• Percival Puggina
  • 22/02/2023
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Brasil e Portugal

 

Percival Puggina  

         Provavelmente somos o único país que cultiva o desapreço por suas origens. Muitas de nossas dificuldades em lidar com questões cívicas decorrem desse vício solitário, que se propaga, por exemplo, quando nos ensinam que o Brasil foi descoberto nos azares de uma calmaria, como se fôssemos resultantes de um furo no preservativo do destino. E passamos a depreciar, por mentiras e gracejos, nossa raiz lusitana.

Primeiro estado nacional moderno com a revolução do Mestre de Avis (1385), confinado entre os mouros, o oceano e Castela, o pequenino Portugal, a quem “Netuno e Marte obedeceram”, sonhou com expandir - nessa ordem - “a Fé e o Império”. Criou a Escola de Sagres, projetou e construiu as embarcações de que precisaria e se lançou a “mares nunca dantes navegados”, numa empreitada que logo seria seguida pelos espanhóis. Desbravou a costa ocidental da África, o caminho das Índias, o Brasil, dividiu o planeta ao meio e retirou o eixo da História das mãos dos francos e dos germanos.

Portugal entendia sua missão no Brasil como “povoamento”. Para essa imensa tarefa, dificultada pela escassa população do reino, mandou o que podia e não podia: criminosos e presos políticos, homens de empresa, religiosos do mais alto nível, membros da corte (que nos apresentam, genericamente, como um bando de “degredados”). O Brasil, que estudamos como explorada “colônia”, nunca teve esse tratamento no vocabulário e nas leis portuguesas. Quem aqui nascia, desde 1605, era cidadão de um reino cujo coração batia cada vez mais forte no Brasil. Por fim, o sonho de Martim Afonso, D. João IV e Luís da Cunha: uma coroa europeia fora da Europa (que nos relatam como o “episódio da fuga”) e o depreciado Reino Unido (um modelo de comunidade política, concebida pelo talento português, que os britânicos mais tarde iriam, exitosamente, reproduzir). 

Pedro I, proclamando a Independência segundo conselho do próprio pai (“antes para ti que para algum desses aventureiros”) e Pedro II, deposto e exilado, levando consigo terra do Brasil para nela “repousar a cabeça”, são fatos a demonstrar que nunca houve na história universal uma relação como a de Portugal com o Brasil - a maior nação católica, mestiça e ibérica do planeta. Impossível amar o Brasil sem amar Portugal.

Infelizmente, a essa crise de identidade, que inicia com a depreciação de nosso nascimento e paternidade, soma-se, mais recentemente, uma visão fragmentada da nação, fracionada em múltiplas identidades e interesses em conflito. Que maldade!

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 


ulrich mielenhausen -   27/02/2023 13:13:37

Prezado Mestre, tenho muito apreço pela qualidade e inteligência dos seus artigos. Como alemão nato, vivendo desde 1952 no Brasil, conheço em profundidade a história brasileira, profundo conhecedor da Europa e tendo visitado/permanecido em 65 países do mundo, tenho condiçôes de discordar 100% da sua matéria sobre nossa origem portuguesa. Para sintetizar, a leitura do excelente livro 1808, da chegada do infeliz D.João VI, não deixa dúvidas sobre a nossa origem muito lamentável. O conceito estende-se a toda Peninsula Ibérica ( + Espanha) cujo histórico de conquista da Ibero-América, até hoje deixa suas conseqüencias de desrespeito com os habitantes originais, até hoje cidadãos de segunda classe. Na minha primeira viagem de volta a Europa, visitando 10 países em 3 meses, comecei por Lisboa ( lembra do vôo da Amizade da Panair ?) e participando de um jantar com empresários portugueses, um dêles comentou comigo que na próxima semana iria para a Europa. Respondendo a minha questão de que Lisboa é Europa, respondeu taxativamente que a Europa começa depois dos Pirineus. Fui diretor de 3 bancos e de 3 cias. aéreas em minha carreira, e conheço muito bem nosso triste país, que já teve fases aureas. SE quiser marcar um encontro para falar dceste tema, estou às ordens, porque um inteligente senhor como você não pode derrapar n um assunto tão importante. Grande Abraço

Menelau Santos -   26/02/2023 09:43:52

O Professor Puggina sempre desmistificando as falsas informações propagadas pela turma que não estuda e não tem apreço por nada. Havia um sujeito que fazia isso, escrevia muito bem (ainda escreve), abordava também tais temas, mas...que pena! sucumbiu à moral esquerdista: Sr. Reinaldo Azevedo.

Alexandre Carneiro Wendling -   24/02/2023 10:49:59

A perversão do Brasil aconteceu com a implantação do socialismo nacionalista pelas armas de Vargas em 1930. Nunca mais saímos desse buraco.

Maria L F Cauduro -   22/02/2023 15:32:51

Belo artigo! É preciso esclarecer a nossa origem lusitana, os feitos dos nossos imperadores e a pujança do Brasil império. Parabéns!