Percival Puggina

27/08/2018

 

Como entender esse sentimento de inferioridade, de desapreço em relação a nós mesmos, sendo herdeiros de uma história e de uma cultura tão ricas? Qual a causa desse rastejar em culpas e remorsos, como se ser brasileiro equivalesse a viver num estuário de vilanias e maldições?

A visão negativa a que me refiro iniciou com a propaganda republicana. No entanto, nada fez tanto estrago à nação quanto o discurso esquerdista ao suscitar conflitos sem os quais sua ação política entra em coma.

É como se a história do Brasil fosse uma reportagem de horrores que começa com genocídio indígena e escravidão. A partir disso não tem mais cura nem conserto. Ora, qual país não registra páginas escuras em seus anais? Qual não viveu ou criou situações assim? Não conheço outro, contudo, que as traga de modo permanente à luz para repudiar suas origens desde o Descobrimento, injuriar a identidade nacional e desprezar a própria dignidade. Desconheço estupidez análoga em outro lugar planeta!

São ideias difundidas por supostos estudiosos dos temas nacionais que se aborrecem com o fato de nosso povoamento haver transcorrido no período histórico correspondente ao absolutismo monárquico. Deprime-os a maldição de que o mercantilismo fosse o sistema econômico então vigente. Incomoda-os saber que no século XVI foi levado o último toco de pau-brasil, sem o qual fomos obrigados a sobreviver até hoje. Atribuem nossas dificuldades financeiras ao ouro arrancado de nossas entranhas (uma exploração privada, sobre a qual a Coroa cobrava 20% de imposto) e que gerou desenvolvimento econômico e social em Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

De fato, a Coroa portuguesa entre os séculos XVI e XIX não regia uma economia de livre mercado, não era uma monarquia constitucional, nem uma “democracia popular”, nem era “politicamente correta”! Ora pombas, que coisa mais anacrônica!

Prefiro outro modo de ver a história. Prefiro valorizar a riqueza cultural de que somos herdeiros, enriquecida pelo aporte das varias etnias que aqui se agregaram. Nessa herança, valorizo o idioma que falamos. Ele resulta de laboriosa construção no tempo e lança raízes na Península Ibérica desde que, vitorioso na 3ª Guerra Púnica, o Império Romano conquistou a região e criou a província Lusitânia. Não fosse isso, falaríamos o idioma púnico de Cartago, ou o germânico dos suevos, ou o gótico dos visigodos. A história do nosso belo idioma também é nossa e tem tudo a ver com a cultura e a identidade nacional.

A religião é parte integrante da cultura dos povos em todas as civilizações. Não há povo sem religião. Parte valiosa de nossa identidade, então, está fornecida pelo cristianismo aqui aportado de múltiplas formas pelos nossos povoadores. É igualmente longo, procede de Roma e vive momentos decisivos na Ibéria do século VI, o processo de conversão daqueles povos ao cristianismo. Também é nossa essa história.

 A ideologia do conflito, revolucionária, precisa destruir a base cultural das sociedades ocidentais cristãs. Tanto quanto Marx viu a religião como ópio do povo, seus seguidores percebem que precisam destruir a cultura do Ocidente. Para isso trabalhou a Escola de Frankfurt e para isso opera parcela expressiva do mundo acadêmico brasileiro.

Como parte dessa estratégia perversa, enquanto outros povos se orgulham de sua nacionalidade, cultuam seus grandes vultos, enfeitam suas cidades com monumentos que os exibem à memória e reverência de sucessivas gerações, aqui eles são escondidos. Quantos monumentos a Bonifácio? Frei Caneca? Nabuco? D. Pedro II? Isabel? Mauá? Rio Branco? Caxias? Patrocínio? Rui? Quantos estudantes brasileiros conseguiriam escrever cinco linhas sobre qualquer deles?

Se não vemos dignidade em nossa história, dificilmente a veremos em nós e muito mais dificilmente a veremos nos outros. Seremos grotescos pichadores de nós mesmos. Tenho orgulho das minhas raízes como brasileiro. É a política do tempo presente que me constrange.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.


 

Percival Puggina

27/08/2018

 

 A esquerda, cuja fidelidade aos seus sofismas é levada ao limite da serventia, tem aproveitado a expressiva riqueza dos candidatos Amoedo e Meirelles para pilotar o megafone da luta de classes. Há mais de um século, combatendo a economia de empresa e o capitalismo, sustenta que se alguém enriqueceu é porque muitos empobreceram e que tal situação só pode ser superada com a rebelião dos trabalhadores para um governo de operários. Trata-se de sofisma vulgar, de colossal ignorância sobre Economia, de ainda mais grave incapacidade de aprender dos fatos e da história, e de chocante hipocrisia. Até países que afogaram sua população em sangue para implantar o comunismo já aprenderam que as coisas não são assim. Por aqui, no entanto, esse miserável arsenal retórico é usado para influenciar parcelas da opinião pública.
A ideia de que há um nível básico e que se alguém criar para si um montinho, alguém ficará com um buraquinho, é de uma sandice inigualável. Como bem ensina o exemplo cubano, em tal regime as galinhas deixam de pôr ovos e as vacas não dão mais leite. Falta até sabão porque, sob comando do Estado, sequer atividades industriais sofisticadas como a produção de sebo e sabão conseguem atender o mercado. Na vida real, a miséria só começa a diminuir  (leia mais em  https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/candidatos-ricos-e-candidatos-pobres-45khtyeqlb4tzmsp9xqubfobd

* Artigo exclusivo para a Gazeta do Povo

Percival Puggina

24/08/2018



 Observe a conduta de muitos dos principais meios de comunicação brasileiros, seus editoriais e mais badalados comentaristas. Não precisará muito tempo para concordar com esta afirmação: eles decidiram que o problema do Brasil não são os corruptos, nem é a esquerda retrógrada, nem a irracionalidade do modelo institucional, nem a irresponsabilidade fiscal dos parlamentos, nem a instabilidade criada pelo STF. O que tem que ser combatido no Brasil é o conservadorismo. Não lhe deve ser concedido direito de representação e precisa ser alvejado até que não reste em pé um só desses idiotas para que suas pautas não ganhem força institucional.

Ampla maioria da população crê em Deus e reconhece a importância da religião e da instituição familiar. É contra a ideologia de gênero e quer proteger as crianças dos abusadores que pretendem confundir sua sexualidade. É contra o aborto, o desarmamento e a liberação das drogas. Quer segurança e bandidos na cadeia. Repudia o feminismo como pauta política, movimento revolucionário, ou fundamento de uma nova moral. Não admite a transformação da sala de aula em oficina onde o professor opera como torneiro de cabeças. Rejeita o deliberado acirramento de conflitos que se tenta impor em vista de diferentes cores de pele, olhos e cabelos; ou de classe, apetite sexual, faixa etária, renda. E por aí vai.

Os grandes veículos a que me refiro, ou advogam do lado oposto, ou jamais revelaram qualquer interesse por tais posições. Da ideologia de gênero ao feminismo mais transgressor. Degeneradas fazem orgia com símbolos sacros em via pública? Noticia-se o ocorrido como quem descreve um pôr do sol sobre a Lagoa, ou se fala em liberdade de manifestação e em tolerância. É a pretendida tolerância com o intolerável e com os intolerantes...

De fato, o período que estamos vivendo oferece oportunidades extraordinárias para observarmos o principal alinhamento de grandes meios de comunicação. Mesmo quando há diferenças importantes entre eles, sobressai um denominador comum que resiste à desilusão de muitos profissionais com as antigas convicções. Até os que delas se divorciaram antes de ficarem viúvos da esquerda participam da confraria que pode ser definida como a união de quase todos no repúdio às posições conservadoras. E essa intransigência, hoje, tem como alvo o candidato Bolsonaro, saco de pancadas da eleição presidencial. Praticamente todos se dedicam a malhá-lo, haja ou não motivo para isso. Aliás, não precisaria motivo. O conservadorismo basta.

Tal atitude reforça a natural conduta dos demais candidatos. A posição de Bolsonaro nas pesquisas já seria motivo suficiente para todos o atacarem. Com a mídia comandando a artilharia contra o adversário comum, o que pudesse haver de conservadorismo em qualquer deles foi jogado no arquivo morto. “A mídia rejeita e está ajudando”, dirão. Objetivo alcançado: há um único representante dessa importante corrente de opinião indispensável para realinhar aspectos essenciais da vida nacional. Agora, basta abatê-lo e esperar, ali adiante, a colheita integral do "progressismo" plantado por ação ou omissão.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

20/08/2018

 

Os debates entre candidatos a cargos majoritários mostram alguns aspirantes que não conseguem ocultar seu despreparo para as demandas das funções que buscam. Nenhuma empresa de médio porte bem conduzida convidaria para assumir cargo de responsabilidade num segundo ou terceiro escalão. No entanto, aspiram ao poder político e se sentem motivados para conduzir a nação em período de grandes dificuldades. Outros há, bem preparados, sem a mínima competência política.

Não é muito diferente o quadro, aliás, onde quer que o poder dependa das ruas e das urnas. A política, de um modo quase geral, é ponto de encontro de pessoas que gostam do que fazem e fazem empiricamente. Obtêm sua formação da simples experiência, aplicando o intelecto aos fatos que observam, às notícias que leem e às informações que acumulam.

 Se os parlamentos refletem a sociedade cuja pluralidade representam, a maior qualidade daqueles vai depender dos avanços que sejam obtidos no desenvolvimento cultural desta. A União Federal, 21 dos 26 estados brasileiros e a imensa maioria de seus municípios se arrastam numa sufocante crise fiscal, levando junto o setor privado. E só estamos nessa porque as galerias clamam, os parlamentos legislam e governos governam despesas que, sistematicamente, ano após ano, crescem acima da receita. Reflexo de um modelo errado sendo conduzido por mãos impróprias.

 Em outras palavras: faz-se imperioso reconhecer que a alfaiataria institucional brasileira é de péssimo corte e ainda piores costuras. Os temas nela envolvidos estão na raiz de muitos de nossos males e penares.

1) O péssimo corte, inábil e inadequado, criou um sistema de governo que, em vez de dar força às ideias mais aplicáveis a cada momento histórico, escolhe governantes segundo critérios que não costumam guardar relação com as virtudes necessárias ao exercício do poder. E assim, não raro, privilegia os mais demagogos, os mais mentirosos, os mais astuciosos. Num sistema diverso, próprio das democracias mais estáveis, que separe as funções de chefia de Estado das funções de chefia de governo, confiando-as a pessoas diferentes, essa dificuldade é superada. O chefe de estado, o presidente da República, é eleito diretamente pelo povo e representa a nação. O cara da gestão, escolhido pelo parlamento, é o líder do plano de governo que sai vitorioso das urnas porque, em torno dele, se aglutinou a maioria parlamentar.

2) A péssima costura favorece o recrutamento de lideranças políticas de insuficiente preparo, centradas na preservação do poder (o que é normal) a qualquer preço para a sociedade (o que não é normal). E é, precisamente, na costura, feita por mãos inábeis e desonestas, para preservar o poder a qualquer preço, que a corrupção se instala, o Estado incha, a despesa explode e a sociedade, não preciso dizer, você sabe o que acontece com ela.

Enquanto, com angústia, deposito estas ponderações no papel a menos de dois meses das eleições nacionais, só me resta o apelo: Capricha nesse voto, cidadão!

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.


 

Percival Puggina

17/08/2018

 

Aproveito-me da analogia que o amigo Procurador de Justiça Fabio Costa Pereira tem traçado entre aspectos do setor público brasileiro e o fantástico mundo de Nárnia concebido pelo escritor C.S.Lewis para abordar alguns problemas da Educação no Brasil.

 Aqui na nossa Nárnia, o que está bem vai mal e o que está mal vai bem. Quem diverge, sustentando que para estar bem é preciso não estar mal e, simetricamente, que não pode estar mal o que vai bem, é imediatamente considerado fascista, filho de uma égua, inadequado à vida civil de uma sociedade em transformação.

Há muitos anos, ao sul de Nárnia, houve um rei que, entre outros desatinos, decidiu investir contra o educandário militar conhecido como Colégio Tiradentes. Acumulavam-se ali três equívocos intoleráveis: não formava militantes, era dirigido pela Brigada Militar e era bom demais. Situação insustentável que levou o rei a agir rapidamente e com frieza. Cravou o punhal na comunidade escolar e transferiu o Tiradentes para a burocracia aparelhada da Secretaria da Deseducação. Uma tragédia. Foi necessário derrotar o rei em refrega, quatro anos mais tarde, para que a situação se normalizasse.

Ano após ano, os educandários militares despontam entre os melhores do país. Pais os procuram e prestigiam, professores ensinam, alunos estudam e seu desempenho é superior à média. O que pode ser pior do que isso em Nárnia? Respondo: o profundo mal estar que suscita a evidência de certos problemas com o ensino público.

Não cometeria a leviandade de desconsiderar as vantagens qualitativas que atuam em favor dos colégios militares. No entanto, posso afirmar que mesmo se essas desigualdades não existissem, tais colégios teriam desempenho superior à média em virtude de características que lhes são inerentes. Entre outras: disciplina de alunos e professores; respeito às autoridades escolares, à hierarquia, aos códigos de conduta e às tradições; ordem, civismo, meritocracia; professores que ensinam e alunos que estudam. Ora, onde a orientação pedagógica de Nárnia for freireana ou assemelhada, tendo por objetivo “formar cidadãos conscientes a serviço da transformação da sociedade”, o que descrevi acima está fora de cogitação.

Recentemente, li um artigo crítico à educação nos colégios militares. O autor, professor de história, os acusa de não promover a crítica histórica da sociedade brasileira. “Crítica Histórica”, para quem não acompanha esses academicismos, é uma operação muito complexa, envolvendo, além da crítica propriamente dita, tarefas de heurística e hermenêutica. O filme, muitas vezes, termina longe de quaisquer certezas e o mais comum é que tudo seja relatado segundo o viés ideológico do sujeito que pilota o giz. Um bom militante cumprirá seu dever despertando nos alunos aversão à história do Brasil e aos fundamentos da civilização ocidental cristã, sentimentos de revolta ou de culpa e vergonha sobre nossa história, ao cabo dos quais sua identidade nacional rastejará em desconforto e autodesprezo.

Não conheço outra nação cuja identidade tenha sido tão acossada por maligna ação interna quanto esta Nárnia onde se fala português. Tudo por obra daqueles que suscitam e operam com os piores sentimentos e condutas para, supostamente, construir de um mundo melhor. Coisas de Nárnia.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.

 

 

Percival Puggina

15/08/2018

 

 “(...) quando então começaram a se precipitar para esses tempos em que nem nossos vícios, nem os remédios para eles, podemos suportar."  Tito Lívio, em Ab urbe condita.

 Em artigo publicado no meu blog em 30 de setembro de 2014, e que pode ser lido aqui, o prof. Giusti Tavares discorreu sobre o paradoxo representado pelos partidos totalitários que atuam em democracias constitucionais. Advertiu o eminente professor que o surgimento e a atuação de tais legendas se fazem tanto mais vigorosos quanto mais erodidas e fragilizadas forem essas democracias pela decadência de suas elites, pela corrupção e pela desinformação política.

Quando analisamos a conduta do Partido dos Trabalhadores na política brasileira, constata-se facilmente que, desde suas origens, a legenda surge com esse perfil, valendo-se e interagindo com essa erosão e com essa fragilidade. Muitos de seus dirigentes vieram das organizações guerrilheiras e terroristas que atuaram no Brasil nos anos 60 e 70 do século passado e, pela porta da anistia, a partir de 1980, foram absorvidos no jogo político. As organizações que criaram e nas quais militaram mantinham com a democracia constitucional uma atitude que pode ser descrita como de repugnância. Seu objetivo político era a ditadura do proletariado, um governo das classes trabalhadoras, uma nova ordem social, política e econômica. Nada diferente das então ainda remanescentes “democracias populares” padecentes sob o imperialismo soviético, por onde muitos andaram em tempos que lhes suscitam persistente e visível nostalgia.

Essa natureza está perfeitamente expressa no manifesto de fundação do partido: “O PT afirma seu compromisso com a democracia plena e exercida diretamente pelas massas. Neste sentido proclama que sua participação em eleições e suas atividades parlamentares se subordinarão ao objetivo de organizar as massas exploradas e suas lutas”. Vem daí todo o esforço para deitar mão nos mecanismos formadores de opinião – entre outros: meios de comunicação, instituições de ensino, associações, igrejas e sindicatos – e a debilitação da democracia representativa pela ação de conselhos criados, infiltrados e controlados pelo partido.

A estima por regimes totalitários como os de Cuba, Venezuela, Nicarágua, El Salvador, bem como a promoção da convergência ao Foro de São Paulo, dos movimentos e partidos revolucionários na América Ibérica, é expressão da mesma genética. De igual forma, simetricamente, não há registro de proximidade calorosa e simpática dessa organização política com qualquer democracia constitucional estável e respeitável. Os chamados movimentos sociais constituem os braços mais liberados para as tarefas de ruptura da ordem em favor da causa.

Os últimos acontecimentos promovidos em Brasília são um pouco mais do mesmo. São atos que se repetem sistematicamente, sem exceção, contra qualquer governo, em qualquer nível administrativo. A palavra de ordem é “Fora, seja lá quem for!” que esteja sentado na cadeira ambicionada pela legenda. É um perfil golpista. Geneticamente golpista e com longa história de sintomáticas manifestações.

Por isso, seu maior líder, apenas por ser seu maior líder, é tido e havido como alguém que está acima da lei. Por isso, embora legalmente impedido por condenação criminal, Lula foi aclamado candidato a presidente na convenção do PT. Por isso, a estratégia é afrontar o ordenamento jurídico do país. Por isso, no dia seguinte à proclamação do resultado do pleito, o PT estará nas ruas e na imprensa mundial proclamando a ilegitimidade do novo governo.
Tal acusação e o ambiente que proporcionará serão muito ruins para a estabilidade institucional, para o Brasil, para a confiança na economia, para o mercado e para a superação do desemprego. Mas ao PT isso não importa. Ao PT a única coisa que importa é o PT.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

14/08/2018

 

 Há uma pedra no meio do caminho e ela não está ali servindo de inspiração a Drummond. A necessária racionalização de nosso modelo institucional, a mudança das regras do jogo político, mexeria com interesses daqueles que, vitoriosos no sistema vigente, temem criar riscos ou incertezas às suas carreiras. O tempo mais perdido da minha vida foi o que gastei assistindo infindáveis sessões de comissões parlamentares tratando de reforma política.

 No entanto, esse não é um assunto para ser levado “a panos quentes”. O Brasil subiu no telhado e a informação a respeito não viaja de navio. As projeções que disso se extraem ficam disponíveis online. O Word Economic Forum (WEF) de 2017 classificou as instituições brasileiras em 109º lugar num conjunto de 137 países analisados. Claro, alguém, feliz da vida, otimista como o Dr. Pangloss de Voltaire, pode afirmar que está tudo indo muito bem e que esse pessoal do WEF deve ter algum problema de visão que impede captar as “virtudes” de nosso modelo institucional.
 No entanto, isso é mais ou menos como fechar as janelas para não ouvir os miados do gato no telhado. Um país que, de modo continuado, perde posições nos rankings internacionais em tudo que importa; cujo risco de crédito vem se elevando, segundo as principais agências; e cujos poderes de Estado se encontram em absoluto descrédito não pode fechar os olhos, imaginando, assim, não ser visto.

 Sempre me pareceram incompatíveis com um ano eleitoral as expectativas de crescimento do PIB de 2018, estimadas, no ano passado, como próximas a 3%. Por quais estranhos motivos se animariam os agentes econômicos se o cenário era tão pouco animador? Se tantos partidos e lideranças políticas colocavam seus próprios interesses acima do bem do país? Se os vícios do modelo político se apressavam para entrar em atividade e se era tão incerto o futuro? Já soara bem antes o alerta de que o dólar haveria de subir, a bolsa cair, e a economia recuar os dedos, resguardando os anéis restantes para depois da roleta eleitoral. Não é isso que nos ensina a experiência? A única coisa certa na hora incerta é a cautela com o dinheiro, seja você consumidor ou empreendedor.

 Pois bem, para ajudar a complicar, há mais de um ano, o Supremo Tribunal Federal é o mais ativo protagonista da política brasileira. Seus ministros dominam o noticiário com monocráticas declarações e com colegiado silêncio ante as amarguras nacionais. Sem a menor cerimônia, ministros assumem papel regencial, interferindo no rumo dos acontecimentos e das candidaturas. Muitos fazem coro às honoráveis palavras do senador Romero Jucá quando desabafava sobre a necessidade de estancar a sangria... dos corruptos. A sociedade? Esta que vazasse plasma e hemoglobina pelas sarjetas da violência e das carências. Era preciso parar a Lava Jato. E há ministros do STF a disfarçar seu servilismo a esse objetivo com rompantes de uma orgulhosa e não reconhecível dignidade.

 Quando o Congresso Nacional acordará de sua letargia, assumir-se-á como poder e conferirá racionalidade às nossas instituições?

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
** Especial para a Revista Voto.
 

Percival Puggina

10/08/2018

 

Todos os meios de comunicação do país têm produzido matérias sobre o impacto do aumento que os ministros do STF se autoconcederam com  votos vencidos de Cármen Lúcia, Rosa Weber, Edson Facchin e Celso de Mello. A propósito, em entrevista a O Globo, Marco Aurélio Mello esclareceu que não se trata de autoconcessão porque o novo valor só comparecerá ao contracheque após a aprovação pelo Senado Federal. Como se houvesse brio em dose suficiente naquele plenário para se contrapor a todo o Poder Judiciário do país! Em entrevista publicada no site Congresso em Foco, o presidente do Senado, Eunício de Oliveira, já adiantou: “Compreendemos o momento que vivemos do ponto de vista da economia, mas também devemos compreender que cada Poder é autônomo e pode tomar suas próprias decisões. Não vamos fazer nada de confronto”, adiantou o senador, concluindo redundante: “Temos que respeitar a harmonia dos Poderes e o teto constitucional que foi estabelecido para cada um dos Poderes (sic)”.

 Cálculo feito pela assessoria das Comissões de Orçamento da Câmara e do Senado estima que a despesa com pessoal se elevará em R$ 717 milhões no Judiciário, R$ 258 milhões no Ministério Público da União e R$ 400 milhões no Poder Executivo por consequência da majoração do teto remuneratório. Nos estados da Federação, o impacto chegará a R$ 2,6 bilhões.

 Esse é o dano que está sendo divulgado. É um rombo fiscal. Há outro, porém, de natureza moral. Já foi anunciada a necessidade de manter congelados, até 2020, os vencimentos dos servidores públicos da União (e não será diferente nos Estados e municípios). A penúria das contas públicas foi produto de laboriosa construção. De modo irresponsável, os poderes de Estado e seus órgãos de controle permitiram que o gasto se elevasse constantemente em tempos de ruinosa queda da renda nacional e, consequentemente, das receitas fiscais. Estabeleceu-se o caos dos salários parcelados, atrasados e da perda do poder de compra. No setor privado, o efeito é bem mais atroz: desemprego em massa.

É aí que se produz o pior impacto desse vergonhoso aumento do STF. É um impacto moral! Como tolerar que ao topo remuneratório do poder público, aos terraços e coberturas do aparelho de Estado, sejam concedidas reposições de perdas remuneratórias que são recusadas aos miseráveis operadores dos porões? Como explicar isso aos que recebem menos, aos que recebem atrasado, aos que recebem parceladamente seus vencimentos e proventos, bem como aos desempregados? Como fazê-los entender que não bastante essa dura realidade terão que custear o ganho adicional das categorias beneficiadas em cascata pela decisão tomada por sete magistrados com acento no plenário do Supremo? Sim, porque não se imagine, repito, que os rabo-presos do Senado negarão a seus futuros julgadores o valor que pretendem ver incorporado a seus contracheques.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

06/08/2018

 

 

 O escrutínio das causas que levaram ao impeachment de Dilma Rousseff ainda não mereceu consideração nas avaliações internas do seu partido. Depoimentos só foram prestados e confissões só foram ouvidas em processos de colaboração premiada. O que mais aparece no noticiário é uma vitimização atacando o que denomina “discurso de ódio”, ante o qual o partido e suas iniciativas seriam vítimas indefesas e consternadas.

 Entre as vantagens que advêm dos meus 73 anos, incluo, sem dúvida, o acompanhamento ao vivo da política nacional durante largo período de tempo. A isso agrego o fato de ser colunista de jornais ao longo das últimas três décadas e meia. Se houve um traço nítido na ação política do PT durante esse período, foi, precisamente, a incitação ao ódio em pluralidade de formas e expressões.

Quase como parte de minha atividade cotidiana acompanhei o surgimento e o crescimento desse partido, mas qualquer um que já tenha idade para estacionar em vaga de idoso também assistiu a tudo. Observei a natureza das ações, o trabalho de organização dos movimentos sociais, o lado trotskista que reconhecia a centralidade da política, e o diálogo com organizações da luta armada (as tais frentes de “libertação nacional” em países da América do Sul, na América Central e na África).

Em todas as atividades compareciam, sempre, os elementos apontados por José Hildebrando Dacanal em “A Nova Classe - o governo do PT no Rio Grande do Sul. São eles: 1) a culpa é do sistema; 2) a sociedade tem que se revoltar; 3) os que se revoltarem votarão em nós; 4) a solução virá com a revolução socialista que nós faremos”. Cada passo dessa sequência não envolve qualquer generosa declaração de amor, mas exige a construção do antagonismo e a percepção do ódio como instrumento de luta.

Coerentemente, então, foram décadas de louvação a um homicida furioso como Che Guevara, para quem “O ódio é o elemento central de nossa luta! Ódio é tão violento que impulsiona o ser humano além de suas limitações naturais, convertendo-o em uma máquina de matar com violência e a sangue frio”. Não pensava diferente outro ícone frequentemente lembrado. Carlos Marighella, em seu minimanual do guerrilheiro urbano alerta que o guerrilheiro somente poderá sobreviver se estiver disposto a matar os policiais e todos aqueles dedicados à repressão e se for verdadeiramente dedicado a expropriar a riqueza dos grandes capitalistas, dos latifundiários, e dos imperialistas. Não, a adoção de modelos não é uma tarefa inconsequente.

Como produto, a violência foi se tornando rotineira. Todo um divisionismo foi minuciosamente semeado entre raças, etnias, sexos, gerações, grupos e classes sociais. Gradualmente, num crescendo, desencadearam-se as invasões de propriedades rurais seguidas de corredor polonês para retirada dos proprietários, as destruições de patrimônio, as invasões de parlamentos e prédios públicos, os enfrentamentos às autoridades policiais, os trancamentos de rodovias e queimas de pneus, as destruições de lavouras, os black blocs, as campanhas pela mudança de nomes de ruas e todas as ações voltadas para o quanto pior melhor.

Não preciso que alguém me descreva os danos causados pelo ódio dentro de uma sociedade. Eu vi isso acontecer. Eu o rejeitei então e o rejeito agora. Ele não se confunde com a indignação contra a injustiça, contra o mal feito, nem com a denúncia do malfeitor. O que refugo, por absolutamente hipócrita, é a denúncia do “discurso de ódio” formulada como escudo protetor de quem dele se serviu para suscitar tanta divisão, antagonismo e malquerença no ambiente social e político brasileiro!

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.