Michel Temer concedeu ordem para desmontar à força o acampamento a frente do Comando Militar em Brasília. “Ordem dada, missão cumprida”. É assim que no Brasil destes anos imoderados se faz política no Brasil. Sem modos e sem povo.

“Deus cria, o diabo espalha e eles por si se juntam”, constata o ditado popular. A História está cheia desses exemplos, como os de Mao Zedong e Zhou Enlai, Hitler e Goebbels. Às vezes se juntam e se separam como os três monstros da Revolução Francesa – Robespierre, Danton e Marat – ou Lênin e Trotsky.

Aqui no Brasil temos o recente caso da dupla Alexandre de Moraes e Randolfe Rodrigues. Um ministro do Supremo e um senador pelo Amapá que se tornou famoso em virtude do ritmo alucinante que, sozinho, consegue imprimir aos tribunais superiores da República. Ele é o cara que faz girar a roleta. E ganha sempre.  Moraes e Ranolfe parecem almas gêmeas, nascidas uma para a outra.

O senador alegou que o acampamento estava tumultuando a vida da capital do país e era necessário “puni-los exemplarmente”. É óbvio que os acontecimentos posteriores à prisão do cacique têm que ser investigados e as autores identificados e submetidos à lei. Se a investigação for feita como deve, certamente evidenciará que houve infiltração. Seja porque a conduta dos malfeitores é totalmente atípica em relação aos manifestantes acampados, seja porque, ao contrário, do que pensam o senador e o ministro, ela caracteriza um tipo bem conhecido de militância.

A Vice-Procuradora- Geral da República, Lindôra Araújo, em contestação à decisão, escreveu:

"O Ministério Público Federal requer, em caráter de urgência, o exercício do juízo de retratação pelo eminente Ministro Relator, reconsiderando-se a decisão agravada, com a consequente negativa de seguimento ao pedido incidental formulado por agente político e o desentranhamento dos autos deste inquérito, com arquivamento das petições, sob os fundamentos de falta de legitimidade ad causam, ausência de conexão, violação do sistema acusatório e ocorrência de “bis in idem", Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral da República.

A Vice-Procuradora afirma uma verdade que a dupla não se empenhou em buscar. A Justiça não pode funcionar desse jeito, na base do “ordem dada, missão cumprida” (“falta de legitimidade”), violando constantemente o sistema acusatório da competência da PGR, nem agir onde já existe inquérito funcionando “(bis in idem”).

Mas o Brasil está assim. O povo não gostou do modo como é tratado? Vá para casa e faça cara feia onde ninguém veja. Tal qual em Cuba, que conheço melhor do que o Lula (onde falei e falo com quem ele jamais falou) e certamente como na Venezuela e Nicarágua, que o Lula conhece melhor do que eu (mas na campanha eleitoral não se podia dizer).

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

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17/12/2022

 

Percival Puggina

         Se você procurar uma imagem que retrate “austeridade” no Google, vai encontrar uma assustadora montanha de charges e mensagens, ditos e piadas depreciando essa virtude. Praticamente nada a favor! Vejam o estrago político que o corporativismo, o patrimonialismo e a manipulação das mentes produziram! Há um governo, ou coisa que o pareça, se formando em Brasília, com fila de embarque, e todos querendo dinheiro para gastar... Pensando a respeito, lembrei-me de dois fatos. Um deles é frequentemente mencionado. Do outro, poucos tomaram conhecimento e eu tive o privilégio de testemunhar.

Quando o general Castelo Branco era presidente, havia um projeto estacionado no governo aguardando decisão que beneficiaria a categoria funcional a que pertencia um irmão seu. Decidido o caso de modo favorável, os colegas cotizaram-se e o presentearam com um automóvel Aero Willys, em recompensa pelos supostos esforços que teria feito para obter do presidente a decisão que agradou a todos.

O assunto chegou ao conhecimento de Castelo Branco que chamou o irmão e o mandou devolver o veículo. Ante a recusa, o presidente o demitiu no ato, advertindo que restava decidir, apenas, se o mandava prender ou não.

Do outro fato, sou testemunha pessoal. Aconteceu pouco tempo depois e há, também, um Aero Willys na história. Eu tinha meus 23 anos, estava terminando o curso de Arquitetura e Urbanismo e trabalhava, às tardes, como oficial de gabinete do governador gaúcho coronel Walter Peracchi Barcelos. Certa feita, entrei no gabinete e o encontrei esbravejando. Ele tinha em mãos pedido encaminhado por dirigente de um órgão qualquer interessado em adquirir um automóvel Ford Galaxy para a própria locomoção e serviços ao seu gabinete.

O Ford Galaxy, para quem não conheceu, era a nave espacial da época. Um carrão no melhor estilo das grandes “banheiras” norte-americanas de então. À frente, um imenso motor V8 4.9 cilindradas; atrás, o porta-malas parecia uma suíte. Viajava-se nele pelas antigas estradas de terra, onde tudo sacolejava, sentindo o suave balanço de um navio em alto mar. Privilégio de poucos, e o tal funcionário queria um para seu uso.

“Está demitido!”, esbravejou o governador. “Imagina: eu uso um Aero Willys surrado e ele quer um Galaxy”. 

Eram outros homens, outros tempos. O que aconteceu de lá para cá? Não é mais possível ser austero? Os eleitores apreciam a ostentação das cortes? Se for assim, como parecem mostrar os acontecimentos destes dias, então regredimos, como sociedade, para antes das revoluções liberais dos séculos XVIII e XIX.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.