Percival Puggina

01/08/2022

 

Percival Puggina

 

         Sérgio Moro é um caso para estudo em Ciência Política e Comunicação Social. Como juiz, trabalhou muito, chegou ao estrelato e se tornou celebridade mundial credora de reverências. Precisou bem menos para ele próprio jogar isso fora numa operação tipo “carga ao mar” usada por navios em situações de pânico a bordo. Seus erros são um mostruário do que não se deve fazer em política.

Errou como magistrado ao desistir da carreira em que se consagrou para ser ministro do governo Bolsonaro sem ter afinidade com ele.

Errou ao crer que disporia, no ministério, da mesma autonomia que tinha em seu gabinete de magistrado. A vida, neste governo, não é assim. Antes, os ministérios funcionavam em modo “porteira fechada”, operando ali um patronato compartilhado entre o ministro e seu partido. Todos sabemos aonde tal prática levou.

Errou muitas vezes na relação com o presidente, modificando seus projetos e desconhecendo suas promessas de campanha e seu perfil conservador. No governo, se revelou um socialdemocrata e quis impor essa orientação ao Ministério da Justiça. Foi assim que perdeu a ambicionada cadeira no STF.

Errou ao “sair atirando” quando deixou o ministério, evidenciando mágoa, sentimento nocivo, mormente quando tornado público. “Never complain!” (Nunca queixar-se!) é parte de conhecido aforismo de Benjamim Disraeli, que foi por duas vezes primeiro ministro do Reino Unido na segunda metade do século XIX.

Errou ao aceitar convite para trabalhar numa empresa norte-americana que tem a Odebrecht em seu portfólio de clientes ativos.

Errou ao não defender seu trabalho na Lava Jato com o vigor que a situação exigia quando este se tornou objeto de intriga e maledicência no STF.

Errou ao avaliar suas condições para disputar a presidência na condição de 3ª via quando era o menos indicado para esse papel. Sabidamente, Moro tinha frontal antagonismo com os dois ponteiros da disputa, sendo-lhe impossível tirar, destes, os votos necessários para ultrapassá-los. Um pouco de sensibilidade política e de aritmética elementar teriam sido suficientes para evidenciar isso.

Errou ao se filiar ao Podemos, um partido socialdemocrata, dissidente do PSDB, sem avaliar sua receptividade pelos deputados federais da sigla, já comprometidos com candidaturas em suas alianças regionais. Filiou-se em novembro de 2021 e se desfiliou em abril de 2022.

Errou ao filiar-se ao União Brasil (PSL + DEM), onde encontrou o mesmo problema na ala PSL do novo partido, e se vê às voltas com o projeto pessoal de Luciano Bivar.

Errou ao postular uma candidatura ao Senado por São Paulo, quando não tinha como comprovar sua condição de eleitor residente no Estado, fato que o levou de volta ao Paraná onde busca ser candidato ao Senado. Ali, o que seria fácil, ficou difícil contra Álvaro Dias (Podemos) e Paulo Martins (PL), candidato oficial do governador Ratinho Jr., politicamente muito forte no estado.

Na base de quase todos os erros cometidos a bordo, está o mau uso dos dois anos de que dispôs até chegar ao instante decisivo das convenções partidárias. Perdeu a oportunidade de se preparar para afastar de si a imagem de inexperiente, forasteiro na política, e orientar melhor suas decisões num cenário sem dúvida complexo.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

29/07/2022

 

Percival Puggina

 

         Movido pelo estardalhaço midiático, li a carta com descabida atenção porque havia quase nada a ler. Nos primeiros parágrafos, que tratam sobre os poderes de Estado, entendi que os autores compareceram às aulas de OSPB. Em seguida, lendo os nomes dos mais destacados signatários evidenciou-se o uso que fizeram desse conhecimento sobre nossa ordem política. Ficou claro, então, ter sido sobre eles que escreveu Raimundo Faoro em “Os Donos do Poder - Formação do patronato político brasileiro”.

Nessa importante obra, sociólogo e politólogo que era, Faoro demonstrou quem, sobre tudo e todos, em qualquer circunstância, detinha as rédeas do poder nacional. Tenho certeza de que ele não seria ufanista como são os autores da carta nas reverências à nossa democracia. Nem concordaria com o que vem acontecendo com a liberdade em nosso país. Tenho certeza de que ele, vivo fosse, conheceria os principais nomes subscritores da carta e muito provavelmente, como eu, afirmasse que sintetizam sua obra.

Pensem comigo. A lista dos primeiros signatários cabe inteira no topo da pirâmide de renda do país. Ali estão nossos tradicionais e novos banqueiros e alguns empresários de peso. Ali está, a postos, a coesa militância de nossas universidades, nas quais, refugando o ânimo que lhes é essencial, toda diversidade e pluralidade são bem vindas, exceto as de opinião e expressão. Ali está uma consistente representação das carreiras de Estado e da enraizada burocracia nacional. Ali estão os porta-vozes habituais do mundo artístico, sempre solidários com os companheiros e lacrimosos com a perda de suas fatias no bolo fiscal.

Independentemente do que aconteça nas ondas revoltas onde braceja a escumalha plebeia, todos surfam nas pranchas do poder. Por isso, sua “Carta aos brasileiros e brasileiras em defesa do Estado democrático de Direito” é típica dessas parcelas da elite brasileira.

Burocratas, não os li enquanto a nação era roubada. Acadêmicos, nada disseram enquanto a educação despencava em mãos inábeis. Intelectuais, nada escreveram quando a censura iniciou seu nefasto trabalho. Juristas e cientistas políticos contemplaram inertes o ativismo e o consequencialismo diluirem a Constituição no coquetel das supremas vontades; calaram-se quando nossos congressistas legislaram em benefício próprio e desfiguraram a democracia, transformando os partidos em tesourarias e tornando assimétricas as disputas eleitorais.

Os donos do poder sentem-se donos da eleição. Pareceu-lhes sempre normal, então, que o povo não fosse ouvido, afinal, surfam sobre suas angústias cotidianas. Fizeram-se surdos à voz das ruas que, ao longo de anos clamam por transparência no sistema eleitoral. Para eles, nada há de novo no front nacional quando temos censura, presos políticos e cidadãos exilados, conluios e estratégias entre o Senado e o Supremo.

Aos donos do poder, se banqueiros, é intolerável, terem que atender a milhões de brasileiros de mãos grossas, encardidas e a essas brasileiras de fisionomia sofrida que ganharam a cidadania da conta bancária e do pix. É inadmissível, se “empresários”, ver os bilhões de reais que antes lhes chegavam quase de graça sendo usados para amenizar dificuldades de motoristas e saciar a magra fome do prato de comida dos setores mais carentes da população. Se artistas e famosos, desses que “lacram” nos palcos, há que pisotear na bandeira do Brasil se o Estado não mais custeia suas turnês.

Vejo que colhem adesões a essa carta. Mais do que as palavras vazias e a retórica chinfrim do texto, gritam os nomes dos signatários. De algum lugar, as aves de rapina espreitam a cena e a oportunidade de voltar à presa.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

27/07/2022

Percival Puggina

 

História número 1

Na primeira aula para a turma de calouros de uma faculdade de Direito, o professor, logo após a chamada, encarou o aluno visivelmente mais idoso da classe e disse, em tom agressivo: “O senhor aí, retire-se da minha sala de aula!”. Após alguns instantes de tensão, tendo o aluno saído, perguntou à turma: “O que houve? Porque vocês estão assim, com cara de quem viu lobisomem?”. Longo silêncio até que um dos estudantes, com visível insegurança, explicou que a expulsão do colega parecia não ter razão de ser. “Cometi uma injustiça? É isso? Então, vai lá fora e chama-o de volta”. Ao retornar, a surpresa: o aluno expulso ocupou o lugar do “professor” e este, encerrada sua representação, sentou-se entre os colegas. A partir daí, o verdadeiro docente da turma passou a lecionar o grupo sobre o dever moral, mormente entre advogados, de não silenciar perante uma injustiça.

História número 2

A aula daquela matéria toda vez mudava de local. Perdia-se um tempo procurando, subindo e descendo escadas. Naquela manhã, o professor já começara a falar quando uma aluna, retardatária, ensaiou entrar na sala. O homem com giz na mão olhou-a de modo rude e lhe disse, em tom mais rude ainda, que não podia entrar, pois a aula já começara. Enquanto a mocinha, humildemente, se retirava, um aluno levantou-se e explicou ao professor que sua cadeira sempre envolvia aquela dificuldade de localização, dando causa a tais atrasos. E completou: “Se a colega não pode entrar, eu saio”. E saiu da sala, seguido pelos demais.

A primeira história circula nas redes sociais há algum tempo. Não sei se realmente aconteceu. A segunda, esta última, deu-se na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRGS, na minha turma, por volta de 1966 e fui eu o aluno que reagiu à conduta do professor.

Quando o silêncio de alguns faz a história de todos

Injustiças me incomodam. Por isso, observo com indignação as ocorrências nacionais e o silêncio de tantos que devendo reagir, não o fazem. Penso na omissão perante casos como os de Allan dos Santos, de Barbara Destefani (Te atualizei), de Bernardo Küster, de Camila Abdo e outros que tiveram cortadas suas fontes de renda e enfrentam as dificuldades disso decorrentes sem ter acesso aos seus processos. O que fazem com eles não cabe no mundo das boas leis. Não conheço a todos, mas os que mencionei são pessoas que, de bom grado, receberia em casa para jantar com minha família. A seus detratores, não.

Outro dia, assisti Bárbara dizer à Jovem Pan que, há 10 meses, foi desprovida de seu sustento e não recebeu até agora sequer um e-mail que lhe indicasse os motivos disso. Logo após, li Bernardo afirmando estar na mesma situação dois anos depois de ter sido vítima de igual arbitrariedade.

A defesa da liberdade

Eles tinham milhões de seguidores. São pessoas que comungam do amor à liberdade e da aversão ao arbítrio. Censurados, podem sair à convivência das ruas enquanto seus censores viajam ao exterior para poder tomar sol.

Nada espero da OAB, nem dos advogados banqueteiros e festeiros da confraria Prerrogativas (Prerrô, para os íntimos). Tampouco espero algo das associações ditas “Pela democracia”, organizadas por pessoas que passaram por cursos de Direito e nada aprenderam sobre o valor Justiça.

Minha singular e tênue esperança está em que a sociedade não deixe morrer  a repugnância à injustiça. E perceba, em tempo, o quanto ainda pode ir além, perigoso e arrogante, o poder que tudo pode. 

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

23/07/2022

Percival Puggina

 

Trata-se de algo realmente irritante. Tem-se a impressão de que a maior parte do jornalismo brasileiro, ao sentar-se diante do teclado para produzir um texto ou repassar uma informação veste a camiseta partidária ou se ajoelha ante o altar da ideologia, passando a agir como militante.

Ontem, quis verificar os resultados de pesquisas que tenham avaliado a confiabilidade do nosso sistema eleitoral (votação e apuração). Do que encontrei conclui que apenas Datafolha faz essa investigação com certa regularidade. Afora essas, só encontrei uma Genial/Quaest, feita também em maio, com números semelhantes aos do Datafolha desse mesmo mês.

Nem o noticiário do site do TSE escapa à manipulação da informação. A exemplo dos maiores veículos de comunicação do país, divulgou pesquisa de março afirmando, no título, que 82% dos eleitores confia nas urnas eletrônicas”. Mas... e o termo médio, senhores? Eu sabia que as pesquisas indagam ao entrevistado se confia muito, confia um pouco ou não confia. No noticiário, porém, o termo médio some da informação e é, sem autorização dos entrevistados, somado ao “confia muito”!

Na pesquisa de maio, a mais recente, ele aparece apenas em matérias de O Globo e na DW. Os três números são os seguintes: 42% confiam muito, 31% confiam um pouco e 24% não confiam. As notícias, porém, destacam que 73% confiam no sistema brasileiro de votação e apuração.

No mundo onde vivo, com os pés no chão dos fatos, quem confia um pouco no médico, procura outro; quem confia um pouco no cônjuge, contrata detetive; ministro que confia um pouco em seu guarda-costas o substitui. E eleitor que confia um pouco no sistema preferiria algum mais confiável.

A pergunta sobre a posição intermediária – confia um pouco – está bem formulada. O que estou questionando aqui é a incorreta leitura da resposta. Só como exercício de manipulação faz sentido misturar esse tipo de desconfiança com confiança absoluta! Menos ainda em matéria dessa gravidade.

Então, caro leitor, se somarmos os eleitores que dizem “confiar um pouco” (31%) aos que não confiam em absoluto (24%), temos que a maioria do eleitorado não confia, ou seja, 55% dos pesquisados não confiam e 42% confiam. Mesmo assim, a matéria de O Globo sublinha que “a grande maioria dos brasileiros confia plenamente no equipamento usado pela Justiça Eleitoral”. 

Por quê? Porque tudo serve se for útil contra o governo. Até usar o poste de luz da informação como bêbado, para escorar-se. Ou coisa pior.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

21/07/2022

 

Percival Puggina

 

“Até numa conversa com ele [Bolsonaro], brinquei, dizendo que tinha vontade de acreditar na fraude das urnas, porque, quando via nomes como Hélio Negão, Bia Kicis, ou coisas assim, pensava, poxa. Mas sei que eles foram eleitos, assim como tivemos, em outros momentos, como na vitória de Collor, a eleição de muita gente desconhecida”.(Ministro Gilmar Mendes em entrevista ao Correio Braziliense, publicada ontem, 20/07)

Falando ao Jornal da CBN, o ministro já havia, anteriormente, ironizado os dois parlamentares:

“Quem tinha ouvido falar aqui de Hélio Negão? Quem tinha ouvido falar de Bia Kicis? Nenhum de nós tinha ouvido falar deles. Não obstante, eles vieram nesse arrastão provocado pelo presidente Bolsonaro, o que prova que a urna é fiel ao voto que foi depositado”. (Ministro Gilmar Mendes, um ano atrás. Assista aqui.)

É por não respeitar a si mesmo e abraçar-se às próprias conveniências, ainda que isso afronte o mais legítimo interesse da sociedade, que o Congresso Nacional ouve calado frases como as proferidas pelo ministro Gilmar Mendes. Resulta em paradoxo alguns membros do Supremo se excederem no uso da liberdade de falar enquanto atropelam ou convalidam atropelos impostos por seus pares à liberdade de expressão dos cidadãos.

Haveria menos barulho de prato quebrado, muita louça institucional não se espatifaria em cacos pelo chão se todos os senhores ministros se mantivessem nos limites da função que exercem e se fossem menos falastrões.

Militantes de pautas identitárias ainda não reagiram à manifestação do ministro. Nem vão, porque essas pautas só têm validade para companheiros.  Escrevo, pois, estas linhas em desagravo aos parlamentares e, em especial, à deputada Bia Kicis, e não por ser mulher, mas por ser excelente parlamentar. Coisificá-la é coisa de quem tem outra coisa na cabeça.  Bia foi procuradora concursada do Distrito Federal. Como cidadã, foi ativa no combate à corrupção, defensora das pautas conservadoras, líder na defesa do voto com impressora, auditável.

Como congressista, a contragosto de Gilmar Mendes e seus pares e ímpares no STF, precisou de pouco tempo para se tornar nacionalmente conhecida. Formamos amizade e, por isso, acompanho, à distância, seu trabalho como vice-líder do governo e presidente da CCJ, a mais importante comissão da Câmara dos Deputados.

Bia Kicis incomoda? Sim, incomoda, mas não foi eleita para acomodar. Parlamentares inócuos, placebos, já temos muito além da conta.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

 

 

 

Percival Puggina

18/07/2022

Percival Puggina

 

Todo dia estou aprendendo. Os espaços de informação que mais frequento ficam fora do circuito onde opera o consórcio dos grandes meios de comunicação.

Para exemplificar, nesse espaço modesto, cívico e abnegado, encantou-me a sabedoria de uma frase do eng. Roberto Motta: “Uma sociedade que não consegue condenar moralmente seus criminosos jamais conseguirá condená-los judicialmente”. Ao contrário do que afirmam os bandidólatras, a turma do desaprisionamento e os ideólogos do pandemônio, nosso problema não é de presos em excesso. O que temos é verdadeira multidão de bandidos soltos a infernizar nossa vida de mil e uma formas.

Em novo exemplo de sabedoria numas poucas linhas, um leitor comentou-me ontem: “Os apoiadores de Bolsonaro não se apropriaram da bandeira do Brasil, apenas veem nele um exemplo do amor à Pátria”. Com efeito, esse sempre foi um sentimento estranho para alguns. Refiro-me, especialmente, a quem se alegra quando nosso jornalismo compromete a reputação do país e quando personagens de nossa cena política e do ambiente jurídico viajam ao exterior para fazer exatamente a mesma coisa.

Aproveitemos as semanas vindouras para refletir sobre o que os maus brasileiros estão fazendo com nossa gente. Eles não podem continuar transformando o Brasil numa casa de tolerância, desavergonhada como nunca se viu igual. Uma casa de tolerância que aplaude o gangsterismo político, que neutraliza a democracia, que levou ao requinte a impunidade nos altos andares da República e que confere poder ao banditismo deslavado. Uma casa de tolerância onde dinheiro e votos são contados como se fossem a mesma coisa.

Já não lhes basta a própria corrupção. Dedicam-se, há bom tempo, à tarefa de corromper, aos milhões, nossa juventude, porque são milhões e milhões que não se revoltam, mas apoiam, aplaudem e se declaram devotos.

Não é apenas no plano da política que a nação vai sendo abusada e corrompida. Dividiram a sociedade entre devedores e credores. As aspirações individuais e as perspectivas de vida são as novas vítimas desse caos. Adoeceram a consciência nacional. À medida que Deus vai sendo expulso, à base de interditos judiciais e galhofas sociais, instala-se, no Brasil, a soberania do outro.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

Percival Puggina

15/07/2022

 

Percival Puggina

 

         Recentemente, falando perante um grupo de apoiadores e militantes, Lula reconheceu a acusação de Fernando Henrique de que o PT “vaia até a bandeira brasileira e o hino nacional”. E completou, em viva voz e imagem: “De vez em quando ainda vaiamos”.  

Pois é. Essa esquerda tem um problema com a ideia de pátria e, principalmente, com patriotismo. Daí o Foro de São Paulo, daí a fixação com “La Pátria Grande” e seus desdobramentos, daí a Internacional Socialista, ou “a Internacional”, para os íntimos, que é como camaradas e companheiros a denominam. Marx, tataravô de todos, queria uma revolução mundial, uma fusão de revoluções. Para ele, o comunismo adviria do vitória do proletariado internacional na luta contra o capitalismo.

A URSS dispunha de uma série de mecanismos para apoiar e definir estratégias com esse fim. Apostava nisso e se espantava quando não dava certo. Os líderes comunistas russos nunca entenderam, por exemplo, proletários finlandeses e alemães, em defesa de suas pátrias invadidas, pegarem em armas contra os camaradas soviéticos em 1939 e 1941...

Há vários motivos para essas vaias a hino e bandeira. Primeiro, porque quem assim reage precisa de um ânimo revoltoso como ponto de partida para qualquer ação política. Segundo, porque esse ponto de partida exige divisões que, nas últimas décadas, correspondem aos conhecidos conflitos identitários já mundializados, como se sabe. Terceiro, por estarem convencidos de que o Brasil é uma excrecência criada por gente muito má. Gente que resolveu ocupar como coisa sua o suposto paraíso perdido, a idílica Pindorama das praias e palmeiras.

Para eles, por fim, nosso país não foi descoberto, o 22 de abril de 1500 foi uma aberração histórica, o Sete de Setembro é uma ficção porque o Brasil nunca foi independente e São José de Anchieta foi um predador cultural. Ponto e basta.

Ao sopro da mesma ideologia, bandeiras do Brasil servem, frequentemente, para fazer fogueira. Não obstante, vê-las nas mãos de adversários políticos e confrontá-las com suas bandeiras vermelhas e apátridas dói como pisada no calo.

Para quem tem memória curta, é bom lembrar que as bandeiras do Brasil passaram a ser usadas massivamente nas manifestações de 2013, exatamente para diferenciar dos arruaceiros e depredadores que então iam às ruas, no truculento estilo de sempre, protestando contra os 20 centavos a mais nas passagens de ônibus.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

14/07/2022

 

Percival Puggina

 

         Há um ano, em 11 de julho, quando explodiu em Cuba um movimento de viés libertador levando o povo às ruas, fui muito indagado sobre a sequência e as consequências daquilo. As observações e experiências pessoais colhidas durante várias viagens relatadas por mim em “A tragédia da Utopia” e as informações que regularmente recebo explicam esse interesse por minha opinião. Não sou cubanólogo, mas sim, conheço a dura realidade daquela ilha.

Lembro-me que meus interlocutores se decepcionavam com o que lhes dizia sobre a inviabilidade de uma “primavera” cubana. Era como se preferissem informação ilusória e essa reação me fazia pensar sobre o quanto as fantasias são sedutoras e fáceis de vender. Há quem creia, por exemplo, em Lula de outra pipa...

No entanto, era perfeitamente previsível que aquele regime se recusaria a qualquer entendimento com a população desarmada (desarmada, note-se bem) e iria endurecer contra os manifestantes. Foi exatamente o que ocorreu. O Estado reagiu com inusitada violência – porrete e cadeia – contra todos em quem conseguiu deitar a mão. O evento subsequente simplesmente não aconteceu.

Agora, acabo de ler um rescaldo daqueles dias em matéria publicada na Gazeta do Povo. Trata-se de um relatório divulgado por Cubalex (consultoria jurídica) e pelo Movimento 11J (referido à data dos eventos de 2021): 1484 prisões e 505 pessoas já condenadas ao cárcere ou a “trabalhos correcionais” com internamento. Outras 196 estão em prisão provisória (decorrido ano inteiro de uma simples mobilização popular). Há 703 não encarcerados, dos quais alguns pagaram multas e outros cumprem “trabalhos correcionais” sem internação. Sobre 80 não há informações. Maus tratos e tortura são frequentes e a legislação contra esse tipo de evento tornou-se mais rigorosa.

Triste, não? No entanto, esse regime tem apoiadores internos na população cubana (gente de cabeça feita pelo sistema ou beneficiada por ele de algum modo) e tem à disposição para acionar, uma poderosa máquina repressiva policial, judicial e militar (com ganhos privilegiados). Tem, também, apoiadores externos, entre os quais um candidato à presidência do Brasil. Esse cidadão apoia, igualmente, os regimes da Venezuela, da Nicarágua e, para favorecer a expansão dessas aberrações, criou o Foro de São Paulo.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

Percival Puggina

12/07/2022

Percival Puggina

         Vivemos sitiados pela mentira, muitas vezes apresentada sob o engenhoso nome de “narrativa”. Ora, a construção de uma versão que altere a essência de determinado fato não é um mero modo de relatá-lo nem questão de estilo. É mentira, pura e simples, construída com a intenção de iludir.

Quando Lula se afirma inocentado, está mentindo. Ele não foi inocentado nem descometeu os crimes pelos quais foi condenado por nove magistrados diante de robustíssimo volume de provas e evidências.

Quando Lula, que vive como multimilionário que é, fala dos pobres em seu governo, a mentira não encontra quaisquer limites. Recentemente, em entrevista à Rádio Metrópoles, reafirmou sua clássica frase segundo a qual, em seu governo, “os pobres andavam de avião, compravam carro e usavam perfume importado”...

Quando ministros do Supremo dizem que a democracia e as instituições estão sob risco, isso só não será mentira se for confissão de culpa.

Quando um ministro do STF busca para si méritos por haver impedido a volta do antigo voto em papel, ele deixou a verdade em alguma gaveta do gabinete.

Quando é dito que as condenações de Lula foram anuladas porque julgadas no endereço errado temos uma inversão dos fatos, o foro foi dito errado para que os processos fossem anulados. Tanto assim que o próprio ministro Fachin havia, em várias ocasiões, negado recursos nesse sentido formulado pelos advogados de Lula e de outros réus.

Quando verdadeira multidão de jornalistas repete, em descarado coro, anos a fio, que Bolsonaro é o responsável por todos os óbitos causados pela pandemia no Brasil, podemos sentir o atoleiro moral em que afundou imensa parcela da imprensa brasileira.

Quando um inquérito do fim do mundo, mantido em sigilo, fornece motivação para medidas de censura e prisões políticas que assombram a liberdade de opinião, e dele só se menciona certo telefonema ameaçador, a narrativa foge das suas consequências reais tanto quanto a verdade foge da mentira.

Quando um leitor me escreve, em bom português, dizendo que Lula é inocente e foi condenado num complô porque compraram uma testemunha e o juiz era militante político, ele está ao mesmo tempo afirmando que o desconhecido Fernando Bittar tinha o poder de levar para a reforma de seu sítio em Atibaia as duas maiores empreiteiras do Brasil. Está dizendo que essas empresas deslocaram equipes de obras em portos e hidrelétricas para reformar um sitiozinho! Está dizendo, por fim, que a admirável e prestativa OI subiu a Serra e construiu uma torre para o bom funcionamento do telefone e da internet de um certo Fernando Bittar.

Está afirmando por fim, em sua “narrativa” que o crime de Lula, no caso do sítio em Atibaia, foi de esbulho possessório...

A verdade pode, muitas vezes, não ser amável, mas sempre exigirá respeito.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.