SINDICALISMO JUDICIAL
Percival Puggina
A greve dos magistrados, ainda que sob o rótulo genérico de “paralisação”, dá um passo muito perigoso no sentido de reduzir a magistratura a mera categoria funcional, diminuindo o status de seus membros entre os poderes de Estado. Juiz não é trabalhador nem funcionário. O Estado não é seu patrão. Seu poder é poder de Estado.
Não vou entrar no mérito das reivindicações ontem apresentadas pelos líderes desse sindicalismo judicial. Li, outro dia, a pauta de reivindicações dele procedente e que consta de uma proposta de regulamentação dos adicionais, indenizações, auxílios e similares que vem circulando nos gabinetes de Brasília. Têm o patrocínio, ao que soube, dos ministros Fux e Lewandowski. Sinaliza perigosa perda da noção de limites. Tenho certeza de que a maioria dos magistrados a rejeita, como tantos, ontem (15/03), rejeitaram a greve.
O que me traz a estas linhas é algo que tenho lido e ouvido reiteradas vezes nos últimos dias como parte da argumentação em favor da manutenção do auxílio-moradia. Refiro-me às afirmações de que estariam os magistrados sendo vítimas de retaliação em virtude de sua atividade no combate à corrupção.
Isso ofende a Nação. A sociedade agradece e se rejubila com a dedicação de alguns magistrados aos quais as circunstâncias atribuem o julgamento de tais processos e neles atuam com isenção e elevado senso de justiça. A sociedade sabe que, fossem quais fossem os magistrados incumbidos desses casos, neles atuariam com igual proficiência. Mas não soa adequado buscar abrigo corporativo no guarda-chuva de alguns colegas. E mais impróprio ainda: a imensa maioria da sociedade admira o trabalho de seus magistrados, louva o combate a corrupção e considera a generalização do auxílio-moradia um benefício excessivo.
REUNIÃO COM CÁRMEN LÚCIA IRRITOU SEPÚLVEDA PERTENCE
Percival Puggina
Durou cerca de uma hora a audiência do advogado Sepúlveda Pertence com a ministra Cármen Lúcia, presidente do STF. O objeto da conversa era o habeas corpus solicitado pelo ex-presidente Lula, que se vira como pode para evitar sua prisão.
Cercado pela imprensa, ao sair da reunião, o ex-presidente do STF, hoje advogando para o mais popular dos condenados da Lava Jato, negou-se a atender os repórteres. Indagado se a ministra presidente teria manifestado previsão sobre quando seria pautado o HC, Sepúlveda, com cara de poucos amigos respondeu secamente: “Não”.
O advogado bateu na porta errada. Sua melhor sala de espera, neste momento, é a do ministro Celso de Mello. Malgrado a pose de comensal do Olimpo, Sua Excelência não se peja de desempenhar papéis como o que lhe vem sendo solicitado, e desencadear o casuísmo que pode beneficiar Lula. Uma solicitação do decano para que o tema da prisão após condenação em segunda instância volte à deliberação do Pleno teria que ser atendida pelos pares. Eu disse papéis? Deveria ter dito papelão, como papelão foi sua inacreditável inovação no julgamento do mensalão. No final daquele processo, Celso de Mello criou a possibilidade dos embargos infringentes contra acórdão condenatório da própria corte, para permitir, graças a uma bem urdida alteração na composição da Corte com a aposentadoria de Joaquim Barbosa, que fossem suprimidas as condenações por crime de formação de quadrilha. A manobra do ministro com poses de comensal do Olimpo constrangeu o STF a pagar o mico de introduzir em seus anais uma sentença pela qual não houve formação de quadrilha no caso do mensalão. E as penas dos réus políticos tornaram-se breves e leves como certos nevoeiros outonais.
Não nos surpreendamos com o que venha a acontecer na semana que vem.
OLHA O QUE ESSE PESSOAL TEM NA CABEÇA
Percival Puggina
Recebo do amigo, colega arquiteto e escritor Luiz Carlos Da Cunha duas imagens. Uma reproduz capa de O Globo com a manchete: “Rio teve 640 tiroteios só no primeiro mês do ano”. Logo abaixo, a foto de uma senhora, aos prantos, sendo protegida e conduzida por dois policiais para fora da área de conflito. A outra imagem é do jornal comunista A Nova Democracia. Mostra um policial tendo ao fundo a favela, com os dizeres: “Intervenção policial no Rio de Janeiro aprofunda a guerra contra o povo”.
Meu amigo pergunta: “Dá para entender o que pensa um comunista? Se Freud estivesse vivo certamente não compreenderia as razões”. E aponta o paradoxo de um veículo se declarar “a favor dos menos favorecidos, do proletariado, dos estudantes, do campesinato e das massas das favelas enquanto critica ferozmente a intervenção
federal,cujo objetivo é minimizar a violência que aterroriza essa mesma população”.
O paradoxo, a meu ver, se explica com a seguinte chave de leitura: o comunista só vê classe social. O único crime que ele não perdoa é a prosperidade alheia (a própria não o perturba, mas a prosperidade alheia o deixa indignado). O comunista precisa da insegurança social. Ela lhe serve para denunciar o sistema econômico como causador das desigualdades que jogam bandido nas vielas do crime. O fato de a economia brasileira ser menos capitalista do que a do Afganistão, estar nivelada com Serra Leoa, e haver muito mais segurança nas ruas dos países realmente capitalistas (Hong Kong, Nova Zelândia, Suíça, Irlanda, entre tantos outros) deixa de ser por eles mencionado porque não convém.
SEPÚLVEDA PERTENCE ESTÁ DEVENDO PARA LULA
Percival Puggina
Tornou-se público e notório que a contratação de Sepúlveda Pertence para atuar como seu advogado foi uma jogada de Lula e dos que atrás dele se escudam e defendem. Tornara-se óbvio que Cristiano Zanin era uma figura mais preocupada com o discurso político e com o engomadinho da própria imagem do que com as teses jurídicas a defender. Errou a mão. Enfrentou mais os magistrados do que o processo.
Enfim, essa foi a impressão geral e parece ter sido, também, a de Lula que apostou alto, então, na contratação de Sepúlveda Pertence, um experiente e idoso jurista que foi procurador-geral da República e presidente do STF.
No entanto, frustraram-se as expectativas do contratante. A jogada de Sepúlveda - habeas-corpus preventivo no STJ - levou uma goleada de cinco a zero que veio coroar a anterior recusa da ministra presidente do Supremo a recebê-lo para uma conversa.
Nem Lula, nem Sepúlveda esperavam por essas. Personalidades como o advogado em questão costumam valer muito exatamente pela facilidade com que obtêm audiências ao pé do ouvido dos julgadores. No entanto, após os últimos incidentes desse processo, sabe-se que uma coisa é ser ex-presidente do STF. Outra é ser advogado de um réu como Lula.
A IMPUNIDADE A GOLPES DE TALÃO DE CHEQUES
Percival Puggina
O STF, como instituição, fala pelos cotovelos, mas age como se fosse cego e surdo. Enquanto o Brasil do bem paga com insegurança e corrupção a conta da impunidade, a posição do STF sobre a prisão após condenação em segunda instância tem a solidez de um pudim de claras.
O Supremo, é óbvio, não tem qualquer obrigação de atender os anseios da população. A rigor, nenhum dos poderes de Estado tem esse dever. A tal “soberania popular” tem vigência fugaz, a cada quatro anos, no primeiro domingo de outubro dos anos pares não bissextos, e é exercido no silêncio das urnas, das 8 horas da manhã às 5 da tarde. E acabou. A partir daí prevalece, sempre e sempre, a vontade dos representantes. E dos magistrados.
No entanto, somente alguém cego e surdo não sabe que a lei, em tese, se impõe sobre todos os poderes, inclusive sobre o STF. Este, porém, tem dado mostras suficientes de que seus onze membros, na prática, decidem com a testa e sem o texto em muitas oportunidades nas quais o tema é polêmico. Já ouvi votos em que só ficou faltando a locução “eu acho”. Ora, se os onze podem fazer o que bem entenderem (é assim que alguns “supremos” compreendem a própria função), puxa vida, bem que poderiam ouvir o clamor da sociedade na questão da prisão após condenação em segunda instância.
Foi o que aconteceu em fevereiro de 2016. Desde então, as coisas vêm andando assim e muitos corruptos cumpriram ou estão cumprindo uma temporada com mordomia zero e pouco sol. Se o pudim de claras dessorar, a prisão dos criminosos de primeira classe voltará a ser postergada para após o trânsito em julgado da sentença condenatória. E isso, sabemos todos, voltará a ser sinônimo de “nunca”. Será a impunidade a golpes de talão de cheques. Será o “foro privilegiado” que o sistema recursal brasileiro proporciona a quem tem recursos.
A leitura do blog do Merval Pereira, nesta sexta-feira 02/03, leva a crer que a bolsa de apostas pendeu para o lado da volta ao sistema antigo. Há outro pudim de merengue no forno. Cegos e surdos, seis ministros se inclinam pela volta da impunidade. Nossa esperança estaria num remendão pelo qual a condenação em segunda instância autorizaria prisão provisória. Mas essa tese, por enquanto, só teria cinco votos...
Saramago, se vivo, poderia escrever um ensaio sobre essa cegueira e essa surdez.
OLHOS PARA VER OU PARA CHORAR?
Ricardo Bergamini
“Quem não usar os olhos para ver, terá que usá-los para chorar!” (Foerster).
Hoje é dia de divulgação da dívida da União base janeiro de 2018 e, como sempre, a imprensa omite o estoque da dívida em poder do Banco Central no montante de R$ 1.670,3 bilhões (25,28% do PIB), sendo essa a parte mais importante da dívida, visto que nada mais é do que uma “pedalada oficial” (aumento disfarçado de base monetária, ou emissão de dinheiro falso) que não existiria se o Banco Central fosse independente. Vejam que essa orgia saiu de 17,86% do PIB em 2010 para 25,28% do PIB em janeiro de 2018. Crescimento real em relação ao PIB de 41,15%. Uma imoralidade sem precedentes.
Em 2010 o estoque correto da dívida líquida da União (interna mais líquida externa) era de R$ 2.388,0 bilhões (61,46 do PIB). Em janeiro de 2018 era de R$ 5.198,6 bilhões (78,68% do PIB). Crescimento real em relação ao PIB de 28,02%.
Quem não usar os olhos para ver, terá que usá-los para chorar, quando em algum momento a estupidez coletiva que sempre comandou a economia brasileira criar um novo confisco contra os poupadores e investidores, que no Brasil sempre foram considerados criminosos, traidores e lesas - pátria. Os governantes de plantão brasileiro sempre estiveram na defesa dos devedores, condição da qual sempre viveu o Brasil.
*Publicado originalmente em www.ricardobergamini.com.br
*O autor é economista