Percival Puggina

04/06/2021

 

Percival Puggina

 

A grosseria na CPI é termômetro da covardia. Aproveitar-se do poder conferido pelo mandato para ofender os depoentes é atitude reprovável, típica de tiranos e de abusadores. Senadores cobram dos interrogados um respeito que não lhes concedem. Quantas vezes os trabalhos da CPI me fizeram lembrar as assembleias estudantis do início dos anos 60! Militantes da esquerda de então, ensaiavam os mesmos artifícios, a mesma gritaria, os mesmos recursos regimentais para fazer calar a divergência. Mas eram adolescentes e lá havia o recurso da hombridade: “Te espero na saída!”.

Nem naqueles tempos, contudo, o desrespeito da militância esquerdista se voltava contra as colegas. Impensável então, tanto quanto hoje, fazer o que alguns senadores fazem ao interrogar mulheres nas sessões de tortura da CPI. E tudo perante o silêncio complacente da mídia e do feminismo militantes, que só zelam pelas mulheres de esquerda.

Disse bem o Simers em nota de repúdio:

O Sindicato Médico do Rio Grande do Sul manifesta indignação ao tratamento de senadores às médicas Mayra Pinheiro e Nise Yamaguchi, na CPI da Pandemia. A entidade repudia veementemente constrangimentos submetidos às respeitadas cidadãs, mulheres experientes, profissionais com qualificados currículos e respeito profissional. 

O ambiente de hostilidade e absoluto demérito a posicionamentos contrários aos dos questionadores que se direcionaram às médicas, além de expostos preconceitos, denota profundo desrespeito ao ato médico. O fato ataca profundamente toda a categoria, independentemente da atuação de cada profissional. 

Mais contundente ainda falou o presidente do Conselho Federal de Medicina, órgão máximo da categoria, em manifestação cuja íntegra pode ser assistida aqui. Afirma o Dr. Mauro Ribeiro:

Infelizmente, aquilo que nós temos visto nessa CPI da Covid é inaceitável, é intolerável, principalmente quando nós vemos médicas, como no caso das doutoras Nise Yamagushi  e a Mayra Pinheiro, que estiveram lá recentemente, sendo completamente destratadas por alguns senadores que fazem parte daquela Comissão Parlamentar de Inquérito. Isso, para o CFM, instituição maior da medicina brasileira, é intolerável, é inaceitável sob todos os pontos de vista.

Antes de encerrar lamentando o ambiente tóxico da CPI, o presidente do CFM, dirigindo-se ao senador Otto Alencar por sua conduta em relação à colega doutora Nise Yamaguchi quando depondo à CPI, disse:

O senhor é um médico e deveria refletir sobre aquilo que o senhor fez, a deslealdade que o senhor teve com uma médica mulher. Sua atitude como senador da República poderia, até, ser caracterizada como um ato de misoginia, tamanha a agressividade que o senhor teve naquele momento e a desqualificação que o senhor fez com uma mulher que estava ali convidada.

Creio estar minha opinião suficientemente respalda, seja por minha observação pessoal, seja pelos depoimentos transcritos, aos quais se somaram protestos de outras senadoras e senadores presentes às sessões da Comissão.

Essa CPI faz mal a si mesma e mostra ao Brasil a face sinistra de políticos e partidos que, exatamente por serem como são e agirem como agem, têm que ser mantidos, por opção democrática da sociedade brasileira, longe de posições de mando. São tiranetes em busca de mais poder.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

        

Percival Puggina

02/06/2021

 

Percival Puggina

 

Em seu livro “Post-Capitalist Society”, Peter Drucker sustenta a ideia de que a derrubada do credo marxista significou “o final da fé na salvação pela sociedade”. Justificadamente convergem a esse autor o reconhecimento mundial como perito em Administração e como analista de seu tempo. Na nota introdutória da referida obra, Drucker afirma:

O comunismo faliu como sistema econômico. Em lugar de criar riqueza, criou pobreza; em lugar de criar igualdade econômica, criou uma nomenclatura de funcionários que gozavam de privilégios sem precedentes. Mas foi como credo que faliu porque não criou o homem novo; em seu lugar fez aparecer e reforçou tudo que havia de pior no velho Adão: corrupção, cobiça, ânsia de poder, inveja e desconfiança mútua, mesquinha tirania e “secretismo”; a mentira, o roubo, a denúncia, e, acima de tudo, o cinismo. O comunismo, o sistema, teve seus  heróis, mas o marxismo, o credo, não teve um único santo.

Essa exata descrição da realidade foi escrita três anos após os fatos de 1989, quando a abertura do Muro de Berlim suscitou o vendaval que pôs por terra todo o castelo de cartas a que estava reduzido o imperialismo soviético após quatro décadas de muita propaganda e ainda maiores e mais numerosas frustrações.

O que me chama atenção como leitor de Drucker é a semelhança existente entre essas considerações de seu livro e o que, cem anos antes, escrevera Leão XIII, em 1891, na Encíclica Rerum Novarum. Naquele pequeno documento, destinado à reflexão dos povos e dos governos da Terra, o admirável pontífice profetizara sobre o que aconteceria onde o comunismo viesse a ser implantado. Note-se que esse regime só teria testes de campo a partir de 1917, ou seja, um quarto de século após a publicação da encíclica. Vicenzo Gioachino Pecci, esse era o nome de batismo do sábio profeta, não pode ver em vida a perfeição de suas previsões, pois faleceu em 1903. É impossível lê-lo, porém, sem ser impactado pela lucidez com que abriu o véu do futuro e anteviu, no emaranhado de ciências sociais envolvidas, o desastroso produto final daquele regime. Eis suas palavras sobre o comunismo, escritas, repito, em 1889:

Mais além da injustiça de seu sistema, veem-se bem todas as suas funestas consequências, a perturbação de todas as classes da sociedade, uma odiosa e insuportável servidão para todos os cidadãos, porta aberta a todas as invejas, a todos os descontentamentos, a todas as discórdias; o talento e a habilidade privados de seus estímulos, e, como consequência necessária, as riquezas estancadas na sua fonte; enfim, em lugar da igualdade tão sonhada, a igualdade na nudez, na indigência e na miséria.

Cem anos inteiros separaram o consagrado analista Peter Drucker do profético Vicenzo Gioacchino Pecci (Leão XIII). Deste último, ninguém sabe o nome e poucos, muito poucos, têm notícia da admirável previsão disponibilizada por ele à humanidade que muito, dela, se poderia ter beneficiado.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

 

 

Percival Puggina

30/05/2021

 

Percival Puggina

 

Sempre me vi como um aprendiz, bom ouvinte, atento às páginas do cotidiano, da história e dos livros. Eis porque não consigo entender a pouca atenção dada às imensas oportunidades de aprendizado e experiência que a sala de aula dos fatos proporciona em nosso país. E note-se: fatos de muito boa pedagogia.

Lição nº 1 – Depois da ordem divina que pôs o Paraíso Terrestre em lockdown, o Senado brasileiro tornou-se a melhor alternativa disponível. Como regra geral, é o prêmio que a política partidária reserva a seus caciques (ou estes para si mesmos). É ali que comem a maçã, conversam com a serpente, preservam a impunidade, articulam o próprio futuro e determinam o tamanho da conta que mandarão para nós. Muda Senado!

Lição nº 2 – A CPI da Covid-19 é aula magna apresentada por eminentes doutores na arte da mistificação e do sofisma. Pensada pela serpente para organizar a seu modo e gosto o ambiente político de 2022, tem deixado à mostra o bote armado, os dentes e o chocalho no rabo. Esse Senado onde as boas exceções não contam 20 votos, esse Senado dos caciques, suportado pelos eleitores sem um justo brado de revolta, prova nossa negligência para com a política e o bem do país. Só uma instituição majoritariamente desqualificada extrairia de seus quadros tal deformidade para fazer o que faz. Muda Senado!

Lição nº 3 – Era preciso estar hibernando no início deste século para não perceber o que inevitavelmente iria resultar de um STF quase inteiramente indicado pelo PT. Um colegiado escolhido pelo partido, soprado por José Dirceu, poderia ser melhor ou, mesmo, diferente? A outrora respeitável Suprema Corte brasileira tornou-se um poder contra a nação e fez da Carta de 1989 seu objeto multiuso, seu canivete suíço. Mais do que todos, sabem-no os membros da Corte e enaltecem a si mesmos declarando-se “contramajoritários”. Mas saibam: essa é apenas uma expressão de suposta cultura jurídica para fazerem o que bem entendem, chutando a democracia e o resultado das urnas... Muda STF!

Lição nº 4 - Cento e trinta e dois anos de crises, instabilidades, frustrações não foram suficientes para nos mostrar que esse modelo institucional é incorrigível. De um modo sistemático, transforma a governabilidade em mercadoria, agrega oportunidades e valor à corrupção, produz hipertrofia e aparelhamento do Estado e, a cada quatro anos, renova para pior a representação parlamentar. Acorda Brasil!

Lição nº 5 – O presidente da República não é um príncipe perfeito. Às limitações institucionais, somam-se as próprias. Mas tem méritos, políticos e de gestão. Graças a ele, a seus esforços pela liberdade, resistimos à depressão para onde, de modo doentio, insistem em nos levar os grandes meios de comunicação. Ele não é o conservador nem o liberal de manual, mas defende valores estimados por uns e outros. E é o único que pode, no ano que vem, vencer o adversário que quer voltar para prosseguir a obra sinistra interrompida em 2018.

Deus abençoe e fortaleça os conservadores e liberais brasileiros!

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

28/05/2021

 

Percival Puggina

 

Às vezes encontro pessoas cuja posição política conheço e me surpreendem repetindo o falatório da oposição, afirmando que o Bolsonaro isso, o Bolsonaro aquilo, apontando mancadas do presidente. Alguns ilustram o que dizem mencionando danos supostamente causados por ele à imagem do Brasil. Isso é referido como se tais danos não tivessem outras causas, ou como se o refinamento de Lula e a fulgor intelectual de Dilma tivessem sido ofuscados pelos modos toscos do atual chefe do poder executivo. Não raro, indicam como novidade, o racha da sociedade brasileira. “Vivemos um maniqueísmo”, exclamam.

Sei que esses interlocutores, tanto quanto eu, conhecem os males em médio prazo insanáveis que o falso progressismo causou ao Brasil. A obra de ocupação do território educacional e cultural já conta várias décadas e permanece abertamente operacional. Mais do que na degradação moral causada pela transformação do velho patrimonialismo em um conjunto de organizações criminosas, certamente é nesses dois setores conexos – educação e cultura – que se desenrola sua atividade mais perniciosa.

Sempre que denuncio o mal causado por Paulo Freire à juventude brasileira, esquerdistas me contestam mencionando as luzes que a ribalta companheira ou camarada ainda hoje acende para ele no cenário internacional. Falam da experiência alfabetizadora de Angicos e alegam que seu método nunca foi aplicado no Brasil. Também em Angicos, aliás, passados os 40 dias da aparatosa exibição, os alunos avaliados em alfabetização e politização saíram-se melhor nesta do que naquela. A política em primeiro lugar...

O estrago causado por Paulo Freire, sempre esteve em ter capturado para a pedagogia o que havia de mais destrutivo na filosofia, na sociologia e no pensamento político de seu tempo. Tanto foram e permanecem extensivos e dominantes esses paradigmas que a atrasada e decadente Educação em nosso país o tem por patrono! Como unir esforços com trabalhadores em educação?

O maniqueísmo que alguns almejam derrotar não é obra dos conservadores e liberais brasileiros, politicamente omissos até 2014. Com persistência que faz lembrar os construtores de grandes muralhas, os falsos progressistas foram dividindo a nação como obra das próprias mãos. Sem encontrar resistências! Estas só surgiram quando conservadores e liberais, olhando os escombros da sociedade, se perceberam maioria irresponsavelmente omissa, silenciosa e derrotada.

O enfrentamento hoje instalado no Brasil precisa se manter nos âmbitos devidos – da cultura, da educação e da política – para que maiores males sejam evitados. Portanto, atenção, leitor: entrar nesse contexto com apito na boca, com a neutralidade e o desinteresse dos árbitros em relação ao resultado da partida, ou querer encerrar o jogo para uma imaginária confraternização dos “atletas” é generosa, inútil e, como sempre, perigosa utopia. Deus abençoe e fortaleça os conservadores e liberais brasileiros.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

25/05/2021

Percival Puggina

 

Cuidado, pessoal. As bandeiras do falso progressismo, como a liberação de certas drogas, acabam elegendo os Joe Bidens da vida.

A frase acima é uma provocação ao leitor. O que estou querendo afirmar neste artigo é que esse “progressismo” entre aspas que assola o Ocidente defende a liberação da maconha e outras drogas como se elas fossem um problema apenas individual e não um gravíssimo problema social, na raiz de muitos dos males que a todos atingem e em quase uníssono condenamos.

Nessa linha, desconsiderando o fato de tantos de seus atores e artistas terem sido vitimados por esses vícios que a empresa quer ver descriminalizados e liberados, o jornal O Globo afirmou em editorial de 14 de novembro do ano passado:

 “(...) Ao mesmo tempo que  a maioria dos eleitores americanos tratava de tirar Donald Trump da Casa Branca, muitos também votavam em plebiscitos estaduais para ampliar a liberação do uso recreativo e da aplicação medicinal das drogas. Tais consultas mostram quanto o Brasil está atrasado nesse campo, apesar dos esforços de legisladores, juízes e pesquisadores.

Estou plenamente advertido sobre o fato de que o uso medicinal da  maconha não se confunde com o recreativo. Aquele pressupõe o emprego da cannabis sativa processada em laboratórios para pacientes com enfermidades e não para gerar dependências e sequelas em pessoas sadias. Sei, também, que o hábito de encher a cara é anterior ao Antigo Testamento; que os ameríndios mascavam folha de coca, fumavam cachimbo e destilavam a própria aguardente; que no início do século XIX houve uma guerra entre a Inglaterra e a China pelo transporte dos derivados da papoula, e que a dependência do ópio já era um flagelo na Antiguidade. Sei, por fim, que nos filmes da Netflix – uma das referências do “progressismo” – fuma-se mais maconha do que cigarros de tabaco porque é “muito mais divertido”.

Ouvir em meios culturais e de comunicação um discurso de tolerância em relação à maconha e outras drogas, ou, o que talvez seja ainda pior, perceber que se difunde por repetição a ideia de que maconha não faz mal algum (“porque é até medicinal”), resulta inquietante para quem tem informação verdadeira e objetiva sobre o assunto. Pergunte, leitor, a profissionais da área de saúde que lidam com dependência química. Ouça peritos a respeito dos efeitos neurológicos, psicológicos e comportamentais da maconha e suas consequentes companheiras. Indague a pais e professores sobre o impacto que o uso dessa droga determina na capacidade intelectiva, na concentração, na disciplina e na vida escolar de milhões de jovens.

Nunca esqueça ter sido ela que abriu a caixa de maldades e perversidades desencadeadas em nosso país nas últimas décadas. Primeiro gerando o hábito social, em seguida o vício, e, depois, puxando a longa corrente das drogas cada vez mais pesadas que invadiram o mercado com seu poder de destruição, violência e corrupção.

Triste a nação que renuncia à tarefa de transmitir valores às suas gerações! Se as famílias cuidam apenas da subsistência material, se as escolas se encarregam, quando muito, de transmitir conteúdos didáticos, se as Igrejas só se ocupam de questões sociais e políticas, se os meios de comunicação deixam de lado sua responsabilidade social, quem, afinal de contas, vai orientar a sociedade para o bem?

Observe o trabalho dessas meritórias instituições que assumem a missão de recuperar os destroços humanos deixados pelas drogas. O que oferecem? Qual sua receita? Saudável orientação moral, abstinência do vício, espiritualidade, disciplina e trabalho. Mas, onde o trabalho das grandes instituições? Elas, que durante séculos responderam social e responsavelmente por tais tarefas, foram tragadas por um alinhamento automático ao “progressismo” que as queria derrotar. Deus abençoe a resistência conservadora!

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

23/05/2021

 

Percival Puggina

 

Telefonou-me o amigo jornalista Júlio Ribeiro, que apresenta o Boa Tarde Brasil na Rádio Guaíba de Porto Alegre. “Puggina, qual tua música brasileira preferida?”

A resposta estava na ponta da língua, mas eu precisava reler a letra e, nas horas seguintes, viajar em memórias e em reflexões sobre o desastre cultural brasileiro. “Aquarela do Brasil”, foi o nome que, por WhatsApp, enviei ao Júlio pouco depois. Talvez mais do que nunca, em tempos de tamanho desamor ao Brasil, o samba sinfônico de Ary Barroso vale por um manifesto.

Em duas ocasiões, jantando no exterior com minha mulher, noite romântica, música de fundo, aconteceu de ouvirmos os primeiros acordes de Aquarela do Brasil se difundirem pelo sistema de som ambiental. Aos poucos, as vozes foram calando, o silêncio se impondo reverente e os rostos se abrindo em sorrisos. Logo, todos marcavam compasso, balançavam os corpos numa celebração da brejeirice que é marca da cultura popular brasileira. Momentos de arrepiar, para um brasileiro “fora da base”.

A obra de Barroso fala do muito que maldosamente nos foi tomado depois. Há nela um saudável amor ao Brasil que se reforça (Brasil brasileiro), nação mestiça, do samba, do amor e de nosso Senhor.

Brasil meu Brasil brasileiro
Mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
Brasil, samba que dá
Bamboleio, que faz gingar
O Brasil do meu amor
Terra de nosso Senhor

Não se envergonha da história, mostra o multiculturalismo, venera a mulher.

Abre a cortina do passado
Tira a mãe preta do cerrado
Bota o Rei Congo no congado
Canta de novo o trovador
A merencória à luz da Lua
Toda canção do seu amor
Quero ver essa dona caminhando
Pelos salões arrastando
O seu vestido rendado

E canta as maravilhosas dádivas com que a Criação obsequiou esta porção do planeta.

Esse coqueiro que dá coco
Oi onde amarro a minha rede
Nas noites claras de luar
Por essas fontes murmurantes
Onde eu mato a minha sede
Onde a Lua vem brincar
Oh esse Brasil lindo e trigueiro
É o meu Brasil brasileiro
Terra de samba e pandeiro

Perdoe-me o leitor, mas que saudade me dá! E que tristeza me causa saber que hoje, brasileiros promovem mundialmente preconceitos e boicotes contra o Brasil; saber que amor à pátria é considerado defeito de caráter, mediocridade política e fanatismo “de direita”; que o desprezo à nossa história e origem é cultivado em salas de aula por professores que coletam o lixo histórico para construir narrativas que a tanto levam.  Quem vive politicamente de gerar preconceitos internos não tem escrúpulo em criar preconceitos externos contra o próprio país. E faz isso.

Estaremos (estivemos?) mais bem servidos por apátridas bandeiras vermelhas? Parece que o novo presidente dos EUA sinalizou o caminho das rupturas ao autorizar o hasteamento da bandeira do orgulho gay ao lado da “Stars and Stripes”, como se uma bandeira nacional não fosse de todos e precisasse de anexos. 

A divisão de um reino contra si mesmo, nas palavras de Jesus em Mateus, faz com que esse reino não subsista. Como nos é oportuno tal ensinamento!

Faça um bem a si mesmo. Depois de ler este artigo, ouça Aquarela do Brasil e assuma consigo mesmo o amável compromisso que ela inspirará.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

21/05/2021

 

Percival Puggina

 

No último dia 15, vi esse bom povo rezar, cantar, valorizar em cartazes, gestos e aplausos, palavras que traziam calor à alma na tarde fria de Porto Alegre. Havia, na manifestação pela Família, alguns amigos pessoais, claro. Mas eu conhecia aquela gente toda pelo muito que temos em comum no pequeno e imenso repertório de afetos morais e espirituais que trazemos no coração.

Estávamos unidos por algo valioso e, sim, também contra perigos assustadores. Quando lhes falei, encerrando o evento, disse que no campo político, no lado oposto, cada palavra proferida ali no Parcão era objeto de escárnio e combate. Era execrado cada cartaz, bem espiritual, valor moral, anseio expresso, oração pronunciada. Difícil, no mundo moderno, imaginar antagonismo maior e conciliação tão impossível.

Engana-se quem pensa que as bandeiras vermelhas expressam mera opção política. Não! Trata-se de algo muito mais profundo, que envolve a destruição de toda uma cultura. E não é para substituir por outra superior, que seus filósofos, psicólogos, linguistas, juristas estão longe de esboçar, mesmo os mais eminentes. Pensam tão distantes do homem real que negam a própria Razão.

Por acaso, poucas horas antes de sentar-me para escrever este artigo, recebi da editora Avis Rara, o livro “Guerra Cultural” de Stephen Hicks. Nas primeiras páginas, engasgo a leitura diante da composição de duas frases. Numa, diz Michel Foucault: “A Razão é a derradeira linguagem da loucura”. Na outra, Jean-François Lyotard completa o abismo: “A Razão e o Poder são uma coisa só”.

Perceberam, queridos leitores, as consequências disso? De um golpe só todas as bibliotecas são derrubadas.  É a filosofia que nega a filosofia! Segundo ela, observar a realidade, buscar sentido, aplicar a inteligência ao objeto, ter razão, por fim, é opressão. Que dizer, então da Fé, da verdade, do bem, do justo, do belo?

Sigamos adiante com os semideuses das prateleiras universitárias. Eles nos levam pela mão àquilo de que nos querem afastar. Pense nas nossas salas de aula que motivam o desamor à pátria, no “pluralismo” excludente das universidades, no que aconteceu com a arte ao longo do último século. Pense nas notícias que chegam de toda parte sobre a total rendição dos educandários católicos, pense na acomodação e reacomodação da doutrina à falta de juízo da hora. Pense na fragmentação da sociedade, no modo como o poder é disputado, no que o Congresso vota, ou não vota, e no que STF decide, ou não. Pense na erotização das crianças, na ânsia pela liberação da maconha, nas prisões abertas, na culpa das vítimas e na inocência dos culpados. E vamos, assim, virando o mundo pelo avesso, usando a difamada Razão para estabelecer relações de causa e efeito.

Durante dezenove séculos, minha amada Igreja Católica foi a grande depositária e sustentáculo da cultura do Ocidente. Sua missão educadora e cultural andava lado a lado com a espiritual. Ao ceder aquelas, fragilizou esta. Ao exorcizar seus conservadores, foi à dança com os lobos. Por isso, o Brasil, com um governo que coloca Deus acima de todos, está no olho de um furacão de intolerância a evidenciar que não há lugar para Ele na destruição empreendida por seus adversários. Há dois anos, o Brasil mostrou não estar perdido. Não há uma carta de rendição sobre a mesa. Ainda é tempo de salvação.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

18/05/2021

 

Percival Puggina

 

Há alguns anos, durante um dos mandatos de Lula, escrevi um artigo em que lastimava a falta de cobertura para a tarefa oposicionista no Congresso Nacional. Lembrava os tempos em que os jornalistas acompanhavam as sessões com bloco de papel e lápis fazendo registros sobre o que era dito pelos atores da cena política e o que lhes era sussurrado aos ouvidos para concluírem suas matérias no teclado das máquinas de escrever, aos fins de tarde.  Vi tudo isso acontecer, pois de algo me valem meus 76 anos. Testemunhei um tempo em que o aeroporto, às sextas-feiras, era tomado por repórteres que aguardavam deputados e senadores nos voos procedentes de Brasília. Com eles vinham, fresquinhas, notícias “da corte”. Estas rotinas morreram com a evolução frenética das comunicações.

O que está morto morreu. Com o tempo, já entrando no ritmo do século XXI, foi ficando visível que descera uma cortina de silêncio sobre os congressistas de perfil conservador e/ou liberal. A esquerda já estava no poder. E não apenas no altiplano de Brasília, mas nos cursos de jornalismo, nas redações, no grande mundo da cultura. Nem o jornalismo esportivo escapava àquela hegemonia. O politicamente correto dominava a comunicação social e impunha a toda divergência um cala-boca geral. Foi o tempo em que os gigantes da nossa imrensa foram morrendo e os conservadores remanescentes, excluídos das grandes redações, deslocados para as formas de mídia surgentes.  Restaram uns poucos, raros quais ursos brancos, como o Alexandre Garcia  o J.R.Guzzo e uns poucos outros.

Ao mesmo tempo, o trabalho dos ditos “progressistas”, os portadores de projetos de reengenharia social, atuais oposicionistas, recebem intensa cobertura da mídia militante. A esquerda política, ou seja, o petismo e suas “variantes” (para usar o vocabulário da pandemia), age com as facilidades de uma pedra de curling, batedores à frente, amaciando o terreno. O governo e os governistas, por seu turno, falam nas redes sociais. E também estas vêm sendo manipuladas por “comissários da verdade”, corregedores de “temas sensíveis”, cujas opiniões não podem ser contrariadas.

É fastidioso, por fim, o silêncio dos plenários vazios. Chega a ser ridícula sua substituição por sessões virtuais em que os parlamentares falam em chinelas e bermudas, desde as próprias moradias. São verdadeiros monólogos caseiros, proferidos às “telinhas” enquanto cãezinhos latem, portas batem e os temas não se debatem. O cenário que descrevo de modo algum serve ao interesse da sociedade, cujo amplo esclarecimento é papel comum do bom jornalismo, dos partidos e das instituições do Estado.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

15/05/2021

 

Percival Puggina

 

A Inglaterra, segundo as palavras de Churchill no famoso discurso de 18 de junho de 1939, teve sua “hora mais esplêndida” (finest time) ao entrar, sozinha, na guerra contra a Alemanha nazista. Os Estados Unidos tiveram sua “hora mais escura” (darkest hour) após o ataque terrorista às Torres Gêmeas e caçada a Bin Laden, retratada no filme Zero Dark Thirty (“meia noite e meia”, no jargão militar americano). E o Brasil está vivendo sua hora mais ridícula nessa CPI da Hidroxicloroquina (HCQ).

Pode o vírus voltar para a China com alvará de soltura porque, bem investigadinho em CPI do Senado brasileiro, não lhe cabe culpa alguma. Aqui, nas palavras de senadores membros da comissão, todas as vítimas, sem exceção, foram causadas pelo governo federal. No Brasil, de covid-19, só se morre pela insistência do presidente em apontar um tratamento precoce indicado mundo afora por médicos com atividade clínica, inclusive em automedicação.

“Mas como – perguntará o estrangeiro visitante, que sequer imagina as peculiaridades da política em nosso país – o governo trocou vacina por hidroxicloroquina? Ela é vendida sem receita médica? No Brasil, decisões terapêuticas não são privativas dos médicos?”

Ora, ora, mister, esclareço eu. Aqui há mentiras badaladas e verdades enxotadas. Se você fizer essas perguntas a um militante de esquerda ele o chamará de gado e esperará que você se afaste mugindo. Exibir discernimento resulta ofensivo em certos ambientes e veículos.

Como era absolutamente previsível, com cinco a seis bilhões de pessoas por vacinar e com os cinco países dos grandes laboratórios consumindo mais de 60% da produção em suas próprias populações, o imunizante é um bem escasso, não disponibilizado em ritmo adequado. Ainda assim, o Brasil consegue disputar o quarto lugar em número de doses adquiridas e aplicadas. Não é apenas de postos de trabalho, bens de consumo e matérias-primas que a pandemia gerou escassez. Vacinas também entram nesse cenário, mas o discernimento exigido para percebê-lo excede a capacidade de muitos militantes nas atuais corregedorias da opinião pública e entre os comissários da verdade.

A CPI da hidroxicloroquina já mostrou onde quer chegar. Ninguém precisa ser atirador de elite para identificar o alvo da artilharia inimiga. Ela quer carimbar uma narrativa unilateral, dando-lhe caráter suspostamente oficial. Em nossa hora mais ridícula, um medicamento que não é vendido sem receita médica virou objeto de ódio político e é o eixo em torno do qual giram os trabalhos de uma barulhenta CPI.   

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.