Que coisa, não? Quando você pensava que teríamos um parlamento de qualidade superior, graças à ampla renovação que a sociedade, responsavelmente, se encarregou de promover, nos deparamos com as mesmas velhas práticas. Recomeçou o corpo mole à espera do dá cá para o toma lá.
Estará o Congresso Nacional infectado por uma contaminação resistente à faxina, que permanece no ambiente alterando condutas, transformando discursos de campanha em papel picado? Não é isso, não. Não é bactéria. O Congresso que temos é o que podemos ter com o modelo que escolhemos para nossas instituições políticas.
Repetidas vezes tenho dito e escrito que, diferentemente dos demais jogos, em que a regra determina apenas o modo de jogar, quando se trata do “jogo” da política a regra também determina quem joga. Sob certas regras jogam uns, sob regras diferentes, jogam outros. Uma das consequências mais funestas de um regramento impróprio, pouco ou nada racional, é o mau recrutamento de lideranças pelos partidos e o sumiço dos estadistas de que o Brasil tanto carece. Assim como um mau sistema de ensino sepulta talentos em seu nascedouro, instituições mal concebidas são cemitério de potenciais estadistas. As exceções rareiam.
Observe, leitor, a recente decisão da Câmara dos Deputados instalando o orçamento impositivo. Foi uma péssima decisão para o Brasil, tomada com fundamentos teóricos corretos. Votar o Orçamento é função essencial das casas legislativas. Elas nasceram para autorizar e fiscalizar o gasto público. O Orçamento, portanto, não pode ser mera sugestão de um poder aos outros dois, do Legislativo ao Executivo e ao Judiciário. Os parlamentares não o encaminham aos demais poderes acompanhado de uma cartinha dizendo: “Olha pessoal, é isso aí, ou algo parecido com isso aí”. Não, o Orçamento deveria, mesmo, ser impositivo.
Só que não. Só que no nosso presidencialismo, com o recrutamento de lideranças proporcionado pelo sistema eleitoral e de governo que adotamos, retirar do Executivo, em meio a uma assustadora crise fiscal, seu poder de manobrar o gasto público conforme as imposições da realidade é uma imprudência grave. É carrinho por trás com o pé levantado.
Não se pode importar ao presidencialismo, acriticamente, práticas virtuosas do parlamentarismo. Na transposição, elas podem se tornar viciosas. No parlamentarismo, governo e maioria parlamentar são a mesma coisa. Há sintonia entre ambos. Votar, a maioria, contra o governo é dar tranco em si mesma. Governos caem quando isso acontece. Em casos de instabilidade política, novas eleições para o Legislativo podem ser convocadas (e isso ninguém quer). Por essa razão e por muitas outras, o parlamentarismo é um sistema superior. No entanto e por enquanto nosso sistema é essa joça aí. Nele, maiorias eventuais – eventuais! – podem barrar o governo sem que nada altere o dia a dia do Congresso. As contas dos desacertos, das reformas não feitas, dos gastos inoportunos e das instabilidades são ônus do povo.
* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
João Carlos Biagini - 04/04/2019 14:05:40
Caros Percival e leitores, O Percival situou perfeitamente que o "ônus é do povo." No entanto, a imprensa publica que a Câmara derrotou Bolsonaro, que Bolsonaro venceu no Senado e outras notas nesse sentido. Engraçado, também, quando dizem que o "Planalto falou". Não há um responsável pelo assunto. Outra nota, frequente, é que alguém entrará com ação contra o Estado (que somos nós mesmos). Acho que poderíamos fazer uma campanha, interminável, para esclarecer que as idas e vindas do Congresso, da Presidência, dos órgãos são derrotas são prejuízos prejuízos para o povo, que entrar com ação contra o Estado é ajuizar ação contra si mesmo e que precisamos indicar e responsabilizar a autoridade que falou. Abs.elcio emilio affonso - 01/04/2019 15:31:36
Minha opiniao um bom corredor polones nesses canalhas.José Nei de Lima - 01/04/2019 14:10:29
Bom dia meu querido amigo, parece o filme que aconteceu há quatros anos atrás, é uma pena às grandes mudanças que o Povo Brasileiro acreditava, ótima matéria, não houve mudanças necessárias principalmente no setor do crescimento, que foi muito cobrado de governos anteriores, o que as duas casas legislativas precisam ter objetivo de uma nação e não fazer carreira profissional da Política, meus parabéns, acorda Senadores e Deputados, chega do toma lá e da cada, valeu. Ótima início de semana meu amigo que Deus vos abençoe amém.Josimar - 01/04/2019 00:55:47
Referente aos problemas da política brasileira Solução Presidente Partido Federalista https://youtu.be/uo8Z4cnDyZA Brasil:ISSO RESOLVE FE - Federalista | Autonomia é o Caminho. www.federalista.org.br Cada estado com suas leis Frase Federalista: Mais Brasil e menos Brasilia? COMPARTILHE.. Modelo Federalista onde já funciona: Estados Unidos,Canadá, Austrália, Alemanha, Suíça Impostos: 60% para o Município 30% para o Estado 10% para o Governo FederalTereza Thompson - 30/03/2019 23:29:48
Sem surpresa Professor Percival Puggina?, o fenomeno da indole corrupta ataca todos aqueles que conseguem alavancar um cargo politico sem nenhuma bagagem moral e o que se ve no Congresso e apenas a constatacao disso so que em doses vergonhosas. Alguns ate que tem boa intencao e boa indole mas chegando ali ve a luta ferrenha para conseguir uma otima propina, comeca tambem a fazer corpo mole e dai essa indecencia que vemos que da para contar nos dedos das maos aqueles que conservam a sua moral e nao aceitam ser cooptados.Cesar Gavillon - 30/03/2019 22:55:17
Para que o parlamentarismo seja um sistema melhor do que o atual é preciso termos o voto distrital.Roberto - 30/03/2019 22:18:22
Porque quase todos os deputados do partido do presidente votaram a favor da proposta ?Odilon Rocha - 30/03/2019 14:53:10
Caro Professor Não é bactéria, concordo. Mas é quase isso. Salvo umas poucas exceções, a grande maioria do plantel à disposição dos eleitores representa muito bem, ainda, a média comportamental brasileira. Depois de eleito, prato feito. Há que se ter um patriotismo, desprendimento e consciência nacional muito acima da média, e dos interesses pessoais, para tomar o antibiótico Parlamentarismo. Creio que tão cedo isso não aconteça. Só o nome do remédio já causa arrepios!Irineu Berestinas - 29/03/2019 20:08:17
Brilhante o artigo. Sugiro que em seus comentários, meu caro Puggina, acrescente as funções que o presidente da República deveria ter, a meu ver: Chefe de Estado e guardião dos assuntos republicanos. Dia desses públiquei em minha fanpage um texto síntese sobre essa que, que tomo a liberdade de inserir: Este País só tem um jeito (lúcido e esclarecido): Parlamentarismo, voto distrital puro e limites para os gastos públicos... fora daí é só sabotagem e circo de gente enciumada e dos venezuelanos... No parlamentarismo, o parlamento teria que ajudar o governo a dar certo, porque, do contrário, haveria eleições gerais. É assim que funciona em muitos países do mundo ocidental. O Senado da República seria apenas o guardião dos interesses federativos, reduzindo-se a 1 senador por estado. Já o Presidente da República seria chefe de estado e teria a chave do cofre sobre assuntos republicanos.Célio - 29/03/2019 17:51:13
O que me preocupa num sistema parlamentar é como faríamos para destituir o presidente num congresso oportunista como o nosso? Todos sabemos que os parlamentares da base alugada nos governos petistas eram os verdadeiros beneficiários do status quo. Desta forma, o interesse deles em destituir o governo era menor que zero, resultando num governo tirano sem qq possibilidade de renovação.