Desde que me distanciei do Brasil, tenho visto a inteligência dos meus compatriotas cair para níveis que às vezes ameaçam raiar o sub-humano. Não posso medi-la pela produção literária, que veio rareando até tornar-se praticamente inexistente num país que já teve alguns dos melhores escritores do mundo. Meço-a pelas teses universitárias que me chegam, cada vez mais repletas de solecismos e contrassensos grotescos, pelos comentários de jornal, pelos pronunciamentos das chamadas "autoridades" e, de modo geral, pelas discussões públicas. Em todo esse material, o que mais salta aos olhos não é o vazio de ideias, não é a estupidez dos raciocínios, não é nem mesmo a miséria da linguagem: é a incapacidade geral de distinguir entre o essencial e o acessório, o decisivo e o irrelevante. Não há problema, não há tema, não há assunto que, uma vez trazido ao palco – ou picadeiro –, não seja infindavelmente roído pelas beiradas, como se não tivesse um centro, um significado, um sentido em torno do qual articular uma discussão coerente. Cada um que abre a boca quer externar apenas algum sentimento subjetivo deslocado e extemporâneo, exibir bom-mocismo, angariar simpatias ou votos, como se se tratasse de uma rodada de apresentações pessoais num grupo de psicoterapia e não de uma conversa sensata sobre – digamos – alguma coisa. A coisa, o objeto, o fato, o tema, este, coitado, fica esquecido num canto, como se não existisse, e depois de algum tempo cessa mesmo de existir. A impressão que me sobra é a de que toda a população legente e escrevente está sofrendo de síndrome de déficit de atenção. Ninguém consegue fixar um objeto na mente por dez segundos, a imaginação sai logo voando para os lados e tecendo, embevecida, um rendilhado de frivolidades em torno do nada.
Se me perguntarem quais são os problemas essenciais do Brasil, responderei sem a menor dificuldade:
1) A matança de brasileiros, entre quarenta e cinquenta mil por ano.
2) O consumo de drogas, que aumenta mais do que em qualquer país vizinho, e que alguns celerados pretendem aumentar ainda mais mediante a liberação do narcotráfico – o maior prêmio que as Farc poderiam receber por décadas de morticínio.
3) A absoluta ausência de educação num país cujos estudantes tiram sempre os últimos lugares nos testes internacionais, concorrendo com crianças de nações bem mais pobres; num país, mais ainda, onde se aceita como ministro da Educação um sujeito que não aprendeu a soletrar a palavra "cabeçalho" porque jamais teve cabeça, e onde se entende que a maior urgência do sistema escolar é ensinar às crianças as delícias da sodomia – sem dúvida uma solução prática para estudantes e professores, já que o exercício dessa atividade não requer conhecimentos de português, de matemática ou de coisa nenhuma exceto a localização aproximada partes anatômicas envolvidas.
4) A falta cada vez maior de mão-de-obra qualificada de nível superior, que tem de ser trazida de fora porque das universidades não vem ninguém alfabetizado.
5) A dívida monstruosa acumulada por um governo criminoso que não se vexa de estrangular as gerações vindouras para conquistar os votos da presente, e que ainda é festejado, por isso, como o salvador da economia nacional.
6) A completa impossibilidade da concorrência democrática num quadro onde governo e oposição se aliaram, com o auxílio da grande mídia e a omissão cúmplice da classe rica, para censurar e proibir qualquer discurso político que defenda os ideais e valores majoritários da população, abomináveis ao paladar da elite.
7) A debilitação alarmante da soberania nacional, já condenada à morte pela burocracia internacional em ascensão e pelo cerco continental do Foro de São Paulo (aquela entidade que até ontem nem mesmo existia, não é?).
8) A destruição completa da alta cultura, num estado catastrófico de favelização intelectual onde a função de respiradouro para a grande circulação de ideias no mundo, que caberia à classe acadêmica como um todo, é exercida praticamente por um único indivíduo, um último sobrevivente, que em retribuição leva pedradas e cuspidas por todo lado, especialmente dos plagiários e usurpadores que vivem de parasitar o seu trabalho.
Se me perguntam a causa desses oito vexames colossais, digo que é a coisa mais óbvia do mundo: quarenta anos atrás, as instituições que se gabam de ser as maiores universidades brasileiras lançaram na praça uma geração de pseudointelectuais morbidamente presunçosos, que na juventude já se pavoneavam de ser "a parcela mais esclarecida da população". Hoje essas mentes iluminadas dominam tudo – sistema educacional, partidos políticos, burocracia estatal, o diabo –, moldando o país à sua imagem e semelhança. Matança, dívidas, emburrecimento geral, debacle do ensino, é tudo mérito de um reduzido grupo de cérebros de péssima qualidade intoxicados de idéias bestas e vaidade infernal. Dentre todas as gerações de intelectuais brasileiros, a pior, a mais predatória, a mais destrutiva.
Se querem saber agora por que os temas fundamentais não podem ser enxergados e discutidos na sua essência, por que as atenções são sempre desviadas para detalhes laterais e por que, em suma, nenhum problema neste país tem solução, a resposta também não é difícil: quem molda os debates públicos, por definição, é a elite dominante, e esta não permite que nada seja discutido exceto nos moldes do seu vocabulário, dos seus interesses, da sua agenda, da sua irresponsabilidade psicótica, da sua ambição megalômana, da sua autoadoração abjeta.
Enquanto vocês não perderem o respeito por essa gente, nada de sério se poderá discutir no Brasil.
*Publicado originalmente no Diário do Comércio, 3 de junho de 2011
**Publicado, também, em olavodecarvalho.org.
Herodes, rei dos judeus, foi personalidade cruel e sanguinária, que não hesitou em decretar a morte de dois filhos e da própria esposa. Quando nasceu Jesus, apavorado com a notícia de que nascera o futuro rei, seu sucessor, ordenou a matança de todas as crianças recém nascidas.
O júbilo na Argentina das massas urbanas festejando a esperada confirmação para breve da legalização do aborto, com milhares de apoiadoras de todas as idades, inclusive de muitas bruacas horrorosas em êxtase, rindo e batendo palmas, lembrando cenas do circo romano, demonstra que o sacrifício dos inocentes ainda está vivo como motivo de júbilo para muita gente. A carnificina covarde ordenada por Herodes, está viva na memória de muita gente.
A reprovação do aborto não responde a motivos religiosos, exclusivamente. Sua condenação se apóia, de direito, em argumentos leigos sem nada a ver com religião.
O argumento religioso tem o defeito de interessar somente à população devota.Não impressiona nem interessa à população leiga,talvez majoritária.
A novidade tem nome: “a interpretação antropológica do aborto”, antecipada pelo filósofo espanhol Julián Marías. A visão antropológica do aborto acompanha o desenvolvimento do nascituro desde o primeiro momento, que é a concepção. O cúmulo da hipocrisia está em marcar data para a legalização do aborto, depois de decorridos tantos meses. Quer dizer que o feto só assume a condição de intocável pela agulha do cirurgião depois de certo tempo?Quer dizer que o nascituro só assume condição humana a partir de determinada data?
Muito ao contrário, a condição humana, pessoal, do feto, tem início a partir da concepção. Por que razão o ser humano seria diferente das outras espécies? Por que razão um mamoeiro só poderia ser considerado mamoeiro depois de crescido? E antes, enquanto tenro arbusto,não mereceria o título de mamoeiro?
Muita hipocrisia é admitir que o feto antes dos três meses pode ser sacrificado cruelmente porque ainda não tem idade para ser portador de direitos, sobretudo o direito à vida,base de todos os demais direitos.
O feto, a partir da concepção,com um só dia de idade é portador do direito à vida, devendo ser respeitado como um embrião da futura pessoa plena.
Por isso mesmo é falso sustentar que o direito ao aborto justifica-se porque a mulher tem direito absoluto sobre seu corpo. Sim, é verdade, exceto quando a mulher é portadora em seu útero de um ser vivo,uma pessoa em embrião, que deve ser reconhecida plenamente como outro ser, outro destino desde a concepção.
Ou seja, o feto no corpo da mulher não pertence à mulher, compromissada a respeitar sua personalidade desde que sente a primeira palpitação em seu ventre de outro ser humano a caminho. Não é esta a beleza da gravidez?
*Procurador de Justiça em MP/SP
**Publicado no Facebook do autor.
2013 é um marco ambíguo. Entrou para a história como o do "despertar do gigante adormecido"... mas de um despertar para o seu próprio vazio. Já lá vão mais de cinco anos e seguimos perdidos no espaço, incapazes de um discurso articulado, de distinguir causas de efeitos e aliados de inimigos, sabendo, vagamente, balbuciar nossos "não", mas sem repertório que nos permita esboçar um único "sim" digno de ser abraçado como projeto para a nação. Somos o país que morre de fome por não saber pedir; que não consegue ler o menu das soluções institucionais modernas, arrastado que foi de volta para o limbo pré-republicano mediante o aparelhamento dos meios de difusão de cultura e informação e o aniquilamento das nossas universidades (as últimas das Américas) como centros de pesquisa pura e busca do conhecimento. O país em cujas escolas cultua-se só o que fracassou, instila-se o ódio ao merecimento e proíbe-se mostrar, do mundo que deu certo, senão o que tem de pior.
Não é de hoje. A primeira faculdade chegou aos EUA com os colonos ingleses. E a América Hispânica já tinha 23 em funcionamento quando o Brasil fundou a sua primeira – de medicina porque a corte transplantada em 1808 precisava de médicos. Até então tudo o que havia aqui era um colégio de teologia, instituição voltada, portanto, para a negação em nome do dogma, e não para a busca do conhecimento.
No país onde a metrópole proibira desde sempre a produção e a importação de papel (e mais recentemente a entrada da informática) a primeira impressora chegou com 358 anos de atraso em relação à invenção de Gutenberg. Mas junto com a "Impressão Régia" (a única admitida) desembarcaram os censores.
"Posto numa balança o Brasil e na outra o reino, há de pesar com grande excesso para mais aquela primeira que esta última; e assim, a maior e mais rica parte não sofrerá ser dominada pela menor", argumentava um alto funcionário do rei para justificar tão rígido cerco à informação e ao conhecimento. Não se alterou fundamentalmente a situação com a mudança da metrópole colonialista de Lisboa para Brasília. É a ignorância semeada pela censura das soluções que o mundo moderno dá aos problemas que nos afligem, mais que tudo, que garante a nossa permanência no estágio pré-republicano em que nos arrastamos.
A democracia moderna, essencialmente, é um arranjo de sobrevivência pactuado por comunidades isoladas em territórios hostis. Longe do rei e de qualquer socorro de fora elas tiveram, por si mesmas, de fazer e cobrar suas leis, decidir e executar suas decisões e prover sua própria segurança. Foi isso o "Pacto do Mayflower". Foi isso, com quase um século de adiantamento em relação à versão saxônica, o arranjo das Câmaras Municipais das vilas portuguesas no Brasil. Isoladas umas das outras e do resto do mundo, havia nos seus governos um grau de soberania popular que nem a metrópole nem ninguém antes jamais vivera. Por mais de três séculos, de três em três anos nossa gente organizou eleições, deu posse a governos, seguiu-lhes as determinações e os governantes entregaram seus cargos aos novos eleitos sem uma única quebra.
Nenhum outro povo na terra teve tão longa vivência de democracia. E até Tiradentes estivemos ao par da ponta mais moderna do pensamento político da época. O Brasil real organizou-se e construiu-se por si mesmo à margem do Brasil oficial, à margem do governo central instalado na praia e voltado para a metrópole antes e depois de 1808. Na informalidade, regido pelo costume, pela lei não escrita e financiado pelo "fiado".
Só 15% da economia nacional, ao longo de todos os séculos do Brasil colônia, hoje sabe-se graças à econometria aplicada à historiografia a partir de 1970, era contabilizada e registrada nos anais da metrópole. A economia de exportação – e só ela – vivia no figurino casa grande e senzala, o "único que existiu" segundo os nossos historiadores "marxistas". O outro Brasil, o do mercado interno, o da pequena propriedade, o dos empreendedores que produziam, movimentavam e comercializavam bens e serviços, pesando 85% de tudo o que se fazia aqui, viveu na clandestinidade e à margem da lei até o primeiro governo da "república" tomada de assalto pelos ditadores do credo "positivista" que nos assombra até hoje. Foi por mera distração deles que Rui Barbosa teve a oportunidade de baixar, a 17 de janeiro de 1890, os quatro decretos que constituíram a "lei áurea" da iniciativa privada no Brasil. "As companhias ou sociedades anônimas, seja civil ou comercial o seu objetivo, podem estabelecer-se sem autorização do governo", rezava a peça que transformava num direito do cidadão investir sua poupança pessoal num empreendimento reconhecido pela lei... só que não. Prudente de Morais, o terceiro da "república", foi o primeiro e talvez o único presidente brasileiro de todos os tempos que conhecia e praticou a teoria por trás dessa expressão. Desde então tem havido mais esforços para fazer regredir do que para fazer avançar o Brasil que Rui e ele vislumbraram.
Não tivemos uma nobreza hereditária, mas a de toga a substituiu com "vantagem", pois até o "rei" ela submeteu. O direito brasileiro é ainda o do "direito adquirido" à diferença que sustentou o absolutismo monárquico e não o dos Iluministas e da república sem aspas que consagra a igualdade e criminaliza o privilégio.
E, cada vez mais, é isso que nos mata.
É essa a história que se conta na História da Riqueza no Brasil, livro que consolida uma inspiradora série de trabalhos anteriores de Jorge Caldeira, o libertador da historiografia brasileira. A história é a psicanálise das sociedades, e esta que ele conduz aponta claramente um caminho: o da soberania do povo a partir da base municipal. "A maior e mais rica parte" só se libertará da opressão da outra com a despartidarização das eleições, o voto distrital puro e os direitos de retomada de mandatos (recall) e referendo de leis pervertidas no âmbito dos municípios. Só então poderemos retomar a vocação democrática de que vimos sendo desviados à força.
*Publicado no Estadão, 15/06/2018
Os debates oficiais da campanha eleitoral de 2018 ainda não iniciaram, mas me pergunto se os candidatos e os eleitores têm real noção da dimensão dos desafios que se desenham para o Brasil nos próximos anos. Certamente iremos nos deparar com propostas para temas como violência, combate à corrupção, como ajustar a infraestrutura, dentre outros que sempre permeiam essas datas. Ou seja, nunca foram resolvidos.
Na verdade, no Brasil de hoje, não faltam problemas para que se apontem as soluções e, neste artigo, quero chamar atenção para um ponto central que precisa entrar nesse debate: a gestão das contas públicas. Desde o início da última década, vivemos uma pseudo lua de mel com o discurso do "nunca na história desse país". Parecia que tudo ia bem, da política econômica ao dia a dia das famílias, passando pelo crédito para comprar um carro 1.0 e a falsa impressão de que havíamos acabado com a desigualdade social.
Mas, como que em um passe de mágica, tudo o que envolve o Estado passou a apresentar déficit ou então prejuízo. A maior empresa do Brasil estava quebrada, as ruas cheias de buracos, governo e consumidores endividados, os indicadores de pobreza aumentaram, o país entrou em uma recessão profunda e até no futebol passamos vergonha.
Onde erramos? Em várias áreas e em vários momentos. Em apenas um texto é impossível mostrar todos os erros que cometemos no passado recente, principalmente no setor público. Eles vão desde a omissão em apresentar uma proposta para ajustar a Previdência, o que colocaria em risco a popularidade do presidente em exercício, até a aprovação de propostas e leis que só aumentaram gastos ou geraram prejuízos para o país como, por exemplo, os empréstimos obscuros do BNDES.
Ou seja, nossos governantes conseguiram a proeza de errar, nos últimos 20 anos, quando não fizeram e também quando fizeram. Em algum momento o sistema não aguentaria e aconteceu o que já se previa: a conta veio e é alta. Uma pequena parte dela já foi paga nesse período de déficit primário que resultou na maior crise econômica da nossa história. Mas ainda falta muito a pagar. As projeções da LDO de 2019 dão conta de que o próximo presidente assume flertando com, no mínimo, mais três anos de déficit primário, aumento da dívida pública interna, que pode ultrapassar facilmente os 80%, e elevados esqueletos para tirar do armário. Vai ter de ser muito bom gestor para que não passe os quatro anos apenas esquentando a cadeira no Planalto ou batendo fotos de inauguração de obras que já foram inauguradas várias vezes no passado.
Dentre os temas urgentes, impopulares e já bastante conhecido de todos nós, está a reforma da Previdência. Mas essa corre o risco de não sair da mesma retórica de sempre, exatamente pela falta de entendimento do seu real problema. Muito se fala dos aposentados do INSS, mas veja que o contingente de pessoas que teve tempo de contribuição suficiente para se aposentar, e realmente merece receber, é de apenas 6 milhões. Isso dá 17,5% de um total de 34,5 milhões que recebem algum dinheiro do INSS todo mês. Não é com esses aposentados que está o maior problema. E não será aumentando a idade mínima ou o tempo de contribuição que extinguiremos os déficits. O desequilíbrio está nos outros 28 milhões de beneficiários do INSS, dos quais 18 milhões não contribuíram pelo tempo mínimo exigido pela lei e mesmo assim se aposentaram.
Veja a distorção que criamos. Para cada um que cumpriu com o tempo mínimo de contribuição, há outros dois que não o fizeram. Além disso, há mais gente recebendo do INSS uma pensão por morte do que aposentados por tempo de contribuição. E o que dizer então dos mais de 6 milhões de pessoas que recebem algum benefício do INSS por ser inválido ou portador de deficiência? Isso dá 3% da população em um país que não está em guerra declarada.
O enfrentamento do problema do INSS passa por melhorar a gestão, treinando, equipando e criando regulamentos que permitam a instituição fazer um trabalho que elimine as fraudes, a evasão de divisas e as subjetividades nas concessões de benefícios. Uma boa sugestão seria implementar a tecnologia blockchain para registro dessas transações, o que criaria mais segurança, transparência, agilidade e eficiência para o órgão.
Mas a reforma da previdência tem de vir acompanhada de outra, a do servidor público. O próximo presidente vai precisar de coragem de enfrentar esse tema, que atinge as pessoas diretamente ligadas ao aparelho estatal. A diferença é que aqui não será difícil convencer a população, ou os congressistas, que essa reforma é importante. Basta mostrar que no INSS o aposentado por tempo de contribuição tira R$ 1,9 mil em média ao mês, enquanto no setor público esse valor vai a R$ 26,8 mil de média ao mês no caso do Legislativo. Além disso, a média de salário dos aposentados no Legislativo, Judiciário e Ministério Público é maior que o pessoal da ativa. Algo impensável para quem contribui para o INSS.
O que gera a desigualdade
Sem sombra de dúvida, o fator que mais gera desigualdade no Brasil atualmente é a diferença de tratamento na remuneração recebida entre os que estão nos regimes previdenciários do setor público e privado. Podemos começar a reduzir os indicadores de desigualdade no Brasil eliminando essa distorção. Nesse cenário traçado, nosso próximo presidente vai herdar um rombo conjunto de quase R$ 400 bilhões entre INSS (R$ 291 bilhões) e Previdência do setor público (R$ 80 bilhões). E não basta fazer uma reforma qualquer: o equilíbrio só virá se tivermos uma relação entre contribuição e despesas dos aposentados. Caso contrário, esperaremos pelo menos cinco décadas para equacionar essa questão.
Além desses já conhecidos problemas estruturais, há outros, relacionados à má gestão e interpretação das leis pelo próprio Estado que são menos discutidas e que consomem bilhões de reais do que pagamos de impostos. Todos os anos a União vira ré em ações movidas por empresas ou grupos sociais e econômicos que questionam a aplicação de uma lei ou regra que foi feita de maneira equivocada. Essas ações acabam ficando anos em discussão, mas inevitavelmente uma boa parte acaba tendo como desfecho uma despesa a ser paga.
A lista é grande e envolve questões tributárias, trabalhistas, previdenciárias e diversas outras que tiveram como origem uma ideia "mirabolante" que nos custou ou ainda vai custar muito dinheiro. O sinal de que estamos fazendo mal a gestão do setor público está no total pago de precatórios e sentenças judiciais, pelo Tesouro Nacional, que era nulo até 2004 e, desde então, não para de crescer, tendo atingido a cifra recorde de R$ 11 bilhões. E ainda há um estoque enorme de processos a serem julgados e que envolvem valores muito elevados, como os R$ 560 bilhões em ações tributárias e outros R$ 102 bilhões no Tesouro Nacional.
Em algum momento, o dinheiro dos nossos tributos que deveriam ser destinados para educação, saúde e segurança vai ser desviado para cobrir essa ineficiência. A solução para tantos problemas estruturais não será uma tarefa fácil para qualquer um que subir a rampa do Planalto no dia 1º de janeiro de 2019. A herança que duas décadas de má gestão, corrupção e descaso com o Estado deixa para todos nós é muito ruim. Será preciso ter uma combinação de boa vontade política, disposição para fazer diferente, compreensão para entender que os resultados positivos só devem aparecer no médio e longo prazo, mais independência das instituições de controle, como o Judiciário e tribunais de contas e muita capacidade técnica dos gestores que estarão à frente do Estado. Temos muito o que fazer para corrigir o Brasil.
*Economista
** Publicado originalmente na Revista Voto
Não sendo nem uma religião nem uma ideologia, o corpo de opiniões denominado Conservadorismo não possui um Livro Sagrado nem um Das Kapital para prover dogmas. Até onde é possível determinar em quê acreditam os conservadores, os primeiros princípios da convicção conservadora são derivados do que professaram os principais escritores e homens públicos conservadores durante os últimos dois séculos. Após algumas observações introdutórias neste tema geral, prosseguirei e listarei dez destes princípios conservadores.
Talvez fosse melhor, na maioria das vezes, usar a palavra “conservador” principalmente como um adjetivo. Pois não existe um Modelo Conservador, e o conservadorismo é a negação da ideologia: é um estado da mente, um tipo de caráter, um modo de olhar para ordem social civil.
A atitude a que chamamos conservadorismo é sustentada por um corpo de sentimentos, mais do que por um sistema de dogmas ideológicos. Em geral um conservador pode ser definido como alguém que se define como tal. O movimento conservador, ou corpo de opiniões, pode acomodar uma considerável diversidade de perspectivas em muitos temas, não havendo um “Test Act” ou “Trinta e Nove Artigos” do credo conservador.
Em essência, a pessoa conservadora é simplesmente aquela que acha as coisas permanentes mais satisfatórias do que o “Chaos and Old Night” (NT: Kirk alude aqui ao poema épico Paradise Lost de John Milton). (Embora os conservadores saibam, com Burke, que a “mudança saudável é o meio de nossa preservação”). A experiência histórica continuada de um povo, dizem os conservadores, oferece um guia para a política muito melhor que os projetos de filósofos de cafeteria. Mas, é claro, há muito mais para a convicção conservadora do que esta atitude geral.
Não é possível esboçar um catálogo simples das convicções dos conservadores. Entretanto, ofereço a você, sumariamente, dez princípios gerais. Parece seguro dizer que a maioria dos conservadores subscreveria a maior parte destas máximas. Em várias edições de meu livro The Conservative Mind listei certos cânones do pensamento conservador – a lista difere, de algum modo, de uma edição para outra; em minha antologia, The Portable Conservative Reader, ofereço variações sobre este tema. Agora apresento a você um resumo dos pressupostos conservadores que difere de algum modo de meus cânones naqueles dois livros. Em si, a diversidade de maneiras pelas quais as perspectivas conservadoras podem encontrar expressão é por si prova de que o conservadorismo não é uma ideologia fixa. Quais princípios são enfatizados por conservadores durante determinada época variará com as circunstâncias daquela época. Os dez itens de crença que se seguem refletem a ênfase dos conservadores na América hoje em dia.
? Primeiro, o conservador acredita na existência de uma ordem moral perene.
Que a ordem é feita pra o homem, e o homem é feito para a ordem: a natureza humana é constante, e as verdades morais são perenes.
Ordem significa harmonia. Há dois aspectos ou tipos de ordem: a ordem interior da alma, e a ordem externa da comunidade. Vinte e cinco séculos atrás Platão ensinou esta doutrina, mas mesmo os instruídos de hoje em dia acham-na difícil de entender. O problema da ordem tem sido sempre a principal preocupação dos conservadores desde que conservador tornou-se um termo político.
O mundo do século XX experimentou as consequências hediondas do colapso da crença na ordem moral. Como as atrocidades e desastres da Grécia cinco séculos antes de Cristo, a ruína das grandes nações no século XX mostra-nos o fosso no qual caem as sociedades que erradamente tomam o hábil interesse próprio ou engenhosos controles sociais como agradáveis alternativas a uma ordem moral “antiquada”.
Tem sido dito por intelectuais liberais que os conservadores acreditam que todas as questões sociais, em essência, sejam questões de moralidade privada. Propriamente entendida, esta afirmação é totalmente verdadeira. Uma sociedade na qual homens e mulheres sejam regidos pela crença numa ordem moral permanente, por um forte senso de certo e errado, por convicções pessoais sobre justiça e honra, será uma boa sociedade – qualquer que seja a organização política que ela possa utilizar; enquanto que uma sociedade na qual homens e mulheres estejam moralmente à deriva, ignorantes das normas e intencionem principalmente a satisfação dos apetites, será uma sociedade má – não importa quantas pessoas votem e não importa quão liberal sua constituição formal possa ser.
? Segundo, o conservador adere ao costume, às convenções e à continuidade.
É a antiga tradição que capacita as pessoas a viverem juntas pacificamente. Os destruidores de costumes destroem mais do que desejam ou sabem. É através da convenção – uma palavra muito violentada em nossa época – que conseguimos evitar a disputa perpétua a respeito de direitos e deveres: a lei, em seus fundamentos, é um corpo de convenções. A continuidade é o significado de vincular geração a geração, importa tanto para a sociedade como para o indivíduo, sem isto a vida é sem sentido. Num tempo em que revolucionários bem sucedidos têm apagado antigos costumes, escarnecido de antigas convenções, e quebrado a continuidade das instituições sociais, porque atualmente descobriram a necessidade de estabelecer novos costumes, convenções e continuidade. Porém este processo é doloroso e lento, e a nova ordem social que eventualmente emerge pode ser muito inferior à antiga que os radicais derrubaram em seu entusiasmo pelo Paraíso Terrestre.
Os conservadores são defensores dos costumes, convenções e continuidade porque preferem o diabo conhecido ao diabo que não conhecem. Ordem, justiça e liberdade, acreditam, são produtos de uma longa experiência, o resultado de séculos de testes, reflexões e sacrifícios. Então, o corpo social é um tipo de corporação espiritual comparável à igreja. Pode mesmo ser chamado de comunidade das almas. A sociedade humana não é uma máquina para ser tratada mecanicamente. A continuidade, sangue vital de uma sociedade, não deve ser interrompida. O lembrete de Burke sobre a necessidade de mudança prudente, está na mente do conservador. Mas a mudança necessária, argumenta o conservador, deve ser gradual e discriminada, nunca quebrando antigos interesses imediatamente.
? Terceiro, conservadores acreditam no que pode ser chamado princípio da prescrição.
É o senso conservador de que as pessoas modernas são anões nos ombros de gigantes, capazes de enxergar mais longe que seus ancestrais apenas devido à grande estatura daqueles que nos precederam no tempo. Consequentemente os conservadores quase sempre enfatizam a importância da prescrição – isto é, das coisas estabelecidas pelo uso imemorial, de modo que a mente humana não caminhe ao contrário. Há direitos para os quais o principal reconhecimento público é a antiguidade – incluindo, quase sempre, direitos de propriedade. Similarmente, nossa moral é em grande parte prescritiva. Conservadores argumentam ser improvável que nós modernos façamos qualquer grande descoberta em moral, política ou propensão. É perigoso pesar cada questão passageira na base do julgamento e racionalidade particulares. O indivíduo é tolo, mas a espécie é sábia, declarou Burke. Em política fazemos melhor obedecendo ao precedente, ao preceito e mesmo ao preconceito, pois a grande incorporação misteriosa da raça humana adquiriu uma sabedoria prescritiva muito maior que qualquer insignificante racionalidade particular.
? Quarto, conservadores são guiados por seu princípio de prudência.
Burke concorda com Platão que num homem de estado a prudência seja a maior virtude. Qualquer medida pública deve ser julgada por suas prováveis consequências de longo prazo, não apenas por sua vantagem temporária ou popularidade. Liberais e radicais, dizem os conservadores, são imprudentes: pois eles traçam seus objetivos sem dar muita atenção ao risco de novos abusos, piores que os males que esperam eliminar. Como colocou John Randolph, de Roanoke, a Providência move-se lentamente, enquanto o diabo sempre se apressa. Sendo a sociedade humana complexa, os remédios, para serem eficazes, não podem ser simples. O conservador declara que age apenas após reflexão suficiente, tendo pesado as consequências. Reformas repentinas e profundas são perigosas como cirurgias repentinas e profundas.
? Quinto, conservadores prestam atenção ao princípio da diversidade.
Conservadores sentem afeição pela intrincada proliferação de instituições sociais de longa data e pelos modos de vida, distintos da estreita uniformidade e sufocante igualitarismo dos sistemas radicais. Para a preservação de uma diversidade saudável, em qualquer civilização, devem sobreviver ordem e classes, diferenças nas condições materiais e muitos tipos de desigualdades. As únicas formas verdadeiras de igualdade são a igualdade do Julgamento Final e igualdade perante um justo tribunal da lei. Todas as outras tentativas de nivelamento levarão, na melhor das hipóteses, à estagnação social. A sociedade requer líderes capazes e honestos, e se as diferenças institucionais e naturais são destruídas, brevemente algum tirano ou algum bando de oligarcas sórdidos criarão novas formas de desigualdade.
? Sexto, conservadores são refreados por seu princípio de imperfectibilidade.
A natureza humana sofre irremediavelmente de certas faltas graves, sabem os conservadores. Sendo o homem imperfeito, nenhuma ordem social perfeita pode ser criada. Devido à inquietação natural, a espécie humana se rebelaria sob uma dominação utópica e eclodiria uma vez mais em descontentamento violento, ou senão, expiraria em tédio. Procurar pela utopia é terminar desastre, dizem os conservadores: não somos feitos para as coisas perfeitas. Tudo que podemos esperar razoavelmente é uma sociedade aceitavelmente ordenada, justa e livre, na qual alguns males, desajustamentos e sofrimentos continuarão a espreitar. Pela atenção adequada à reforma prudente podemos preservar e melhorar esta ordem aceitável. Mas se as antigas salvaguardas institucionais e morais de uma nação são esquecidas, então a o impulso anárquico da espécie humana desprende-se: “a cerimônia da inocência é suprimida”. Os ideólogos que prometem a perfeição do homem e da sociedade têm convertido grande parte do mundo, desde o século XX, num inferno terrestre.
? Sétimo, conservadores estão persuadidos de que propriedade e liberdade estão intimamente vinculadas.
Dissocie propriedade de posse privada e o Leviatã torna-se o dono de tudo. Sobre o fundamento da propriedade privada grandes civilizações são construídas. Quanto mais ampla a posse de propriedade privada, tanto mais estável e produtiva é a comunidade. Nivelamento econômico, sustentam os conservadores, não é progresso econômico. Ganhar e gastar não são os principais propósitos da existência humana, mas uma sólida base econômica para a pessoa, a família e a comunidade, é muito desejável.
O Sr Henry Maine, em seu Village Communities, expressa robusta defesa da propriedade privada como distinta da propriedade comunal: “Ninguém é livre para atacar a múltipla propriedade e dizer ao mesmo tempo que valoriza a civilização. As histórias de ambas não podem ser desentrelaçadas”. Pois a instituição da múltipla propriedade – isto é, propriedade privada – tem sido um poderoso instrumento para ensinar responsabilidade a homens e mulheres, por prover motivos de integridade, por estimular a cultura geral, por elevar a espécie humana acima do nível de mera labuta, por fornecer tempo para pensar e liberdade para agir. Ser capaz de conservar os frutos do trabalho de alguém; ser capaz de assegurar que o trabalho de alguém seja duradouro; ser capaz de legar a propriedade de alguém para a posteridade; ser capaz de elevar o homem da condição natural de pobreza opressiva para a proteção da realização duradoura; possuir algo que seja realmente sua propriedade– são benefícios difíceis de negar. Os conservadores sabem que a posse de propriedade estabelece certas obrigações sobre o proprietário, eles aceitam alegremente estas obrigações morais e legais.
? Oitavo, conservadores apoiam a associação voluntária, tanto quanto se opõem ao coletivismo involuntário.
Embora os Americanos tenham sido fortemente vinculados à intimidade e à privacidade, eles também têm sido um povo notório por um bem sucedido espírito de comunidade. Numa comunidade genuína as decisões que afetam mais diretamente as vidas dos cidadãos são tomadas voluntariamente e localmente. Algumas destas funções são realizadas por entidades políticas locais, outras por associações privadas: tanto quanto elas sejam mantidas locais, e sejam marcadas pela concordância geral daqueles que são afetados, elas constituem uma comunidade saudável. Mas quando estas funções passam, por definição ou usurpação, a uma autoridade centralizada, então a comunidade está sob séria ameaça. Tudo o que seja beneficente ou prudente na democracia moderna torna-se possível através da cooperação voluntária. Se, então, em nome de uma democracia abstrata, as funções da comunidade são transferidas para uma direção política distante, o governo real, pelo consenso dos governados, cederá a um processo de padronização hostil à liberdade e à dignidade humana.
Pois uma nação não é mais forte que as numerosas pequenas comunidades das quais é composta. Uma administração central, ou um grupo de seletos administradores e servidores civis, embora bem intencionado e bem treinado, não pode oferecer justiça, prosperidade e tranquilidade sobre uma massa de homens e mulheres despojados de suas antigas responsabilidades. Este experimento foi feito antes, e foi desastroso. É o desempenho de nossas obrigações na comunidade que nos ensina a prudência, a eficiência e a caridade.
? Nono, o conservador compreende a necessidade de restrição prudente sobre o poder e sobre as paixões humanas.
Falando politicamente, poder é a capacidade de fazer algo que alguém queira, indiferente às vontades dos demais. Um estado no qual um indivíduo ou pequeno grupo é capaz de dominar as vontades de seus companheiros sem consulta é um despotismo, seja ele chamado monárquico ou aristocrático ou democrático. Quando cada pessoa afirma ser um poder por si mesma, então a sociedade cai na anarquia. Sendo intolerável para todos e contrária ao fato inelutável de que algumas pessoas são mais fortes e mais engenhosas que seus vizinhos, a anarquia nunca dura muito. À anarquia sucede-se a tirania ou a oligarquia, na qual o poder é monopolizado por alguns poucos.
O conservador empenha-se então em limitar e equilibrar o poder político para que a anarquia ou a tirania não possam surgir. Em cada época, entretanto, homens e mulheres são tentados a derrubar as limitações sobre o poder, por amor a alguma vantagem temporária imaginária. É característico do radical que ele pense no poder como uma força para o bem – desde que o poder esteja em suas mãos. Em nome da liberdade, os revolucionários Franceses e Russos aboliram as antigas limitações ao poder, mas o poder não pode ser abolido, ele sempre encontra seu caminho para as mãos de alguém. Aquele poder que os revolucionários pensavam opressivo nas mãos do antigo regime tornou-se, muitas vezes, tirânico nas mãos dos novos controladores radicais do estado.
Conhecendo a natureza humana como sendo uma mistura de bem e mal, o conservador não coloca sua confiança na mera benevolência. Restrições constitucionais, pesos e contrapesos políticos (divisão de poderes), cumprimento adequado das leis, a velha intrincada teia de restrições sobre desejos e apetites – são restrições que os conservadores aprovam como instrumentos de liberdade e ordem. Um governo justo mantém uma saudável tensão entre a afirmação da autoridade e a afirmação da liberdade.
? Décimo, o pensador conservador entende que permanência e mudança devem ser reconhecidas e reconciliadas numa sociedade vigorosa.
O conservador não se opõe ao aperfeiçoamento social, embora duvide que haja qualquer força tal como um místico Progresso, com P maiúsculo, em funcionamento no mundo. Quando uma sociedade está progredindo em determinados aspectos, está regredindo em outros. O conservador sabe que qualquer sociedade saudável é influenciada por duas forças, as quais Samuel Taylor Coleridge chamou Permanência e Progressão. A Permanência de uma sociedade é formada por aqueles interesses e convicções duradouros que nos dão estabilidade e continuidade. Sem a Permanência, as nascentes de grande profundidade são interrompidas, a sociedade decai na anarquia. A Progressão numa sociedade é aquele espírito e aquele corpo de habilidades que nos instigam à reforma prudente a ao aperfeiçoamento. Sem esta Progressão, o povo estagna.
Portanto o conservador inteligente empenha-se em reconciliar as afirmações de Permanência e as afirmações de Progressão. Ele pensa que o liberal e o radical, cegos às justas afirmações da Permanência, arriscariam a herança que nos foi legada numa tentativa de nos conduzir para um duvidoso Paraíso Terrestre. O conservador, em resumo, prefere o progresso razoável e moderado. Opõe-se ao culto ao Progresso, cujos adeptos acreditam que qualquer coisa nova seja necessariamente superior a qualquer coisa antiga.
Mudança é essencial para o corpo social, raciocina o conservador, assim como é essencial ao corpo humano. Um corpo que tenha cessado de se renovar, começou a morrer. Mas para que este corpo seja vigoroso, a mudança deve ocorrer de forma regular, em harmonia com a forma e a natureza daquele corpo. De outra maneira a mudança produz um crescimento monstruoso, um câncer, que devora seu hospedeiro. O conservador preocupa-se com que nada na sociedade deva ser inteiramente antigo, e que nada deva ser, nunca, inteiramente novo. Este é o significado de conservação de uma nação, tanto quanto seja o significado de conservação de um organismo vivo. Quanta mudança uma sociedade requer, e que tipo de mudança, depende das circunstâncias da época e da nação.
Tais, então, são dez princípios que têm amplamente emergido durante dois séculos de pensamento conservador. Outros princípios poderiam ter sido discutidos aqui: por exemplo, o entendimento conservador de justiça, ou a perspectiva conservadora de educação. Mas tais temas, com o passar do tempo, devo deixar para sua própria investigação.
A grande linha de demarcação na política moderna, como costumava destacar Eric Voegelin, não é a divisão entre liberais de um lado e totalitários do outro. Não, em um lado desta linha estão aqueles homens e mulheres que imaginam que a ordem temporal seja a única ordem, que as necessidades materiais sejam as únicas necessidades, e que podem fazer o que bem quiserem com o patrimônio da humanidade. Do outro lado desta linha estão aquelas pessoas que reconhecem uma ordem moral permanente no universo, uma natureza humana constante, e altas obrigações diante da ordem espiritual e da ordem temporal.
*Adaptado por Kirk de The Politics of Prudence
**Traduzido por Flávio Ghetti
***Publicado em tradutoresdedireita.org
IMPRENSA LIVRE
Pela enésima vez, nesta semana, mais precisamente na 2ª feira, 11, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, defendeu, no seminário do CNJ - Conselho Nacional de Justiça, a IMPRENSA LIVRE para o bom funcionamento do Estado, da Justiça e da sociedade.
O ESTADO NÃO FUNCIONA BEM SEM LIBERDADE
No seu discurso, a presidente do Supremo disse que o Brasil precisa de imprensa livre para a população ser bem informada e exercer a cidadania, e que Estado e Justiça não funcionam direito sem liberdade de expressão. Disse mais: - "Sem a imprensa livre, a Justiça não funciona bem, o Estado não funciona bem".
DEMAIS ATIVIDADES
O curioso, para não dizer lamentável, é que a ministra Cármen Lúcia, assim como a maioria dos nossos governantes, só defende a LIBERDADE DE IMPRENSA. As demais atividades, que exigem muita LIBERDADE para fazer o nosso empobrecido Brasil crescer e se desenvolver, simplesmente não são defendidas pelos representantes dos Poderes da República.
FÓRMULA ESTÚPIDA
Vejam, por exemplo, o que acontece apenas no que diz respeito aos FRETES. Ao invés de deixar para o mercado a tarefa de LIVRE NEGOCIAR o preço do transporte de mercadorias, o Executivo, com o aval do Legislativo e Judiciário, volta no tempo das cavernas e resolve aplicar a equivocada e estúpida fórmula da -FALTA DE LIBERDADE-. Pode?
DISCERNIMENTO LIMITADO
Ora, aproveitando a frase dita, com ênfase e muito convencimento, pela presidente do STF, no seminário da CNJ, de que o -ESTADO NÃO FUNCIONA BEM SEM IMPRENSA LIVRE-, e a Justiça idem, não há como admitir que o discernimento da ministra Cármen Lúcia, quanto a LIBERDADE, se limita ao setor IMPRENSA.
TUTELA
Volto a afirmar, também pela enésima vez (e farei isto quantas vezes for necessário) que a LIBERDADE DE EXPRESSÃO é tão importante e necessária quanto a LIBERDADE PARA FAZER, OFERTAR E CONSUMIR, MERCADORIAS e/ou SERVIÇOS. Quem defende a LIBERDADE apenas para a Imprensa, certamente está escondendo a pretensão de, em algum momento, tutelar a própria imprensa.