Percival Puggina
12/07/2018
Você sabe por que o Brasil não consegue solucionar o problema da miséria? Porque, de um lado, deixamos de agir sobre os fatores que lhe dão causa, e, de outro, nos empenhamos em constranger e coibir a geração de riqueza sem a qual não há como resolvê-la. Os fanáticos da política, os profetas de megafone, os "padres de passeata", para dizer como Nelson Rodrigues (ao tempo dele não existiam as Romarias da Terra), escrutinando os fatos com as lentes do marxismo, proclamam que os pobres no Brasil têm pai e mãe conhecidos: o capitalismo e a ganância dos empresários. Em outras palavras, a pobreza nacional seria causada justamente por aqueles que criam riqueza e postos de trabalho em atividades desenvolvidas sob as regras do mercado.
Estranho, muito estranho. Eu sempre pensei que as causas da pobreza fossem determinadas por um modelo institucional todo errado (em 2017, o 109º pior entre 137 países, segundo o World Economic Forum (WEF). Pelo jeito, enganava-me de novo quando incluía entre as causas da pobreza uma Educação que prepara semianalfabetos e nos coloca em 59º lugar no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), entre 70 países. Sempre pensei que havia relação entre pobreza e atraso tecnológico e que nosso país não iria longe enquanto ocupasse o 55º lugar nesse ranking (WEF, 2017). Na minha santa ignorância, acreditava que a pobreza que vemos fosse causada, também, por décadas de desequilíbrio fiscal, gastos públicos descontrolados tomados pela própria máquina e inflação. Cheguei a atribuir responsabilidades pela existência de tantos miseráveis à concentração de 40% do PIB nas perdulárias mãos do setor público (veja só as tolices que me ocorrem!). E acrescento aqui, se não entre parêntesis, ao menos à boca pequena, que via grandes culpas, também, nessas prestidigitações que colocam nosso país em 96º lugar entre os 180 do ranking de percepção da corrupção segundo a Transparência Internacional.
Contemplando, com a minha incorrigível cegueira, os miseráveis aglomerados humanos deslizantes nas encostas dos morros, imputava tais tragédias à negligência política. Não via como obrigatório o abandono sanitário e habitacional dos ambientes urbanos mais pobres. Aliás, ocupamos a 112ª posição no ranking, entre 200 países, no acesso a saneamento básico. Pelo viés oposto, quando vou a Brasília, vejo, nos palácios ali construídos com dinheiro do orçamento da União, luxos e esplendores de uma corte dos Bourbons.
Mas os profetas do megafone juram que estou errado. A culpa pela pobreza, garantem, tampouco é do patrimonialismo, do populismo, dos corporativismos, do culto ao estatismo, dos múltiplos desestímulos ao emprego formal. Não é sequer de um país que, ocupando a 10ª posição entre os mais desiguais do mundo, teve a pachorra de gastar, sob aplauso nacional, cerca de R$ 70 bilhões para exibir ao mundo sua irresponsabilidade na Copa de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016. No entanto, os Pinóquios da política, das salas de aula, da mídia e dos púlpitos a serviço da ideologia, fanáticos da irrazão, asseguram-nos que existem pobres por causa da economia de empresa e dos empreendedores.
Um dos fenômenos brasileiros deste início de século é o silêncio das consciências ante toda falsidade. É a morte do grilo falante.
* Este texto atualiza dados de um pequeno trecho do meu livro “Pombas e Gaviões”, publicado pela AGE em 2010.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
10/07/2018
Cada vez que, em viagem, passo pelo guichê da PF, saúdo o agente que ali está com a exclamação: “Polícia Federal, orgulho nacional!”. Digo o que penso para expressar reconhecimento e falo alto para ser ouvido. Recolho o sorriso do policial e manifestações de aprovação ao redor. É o mesmo conceito que tenho dos procuradores de justiça da operação Lava Jato, do juiz Sérgio Moro, do TRF4 (com a exceção que recentemente se expôs aos holofotes) e do STJ.
Já o STF... Ele é institucionalmente tão necessário que, durante anos, o levei a sério. Os indicados, afinal, atendiam às exigências de caráter e cultura jurídica. Eu respeitava aquele poder do Estado mesmo quando as ações penais contra inquilinos das penthouses do poder hibernavam, e veraneavam, e voltavam a hibernar entre ácaros e fungos nas suas empoeiradas prateleiras. Era um poder lento, muito lento, mas honorável. E assim foi até o advento do petismo, cujo legado acabou com a credibilidade e a dignidade do poder. O Supremo de hoje, que breve será presidido por Dias Toffoli – imaginem só! – junta o que de pior é pensado pela “esquerda do Direito” com os produtos cada vez mais numerosos da magistratura militante, a escancarado serviço de suas causas ideológicas. Como regra, estão do lado do bandido e contra a sociedade.
Se não, vejamos. Em poucos meses, a Lava Jato desmontou o esquema de corrupção organizado em torno dos negócios da Petrobras. Os inequívocos crimes começaram a ser confessados, valores foram devolvidos, as quadrilhas se desfizeram em delações e foi o que se viu. A sociedade exultou. E o STF? Aparelhado pelo PT, num crescendo de manifestações individuais que evoluiu para decisões colegiadas, passou a inibir a eficiência da operação e a proteger os bandidos. Marco Aurélio Mello (o primo de Fernando Collor) foi o primeiro a denunciar os “julgamentos de cambulhada”. Depois vieram as restrições às algemas e às conduções coercitivas, os fatiamentos dos inquéritos, as críticas às colaborações premiadas, as tentativas de restaurar a impunidade eterna com o fim da prisão após condenação em segunda instância e, por fim, as inacreditáveis solturas de cambulhada.
Para assegurar a renovação dos mandatos dos quadrilheiros do Congresso Nacional, nada melhor do que impedir o financiamento privado das campanhas eleitorais. Assim, mediante decisão que atropelou o poder legislativo, o STF, em nome da “ética”, preparou o caminho por onde bilhões de reais, em recursos públicos, chegarão aos corruptos para usarem de modo privado, antagonizando os anseios nacionais por renovação nos parlamentos.
Temos um STF desafinado, a proteger a bandidagem endinheirada enquanto a sociedade se exaspera em vão, impotente, vendo esvair-se a possibilidade de higienizar a cena política do país. Os grandes bandidos brasileiros estão bem cuidados, aconchegados e acarinhados no colo da deusa Têmis. E nós?
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
08/07/2018Sou cauteloso em relação às redes sociais, ou seja, sei que elas compõem um ambiente onde tudo ou quase tudo vale. Nele se torna impositivo, portanto, discernir a boa fonte, a começar pela linguagem, seguindo pela forma, passando pelo conteúdo e pela checagem do fato, quando houver fato envolvido. Convenhamos que isso não é muito diferente do que se deve fazer em relação a tantos veículos e profissionais da mídia tradicional, especialmente quando se trata de juízos e opiniões. É principalmente nesse território, até bem pouco dominado pelos tradicionais meios de comunicação, que se vão encontrar as mais escandalosas manipulações, construídas para induzir o público a se afastar da verdade e do justo discernimento em relação aos fatos.
Nesse sentido, as redes sociais, sites e blogs promoveram importante democratização no direito de opinião, com enormes ganhos à sabedoria e à burrice nacional. Acabou o monopólio do direito de opinião. Quem abastece seu espírito com beleza e sabedoria, sai bem servido. Quem busca mediocridade e grossura, idem. Também isso é democrático.
Ao noticiar o caso da mulher que assediou Jair Bolsonaro no aeroporto de Congonhas, quase todos os jornais que li instilaram sua dose de veneno contra o candidato afirmando que ele “se escondeu no banheiro”, ou que “se refugiou no banheiro” ao ser xingado por uma mulher, ou que “se envolveu numa confusão (segundo alguns relatos) ou numa discussão (segundo outros)”, ou que a tal mulher “chegou a se jogar no chão” (quando, na verdade, caiu de bêbada) e por aí andou a criatividade das distorções. Quem “se envolve” é sujeito ativo do envolvimento. Portanto, o candidato seria sujeito da confusão e não objeto do escarcéu armado por alguém fora de si. Resumo da opereta segundo quase todas as matérias que li: o machista Bolsonaro foi xingado por uma mulher, se envolveu em encrenca e teve que fugir para o banheiro...
O fato, porém, foi inteiramente filmado e o vídeo que a tudo isso desmente está disponível no YouTube. Mostra uma mulher não identificada (mesmo passados tantos dias), num pileque como raramente se vê igual, ou atuando como tal, berrando palavrões na sala de embarque, tentando, durante quase dez minutos, se aproximar do candidato e invadir o banheiro onde Bolsonaro prudente e adequadamente entrou.
O momento atual, no meu modo de ver, é muito prematuro para escolher candidato presidencial. Mas algo está a me dizer que quem suscita tão articulada animosidade entre pessoas intelectualmente desonestas, algum mérito deve ter.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
04/07/2018Dias Toffoli, o paraquedista enxertado por Lula no STF, cassou a decisão do juiz Sérgio Moro que impusera a José Dirceu o uso de tornozeleira eletrônica. Ao expedir a ordem, com o pé no estribo do recesso, o ex-funcionário do PT afirmou, sem revelar o menor constrangimento, que a Segunda Turma (sempre ela!) concedera “liberdade plena” ao preso e que, portanto, tornozeleira era uma inibição da liberdade. Daquela liberdade fulgente, de asas ao vento, que o trio maravilhoso fizera raiar para o pensionista da Papuda.
Liberdade plena! Claro, por que não? Só porque Dirceu é um criminoso reincidente em corrupção passiva, condenado em segunda instância por tribunal federal, num novo processo, a mais de 30 anos de prisão? Como encarcerar, só por isso, um guerreiro herói do povo brasileiro? Afinal, a matéria adquire urgência absoluta posto que a carimbada, rotulada e descarada maioria da Segunda Turma vislumbrou “plausibilidade nos recursos interpostos [pela defesa] quanto à dosimetria da pena”. Faz sentido. E, se refeitos os cálculos, os 30 anos forem corrigidos para 30 dias? Para 30 minutos? Já pensaram nisso? Toffoli pensou.
Cai sobre tão insólitas decisões o silêncio dos adoradores de corruptos, a mais nova seita nacional. Fervilham os engomados e bem trajados jurisconsultos nos corredores das carceragens. Imagine leitor, a inveja ao longo do corredor enquanto os demais presos acompanhavam os passos de Dirceu rumo aos portões do presídio. “Quando sair daqui vou para a política!”, devem ter jurado a si mesmos.
A Segunda Turma faz a festa dos grandes escritórios de advocacia criminal! Querem nos convencer de que estamos presenciando as maravilhas de um ordenamento jurídico perfeito. No firmamento da democracia, ele faz luzir a constelação dos inabaláveis direitos dos cidadãos. Dito isso for the record, bota o pé no chão, deixa de frescura e solta a bandidagem endinheirada. Libera os amigos. Protege os companheiros.
É preciso andar de quatro, com o nariz enfiado no chão, para imaginar que [no firmamento da tal “democracia” da Segunda Turma] os mesmos favores, o mesmo atendimento urgente em meio àqueles arquivos empoeirados, são conferidos a todo processo, a toda petição. E que a mesma orelha ministerial esteja sempre disposta a ouvir todas as arengas e a atender todos os telefonemas. Por quem nos tomam?
É instigante observar que os cavaleiros do apocalipse moral do país, veneráveis patronos da impunidade eterna, ostentam uma característica comum. São bifrontes. Têm uma face para promover a impunidade, para jurisdicionar e fazer felizes os grandes corruptos. E outra para – peito estufado de vaidade enferma – descrever tais atos como virtuoso exercício de sua missão constitucional.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
02/07/2018
As ruas quase vazias de Porto Alegre, nos instantes anteriores ao início do jogo contra o México, e o fervilhante acúmulo de pessoas diante dos telões em todo o Brasil, reafirmaram, hoje (02/07), o quanto é singular e bissexta nossa exaltação patriótica.
Roendo unhas e unindo as palmas das mãos em oração, aquelas multidões exibidas na TV me trouxeram à mente os versos de Cassiano Ricardo em “Exortação” (muito provavelmente suprimidos dos repertórios escolares). Em torno da magia do gramado mesclavam-se, abraçavam-se, exclamavam-se, como que saídos da pena do poeta, os filhos do imigrante loiro e diferentes gerações que ele proclamou filhas do sol, do mar e da noite. Basta olhá-los para reconhecer os traços marcantes de diferentes etnias, num convívio alegre e espontâneo que a sociologia de relógio atrasado, gostaria de apartar, imputar culpas, construir conflitos e gerar contas a pagar.
A seleção brasileira desmente os “intelectuais” farsantes. Desmente-os dentro do gramado, nas arquibancadas e nas multidões reunidas na praça. O Brasil mal-humorado deve ter fechado os olhos para não ver tanto verde e amarelo num cenário onde não se conseguia vislumbrar sequer um pedaço de trapo vermelho.
O brasileiro ama o Brasil. Ele foi ensinado, porém, a repudiar esse sentimento. Foi sonegado a ele o direito de conhecer sua identidade, de ser informado sobre toda a dignidade presente na nossa história, de admirar o valor dos grandes vultos da pátria e seus exemplos. Maus brasileiros, industriados à tarefa professoral de “formar para a cidadania”, dedicam-se, como baratas, a correr pelos cantos escuros do passado em busca do lixo perdido (que país não o tem?). Nesse triste caminhar rejeitam as virtudes, os grandes exemplos e as nobres realizações (que outro país faz isso?). Até das estampas de nossas cédulas essas figuras notáveis sumiram para ceder vez a onças e araras, como me observou, recentemente, um leitor atento.
Não surpreende que, no desdobramento, a mal-amada pátria resulte na mal tratada pátria. Até que um belo dia – verde, amarelo e bissexto – o amor explode, a emoção enche os corações e traz lágrimas aos olhos. Claro. Como não chorar sentimentos tão sonegados e contidos?
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
01/07/2018
Uma coisa é perceber que a municipalidade (Porto Alegre é o caso, aqui) não conta com receita suficiente para manter, ainda que minimamente, serviços rotineiros como o de tapar buracos. Outra, bem diferente, é considerar que a solução passa por majorar o valor do IPTU segundo valores que, em 20% dos casos, podem mais do que duplicar.
Uma coisa é a administração local enviar projeto à Câmara de Vereadores com tal objetivo. Outra, bem diferente, é a autoridade alegar que não está promovendo aumento de imposto quando a maior parte dos pagadores de IPTU passará a despender muito mais ante o mesmo fato gerador.
Uma coisa é o justo anseio da gestão local por realizar um pouco ao menos daquilo que, na campanha eleitoral, demonstrou saudável intenção de concretizar. Outra, bem diferente, é cumprir tal objetivo buscando os recursos nos bolsos já rotos e drenados dos pagadores de impostos.
Uma coisa é o prefeito revelar a intenção de reduzir vantagens funcionais incompatíveis com a penúria do erário e atuar com firmeza na diminuição do gasto. Obviamente não é sustentável que as despesas correntes cresçam, de modo sistemático, segundo percentuais superiores aos da arrecadação. Um dia essa casa cai. Outra, bem diferente, é equivaler tais impositivos morais e racionais ao aumento imediato da receita tributária. A receita tributária deve evoluir com o desenvolvimento econômico e não com os meios de subsistência das famílias.
Uma coisa é haver desproporções gritantes entre os impostos pagos por imóveis novos e antigos em uma mesma área da planta de valores. Outra, bem diferente, é afirmar que todos são “privilegiados”, quando não agentes ativos de uma suposta injustiça. Imóveis hoje antigos tiveram seu IPTU rigorosamente atualizado na planta de valores fixada em 1989 e, desde então, todo ano, o tributo lançado é corrigido pelo IPCA, preservando seu valor real. Se o imposto cobrado dos novos imóveis não é referido ao valor da transação, isso é um problema da legislação ou das práticas fiscais. Entenda-se o fisco consigo mesmo, antes de acusar os munícipes; é inadmissível que se impute a eles quaisquer responsabilidades em relação a tal situação e que se onere os demais em vista disso.
Uma coisa é isentar imóveis de valor comercial insignificante. Outra, bem diferente, é afirmar que essa isenção depende da majoração do valor pago pelos demais – este, sim, verdadeiramente significativo. A caridade fiscal proposta é nada convincente, tanto no plano da razão quanto no da virtude social. Se a falta de recursos tem a dimensão que se alega, isentar de imposto quem já está pagando, ainda que pouco, não é coerente – a menos que se pretenda, com isso, criar massa de manobra para pressionar pelo que realmente convém à retórica tributarista.
É prova de insensibilidade a majoração de impostos num momento de letargia das atividades econômicas, quando os meios financeiros que faltam para o poder público faltam, também, para os cidadãos. E faltam àquele porque faltam a estes. No entanto, mesmo se as atividades econômicas transcorressem em condições normais, ainda assim haverá grave problema fiscal sempre que as despesas fixas cresçam de modo sistemático acima da receita. O pagador de impostos não pode ser indigitado como bode expiatório de um mal sistêmico.
Por fim, é meio pretensioso tratar da questão fiscal numa perspectiva que parece ver como privilégio o direito do “contribuinte” de viver onde vive enquanto o espaço urbano se degrada à sua volta. São responsáveis pela crise fiscal:
• todo gestor que silenciou e contemporizou enquanto o abismo se desenhava;
• todo pretendente ao posto de prefeito que, em campanha, ao longo de décadas, transmitiu ao eleitor a ideia de que as dificuldades seriam vencidas apenas com o vigor de sua “vontade política”;
• todo vereador, partido e bancada que aprovou despesa sem a sensata previsão de receita correspondente;
• todos os que se renderam, enfim, ao populismo e às facilidades da demagogia nutrida com recursos públicos, à pressão das greves, ao alarido das praças e ao grito das galerias clamando por fatias crescentes do bolo fiscal.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
29/06/2018
Certamente não passava pela cabeça de Angel Castro, ao mudar-se para Cuba, a idéia de que seus dois rebentos transformariam a ilha toda numa espécie de empresa familiar na qual ambos viriam a mandar e onze milhões de cubanos obedeceriam.
Há muito salta aos olhos de qualquer observador intelectualmente honesto que a situação de Cuba enveredou por desastrosa picada sem fim previsível. Mesmo assim, o meio acadêmico brasileiro e expressiva parcela da intelectualidade nacional não poupam louvores a Fidel, ao ideário que ele encarnou e desossou, e aos ícones do fatigante “socialismo o muerte!”, que os cubanos retificam para “socialismo y muerte”. De seu caráter sanguinário dão prova as vítimas do paredón e as sepultadas vivas nas masmorras do regime.
Os malabarismos retóricos a que recorrem seus seguidores brasileiros, treinados para dar nó em pingo d’água quando se trata de defender o comunismo, já começam a exigir platéia com atestado de morte cerebral. Os vários debates de que participei ao longo dos últimos 30 anos forneceram eloquentes exemplos disso.
“Cuba é uma referência de autonomia”, insistem. Cuba? Autonomia? Desrespeitam a autonomia própria e a dos outros! Sob Fidel, esse país viveu trinta anos na mais servil submissão à URSS. Foram três décadas de tenebrosas concessões. Ao longo delas, os jovens cubanos eram alugados como bucha de canhão para as intervenções comunistas na autonomia de Angola, Moçambique, Congo, Nigéria, Bolívia, Nicarágua, El Salvador e onde quer que a URSS precisasse de alguém para o serviço sujo das guerrilhas. “Cuba é uma democracia, sim, mas diferente da nossa”, proclamam, referindo-se a um regime sem liberdade de imprensa e de opinião, que há 60 anos só tem um partido, onde o líder máximo, quando enfermo, transferiu o poder para o maninho, onde criticar o governo faz mal à saúde, e onde ainda hoje, a placa - “Sob nova direção” - oculta o fato de que, por trás dos bastidores e das câmaras ainda é Raúl quem apita o jogo.
O próprio Díaz-Canel encarregou-se de deixar bem claro, ao assumir, que Raúl lideraria "as decisões de maior transcendência para o presente e o futuro do país". No início de junho, o novo presidente anunciou que seu antecessor comandaria, também, uma reforma constitucional que – surpresa! – não implicaria mudanças no modelo político e teria como pilares “a irrevogabilidade do sistema socialista, a união nacional e o papel do Partido (Comunista) como vanguarda organizada e força dirigente superior da sociedade e do Estado".
Quando alguém, desmontando as farsas dos argumentos, põe os pingos nos “is” da história e desenrola o filme dos fatos, eles, inevitavelmente, entre resmungos, começam a falar mal do Trump.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
27/06/2018
Faríamos bom negócio se trocássemos cem corruptos por um STF decente. Com um Supremo formado por juristas de alto nível, juízes de verdade, conscientes de seus deveres e responsabilidades, ficaríamos livre desse flagelo que mantém a nação em sobressalto. E os corruptos acertariam suas contas com a sociedade porque é isso que acontece quando as instituições funcionam.
Não estou sendo sarcástico. É incalculável o montante dos prejuízos que esse STF vem causando à política, à moral do povo, à credibilidade das instituições, à segurança jurídica e à estabilidade necessária ao funcionamento regular da economia.
Não há adjetivo polido para a conduta do ministro Dias Toffoli na sessão de ontem (26/06) da Segunda Turma do STF. A finalidade da sessão era abrir as portas da liberdade a um grupo de condenados da Lava Jato com culpa confirmada pelo TRF-4. No lote, para disfarçar, o ex-chefe José Dirceu. A ideia do trio Toffoli, Lewandowski e Gilmar era romper o entendimento colegiado da corte sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.
abem todos os ministros, sabem os advogados dos presos, sabem os condenados, sabe o Brasil que prisão após o trânsito em julgado de sentença condenatória é sinônimo de liberdade eterna para quem roubou muito. E um tanto mais breve para quem roubou pouco. É uma liberdade alugada com dinheiro das vítimas. É, também, outro nome que se pode atribuir à impunidade, benefício mais importante para o criminoso do que o produto de sua atividade.
Na imagem e possibilidade mais remota e positiva, o STF é um conjunto de 11 pessoas que, segundo maiorias instáveis e seus bestuntos individuais, impõem ao país o convívio com o intolerável. Na imagem mais provável, a coisa fica muito pior. Só para lembrar: em 10 de março de 2015, o ministro que coordenou a operação no dia de ontem enviou ofício ao colega Lewandowski, que presidia o STF, manifestando interesse em ser transferido da Primeira para a Segunda Turma da Corte, ocupando a vaga aberta pela morte de Teori Zavaski. Com essa mudança, o grupo que, por mera coincidência, tinha a seu encargo os processos da Lava Jato ganhava a atual configuração.
Para quem não sabe, ou já esqueceu, quando José Dirceu era chefe da Casa Civil da Presidência da República, Dias Toffoli foi seu subchefe da área de Assuntos Jurídicos. Em junho de 2005, acusado por Roberto Jefferson de ser o mentor do mensalão, Dirceu foi obrigado a demitir-se do cargo, sendo substituído por Dilma Rousseff, a quem Toffoli, imediatamente, solicitou a própria demissão. O fato confirma a estreita ligação entre os dois. Quem disse que gratidão é sempre uma virtude?
Não é de hoje que o STF vem cuidando bem da criminalidade de jatinho. Em fevereiro de 2014, esse Supremo, com voto decisivo do recém-nomeado e gratíssimo ministro Roberto Barroso, decidiu que não houve formação de quadrilha no mensalão. Ela não só houve como jamais interrompeu suas atividades e agora tem tratamento VIP nesse STF que não nega os fatos, mas soluça com os condenados falando em “sanha punitivista”.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
25/06/2018
Você já reparou no quanto a esquerda detesta o Brasil? Observe o mimimi histórico que nos é despejado em salas de aulas e em fake analysis da mídia ideologicamente manipulada: o Brasil explorado, suas riquezas drenadas, “veias abertas” ao longo dos séculos por um colonialismo de péssima origem, que nada de bom produziu e a ninguém dignifica. Bem ao contrário de todos os povos, o brasileiro é ensinado a se constranger de sua história e a repudiar suas raízes. Rotos nossos elos com o passado, o mesmo mimimi se volta para as sujeições internas, para a odiosa burguesia europeia, branca, machista, racista, capitalista e sei lá mais o quê. Tudo construído para que nos vejamos como cachorros vira-latas, uns palermas necessitados da inteligência, sagacidade e discernimento dos “intelectuais” e políticos que disponibilizam esse condensado de desinformação.
Você jamais ouvirá uma só palavra que nos dignifique. Elogiam a latino-americanidade, a pátria grande do Foro de São Paulo e da UNASUL, e vilipendiam nossas origens ibéricas e lusitanas. Nessa infeliz preleção, o pequeno Portugal, cujo território é uma terça parte do Rio Grande do Sul, que foi o primeiro Estado Nacional europeu, torna-se objeto de ressentimento e desprezo. Oculta-se o fato de aquela minúscula nação se haver erguido à liderança mundial nos séculos XV e XVI, assumido a tarefa quase impossível de povoar o continente brasileiro e trazido a civilização ocidental e cristã a esta parte do mundo. Aliás, minimiza-se a própria importância dessa civilização que nos proporcionou idioma, fé e cultura. Até a comemoração dos 500 anos do Descobrimento foi repudiada!
Grandes figuras da nossa história precisam sumir em breves referências que não exaltam sua importância e, menos ainda, os propõem ao reconhecimento e à gratidão nacional: José Bonifácio, Pedro I, Maria Quitéria, Diogo Feijó, Duque de Caxias, Barão de Mauá, Pedro II, Barão do Rio Branco, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa. Eles e tantos outros, em qualquer país que os contasse entre seus filhos, seriam credores de louvor e admiração. No contrapelo, os que viram pelo avesso nossa história oferecem o culto a José Dirceu, José Genoíno, Carlos Marighella, Luís Carlos Prestes...
Por isso, multidões se emocionam com os vídeos do Brasil Paralelo. Eles enfatizam nossa dignidade, nossos méritos, os fundadores da pátria. Sobram-nos razões para o justificado orgulho nacional que todos os povos têm e no qual fundam parte de suas energias. Não somos filhos da macega! Não se trata de ocultar recantos sombrios de nosso passado (qual país não os tem?), mas de fazer o que os demais fazem, valorizando os muitos aspectos positivos para neles cravar raízes e com eles estabelecer nossa identidade nacional.
A conta política da história mal contada se materializa em submissão aos narradores que também se apresentam como redentores da riqueza nacional. Em cinco séculos, apenas os 14 anos de governo petista mereceriam respeito. Tenho ouvido, como sedutor relato contado e aprendido, que o Brasil tem riquezas abundantes das quais e graças às quais todos poderiam viver na fartura. É parte do processo de dominação cultural preservar e reforçar a atitude dependente e subalterna em relação ao Estado, entendido como inesgotável provedor de nossas necessidades comuns e de nossa segurança individual. O Estado precisa ser grande e forte para que à sua sombra possamos viver em meio a muitas estatais, empregos públicos e pressuroso atendimento de todas as demandas sociais. Os sedutores que nos querem dominar se apresentam como portadores desse cardápio de muitos direitos e escassos deveres, a preços de liquidação, embora no delivery só disponibilizem miséria e totalitarismo.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.