• Júlia Schütt
  • 25 Setembro 2018

 

Alguém duvida que a função social da reprimenda penal por excelência – a pena privativa de liberdade – seja a segurança pública? A limitação, mesmo que temporária, à liberdade do criminoso é o precípuo instrumento do estado de direito para garantir um dos seus pilares fundamentais – a segurança de seus cidadãos.

Do mesmo modo, dificilmente alguém desconhece que compete ao Magistrado aplicar, após reconhecer, a partir de ação penal veiculada, que um crime foi praticado (materialidade) por determinado sujeito (autoria), o quantum de pena ao condenado.

Por outro lado, ao que se extrai do exercício da profissão de Promotora de Justiça, é que nem todos os aplicadores do direito entendem – ou ao menos dela fazem uso – a função dos patamares mínimo e máximo de pena cominados pelo legislador no preceito secundário do tipo penal.

Recentemente, minha colega e amiga, Rafaela Huergo, em seu brilhante artigo Execução penal: excesso de benefícios, interpretação e criatividade a serviço da impunidade, destacou que vige no Judiciário brasileiro um fetiche pela aplicação da pena mínima. A questão é: este fetiche, que vem reiteradamente violando o princípio da individualização da pena, é atribuível exclusivamente aos Juízes.

O artigo 59 do Código Penal brasileiro, que disciplina a primeira etapa do sistema trifásico de modulação da pena, exige que, dentre outras circunstâncias judiciais, leve o Juiz em consideração os antecedentes dos acusado como forma de avaliar a adequada mobilidade da sanção a ser aplicada dentre os patamares de pena previamente fixados pelo legislador, a qual deverá ser necessária e suficiente à reprimenda da prática do ilícito.

O critério acima – antecedentes do acusado – apto a mover a sanção penal aplicada dentro dos pilares estacados pelo Congresso Nacional – é parâmetro de fulcral relevância para a estipulação da reprimenda que deve o Estado imprimir ao condenado, vez que, atendendo ao princípio da individualização da pena, permite distinguir proporcionalmente o quantum será aplicado ao sujeito que já faz do crime seu meio de vida daquele que será aplicado ao réu que esteja pela primeira vez a responder expediente criminal.

O Dr. Stanton Samenow, psicólogo que há mais de 40 anos trabalha com pesquisas relacionadas ao comportamento de criminosos, em seu livro Inside the Criminal Mind (1), enfatiza que, embora não possa o sistema judicial relevar a presunção da inocência, autoridades que estejam capitaneando investigações criminais e/ou ações penais, ou seja, antes de tudo, analisando o comportamento do criminoso, devem estar alertas de que uma prisão muitas vezes caracteriza apenas uma fração dos crimes por ele cometidos até então, devendo, para uma melhor aplicação do direito, ser direcionados esforços para determinar o quão extensa já não é a vida criminosa daquele indivíduo. Ao concluir, o PHD destaca ser de máxima relevância para Juízes, ao proferirem suas sentenças, que levem em conta a vida criminosa pretérita do condenado.

Esta sugestão é conferida por expert em solo norte-americano, terra em que a aplicação da lei penal é deveras mais eficiente do que em solo brasileiro. Aqui, onde há muito a análise econômica do delito, infelizmente, concluiu que, em termos de custo/ benefício, vale a pena o cometimento de crime, o incremento de pena ao criminoso carreirista jamais pode ser alvo de desídia. Afinal, somente uma reprimenda penal suficiente e necessária é capaz de dissuadir o criminoso à reiteração da prática ilícita.

Não demanda muito esforço. Mais que isto, é intuitivo: aquele que dispõe de um pergaminho como certidão de antecedentes não poderá ver sua pena base fixada no mesmo patamar do coautor que não apresenta um borrão em sua ficha criminal.

Para o STJ, todavia, não tão intuitivo. Ainda em 2010 foi editada a Súmula 444 daquele Tribunal, que, ao crivar que “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base” acaba por exigir para a aplicação de uma circunstância judicial do art. 59 do CP – antecedentes do acusado – o cumprimento de requisitos quase que idênticos aos estipulados pelo legislador à configuração do instituto da reincidência.

A reincidência, por sua vez, está prevista no artigo 61 do nosso Código. Logo, inconfundível com o de nº 59. Para aqueles que, eventualmente, tenham faltado a esta aula, a lei não traz palavras em vão. Antecedentes do acusado é uma circunstância judicial que independe do selo do trânsito em julgado às ações penais ou aos inquéritos policiais aos quais o condenado responde.

A aplicação da súmula do STJ nos direciona a julgados que nem de perto traduzem o senso comum de justiça. Basta exemplificar com caso recente que chegou ao meu conhecimento: dois elementos foram condenados pelo crime de roubo a pedestre. Um deles era cliente contumaz do tribunal de júri daquele município – já contava com seis condenações, sendo duas por homicídio, mas, afortunadamente para ele, nenhuma com trânsito em julgado. Por sua vez, o comparsa sequer registro policial pretérito tinha.

Alguém pode afirmar ser razoável que ambos tenham a sua pena base fixada em quatro anos? Com a aplicação da súmula do STJ o resultado não foi outro. Há quem de forma sincera insista não ter havido no caso flagrante violação ao princípio da individualização da pena? Está-se, mais uma vez, diante de incentivo jurisprudencial ao criminoso de carreira.

Magistrado com quem já trabalhei, analisando brilhantemente a discrepância à qual se pode chegar com a aplicação do entendimento sumular do STJ, ainda neste ano, decidiu por mover a pena do mínimo legal de acusado que, embora não contasse com sentença transitada em julgado, era cliente cativo da vara criminal, reconhecendo, assim, que os antecedentes daquele permitiam uma elevação de sua pena base dentro dos pilares do preceito secundário do tipo penal.

O êxito na guinada jurisprudencial em prol da aplicação coerente do art. 59 do CP foi efêmero. Àquilo que se intitulava fetiche judicial contaminou o Procurador de Justiça parecerista do feito, que se manifestou favorável ao apelo defensivo para reduzir a pena do réu ao mínimo legal. Entendeu o membro do Ministério Público de segundo grau que há evidente identificação entre os requisitos exigíveis ao reconhecimento do instituto da reincidência e da circunstância judicial identificada a partir da folha corrida sangrenta de antecedentes criminais da qual o réu, no caso telado, tanto se orgulha.

A independência funcional do membro do Ministério Público, como se extrai do caso narrado, também é capaz de fazer sangrar ao trilhar caminho oposto à efetivação de resposta estatal proporcional à transgressão de ordem criminal. A falta de discurso uniforme, ao menos especificamente no que tange à busca pela reversão deste estado caótico de insegurança, é causa de enfraquecimento de Instituição em que a sociedade deposita suas últimas – se ainda as tem – esperanças no combate à impunidade desenfreada.

Enquanto o Ministério Público não entoar um discurso coeso e forte em prol da Segurança Pública, pilar republicano, incorporando de fato o princípio da unidade desta Instituição, marcharemos feito peneiras contra uma sólida criminalidade que “tolera à bala” eventual voz dissonante dentro da sua facção. Não há vácuo de poder. A covardia dos bons, conforme ensina o mestre Gilberto Callado (2), fomenta a audácia dos maus.

(1) Samenow, Stanton E., Inside the Criminal Mind, New York, BDWY, 2014, p. 112.
(2) Oliveira, Gilberto Callado, Garantismo e Barbárie – a face oculta do garantismo penal, Florianópolis, Conceito Editorial, 2014, p. 135.

*Júlia Schütt, promotora de Justiça do MPRS – titular da Promotoria de Justiça Especializada do Alegrete e aluna da Escola de Altos Estudos em Ciências Criminais.


** Publicado originalmente no Estadão.

 

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  • Luiz Felipe Pondé
  • 24 Setembro 2018


E se Lula ganhar as eleições em 2018? O Brasil terá um retrocesso ao paleolítico –sem querer ofender nossos ancestrais.
Sei que inteligentinhos dirão: pelo contrário, as populações mais pobres voltarão a comprar TVs e carros. E eu direi: a bolsa fome é a grande miséria que alimenta o PT e seus associados.
Nelson Rodrigues dizia que, no dia em que acabasse a pobreza do Nordeste, dom Helder, o arcebispo vermelho, perderia sua razão de existir. Por isso, ele e a miséria do Nordeste andavam de mãos dadas.
O truque do PT e associados é o mesmo: destruir a economia, acuar o mercado, alimentar uma parceria com os bilionários oligopolistas a fim de manter o país miserável e, assim, garantir seu curral eleitoral.
Como o velho coronelismo nordestino –conheço bem a região: sou nascido no Recife e vivi muitos anos na Bahia–, o PT e associados têm na miséria e na dependência da população seu capital.
Mas quero falar de outras dimensões da tragédia que nos cerca caso o PT retome o poder.
Desta vez, o projeto "a Venezuela é aqui" se organizará de forma mais concreta.
O Poder Judiciário, já em grande parte na mão da "malta" do PT, servirá ao partido de forma sincera e submissa, destruindo a autonomia da Justiça. Esse processo já está em curso, mas foi, temporariamente, barrado pelo percalço do impeachment e de alguns poucos setores não petistas do Poder Judiciário.
O Legislativo se acomodará, como sempre, a quem manda.
O mercado também se acomodará, servindo, de novo, ao coronel Lula ou a algum genérico que o represente. Eliminarão qualquer elo na sua cadeia produtiva que suje seu nome –da empresa, quero dizer– junto à Nomenclatura.
Quanto à inteligência pública, essa será devastada.
Perda de empregos, contratos, espaços nos veículos, com a bênção da quase totalidade das Redações e editorias. Se não apenas para eles mesmos não perderem empregos, contratos e espaços, também, e principalmente, porque a quase totalidade das Redações e editorias são petistas ou similares.
Nas universidades e nas escolas, a festa. Reforço absoluto da patrulha ideológica de forma orgânica, com apoio da Capes e de sua plataforma Sucupira.
As universidades, entidades quase absolutamente monolíticas e autoritárias, celebrarão a queima total de seus adversários internos e externos. Os alunos, coitados, ou aderirão à retomada vingativa do poder por parte do PT, ou perderão bolsas, vagas e carreiras.
E chegará a vez de as Forças Armadas também serem cooptadas pela hegemonia petista. Uma vez cooptada, como na Venezuela, a regressão ao paleolítico estará plenamente realizada.
O controle da mídia, em nome da "democracia", implicará o silêncio imposto a todos que quiserem pagar suas contas.
A classe artística fará festivais para comemorar o retorno ao poder dos "progressistas" que dão dinheiro para eles gastarem até acabar.
E, quando o dinheiro acabar, como acabou no Dilma 2, os "progressistas" sairão do poder, darão um tempo para os "conservadores" fazerem o trabalho sujo de reorganizar a economia e, quando a casa estiver um pouco mais organizada, voltarão ao poder para gastar tudo de novo.
Vivemos duas formas de hegemonia do PT e associados no Brasil: a hegemonia da miséria e do discurso populista de cuidado com ela e a hegemonia do pensamento público e de suas instituições.
A diferença entre o PT de antes do impeachment e o PT de agora será que antes ele ainda fazia pose de defensor das liberdades.
Agora, ele perderá a pose e destruirá todo o tecido de liberdade de expressão no país.
E mais: a vitória de Lula em 2018 será a prova definitiva de que os eleitores não estão nem aí para suspeita de corrupção pairando sobre qualquer que seja o candidato.
Todo esse mimimi ao redor da Lava Jato ficará claro como mimimi.
Dane-se a corrupção. Ninguém está nem aí para isso. A começar pelos intelectuais, professores, artistas e integrantes de grande parte do Poder Judiciário.
O combate à corrupção é (quase) uma farsa.
Depressão, ressentimento, medo e vingança serão os afetos que definirão 2019.

Publicado originalmente na Folha em 18/12/2017
 

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  • Maria Lucia Victor Barbosa
  • 24 Setembro 2018

 


A discrepância entre o que mostram as pesquisas eleitorais e o resultado das urnas tem acontecido em eleições passadas e recentes, não só no Brasil como em outros países. Um caso que pode ilustrar tal afirmação foi a eleição presidencial norte-americana, quando venceu Donald Trump. Pelas pesquisas aparecia que Trump não conseguiria os delegados para sua indicação. Depois, que perderia por larga margem para Hillary Clinton. Isso fazia a festa da mídia brasileira que até hoje parece desejar fazer no Brasil o impeachment do presidente norte-americano.

É próprio das campanhas políticas o vale-tudo dos golpes baixos. Entram também em cena o marketing, o Quarto Poder da mídia que inclui o Palanque Eletrônico da TV e, agora com a evolução da tecnologia, o Quinto Poder onde avulta o poderoso Palanque Digital das redes sociais composto pelo FaceBook, o WhatsApp, o Twitter, o Instagram, os vídeos. E, por que não, às vezes as pesquisas, que com a indução de certeza transmitida através dos números podem influenciar eleitores, distorcer a realidade, utilizar metodologia errada, propiciar interpretações muitas vezes estapafúrdias.

Nessa eleição sui generis por conta da presença do candidato à presidência da República, Jair Messias Bolsonaro (sem tempo de TV, sem coligações partidárias, sem recursos financeiros, mas escudado pelo Palanque digital), os institutos de pesquisa o mostraram no mesmo patamar de 17% por um bom período, Isto levou à conclusão de que ele havia atingido seu teto para alegria dos adversários. Entretanto, Bolsonaro foi, como dizem os pesquisadores, “oscilando para cima”. Bem para cima por sinal.

Aos poucos os Institutos de pesquisa foram ajustando de modo igual a subida de Bolsonaro, 24%, 26%, 28%. Aconteceu depois do atentado que quase tirou a vida do candidato, quando um matador de aluguel o esfaqueou. Então, lhe foi concedida gradual ascensão que deixou os outros postulantes bem para trás.

Quanto ao petista, Fernando Haddad, teve nas pesquisas uma subida fulminante, como a demonstrar que o presidiário pode exercer seu comando e fascínio sobre as massas mesmo de dentro da prisão. Afinal, anteriormente Lula ajudara ao esnobe Haddad a se tornar prefeito de São Paulo, mas, coisa curiosa, não teve força política para reeleger o pior prefeito da capital paulista, que conseguiu a inédita façanha de perder para João Dória (PSDB) no primeiro turno.

Agora o pior prefeito de São Paulo já se sente presidente da República, pronto para reprisar Dilma Rousseff como preposto do chefe. Diante disso se pode perguntar: Por que Lula consegue tal resultado com Haddad e quase nenhum para Marinho, que postula o governo de São Paulo e se encontra em minguada posição perante os adversários? Afinal, Lula, que reina nas propagandas gratuitas apareceu abraçado com o companheiro Marinho hipotecando-lhe apoio.

Dirão que no caso de Haddad a identificação é maior, mesmo porque o petista afirma: “eu sou Lula”. Seria isso uma boa propaganda? Se Haddad perder, Lula também perde o que não é nada interessante para o PT.

Existem ainda alguns aspectos das pesquisas que levam a conclusões, tais como: O candidato com maior intenção de votos tem também a maior rejeição, logo vai perder. Ou então, Bolsonaro que se encontra em primeiro lugar vai perder de todos os candidatos que se encontram bem abaixo dele no segundo turno.

Contudo, se os resultados forem outros, dirão os donos dos institutos que as pesquisas refletem a realidade do momento, apesar das projeções que fazem para segundo turno darem a impressão de que são imutáveis. Todos os erros, então, se justificarão apesar das imensas diferenças quando as urnas forem abertas.

De todo modo é interessante conhecer o que disse, James Gulbrandsen, gestor de investimentos da NCH Capital e que foi publicado na Folha de S, Paulo (22/09/2018 – A13):

O gestor questiona a metodologia do Datafolha e afirma “que as pesquisas eleitorais trazem um recorte tendencioso da população nordestina que ganha até dois salários mínimos, utilizam porcentagens menores que as reais de pessoas que se afirmam católicas ou evangélicas e trazem uma parcela maior de pessoas que se identificam com ideais de esquerda”. “Para Gulbrandsen estes erros de amostragem tornam as pesquisas enviesadas, favorecendo candidatos como Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT)”. Diz também: “Não quero ofender os estatísticos, mas seus resultados podem ser completamente irrelevantes (para os investimentos)”. Aponta ainda, “um viés político do Datafolha, da Folha e do UOL, empresas do Grupo Folha, que afirma terem ‘inclinações esquerdistas”.

O jornal apresentou na mesma página sua defesa. Aguardemos o resultado das urnas daqui duas semanas para conferir. Até lá o primeiro colocado continuará a sofrer muitas facadas verbais dos desesperados pelo poder. Existe um partido que sabe fazer isso muito bem.

*A autora é socióloga
 

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  • Olavo de Carvalho
  • 24 Setembro 2018

 

O clamor obsessivo dos intelectuais, dos políticos e da mídia pela “supressão das desigualdades” e por uma “sociedade mais justa” pode não produzir, mesmo no longo prazo, nenhum desses dois resultados ou qualquer coisa que se pareça com eles. Mas, de imediato, produz ao menos um resultado infalível: faz as pessoas acreditarem que o predomínio da justiça e do bem depende da sociedade, do Estado, das leis, e não delas próprias. Quanto mais nos indignamos com a “sociedade injusta”, mais os nossos pecados pessoais parecem se dissolver na geral iniquidade e perder toda importância própria.

Que é uma mentira isolada, uma traição casual, uma deslealdade singular no quadro de universal safadeza que os jornais nos descrevem e a cólera dos demagogos verbera em palavras de fogo do alto dos palanques? É uma gota d’água no oceano, um grão de areia no deserto, uma partícula errante entre as galáxias, um infinitesimal ante o infinito. Ninguém vai ver. Pequemos, pois, com a consciência tranquila, e discursemos contra o mal do mundo.

Eliminemos do nosso coração todo sentimento de culpa, expelindo-o sobre as instituições, as leis, a injusta distribuição da renda, a alta taxa de juros e as hediondas privatizações.

Só há um problema: se todo mundo pensa assim, o mal se multiplica pelo número de palavras que o condenam. E, quanto mais maldoso cada um se torna, mais se inflama no coração de todos a indignação contra o mal genérico e sem autor do qual todos se sentem vítimas.

É preciso ser um cego, um idiota ou completo alienado da realidade para não notar que, na história dos últimos séculos, e sobretudo das últimas décadas, a expansão dos ideais sociais e da revolta contra a “sociedade injusta” vem junto com o rebaixamento do padrão moral dos indivíduos e com a conseqüente multiplicação do número de seus crimes. E é preciso ter uma mentalidade monstruosamente preconceituosa para recusar-se a ver o nexo causal que liga a demissão moral dos indivíduos a uma ética que os convida a aliviar-se de suas culpas lançando-as sobre as costas de um universal abstrato, “a sociedade”.

Se uma conexão tão óbvia escapa aos examinadores e estes se perdem na conjeturação evasiva de mil e uma outras causas possíveis, é por um motivo muito simples: a classe que promove a ética da irresponsabilidade pessoal e da inculpação de generalidades é a mesma classe incumbida de examinar a sociedade e dizer o que se passa. O inquérito está a cargo do criminoso. São os intelectuais que, primeiro, dissolvem o senso dos valores morais, jogam os filhos contra os pais, lisonjeiam a maldade individual e fazem de cada delinquente uma vítima habilitada a receber indenizações da sociedade má, e, depois, contemplando o panorama da delinquência geral resultante da assimilação dos novos valores, se recusam a assumir a responsabilidade pelos efeitos de suas palavras. Então têm de recorrer a subterfúgios cada vez mais artificiosos para conservar uma pose de autoridades isentas e cientificamente confiáveis.

Os cientistas sociais, os psicólogos, os jornalistas, os escritores, as “classes falantes”, como as chama Pierre Bourdieu, não são as testemunhas neutras e distantes que gostam de parecer em público (mesmo quando em família se confessam reformadores sociais ou revolucionários). São forças agentes da transformação social, as mais poderosas e eficazes, as únicas que têm uma ação direta sobre a imaginação, os sentimentos e a conduta das massas. O que quer que se degrade e apodreça na vida social pode ter centenas de outras causas concorrentes, predisponentes, associadas, remotas e indiretas; mas sua causa imediata e decisiva é a influência avassaladora e onipresente das classes falantes.

Debilitar a consciência moral dos indivíduos a pretexto de reformar a sociedade é tornar-se autor intelectual de todos os crimes – e depois, com redobrado cinismo, apagar todas as pistas. A culpa dos intelectuais ativistas na degradação da vida social, na desumanização das relações pessoais, na produção da criminalidade desenfreada é, no seu efeito conjunto, ilimitada e incalculável. É talvez por eles terem se sujado tanto que suas palavras de acusação contra a sociedade têm aquela ressonância profunda e atemorizante que ante a plateia ingênua lhes confere uma aparência de credibilidade. Ninguém fala com mais força e propriedade contra o pecador do que o demônio que o induziu ao pecado. O discurso dos intelectuais ativistas contra a sociedade vem direto do último círculo do inferno.

• Publicado originalmente no Jornal da Tarde, 13 de abril de 2000

 

 

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  • Francisco José Dominguez
  • 19 Setembro 2018

 

O autor divergiu do entendimento que manifestei em “A Constituição ‘Cidadã’, a de Mourão e a Viável”. Por isso, escreveu-me a mensagem que aqui transcrevo por atribuir-lhe valor argumentativo num debate que, logo mais, estará aberto em nosso país.

Prezado Puggina


Há muito sigo seus artigos. Sempre muito ponderados, muito cheios de sabedoria e de lógica. Mas, pela primeira vez discordo de um artigo seu. E isto é um elogio ao seu trabalho, já que eu sou tido como um crítico impiedoso.....

Não vou me meter a discutir com o prezado amigo (acho que posso chama-lo assim, pelas afinidades de ideias), porque eu não tenho nenhuma veleidade de me achar mais bem informado, ou mais culto do que ninguém. O fato é que todos concordamos com o óbvio: a Constituição precisa ser mudada, porque está atrapalhando o desenvolvimento do país e criando condições para que a corrupção tome conta dos Três Poderes. O que deve ser mudado é assunto para inúmeros artigos e sugestões. Vou me ater somente ao ponto em que você tocou em seu artigo: Como mudar.

Assim, gostaria de lhe dar alguns tópicos para pensar, ou repensar, suas ideias a respeito de uma nova Constituição.

1 – A Constituição americana foi feita por uma comissão de notáveis. E que notáveis.... Thomas Jefferson, George Washington, Benjamin Franklin e os demais "Founding Fathers", eram a elite da época. Os tempos eram outros, eu sei. Os EUA tinham acabado de se tornar independentes e o povo os apoiava. Bem como não havia ninguém melhor do que eles para fazer o serviço. Fizeram uma Constituição enxuta, que vale até hoje, e que conduziu os EUA à situação de maior potência mundial. Mas também podemos considerar que, se Bolsonaro vencer, teremos vencido a nossa guerra da independência. A guerra contra os comunistas Bolivarianos, Venezuela e Cuba. E o povo vai estar do nosso lado. Difícil dizer se teremos outra oportunidade como esta. Entendo perfeitamente o seu medo de quem seriam os "notáveis" do nosso tempo. Estamos num deserto de homens e ideias, com raros "oásis" espalhados no mesmo. Mas precisamos correr o risco, e escolher bem quem serão os notáveis. Pelos motivos a seguir.

2 – Segundo um grande estudioso de organização, Peter Drucker, existem três modos de alterar as organizações: Reforma, Revolução e Inovação.
- A Reforma seria caracterizada por pequenas mudanças ao longo do tempo. O que ele considera que, na verdade, não mudaria muita coisa. Tudo continuaria como antes.
- A Revolução seria caracterizada pela total destruição de tudo que existia antes, e pela criação de tudo novo, a partir de zero. Seria como a revolução comunista, que pretende destruir a civilização ocidental, para implantar seu "Um mundo novo melhor". O que o professor também desaconselha, porque se jogaria fora toda a experiência acumulada.
- A Inovação, por ele recomendada, seria uma solução que, considerando toda a experiência adquirida previamente, criaria uma nova estrutura organizacional, a partir de zero.
E aqui eu me atrevo a dizer que concordo com ele. Todos os locais onde trabalhei ao longo da vida optaram pelas Reformas. Todos eles se tornaram ineficientes, e perderam suas oportunidades de construírem algo produtivo para si e para seus clientes. E o Brasil tem seguido esse caminho, com resultados bem ruins.

3 – Uma das coisas mais faladas, em Análise de Sistemas, é que, após um sistema receber uma certa quantidade de remendos, quem o projetou se perde no meio da confusão gerada. Portanto, periodicamente, o sistema tem que ser redesenhado a partir de zero, usando a experiência anteriormente adquirida. Como dizia Drucker, INOVAÇÂO. E a Constituição nada mais é do que a documentação que guia um grande Sistema, chamado Brasil.

4 – Temos a mesma idade aproximadamente, eu estou com 73 anos. Portanto, passamos pelas mesmas coisas no país, e temos muitas semelhanças no modo de pensar. Por isso, posso dizer, sem medo de criar melindres, que nós somos uma geração que já está passando o bastão. E é importante que passemos esse bastão em condições favoráveis ao progresso do país.

Uma vez li um livro que me deixou uma grande lição: O Zero e o Infinito, de Arthur Koestler. A lição? "Os jovens querem mudar o mundo, querem mudar tudo. Os velhos não querem mais mudar nada. Da interação do velho com o novo, sai o progresso da humanidade, na velocidade que ela pode suportar."

Não podemos abrir mão, nem do entusiasmo dos jovens, nem da experiência dos velhos. Mas acho que está na hora de mudar o paradigma das reformas progressivas. Estamos num ponto crucial de nossa História. Podemos optar pelas reformas, e manter tudo mais ou menos a mesma coisa, ou INOVAR.

Acredito que o Brasil já teve sua dose de Reformas, e nada me indica que foi uma boa solução.
Abraços do seu leitor e admirador

Francisco José Dominguez
 

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  • João Carlos Biagini
  • 19 Setembro 2018

 

Como sempre acontece, às vezes analisamos a vida como uma novela, que tem um personagem do mal contra outro do bem. E a confusão nas nossas mentes é tão grande que os artistas que fazem os papéis das pessoas malignas são agredidos nas ruas, enquanto na vida real se dá o contrário, os criminosos atacando e matando as pessoas de bem, sem nenhuma punição.

Nas eleições não é diferente. Nós confundimos a pessoa física do candidato com o projeto de governo. E ficamos brigando pela pessoa e não pelo país.

Na época da greve dos caminhoneiros, para esclarecer que não era uma pessoa física contra outra pessoa física, escrevi isto no whatsapp:

Vejo todos se batendo contra pessoas que pouco farão na estrutura atual do Brasil. Urge mudar a estrutura das instituições e governos: mudar para parlamentarismo; adotar o voto distrital puro; quebrarmos todos os monopólios (o problema vivido agora é decorrente do "petróleo é nosso", ou seja, monopólio da Petrobrás); mudança na forma de escolha dos ministros do STF; vendas da Caixa Econômica e Banco do Brasil (o governo fica somente com o Banco Central); reformas da previdência e fundos de pensão (todos devem contribuir e receber da mesma fonte e em valores iguais (nenhum país aguenta pagar aposentadorias de R$30.000,00); inversão do fluxo do dinheiro dos impostos ( o municipal já fica no município, o estadual já fica no estado e o federal vai para a União), porque, enquanto vão e voltam, os custos comem a maior parte; reforma tributária, com implantação do IVA sobre vendas e tantas outras. Não adianta Fora Temer, volta Lula. O problema brasileiro é estrutural.

Agora, nas eleições, a confusão se acentuou, pela inclusão das questões morais: corrupção, aborto, homossexualismo, homofobia e outros tantos.

Para tentar mostrar que a eleição não é de uma pessoa física contra a outra, há várias menções na Internet para a divisão do Brasil em dois, sendo um conservador e um progressista, mais ou menos com as seguintes características e composição:

1 – BRASIL CONSERVADOR: organizado e cristão, que una o povo; com respeito à família tradicional; contra o aborto; contra as drogas proibidas; escolas com disciplina e respeito às professoras, para não apanharem dos alunos; respeito ao tempo da criança; sem ideologia de gênero; com as pessoas reconhecidas pelo seu sexo natural, masculino ou feminino; economia de mercado livre; empreendedores, empresários e comerciantes, pequenos ou grandes, com seus contratos e negócios respeitados; todos igualmente respeitando as leis; policiais que defendem nossas vidas respeitados; o exército, que a paz quer com fervor, garantindo a segurança nacional; com os estupradores presos; com os assassinos condenados e cumprindo suas penas; sem MST invadindo terras e matando o gado; sem o MST destruindo centro de pesquisas de 15 anos, sem sindicatos queimando pneus e impedindo as pessoas de irem para o trabalho; sem black blocs destruindo vitrinas; sem bolsa prisão; com todos iguais e incentivados a estudar e pesquisar, para todos melhorarem suas condições de vida; com os que têm boas condições físicas trabalhando para seu sustento; com a valorização do mérito de cada um; com governantes empenhados nas prioridades da Nação e um país aliado aos outros países democráticos do mundo.

2 – PAÍS PROGRESSISTA: com um governo socialista ou anarquista; desejando uma bala e uma vala para todos os que pensarem diferente; com luta de classes (branco contra negros, trabalhadores contra empresários, nordestinos contra sulistas, homossexuais contra heterossexuais, feministas contra donas de casa e muitas outras classes); sem cristãos; com vadias vilipendiando a crença dos outros; com família de qualquer tipo; com todos sem sexo ou com o mesmo sexo; com escola sem disciplina e professoras apanhando; com crianças de 4 a 10 anos aprendendo na escola a fazer sexo; com aborto livre; com drogas livres, com pedofilia livre; com policiais considerados criminosos; com traficantes e assassinos considerados vítimas; com governo a favor do assalto; com governo aprovando roubos; sem exército para defender o país; sem polícia armada para defender as pessoas; sem presídios e sem cumprimento de penas pelos criminosos; sem empreendedores, empresários e comerciantes livres; com estado socialista, monopolizador das empresas e da economia; com as pessoas estimuladas a não estudar; com as pessoas desobrigadas de trabalhar para seu sustento, esperando tudo do Estado; sem a obrigação de respeitar as leis; com bolsa-prisão para os criminosos maior que o salário mínimo; com partido único, socialista ou comunista, e um país aliado somente de Cuba, Venezuela, Coréia do Norte, Nicarágua e outras ditaduras do planeta.

É claro que a pessoa e a vida social do candidato devem ser examinadas, para não serem eleitas pessoas inescrupulosas, que se apropriam dos bens do povo, que buscam as prioridades próprias e dos seus partidos. O cristão deve participar da política, votando e sendo votado, porque busca o bem comum, conforme orienta o Magistério da Igreja Católica.

Na hora de votar, muito além das pessoas físicas dos candidatos, precisamos analisar bem qual dos projetos queremos para nós, para as gerações futuras e para o Brasil: um país conservador ou um país progressista?
   

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