Alex Pipkin, PhD
Numa nova era, de suposta “nova consciência”, em que retoricamente só se fala em inovação, que significa criar formas inovadoras de resolver os problemas da sociedade (disruptiva), e/ou melhorar produtos e serviços já existentes no mercado (incremental), é kafkiana a incongruência entre a narrativa e a prática das políticas estatais.
O setor privado, apesar do ambiente institucional peçonhento, necessita ir além da criatividade e da ousadia racional para inovar em processos, produtos, serviços e experiências a fim de criar diferenciais e/ou enfatizar valores distintivos para ofertar nos mercados. Se assim não fizer, a soberania do consumidor atuará para que determinadas empresas percam o impacto e a relevância na criação de valor para clientes e para a sociedade como um todo.
Ao mesmo tempo, são surreais o comportamento e as ações governamentais. Além do governo não implementar novas práticas de gestão e maneiras de atender melhor e com menores custos à população, é justamente esse que impede e/ou joga no abismo as inovações a serem praticadas pela iniciativa privada.
Em vez de reduzir o seu tamanho mastodôntico, sua sanha por intervir nos mercados, com regulação, licenças e outras exigências burocráticas,
variados e múltiplos documentos para várias entidades estatais - o que não agrega nenhum valor -, adicionando custos e mais custos com tais licenças, taxas e cobranças, o governo inibe e penaliza as empresas quanto à geração de novas soluções para os cidadãos.
Por óbvio, toda essa parafernália burocrática se justifica para manter e aumentar “ad aeternum” a oxidada e gigantesca máquina estatal.
Mais uma vez, uma típica situação da pregação de moral de cueca, em que o governo impõe suas regras draconianas e seus procedimentos antiquados a iniciativa privada, sufocando as fundamentais soluções inovadoras, mas ele próprio, além de não inovar em suas práticas, retrocede em seus processos da idade do gelo para, populista e ideologicamente, dar mais proteínas a famigerada casta estatal.
Não sei se rio ou choro. Em plena era da digitalização, as “autoridades burocráticas estatais”, ainda exigem que determinados documentos e certificados tenham que estar no papel.
Sou justo, o governo é um exímio inovador quando se trata de aperfeiçoar o improdutivo, aquilo que já nem deveria existir mais!
Na prática, objetivamente, é o governo arcaico o principal gerador de barreiras à entrada de novas empresas no mercado, o que criaria mais da saudável competição e às imprescindíveis inovações.
Não canso em dizer que o governo deveria “sair da frente” dos empreendedores, o que acarretaria em mais atividade econômica, maiores soluções inovadoras para a sociedade, e a geração de mais impostos arrecadados para a provisão de bens públicos de efetiva qualidade.
O “nosso mundo” realmente é outro, porém, os semideuses estatais persistem em viver no reino das benesses, da ineficiência e da improdutividade, do vetusto e do compadrio.
Esses mortais divinizados forçam e, ao mesmo tempo, inibem as salvadoras inovações no setor privado, enquanto enchem suas bocas para arrotar frases feitas sobre o futuro e as tais inovações.
Se já não bastasse a legítima batalha contra as soluções inovadores da esfera privada, o governo, de fato, sempre busca abraçar o retrocesso na sua ânsia pela manutenção do Estado grande e dos privilégios para os agentes estatais.
DEMOCRACIA EM MODO -RELATIVA-
Na rota que leva qualquer -PAÍS CONSIDERADO COMO DEMOCRÁTICO- a fazer um -TEST DRIVE- para conhecer mais de perto como funciona o -REGIME DITATORIAL-, já na primeira curva aparece, com letras garrafais, uma placa informando aos curiosos passageiros que no trecho a seguir a DEMOCRACIA JÁ ENTRA, AUTOMATICAMENTE, EM MODO -RELATIVA-.
ATESTADO DE DESAPARECIMENTO
Infelizmente, por conta de baixa capacidade de discernimento, grande parte dos passageiros não percebem que em REGIMES DEMOCRÁTICOS não cabe o termo -RELATIVO-. Da mesma forma, aliás, como não existe, em hipótese alguma, mulher MEIO-GRÁVIDA. Portanto, para que fique bem claro, usar o termo RELATIVO para definir DEMOCRACIA é, antes de tudo, PASSAR UM ATESTADO DE SEU EFETIVO DESAPARECIMENTO.
RESSUCITAR A ASSASSINADA DEMOCRACIA
Pois, como o nosso triste país vive um momento crítico e decisivo, onde os passageiros dotados de racionalidade tentam, de todas as formas, RESSUCITAR a ASSASSINADA DEMOCRACIA, mais do que nunca é preciso restabelecer o funcionamento da importante -JUSTIÇA- que tem como compromisso GARANTIR OS DIREITOS INDIVIDUAIS, COLETIVOS E SOCIAIS, que de uns tempos simplesmente passaram a ser desrespeitados.
NOTA-EDITORIAL DA JOVEM PAN
A propósito, como as LIBERDADES -DE IMPRENSA E DE EXPRESSÃO- estão sob potente FOGO CRUZADO Brasil afora, onde dois procuradores do Ministério Público Federal -Yuri Corrêa da Luz e Ana Letícia Absy- querem tirar a Jovem Pan do ar, eis aí, em forma de solidariedade total à empresa, a importante NOTA-EDITORIAL emitida ontem, com o título -VOCÊ SABE O QUE É JUSTIÇA?-.
VOCÊ SABE O QUE É JUSTIÇA?
- Você sabe o que é JUSTIÇA? Se você sabe ou não sabe, se tem uma vaga ideia, se acha que sabe, mas não sabe dizer em palavras… enfim, reflita comigo: O que é Justiça? Existem duas respostas: Uma para a Justiça como valor universal, a Justiça como verdade que existe acima dos homens; outra para a Justiça que julga os problemas através das leis, a justiça como instrumento de pacificação e harmonia social. Você quer saber o que é Justiça? Preste atenção: no céu, não há Direito, mas só a Justiça. Até mesmo no inferno não existe Direito, mas somente a Justiça. É sobre este planeta Terra, que, não havendo a verdadeira Justiça, existe o Direito. Porque é um valor universal que vai além deste mundo, a Justiça nos informa a existência da razão e, por isso, a Justiça é aquilo que atesta uma situação de equilíbrio e respeito entre tudo o que existe no universo e qualifica, assim, que a criação divina é justa.
Mas a humanidade nem sempre sabe respeitar e, por isso, ela quebra a harmonia da razão neste planeta. Para que possamos, então, gozar dos direitos humanos fundamentais da liberdade e da igualdade, criamos um sistema chamado Justiça que se inspira na Justiça como valor universal. Neste mundo, portanto, a Justiça parte do pressuposto que, porque somos todos filhos de Deus, tanto quem acusa quanto quem é acusado têm razão. Logo, entre nós, seres humanos, a Justiça é processo e não pode ser outra coisa. Esse processo é estabelecido pelo Direito, cujo objetivo principal é fazer Justiça através da instituição que chamamos de Justiça.
O processo não é a petição inicial, a acusação. O processo também não se resume à decisão dos juízes. O processo é um método preestabelecido pelo Direito que engloba a acusação, a análise de cabimento dessa acusação pelos juízes, a informação desse processo ao acusado pelo juiz, a defesa, o debate sobre os argumentos e as provas, o julgamento e, ainda, o debate acerca da necessidade de revisão do julgamento. O processo é tudo isso. Portanto, acusar ou ser acusado por qualquer um, por qualquer motivo, faz parte do exercício da Justiça no Estado Democrático de Direito. Pelo contrário, quando um acusador faz propaganda da sua acusação como ato de Justiça, pratica, na verdade, uma injustiça, pois, se a Justiça está no processo, essa propaganda é maldosa e quer enganar.
Vale-se da máquina e da estrutura do Estado brasileiro para propagar apenas a acusação, a petição inicial, como se ela fosse uma medida definitiva, como se ela desde já refletisse o resultado de um processo que nem começou; quer dizer, alardear uma petição sem a existência da defesa do acusado, a contestação, como medida heroica e de salvação popular é, em última análise, praticar um crime, o crime de abuso de autoridade. O Ministério Público Federal, quando faz propaganda em um veículo digital pago pelo povo somente para alardear que protocolou uma acusação contra quem quer que seja, faz uso indevido de recursos públicos contra o próprio público, que é dono dos recursos. Esse alarde de uma acusação serve para intimidar e manchar a reputação daquele que é acusado. É, em resumo, um ato antidemocrático, de má-fé, abusivo, leviano e que pretende levar a população a engano. E, porque é abusivo, é um ato ilícito, um exercício de injustiça praticado com o dinheiro do pobre brasileiro pagador de impostos.
Os serviços prestados à sociedade brasileira pela Jovem Pan preenchem muitas páginas da história do Brasil desde o século passado. Mas, somente agora, está sob ataque – justamente por ousar ser aquilo que se espera de um veículo de imprensa: ser livre, independente e ser sempre crítico. Este editorial não se resume em uma defesa da Jovem Pan. É uma defesa para que você não seja calado. Não importa se você é de esquerda, direita, centro ou apolítico: defender o fechamento de um veículo de imprensa é um atentado contra a democracia que somente se viu em regimes fascistas, nazista, soviéticos, enfim, toda sorte de regimes autoritários. Diga não à censura hoje para não se envergonhar de ser brasileiro amanhã.
Samir Keedi, da Academia Paulista de História
Certamente o Brasil deve muito a muitos ao longo da sua história. Mas, a JK e JB deve mais que a outros. Pena que muitos, ao contrário, devem demais ao país e seu povo. Mas, ao invés de se envergonharem, se julgam heróis. O inferno saberá puni-los. Pena que muito tarde. Em que muitos terão pago boletos sem merecer.
JK foi um baluarte em muitas coisas, mas, trazer para cá a indústria automobilística e ocupar o país, é o suficiente, e são impagáveis. Alguém consegue imaginar o Brasil sem a indústria automobilística, e seus satélites produzindo peças para as montadoras? O desenvolvimento que ela produziu, e suas muitas dezenas de milhões de carros aqui fabricados? E a infinidade de empregos gerados? Se não somos um grande país, mas apenas um país grande, imagine-se sem essa fabulosa indústria.
Já vimos muitos criticarem e atribuírem a JK a quase morte da nossa ferrovia e nossa dependência do transporte rodoviário. Uma coisa nada tem a ver com a outra. Não são excludentes. Mas, complementares, o que poucos percebem. Os governos seguintes é que trataram mal essa questão e acreditaram que o transporte rodoviário, e não o ferroviário, é que seria o ideal para o país. Ledo engano. Para um país continental, foi a pior escolha possível. O transporte rodoviário é para curtas distâncias, distribuição de carga e apoio aos demais modos de transporte.
O transporte rodoviário, como se sabe, é o melhor de todos os modos de transporte. O único que pode fazer tudo sozinho e não depende de outro modo qualquer. Todos os demais dependem dele. Inclusive a tão necessária Intermodalidade e a Multimodalidade. Mas, sabemos que ele é o mais caro entre todos os modos de transporte, como já escrevemos e mostramos a nossos alunos e interlocutores diuturnamente, portanto, para ser usado com parcimônia, o que não ocorre em nossas plagas.
Seu outro ponto forte, até mais, foi a mudança da capital do país, da "civilização para o nada" como muitos apregoavam. Já cansamos de ver ataques a ele por isso, até hoje. Obviamente uma visão totalmente equivocada de quem pensa assim. O país era uma faixa de 200 quilômetros do mar, e praticamente nada mais. Com todo o restante quase nada servindo. Ele ocupou o país integralmente. Será que sempre foi mais fácil pensar apenas na maior distância da capital, do que na posse total?
Com a capital no centro do país, proporcionando a ocupação dos nossos 8,5 milhões de quilômetros quadrados, o efeito agrícola foi avassalador. O tamanho da nossa agricultura hoje é invejável, com alta produtividade. E alimentando um bilhão de pessoas ao redor do mundo. Quantidade que ainda pode crescer muito. Alguém consegue imaginar isso tudo sem criticar? Se ficássemos restritos à faixa litorânea, o que seria hoje do país? Hoje tudo é Brasil, e no passado isso era apenas uma utopia. Somente a coragem de JK poderia ter proporcionado esse feito.
Nossa agropecuária é, hoje, invejável e exemplo para o mundo. Esperamos que assim continue e melhore, pois sabemos que muitos querem destruí-la. Tanto interna como externamente.
A JB devemos muito também. Pela primeira vez na história vimos um patriotismo como "nunca antes neste país". Um país que sempre foi tratado como se não existisse para cada brasileiro. Que pensava no país apenas como o que ele poderia lhe dar. Inversão do que apregoava JFK em seu governo nos EUA. Quando os democratas eram mais patriotas e pensavam no país. Não que não pensem mais, mas, eles mudaram muito, para pior. A esperança dos EUA são os Republicanos, para que continuem como são.
JFK gravou na história a sua célebre "Não pense o que seu país pode fazer por você, mas, o que você pode fazer por seu país". Inverso dessas terras tupiniquins, em que sempre valeu "Não pense no que você pode fazer por seu país, mas, o que seu país pode fazer por você, e sempre, mais ainda, o que o país pode fazer "por mim", e se não fizer, eu farei". Hoje somos um país bem mais patriota.
Além do que, JB governou sem pensar no que outros fizeram quanto a obras paradas e desvios. Obras que sempre começavam, enriqueciam o governante, e depois eram paralisadas. Infinitas obras foram retomadas, não importando quem as tinha paralisado. Valia o país, o povo que era beneficiado.
Seu ministério, reduzido de praticamente "Ali Babá..." para 22. Ainda muito, mas, bem menos. E, com nomeação de técnicos, sem cabide de emprego. Claro que sempre há erros, mas, não como antes ou depois, em que nos ministérios só há erros e mistérios. Hoje voltamos a ressuscitar "Ali Babá..." com ministérios sem sentido, sendo que, em seis meses de governo, metade dos ministros não foram recebidos nem despacharam com o presidente, segundo a imprensa.
Estradas foram asfaltadas e melhoradas. Ferrovias receberam atenção que não mais estavam acostumadas a receber a cabotagem voando. Atenção a portos, aeroportos, privatizações, etc. Mudando um pouco o cenário logístico quase desolador e que vinha piorando.
Muito ainda se poderia falar aqui desses dois importantes personagens da nossa história. Em especial de JB, fenômeno que o país nunca conheceu antes. Ninguém jamais arrastou multidões como visto nos últimos anos. Caso único na nossa história. Aliás, em certos aspectos, pobre história, com equívocos enormes, em que parece que aqui foram criadas as fake news. É fake news no descobrimento. Na proclamação da independência. Na proclamação da república, etc., uma vergonha.
Mas, preferimos ficar apenas na história recente, e no transporte e logística, partes da nossa área de atuação profissional, em que sabemos como as coisas se passaram antes, durante e agora novamente.
* O autor é empresário e titular da Cadeira Nº. 4 da APH-Academia Paulista de História - SKE Consultoria Ltda
Leandro Ruschel
Pedro Doria é um dos teóricos da censura, no Brasil.
Que um sujeito dessa estatura moral e intelectual tenha alguma influência no debate público é um sinal dos tempos. Mais grave ainda é que ele seja tratado como "liberal".
Em artigo no Globo, Doria aparentemente muda de posição sobre a censura e se coloca contra o bloqueio de contas do podcaster Monark, determinada pelo ministro Moraes.
"Deixa o Monark falar bobagem", afirma o valente na chamada.
O primeiro parágrafo explica o caso:
"O ministro Alexandre de Moraes, do STF, determinou na quarta-feira o bloqueio de todos os perfis de redes sociais de Bruno Aiub, o Monark. Como ele é um comunicador que vive de se apresentar pelas redes, não é apenas uma ordem de censura prévia. É também uma proibição de que ele trabalhe e se sustente. É uma decisão grave. Censura prévia é proibida pela Constituição. Cláusula pétrea. Jair Bolsonaro não é mais o presidente. As eleições passaram. Qual o sentido de calar Monark?"
As primeiras linhas sugeriam alguma luz surgindo na sua caixola, mas ela logo se apaga com o "Bolsonaro não é mais presidente e as eleições passaram". Ora, quer dizer então que a censura deve ser aplicada durante as eleições para impedir a expressão de quem Doria não gosta? Pois é exatamente durante o processo eleitoral que a liberdade de expressão é mais importante, já que o país definirá o seu rumo!
O "liberal" segue então uma linha de argumentação sobre a liberdade não ser um direito absoluto nas redes e basicamente conclui que John Stuart Mill está ultrapassado. A liberdade de expressão de Mill serviria para uma época que as ideias eram apresentadas de forma mais lenta, não agora, no turbilhão da internet, pois:
"...no ambiente de caos, manipulando desinformação de milhão em milhão de likes, um autoritário se reelege, e nessa morrem 100 mil numa pandemia, uns tantos milhões de hectares de floresta são derrubados, talvez um país vizinho termine invadido. Perdemos a democracia. Então, sim, em alguns momentos pode ser que se justifique maior rigor para conter a desinformação e proteger da morte a democracia.
Mas a eleição passou. Não é à toa que nossa Constituição, em geral verborrágica, vede a censura prévia com um período tão simples: “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Ponto, parágrafo. Só isso e basta."
Em primeiro lugar, já não existe "liberdade absoluta de expressão" porque seus limites estão definidos em lei. O problema é outro: estão sendo criados novos limites sem nenhuma base legal, sob argumento subjetivo de "defesa da democracia".
Sugere Doria que a Constituição e os direitos fundamentais devem ser suspensos por um período, em que o poder ficará a cargo de líderes benevolentes que isolarão a ameaça. Assim que o problema for "resolvido", os direitos voltariam a valer.
Resumindo, Doria defende a imposição de uma ditadura para salvar a democracia. Ele e outros teóricos da censura defendem esse arranjo porque acreditam que serão eles a definir o que pode ou não pode ser expressado, quem deve ou não deve ser perseguido, tudo pensando no bem da sociedade, claro...
"Deixa o Monark falar bobagem. É hora de deixar a democracia funcionar com suas próprias pernas. Confia."
Assim ele encerra o seu panfleto contra a liberdade de expressão, se colocando no posto de censor da República. "Deixa o Monark falar bobagem". E o Allan dos Santos, não?
Coitado, o sujeito parece realmente acreditar que a concentração de poder é um gênio que pode ser colocado de volta na lâmpada assim que utilizada "para o bem". Aprenderá, muito cedo, provavelmente sentindo na própria carne, que uma vez perdida a liberdade, ela demorará muito para ser recuperada, se é que um dia será.
Alex Pipkin, PhD
O ano de 2023 marca os 300 anos de aniversário do maior de todos os pensadores, Sir Adam Smith.
A data é bastante oportuna para reflexões sobre o pensamento smithiano, dentro do qual destaco dois aspectos fundamentais: a natureza do ser humano e as fontes do crescimento econômico e social.
Definitivamente, Smith foi um ferrenho defensor das vitais liberdades: individual e econômica. Ele pregava a imperiosa necessidade das liberdades individuais, exercitadas por meio da racionalidade.
É por demais conhecido que Smith sustentava a tese do autointeresse, explicada por meio da analogia da mão invisível do mercado. Numa economia concorrencial, a busca pelo interesse individual, resultaria no aumento do bem comum, fazendo com que uma nação alcançasse o crescimento econômico e social de forma mais rápida.
Evidente que antes do seminal A Riqueza das Nações (1776), em 1759, no livro Teoria dos Sentimentos Morais, Smith argumenta que os indivíduos são dotados de uma gama variada de sentimentos que estão inclinados ao seu interesse próprio, embora se preocupem com os sentimentos de outras pessoas em função do seu espectador moral imparcial.
Ele nos faz pensar no protagonismo do indivíduo sobre o abstrato coletivo, pontuando que a verdadeira igualdade se fundamenta, especialmente, na capacidade de todos os seres humanos tomarem decisões por si próprios.
Em especial, na vida empresarial, uma ideia inovadora, e a respectiva materialização em produtos e serviços para solucionar os problemas dos consumidores, nasce na mente de um indivíduo curioso e criativo, num processo que é espontâneo e imprevisível. Tal processo é desenvolvido e aperfeiçoado por meio de um conjunto de pessoas com habilidades e competências distintas e especializadas, capazes de gerar novos insights criativos para melhorar essa oferta competitiva.
No entanto, a história da engenhosidade humana demostra que a natureza das ideias inovadoras e do processo criativo é, de fato e muitas vezes, muito particular e incomum. Nesse respeito, a dinâmica imprevisível e, portanto, flexível do processo criativo, demanda aprimoramentos que são alcançados através do conhecimento especializado e da colaboração de uma coleção de pessoas. Num processo criativo que redunde em soluções inovadoras e úteis para a sociedade não pode haver à imposição da ditadura das ideias e do comando de um único rumo a seguir. Aqui é também premente a existência da liberdade individual para o bem do processo de criação. Enfim, Smith nos relembra da essencial importância do indivíduo, num momento em que a narrativa do “social”, estilizada, emocionalmente embala legiões de pessoas.
No que diz respeito às genuínas fontes do crescimento econômico, Smith afirma que a dinâmica do processo de crescimento decorre de uma mudança estrutural que é, por natureza imprevisível, dependente da especialização e dos livres mercados, em especial, da livre competição.
Para ele, a competição é socialmente justa, na medida em que impediria que houvesse a monopolização dos ganhos da especialização de mercado somente para algumas empresas e, portanto, só para alguns indivíduos.
Assim, a concorrência, quanto mais livre e intensa, mais beneficiaria a todas as pessoas de um espaço social.
Mais de 300 anos depois, muito distintamente dos discursos populistas e ideológicos em voga, ele reaviva o papel saudável da economia de mercado e da concorrência.
Seguramente, não são essas que geram as propaladas “desigualdades sociais”. Factualmente, é o declínio da concorrência, por conta da fome voraz por benefícios próprios ilícitos, e vantagens para determinados grupos de pressão e interesse, que faz bradar vozes supostamente bom-mocistas em nome do povo, verdadeiramente populistas e coletivistas, por intervenções regulatórias estatais, que substituem, em vez de aumentar a concorrência e o bem estar das pessoas.
Smith merece ser sempre comemorado. Sempre é um altivo alerta para a permanência das liberdades individuais, para a liberdade nos mercados e a concorrência, e para a elucidação do papel central do indivíduo sobre o coletivo, quando se trata da busca e do alcance do crescimento econômico e social.
Viva Sir Adam Smith!
Katia Magalhães
Se, como todos sabem, as palavras voam, e só a escrita permanece, qual o propósito de deitar estas linhas sobre a entrevista de uma autoridade? Em que pese a sabedoria desse velho adágio, a comunicação verbal adquire relevância sempre que envolve alguém imbuído de poderes virtualmente ilimitados e que traduz autêntico “sincericídio” sobre o modo como o poderoso em questão tem exercido sua posição de mando e pretende continuar a fazê-lo.
Em evento recente organizado pela revista Piauí, o ministro Alexandre de Moraes tornou a monopolizar os holofotes e concedeu uma entrevista divulgada pelo periódico sob a manchete “MORAES DIZ QUE EM SEIS MESES JULGARÁ CASOS MAIS GRAVES DO 8 DE JANEIRO”[1]. Trocando a toga pelo manto de suposto justiceiro, Moraes, erigido, logo no início da reportagem, à figura que “personificou o esforço do Judiciário em lidar com a extrema direita organizada” – afinal, personalismo pouco é bobagem! -, começou por gabar a própria eficiência, segundo ele, evidenciada pelo acúmulo de processos sob sua condução. Em relação a seu burnout, afirmou, em tom quase irônico: “não ganho mais por causa disso, eu não trabalho menos e sou vigiado 24 horas por dia. Bom não pode ser.”
No entanto, a contrapartida a todo o “heroísmo” alexandrino é a crescente concentração de poder nas mãos de alguém enxergado, por boa parte da sociedade, quase como o juiz único do Brasil. Inebriado pela ânsia de determinar o que pode ou não ser dito e o que pode ou não ser feito, Moraes tem apreciado condutas de pessoas que, à luz da Constituição e das leis, não estariam sob sua jurisdição, como foram os casos dos empresários ditos “golpistas de Whatsapp”, das plataformas digitais, dos governadores Ibaneis e Zema, do ex-ministro Anderson Torres e tantos outros, discutidos em detalhes neste espaço. Tudo isso sob o silêncio conivente de seus pares e do Senado, ao qual cabe a função institucional de contenção de abusos da cúpula judiciária. Ou, pelo menos, caberia…
Indagado por jornalistas sobre a receita para a aceleração no ritmo de julgamento dos acusados de participação nos atos de vandalismo do 8 de janeiro, Moraes admitiu que as condutas de cada invasor não serão analisadas individualmente, pois “é um caso de condutas múltiplas. Quem estava lá participou. Não preciso dizer que fulano quebrou a cadeira A ou riscou o quadro B. Estar lá [invadindo prédios públicos] já é crime.” Em relação a esse tópico, me permita, caro leitor, uma breve digressão sobre uns poucos tecnicismos, apenas para que você seja capaz de avaliar, por si mesmo, toda a extensão da “singularidade” da manifestação do togado.
Em situações em que vários indivíduos se reúnam para a prática (“concurso de pessoas”) de um certo delito, e, ainda, nas hipóteses em que uma pessoa, por meio de mais de uma conduta, incorra em mais de um crime (“concurso de crimes”), cabe ao Ministério Público, ao propor a ação penal, descrever os fatos e atribuir a cada agente a prática de uma ou mais infrações, conforme evidenciado pelas provas. Da mesma forma como o julgador tem de absolver ou condenar cada réu por uma ou várias condutas bem definidas, até mesmo para poder fixar a pena cabível. Isso importa, sim, na obrigatoriedade imposta a qualquer magistrado de afirmar se “fulano quebrou a cadeira A, ou riscou o quadro B”, e, acrescento ainda, se “fulano quebrou a cadeira A e riscou o quadro B”. Ora, qualquer leigo entende que a deterioração de objetos configura crime de dano, diferente do delito da invasão em si, e que um agente que tiver invadido e destruído dezenas de antiguidades não poderá ser punido da mesma forma que um invasor destruidor de um único objeto acessório de valor ínfimo, e, muito menos, do mesmo modo que alguém que tiver invadido sem nada danificar!
Tal conclusão óbvia decorre do princípio da individualização da pena, adotado em todo o mundo democrático e no Brasil[2], segundo o qual, no âmbito criminal, cada pessoa só pode responder por sua própria conduta, devendo o julgador levar em consideração todas as especificidades, caso a caso. Mas quem disse que o redentor da nossa democracia, em sua luta gloriosa contra extremistas, tem de se curvar aos ditames constitucionais?
O filme “O homem que não vendeu sua alma” retrata o período final da trajetória de Sir Thomas More, notável intelectual do século XVI, jurisconsulto e membro da corte de Henrique VIII, no tormento de seus últimos anos. Católico fervoroso, não apoiou o divórcio de seu soberano, as novas núpcias deste com Ana Bolena e, muito menos, a ruptura com Roma. Para manter íntegras as suas liberdades, em particular a de opinião, renunciou a seu cargo de chanceler e recolheu-se à vida simples no campo. “Não importa o que eu acho, mas que eu acho”, afirma ele em uma das primeiras cenas que põem em xeque a faculdade do livre pensar.
Ciente da sua impotência em combater um regime absolutista e ainda fiel à velha amizade com Henrique, Sir Thomas não se entregou a qualquer ataque frontal ao monarca, mas lutou, até o fim, pelo seu direito ao silêncio, do qual nenhuma lei o privava. Aliás, tamanho o apego do jurista à legalidade estrita que, em um dos diálogos mais emocionantes, chegou a afirmar que “daria ao diabo o benefício da lei, em prol de sua própria segurança.” Lançou mão de uma hipérbole para asseverar sua convicção de que o pior dos canalhas deveria ser sujeito a um julgamento justo, ao amparo da legislação vigente, para que ele mesmo (Sir More) se sentisse seguro de que também o estaria. Eis aí a própria definição de segurança jurídica, que reside na capacidade, garantida indistintamente a todos, de prever as consequências (inclusive as penalidades) para suas condutas.
Contudo, na distante Inglaterra, onde prevaleceu o desejo do monarca, Sir Thomas pagou com sua vida o preço pela discordância, tendo sido preso e executado por “traição dolosa à supremacia real”, ou melhor, apenas por calar.
Sempre que o império da lei é substituído pelo dos homens, ninguém pode se sentir seguro. Até quando suportaremos ver, entre nós, o julgamento de réus sem especificação de condutas, enquanto sentenças contra criminosos notórios são anuladas por firulas? Censuras e parlamentares defenestrados por fundamentos inexistentes? Que o exemplo de Sir More nos inspire, e que os soberanos da atualidade tenham seus caprichos freados pelas instituições, acionadas mediante pressão de uma sociedade fortalecida e mais madura.
[1] https://piaui.folha.uol.com.br/moraes-diz-que-em-seis-meses-julgara-casos-mais-graves-do-8-de-janeiro/
[2] CF: Art. 5 – XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado
* A autora é advogada formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e MBA em Direito da Concorrência e do Consumidor pela FGV-RJ, atuante nas áreas de propriedade intelectual e seguros, autora da Atualização do Tomo XVII do “Tratado de Direito Privado” de Pontes de Miranda, e criadora e realizadora do Canal Katia Magalhães Chá com Debate no YouTube.
** Artigo reproduzido do site do Instituto Liberal, em https://www.institutoliberal.org.br/blog/justica/a-cada-fala-do-imperador-togado-maior-a-inseguranca/