Percival Puggina

23/04/2025

 

Percival Puggina

         Entendi perfeitamente o ministro presidente do STF, Luís Roberto Barroso, quando se referiu ao populismo autoritário em videoconferência dirigida a evento brasileiro na Universidade de Harvard. Populismo autoritário, no vocabulário do ministro, é uma síntese elegante para tudo que não presta. O que pensar de ruim se encaixa na moldura, mais ou menos como, de modo rasteiro, o esquerdismo universitário faz com a palavra fascismo e com o adjetivo fascista. Democrático, por outro lado, é tudo que ele aprecia, incluídas as descriminalizações do aborto e do porte de drogas para uso pessoal.

Claro que isso também soa como autoritário quando decidido à margem do Congresso Nacional. Impossível não perceber a manipulação de conceitos em modo discursivo, criando ilusões, como a do grão de ervilha em três cascas de noz. O autoritarismo sempre está onde interessa na hora do discurso. Por isso, quando fala sobre aborto, o ideal democrático correspondente considera a sociedade brasileira ainda despreparada para tratar do assunto... e decide por ela. Decide que feto com três meses está pronto para morrer.  

Imagino, então, que o oposto do populismo autoritário deva ser um elitismo iluminista, civilizador, que decide por todos, visto que o atributo ignorância não pode ter peso numa democracia de excelência (ou seria melhor dizer “de excelências”?).

O que mais me chama a atenção na fala do ministro não é tanto o que diz, mas o silêncio sobre o alinhamento de nosso país com China, Irã, Cuba, Venezuela, Nicarágua, Hamas e com organizações políticas do Foro de São Paulo. Algumas destas últimas chegaram ao poder e se afundaram nas negociatas verde-amarelas da Odebrecht, proporcionadas bem se sabe por quais influências. Será que aos olhos e cuidados proativos da atual composição do STF, esses parceiros não se caracterizam como extremistas nem autoritários, nem populistas? Transitam, então, sob simétrico silêncio, as consequentes rupturas, por desalinhamento, com nossos históricos parceiros do Ocidente civilizado e democrático. Meninos de Harvard, it’s complicated.

O iluminismo elitista nada diz sobre a mácula do descrédito que exceções e excessos causaram às instituições republicanas. Nem sobre a notoriedade mundial a que se alçou a ação política da instituição, por meios próprios, com estupor externo e apreensão interna.

Com a devida vênia, é impossível não comparar a conferência do ministro em Harvard com a história do sujeito que, no confessionário, se jactou de seus pecados.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

18/04/2025

 

Percival Puggina

 

         Há alguns anos, ao sair de uma solenidade de formatura, assumi o irrevogável compromisso de nunca mais comparecer a tais atos. Aquelas horas de consternação e aborrecimento haviam esgotado minha paciência. Cada formando que cruzou o palco do Salão de Atos tinha uma lição a dar à plateia sobre o “estado das coisas” no Brasil e no mundo. Como quem escolhe itens de um cardápio, despejavam clichês e inutilidades avulsas sobre desigualdade, diversidade, discriminação, inclusão, opressão, meio ambiente, dominação cultural, mal costurada história universal etc. Ficassem a nação e o planeta advertidos de que eles, elas e elus estavam chegando!

Na sequência, falou o paraninfo. Se ninguém é profeta na própria terra, aquele senhor, consagrado pela moçada, de corpo presente, no palco dos acontecimentos, driblou o preceito. Seu discurso derrubou cercas, muros e muralhas. Como ante um Vesúvio em chamas, tudo veio abaixo para ele se erguer vitorioso sobre... sobre o quê, mesmo? Dedo em riste, atacou como um patético Procurador de Justiça do Juízo Final. Observei silenciosos sinais de discordância da plateia, certamente ocupada numa avaliação de perdas e danos causados por quatro anos de tais doutrinações sobre seus pimpolhos. Tarde demais.

O pior, porém, ainda estava por vir. Ergueu-se o diretor da faculdade. Limpou a garganta com um gole de água e começou outro falatório de teor semelhante, com esta inesquecível declaração: “O ‘coletivo’ da faculdade subscreve integralmente as palavras proferidas pelo professor paraninfo”. Bah! Aquele não era um ato acadêmico de conclusão de curso superior, mas a celebração da morte das individualidades, do pluralismo sem o qual não há o que dizer sobre diversidade. O coletivo cumprira sua missão! Ao mesmo tempo, estava ali o grito de guerra da intolerância e do cancelamento de toda divergência.

Em crônica de 1970, Gustavo Corção conta o diálogo sobre a burrice moderna que entreteve com um amigo que lhe disse, em telefonema: “A burrice não é novidade, é antiquíssima. Garanto-lhe que ao lado do artista genial que pintava touros nas cavernas de Espanha, anunciando há quarenta mil anos a brava raça de toureiros, havia dois ou três idiotas a acharem mal feita a pintura”. Laconicamente, Corção apontou a diferença: - “Mas calavam-se!”.

Sim, os burros de antigamente se calavam. Já a burrice moderna é vistosa e arrogante. Dou razão ao leitor que, outro dia, me observou ter ela deixado de ser atributo de uso pessoal e se disseminado. O mecanismo de disseminação é o moedor de cérebros, cujas consequências testemunhei naquela assustadora solenidade acadêmica porto-alegrense.

Há quem diga ser ilegal a iniciativa do governo Trump de cortar a destinação de recursos públicos para instituições universitárias privadas dos Estados Unidos que se transformaram em “coletivos” esquerdistas. Não sei se as medidas são ilegais ou não. Sei é que não deve ser legal impor verdadeiro apartheid mediante políticas de cancelamento da divergência, nem usar o espaço acadêmico como comitês eleitorais de candidatos de esquerda. Nesses espaços e instituições que recebem verbas públicas, menos legal ainda há de ser a formação de núcleos antissemitas, pró terroristas e de animosidade contra os Estados Unidos – gigantescos cavalos de Troia da revolução cultural. Saudades do Olavo de Carvalho!

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

13/04/2025

 

Percival Puggina

 

           Na narrativa que construiu e o Consórcio Goebbels de imprensa acolheu como revelação divina, o Supremo redige os eventos dos últimos anos como se estivesse tão equidistante do jogo político quanto deveria efetivamente estar. Descreve “o cenário mais amplo” como se não fosse intensa e reconhecida por todos os jornalistas do país sua atividade no palco dos acontecimentos! Aliás, quando seus membros não querem falar por si mesmos, há profissionais da imprensa, selecionados a dedo, que se prestam à função de meninos e meninas de recados nunca desmentidos. De resto, são os ministros, eles mesmos, que reconhecem tais atividades quando, ante públicos seletos, querem destacar seu protagonismo. Foi o ministro Barroso quem melhor explicitou o vulto dessa atuação ao sublinhar à “vertiginosa ascensão política do STF”.  

Dão prova disso as múltiplas interferências do Supremo em decisões do governo Bolsonaro, a natureza política de tantas manifestações espontâneas dos ministros, a animosidade crescente, o enviesamento ideológico da Corte, que bem antes de 2021 já ganhara o nome de ativismo judicial.  Também marcam presença do Supremo num palco de operações integral, não recortado nem híbrido: o antagonismo em relação aos conservadores, as práticas “contramajoritárias”, a censura, as multas, as ameaças e prisões, os bloqueios de canais, as desmonetizações, o combate às redes sociais e os múltiplos ataques à liberdade de expressão. Há todo um pacote de anomalias políticas que vêm sendo normalizadas pela prática continuada, com irrestrito apoio da base do governo e do Consórcio Goebbels com seus paninhos.

Ao abrir a porta para a atividade política, o Supremo importou, sem tarifa nem abatimento, certas consequências que lhe eram alheias. Por metáfora, se pode explicar a situação dizendo que, nesse jogo da política, as chuteiras têm travas e todo mundo tem canela e a consequência, também metaforicamente, vem sendo chamada de crise institucional. Eis por que é de bons modos e boas práticas ser intransponível a distância entre o apito e a chuteira. Quem apita não chuta.

O Congresso Nacional é o coração político do país, não o Supremo, não o Palácio do Planalto. O parlamento é o poder efetivamente representativo do povo brasileiro – este sim, fonte de onde “emana todo poder”, mediante a representação parlamentar que elege. A submissão do Congresso acorrenta e algema a democracia. Festeje-se, então, ter sido ultrapassado com folga, em poucos dias, o número de assinaturas (257) necessárias para impor às instáveis convicções do presidente Hugo Motta que submeta ao plenário o PL da Anistia.

Se quem sabe faz a hora, como cantou Vandré, ponderem os deputados e senadores: ou assumem as rédeas da política ou continuarão, por muitos anos, servindo de montaria a um poder sem votos. Ou aceitam a doma ou corcoveiam e restauram a representação que lhes corresponde.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

 

 

Percival Puggina

09/04/2025

 

Percival Puggina

         Falando à Associação Comercial de São Paulo, Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, mencionou o PL da Anistia e sublinhou a necessidade de “na solução desse problema, que é sensível, que é justo, nós não aumentarmos a crise institucional que já estamos vivendo”. O pior sobre essa frase é ter sido proferida sem causar escândalo, sem arrancar murmúrios da plateia nem indagações dos repórteres.

Infeliz passo a passo nos trouxe até este momento histórico, quando ouvimos de alguém com tamanha responsabilidade e poder que a Câmara dos Deputados agravará uma crise institucional se aprovar lei em matéria de sua exclusiva competência! Que estado de direito é esse, cujo Poder Legislativo pisa em ovos para que as instituições não desabem, para que “a crise não se agrave”? Quando foi que o Direito do país ficou como o direito do anzol, torto para capturar os peixes de cada temporada?

Uma dúzia de anistias foram concedidas desde o período do povoamento até a proclamação da República. Elas ocorreram em todas as etapas de nossa história, tanto com o Brasil na condição de estado ultramarino português, quanto durante o vice-reinado e no Reino Unido. Com a Independência, o instituto da anistia ganhou hierarquia constitucional sendo usado com frequência após movimentos separatistas ou revolucionários. Essa tradição se prolonga no período republicano, com pelo menos uma dezena de anistias sendo concedidas em momentos de fracassos da política e apelos à violência. Anistias nunca deram causa a “agravamento de crises”! Ao contrário, foram conquistadas para a paz e se firmaram como instrumentos eficazes de pacificação, com cada macaco no seu galho. Anistia é instrumento da Política e não da Justiça!

Em artigo para Zero Hora de 7 de abril de 2014, o ministro aposentado do STF, Paulo Brossard, escreveu que “a anistia é de aplicação instantânea e imperativa, independente de quererem ou não seus destinatários”. Noutro ponto, acrescentou o saudoso rio-grandense que “ela não se funda na Justiça, mas na temperança, no esquecimento, e particularmente na paz que a juízo da lei se faça aconselhável”. A lei, como convém saber, é produto do poder político, do Congresso Nacional, no caso.

Salta aos olhos, portanto, que uma situação institucional somente se agravará, com a aprovação de uma lei de anistia, se essa situação já for absolutamente anômala, desarmônica, de exceção e não estável. Quando se ergueu por meios próprios ao protagonismo político, a atual composição do STF entortou o anzol e passou a usar o Direito como instrumento da Política. E essa política não é a da direita nem é a do centrão, se me faço entender. Seus porta-vozes no Consórcio Goebbels festejam a existência de pelo menos três desses instrumentos casuístas, já estudados para “revogar a anistia” ... São verdadeiros anzóis, para caprichosa escolha do mais adequado a capturar esse peixe quando descer as corredeiras do Legislativo e chegar ao STF, que jamais deveria se imiscuir em atos soberanos eminentemente políticos e notavelmente constitucionais.

Talvez convenha que os presidentes das duas casas do Congresso meditem sobre estes versos de Edmond Rostand em Cyrano de Bergerac:

Na esperança de ver nos lábios dum ministro
sorriso que não tenha uns longes de sinistro?
Almoçar cada dia um sapo — e não ter nojo?
Gastar o próprio ventre a caminhar de bojo?
Trazer os joelhos encardidos?
Exercitar a espinha em todos os sentidos?
Não, muito obrigado!

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

06/04/2025

 

Percival Puggina

 

         Existem venenos que funcionam como remédios e remédios que são verdadeiros venenos, liberando toxinas e causando danos ao organismo. Fenômeno semelhante acontece em certas receitas aplicadas a enfermidades sociais por mãos imperitas. Acabam produzindo efeito oposto ao pretendido.

O programa Pé-de-Meia foi criado pelo governo federal com o intuito de reduzir a evasão escolar. No entanto, nem Paulo Freire pensaria em algo tão pouco razoável quanto remunerar estudantes pela frequência às aulas! Esses R$ 12 bilhões/ano em recursos da sociedade seriam muito mais bem aplicados se investidos em uma verdadeira reforma do ensino, em qualificação dos professores e, principalmente, em conscientização dos estudantes sobre os benefícios que colherão de sua dedicação ao estudo e às tarefas escolares.

Com a atual posição dos nossos estudantes no ranking internacional do PISA (Matemática: 65º lugar, Leitura: 52º lugar, Ciências: 62º), o futuro é desalentador. Perguntou-me um jovem, hoje: “Por que a Educação que meu avô recebeu foi tão superior à minha?”. Realmente, a Educação se universalizou e a qualidade se diluiu, por vários motivos. Acredito que o principal tenha sido a propagação de conceitos pedagógicos freirianos, muito úteis a um projeto político esquerdista cujas consequências foram e continuam sendo funestas. Por que seria diferente com a Educação que viabilizou a ascensão dessas ideias ao poder, se é ali que “estão as mentes e os corações”, como bem observou José Dirceu?  

A nação precisa saber que, salvo as sempre valiosas exceções, custeia uma Educação que a condena a um desenvolvimento social, econômico e cultural inferior à média mundial. Não surpreende, portanto, o paradoxo pelo qual a pedagogia dominante no país visa à “conscientização” de supostos oprimidos e opressores, mas não conscientiza princípios e valores, não desenvolve no estudante a percepção de que ele tem uma vida por viver e de que a qualidade de seu futuro dependerá das competências que sua dedicação ao estudo produzir. A falta dessa compreensão gera ambientes escolares desinteressados e indisciplinados, avessos ao processo de aprendizagem.

A Constituição Federal diz, em seu artigo 205, que “A Educação é um direito de todos, dever do Estado e das famílias”, mas é um preceito escasso. Ele transmite ao estudante a ideia de que “os outros” – Estado, sociedade, professores, pais – têm o dever de o educar e não diz que, em contrapartida, todos têm a obrigação de levar a sério seus estudos. Em outras palavras, como lembra Stephen Kanitz, todos têm o dever de “se educar”. O desperdício das oportunidades que a escola deve proporcionar acumula um preço altíssimo ao longo da vida!

Uma avó me transmitiu um retrato desse “Pé-de-meia” furado que Lula inventou como mais uma forma de trocar dinheiro por voto. Disse-lhe o neto adolescente: “Vó, como para mim não vem dinheiro algum, então posso faltar às aulas”. É óbvio: se o governo remunera milhões de alunos que vão à aula, quem não recebe pagamento passa a se considerar um estudante explorado, constrangido a ir “de graça” para as chatices da escola!

A burrice também é um direito de todos e parece ser, cada vez mais, um dever do Estado.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

29/03/2025

 

Percival Puggina

             Há mais de dois anos, todo brasileiro sensato critica, em vão, o fato de os presos do dia 8 de janeiro, arrebanhados, embarcados e levados à prisão, viverem em total desproteção de seus direitos, como se estivessem num campo de concentração. Aos poucos, os escalados para um julgamento sem volta, vão do ruim para o pior, condenados a penas exorbitantes. Na sarjeta da cidadania, enquanto correm os dias, o coro dos imorais, entre risos macabros, grita “Sem anistia!”. Quem tempos, Brasil! Que tempos!

Qualquer cidadão que tenha um palmo de papel para publicar, um espaço para opinar, três minutos para falar, já falou, já escreveu, já condenou o vandalismo, á publicou sua irresignação e sua solidariedade com as vítimas de tais suplícios. Para estes cidadãos, que sofrem com a injustiça praticada contra qualquer ser humano, Débora Rodrigues dos Santos se tornou símbolo de tantos casos semelhantes.

Sob aplausos do Consórcio Goebbels, quando tudo caminhava para consumação da brutalidade contra ela, a irresignação do ministro Luiz Fux e de muitos bons juristas, os vídeos do Dr. Augusto Cury e da própria Débora fizeram crescer o clamor da opinião pública.

Unhas crispadas e risos sardônicos ficaram visíveis. Uma encrenca para o reflexo dos Narcisos nas águas da História! Era tempo de refluir. Então, assim – só então e só assim! –, quando uma semana trágica chegava ao fim, a PGR recomendou a concessão de prisão domiciliar para Débora dos Santos. Pouco depois, em sincronismo, o Supremo lhe concedeu o que deveria ter concedido há dois anos e a restituiu, temporariamente, ao marido e aos filhos, com tornozeleira e boca calada para não ampliar o enorme constrangimento gerado pela exposição pública do caso.

Imaginem o que teria acontecido se apenas ao Consórcio Goebbels fosse dada a liberdade de opinar!

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

24/03/2025

 

Percival Puggina

              A narrativa envelheceu. Capenga, aguarda aposentadoria por falta de condições de prosseguir prestando serviços. Não vai para o exílio, mas para o asilo das estórias mal contadas. Em seu caminho, foi desacreditando as instituições e promovendo uma semeadura de indignações tão intensas que descrédito e indignação são, hoje, os dois sentimentos mais reais entre milhões de brasileiros em relação ao que acontece no Brasil.

Não tenho como saber de quantos milhões estou falando porque no grande total estão os anestesiados pela miséria, estão os drogados pelo conta-gotas do assistencialismo prestado pelo Estado, estão os dopados por overdoses de verbas públicas, estão os omissos com folha corrida, estão os subjugados pelo medo e estão os sabujos de toda tirania.

Ainda assim, são muitos os capazes de fazer como a criança do conto de Andersen e gritar não apenas que o rei está nu, mas proclamar a nudez da maior parte da corte republicana no entorno da Praça dos Três Poderes. Ao longo dos últimos anos foram tantas as artes, os malfeitos, os abusos, as omissões, as mágicas mal executadas, as narrativas arriadas no acostamento dos fatos, que as “vergonhas” ficaram expostas a quem transita no quadrilátero da praça.

Se Débora, a jovem senhora que pichou a estátua, se tornou um exemplo da estupidez a que chega a mão do Estado quando escapa ao controle da sociedade, seja por ação, seja em igual grau por omissão, é importante lembrar que ela é apenas uma dentre muitas centenas de brasileiros vitimados por decisões teratológicas, para dizer como os falantes de jurisdiquês.  

Escrevo este pequeno texto no dia 24 de março e, amanhã, o STF decide se aceita ou não a denúncia encaminhada pela PGR. Se há uma coisa sabida e consabida neste país é que a máquina do poder não esconde sua animosidade contra a oposição. É como se ela fosse um ente político ridículo, pois aferrada a conceitos superados sobre liberdade, democracia, contagem pública de votos e a cláusulas constitucionais pétreas que, sabidamente, foram feitas para proteger a esquerda e os criminosos reais que infernizam a população. Chega a ser revoltante a pretensão de ter abrigo sob tais preceitos e garantias não sendo de esquerda; isso seria esbulho e apropriação indébita.

Em completa nudez, a corte devolve dinheiro a ladrão, helicóptero a traficante, mandato a quem não recebeu indulto e suas comissões de ética perdoam rachadinhas, mas seus opositores são condenados a duras penas por acusações que precisam da muleta e perna de pau da narrativa velha, capenga e reumática para não desabar sobre o chão.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

23/03/2025

 

Percival Puggina

                 A eleição de Bolsonaro em 2018 surpreendeu os “estrategistas” da política e da justiça. Como alguém com aquele perfil, sem tempo de TV, de partido nanico e sem dinheiro, poderia se eleger presidente, derrotando as oligarquias políticas tradicionais do país? Como obteve ele esse resultado com um discurso conservador, falando em Deus, Pátria, Família e Liberdade?

Neste artigo, pretendo rolar o calendário político desde 18 de fevereiro de 2016. Naquele dia, sete dos onze ministros do STF decidiram criar nova jurisprudência, permitindo que réus condenados por órgão colegiado, em grau de recurso (segunda instância), pudessem ser recolhidos para cumprimento de penas privativas de liberdade. Foi quando a Lava Jato viveu um surto de produtividade, atendendo, em fila de confessionário, os pecados próprios e alheios dos penitentes, acompanhados de vultosas restituições de dinheiro roubado. Aquela importante e aguardada decisão – prisão após condenação em segunda instância, que mais tarde valeria contra Lula – foi aprovada com votos de quatro ministros indicados por Dilma (Teori, Fachin, Barroso e Fux), dois ministros indicados por Lula (Cármen Lúcia e Toffoli) e um indicado por FHC (Gilmar).

No dia 31 de agosto daquele mesmo ano (2016), após três meses de tramitações e numerosas manifestações populares, o Senado Federal aprovou o impeachment de Dilma Rousseff. Tão logo Michel Temer assumiu a presidência, iniciaram as especulações e tratativas sobre a futura eleição presidencial. Em dezembro (2016), as intenções de voto mostravam Lula com 28%, Marina com 17%, Alckmin e Jair com 8% cada um. 

Em 12 de julho de 2017, o juiz Sérgio Moro condenou Lula a 9 anos e 6 meses de reclusão por crime de corrupção no caso do triplex de Guarujá. Em novembro, pesquisa Datafolha atribuía a Lula 37% das intenções de voto, 18% a Jair, 8% a Alckmin, 7% a Ciro.

Em março, já correndo o ano eleitoral, números levantados por CNT/MDA mostravam Lula 33%, Jair 17%, Marina 8%, Alckmin 6%. No início de abril, o TRF 4 confirmou a condenação de Lula pelo caso do triplex e ele foi preso no dia 7. Não obstante, ao longo do ano, as pesquisas continuavam mostrando Lula como candidato. No dia 26 de julho, os partidos do centrão (PSDB, DEM, PP, PRB, PR e Solidariedade), numa tentativa de restaurar o teatro das tesouras, oficializaram apoio a Alckmin.

Em 15 de agosto, a PGR impugnou a candidatura de Lula. Cabia ao TSE acolher ou não. No entanto, ainda em agosto, uma pesquisa Datafolha atribuía a Lula 39%, Jair 19%, Marina 8%, Alckmin 6% e Ciro 5%. Em 1º de setembro, um mês antes da eleição, o TSE confirmou a impugnação e Fernando Haddad foi ungido candidato do PT. Uma semana antes da eleição, pesquisa contratada pela TV Globo e Folha de São Paulo mostrava, no primeiro turno, Jair vencendo Haddad por 28% a 22%, mas ... perdendo no segundo turno para Haddad, Alckmin e Ciro.

Foi ali, na mesa do segundo turno da eleição de 2018, entre os dias 8 e 29 de outubro, que a democracia e a liberdade do povo brasileiro subiram no telhado. Foi por seu papel decisivo naquele pleito, mais do que em virtude da COVID, que as redes sociais entraram na UTI e começaram a viver por aparelhos estatais controladores de seus conteúdos e seus visitantes. Contra as malditas redes sociais, antes das quais os donos do poder “eram felizes e não sabiam”, e contra seus usuários, todos os meios se tornaram válidos, inclusive os constitucionalmente proibidos.

Na derrota para Bolsonaro em 28 de outubro de 2018, foram traçados os planos que tirariam Lula da cadeia e o levariam pela mão, passo a passo, ao exercício dessa presidência grotesca, vivida longe do povo. Difícil imaginar que tudo tenha sido uma sequência indesejada de decisões inevitáveis.

Quatro anos depois, na posse de Lula, os que se disseram contramajoritários durante o governo conservador, se tornaram contraminoritários! Paradoxal, não? Para conter a oposição supostamente minoritária, posto que derrotada, os garantistas de ontem tratam, também, de acabar com garantias constitucionais. Profética, a estátua de Themis, em Brasília, não usa a balança da Justiça; carrega apenas espada e corta para um lado só.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

17/03/2025

 

Percival Puggina

         O perigo voltou, de novo. Voltou de Cuba em 1971, mas voltou à ilha para cirurgias plásticas que alteraram sua fisionomia. Voltou ao Brasil em 1975, quando se instalou como comerciante no interior do Paraná. Nem a mulher sabia sua verdadeira identidade. Voltou à política, anistiado, em 1979. Participou da fundação do PT, acumulou mandatos e posições partidárias até ser preso, em 2013, por crimes no escândalo do Mensalão. Acumulou sentenças condenatórias, prisões e solturas até o ministro Gilmar Mendes anular suas condenações na Lava Jato em 2024. Volta agora à política, ficha "limpa", e pode disputar a eleição que quiser. Meu Deus, eu já vi esse filme!

Na semana passada, esse retorno marcou a festa de seu 78º aniversário. A comemoração, quase poderia dizer sagração, atraiu uma lista de personalidades suficiente para destruir o Brasil três vezes.

Em Cuba, onde viveu de 1969 a 1971, pode-se dizer que fez seu “pós” nas habilidades de um agente treinado para atuar no Brasil. Agora, retoma lugar no lado esquerdo do tabuleiro político nacional.

Em certo momento do discurso que fez, atacou a aliança entre Bolsonaro e o governo Trump, mas afirmou, logo em seguida, que não existe mais eleição nacional, pois todas acabam sendo globalizadas. Temos aí a velha estratégia: globalização pela direita é feia, coisa de Trump, Elon Musk e Bolsonaro; pela esquerda, é linda, fofa, coisa de gente da melhor qualidade, como a turminha do Lula mundo afora, Joe Biden incluído.. A questão, contudo, vai bem além do duplipensar esquerdista.

Pense na eleição de 2018. Em um dos melhores momentos da economia mundial, seus governos haviam quebrado o motor de um país que rodava bem. O PT morava no fundo do poço do descrédito. É muito difícil fazer campanha eleitoral do fundo de um poço, pois a mensagem não se propaga.  Em vista disso e de muito mais, perdeu a eleição. Aos empurrões na História, voltou ao poder em 2022 e, passados apenas dois anos já mostra que o fundo do poço fica um pouco mais abaixo. O governo é um navio fantasma. A imagem também cabe: uma tripulação que perdeu a confiança, passageiros e roedores abandonando o barco. Pelas próprias forças, fica à deriva e não vai a lugar algum.

Se o petismo olha o exterior pedindo forças para uma campanha globalizada, a oposição olha o exterior pedindo socorro porque hoje, para ela, no jacobinismo instalado no país, não há Justiça nem Direito no Brasil, só maus tratos, interdição e punição.

A eleição de 2026, contudo, não será globalizada. A esquerda no poder não importará aquela ruinosa parceria que em 2022 sequer podia ser mencionada! Há de ser uma disputa política entre brasileiros, como deve ser, cada um com seu passado. Oposição versus governo. Os abusos e interdições de 2022 não se reproduzirão. Para que a Liberdade e o bom Direito renasçam das cinzas, o Terror jacobino não prevalecerá. A tanto nos ajude o Senhor da História!

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.