Percival Puggina

08/09/2012
Os senadores da República têm em mãos um projeto de Código Penal para o Brasil. Os leitores que já se detiveram sobre o texto terão percebido: o melhor destino dessa peça é o recipiente de lixo orgânico. Do reciclável periga retornar. Pergunto: como acolher por bom um projeto que estabelece pena de um a quatro anos para quem se omitir (art. 388) de prestar socorro a um animal - vale dizer, qualquer ser vivo, pluricelular, heterotrófico, etc, etc, etc. - e pena de um mês com máximo de seis para quem se omitir de socorrer uma criança extraviada (artigo 132)? Ou ainda, pode tramitar como coisa de serventia uma proposta de Código Penal que quer pôr na cadeia por até quatro anos quem modificar um ninho de ave (art. 388), mas transforma em elástico vencido e desbeiçado as restrições constitucionais e penais referentes ao aborto, com a inclusão da certificada incapacidade materna para cuidar do bebê (art. 128)? Tratando-se de seres humanos, não tem ninho, não tem nada: vai no útero e mata o feto. Não é à toa que o professor Miguel Reale Júnior qualifica o projeto inteiro como uma obscenidade. Alguém dirá - Bem, isso tem conserto - mas o projeto não pode ser melhorado pelos motivos que vêm sendo denunciados por eminentes juristas e criminalistas em todo o país, alarmados com as falhas técnicas, vocabulário errado, definições imprecisas e desproporcionalidades que berram dentro do projeto. Entenda-se. Precisávamos de um novo Código Penal. O velho, de tão remendado ficou irrecuperável. Era um caso perdido. Pois bem, assim como o velho não tinha solução, tampouco o anteprojeto proposto pelos notáveis de José Sarney tem compostura possível. A intenção de votar aquele calhamaço de 545 artigos até o dia 4 de outubro é uma total irresponsabilidade! E a ideia de acrescer 30 dias a esse prazo, também. Não se diga que me excedo. Não há qualquer exagero ou excesso em afirmar que esse projeto colide com valores, conceitos, senso de proporção e prioridades bastante consolidadas na sociedade brasileira. Prioridades, senso de proporção, conceitos e valores com os quais estamos habituados a lidar e fazem parte do nosso senso de justiça. No entanto, tudo isso vem sofrendo o ataque sistemático de grupos sociais, tão minoritários quanto influentes e organizados. O projeto do novo Código Penal reflete as posições desses segmentos, cada vez mais interessados em agir sobre as instituições nacionais para moldá-las segundo seus gostos e desgostos. As evidências de que há uma estratégia em curso enchem páginas de jornais e raros são os formadores de opinião dela divergentes. Como os eleitores devem ter percebido, estou falando do politicamente correto, ao qual o projeto faz ensandecidas concessões, e de uma visão de Estado que a opinião pública rejeita. É por causa de ambas que o projeto legaliza o consumo de drogas e o pequeno tráfico. É por igual motivo que o projeto envolve com o manto da exclusão de crime o ato terrorista praticado individual ou coletivamente por pessoas movidas com intuito social ou reivindicatório, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à finalidade (art.239). O projeto fala a voz desses pequenos grupos de enorme influência, malgrado sua dissintonia com o Brasil real, ainda não contaminado pelo relativismo e pela degradação do humano em todas as suas dimensões. Zero Hora, 08/09/2012

Percival Puggina

07/09/2012
O velho totalitarismo tornou-se mestre do disfarce. Durante alguns anos, se fez de morto. Ganhou sapato novo. E chegou ao poder no dia 1º de janeiro de 2003. Hoje, desfila de terno Armani. Se você, leitor, é daqueles que ainda imaginam o totalitarismo parado numa esquina, maltrapilho, barba por fazer, banho por tomar, distribuindo panfletos contra os patrões e seu sistema, engana-se. O totalitarismo está no poder e sua panfletagem se dá pela web. Conta com um exército de blogueiros e editores de jornais eletrônicos que fazem a mesma coisa de antes com eficiência muito maior. A velha tática da infiltração para aparelhamento, que outrora ocorria de baixo para cima, agora é feita desde cima, onde há dinheiro à vontade. Totalitarismo por quê? talvez esteja se perguntando o leitor destas linhas. Afinal, dirá, o regime é democrático, há eleições e as regras do jogo político são cumpridas. De fato, mas cuidado com os disfarces. Não espere o totalitarismo, depois dos vexames que passou mundo afora, exibindo ao público toda sua hórrida nudez. Tampouco o imagine entrincheirado numa encosta de morro, brincando de Fidel Castro e Che Guevara. Nada disso. Renovado, tornou-se sutil. Para reconhecê-lo, é necessário estar atento aos detalhes, observar suas principais afeições políticas, verificar quais são os governantes aos quais dedica seus abraços mais calorosos, o que diz nos fóruns onde solta o verbo, ler as leis que patrocina e o desapreço que manifesta ao cristianismo, à família e à economia de mercado. Poderia desfiar exemplos, contar casos acontecidos em debates de que participei ou assisti. No entanto, meu assunto aqui diz respeito a algo novo, a uma recente evidência do que estou afirmando. Todos sabemos o quanto a manipulação do vocabulário serve aos projetos totalitários. Nada era menos republicano, democrático e popular do que as repúblicas democráticas e populares nascidas no século 20. Na política, o domínio do vocabulário serve esplendidamente à construção da hegemonia e carimba o passaporte do Príncipe para o poder. Gramsci percebeu isso e, aludindo a Machiavel, disse que o novo príncipe é o partido. Pois bem, se o leitor for atento ao que se fala nos blogs e sites de relacionamento para onde convergem milhões de pessoas no país, por certo já deparou com a palavra PIG. Se não sabe o que é isso, eu traduzo. PIG, que também significa porco em inglês, é a sigla de Partido da Imprensa Golpista, expressão criada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim para designar a mídia de oposição ao governo. Ora, ora, caros leitores. Se o jogo político está sendo jogado em conformidade com as regras. Se os quartéis estão parados como água de poço tampado. Se não há um único projeto de impeachment tramitando no Congresso Nacional. Se a oposição, escangalhada, em vão procura um líder. Se nenhum movimento de massa faz aquilo que o Partido dos Trabalhadores era useiro e vezeiro nas suas campanha de Fora Sarney, Fora Collor, Fora FHC. Onde, raios, estão os sinais de golpe? A expressão PIG, criada pelo Amorim, prontamente acolhida pelo totalitarismo de terno Armani e seus exércitos, só se explica pela dificuldade de conviver com a crítica, com a oposição, com a fiscalização da imprensa livre, com um judiciário independente e, portanto, com a própria democracia. Voilá! - conforme queríamos demonstrar. Nem precisaria rejeitar tudo isso junto para ser totalitário. A palavra PIG, por fim, me remete às páginas policiais, onde, cotidianamente, se leem matérias sobre crimes passionais cometidos por pessoas que não suportam não serem amadas. Os totalitários tampouco conseguem conviver com quem não lhes presta veneração.

Percival Puggina

01/09/2012
À medida em que transcorrem os votos dos senhores ministros no julgamento do Mensalão, digo, da Ação Penal 470, dois fenômenos se vão configurando. No primeiro, evidencia-se a existência, no processo, de um sujeito oculto. Tão esperto, o sujeito, que sequer precisou de advogado. Ele é doutor. Doutor honoris causa. No segundo, vai desaparecendo o sorriso nos rostos dos advogados de defesa. Desenham-se condenações no horizonte de quase todos os réus. Se não uma sentença para ver o sol nascer quadrado (quando forem deduzidas as prescrições, tudo somado e ponderado, pode não sobrar muita coisa), ao menos uma sentença perante a opinião pública. E, para os políticos, um longo período sem foto em urna eletrônica. Entendo, perfeitamente, todos os papéis desempenhados pelos atores do julgamento. Não os vou descrever. Fixar-me-ei nos trabalhos dos defensores. Queimaram pestanas na elaboração de suas teses. Perscrutaram bibliotecas para lhes conferir suportes jurídicos de boas fontes doutrinárias. Examinaram minuciosamente provas e perícias. Contrapuseram objeções. Construíram versões. Amealharam documentos. E escreveram. Quanto escreveram! Teses de defesa e petições que se acresciam a outras teses e petições, formando pilhas e avolumando os terabytes do processo. E as fadigosas viagens a Brasília para juntada de documentos, audiências privadas e públicas? Anos a fio. Eu entendo esses advogados em sua - por enquanto, ao menos - crescente frustração. Nem sempre terão antevisto um horizonte tão nubloso para seus clientes. Há algo, contudo, que me escapa à compreensão. Os advogados dos réus são pagos e, ao que sei, muito bem pagos. Entretanto, na web, nos blogs, nas redes sociais, milhares de pessoas executam com denodo um não menos volumoso trabalho de convencimento da opinião pública. Atuam, com desassombro, na defesa dos réus e do sujeito oculto. Valem-se de toda retórica possível para contestar a denúncia e seu acolhimento, os fatos, as perícias, a razoabilidade, a enorme lista de ocorrências cujo simples enunciado escancara o caráter criminoso das condutas de seus defendidos. Não silenciaram, sequer, ante as sentenças já prolatadas: insubmissos, refutam o juízo quase unânime e demolidor dos ministros do STF. Repetem sem fadiga, que os fatos não existiram e que os réus são inocentes como donzelas quinhentistas. Note, leitor, que tais defensores exaurem-se graciosamente. Fazem tudo isso, de graça. Pro bono, como diriam os profissionais do Direito. Em nome, apenas, do companheirismo, da ideologia, da causa. São ou não são uns cidadãos extraordinários? O herói deles, o seu varão de Plutarco, chama-se Dias Toffoli. ______________ * Percival Puggina (67) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões

Percival Puggina

26/08/2012
GATO POR LEBRE Alguém já viu, na propaganda da candidata do PCdoB em Porto Alegre, alguma vez, o símbolo da foice e do martelo? Alguma vez, em destaque, o nome do próprio partido? Eu não vi. O foco está sempre posto no nome da candidata, na letra M e no número 65. Por que será? E quando algum dos outros candidatos vai apontar para essa escandalosa ocultação que a candidata faz de sua ideologia?

Percival Puggina

26/08/2012
Pois não é que dia desses me peguei assistindo o programa Na moral? Por Deus. Estava ali, deitado, zapeando, e me deparo com Pedro Bial entrevistando convidados. Como peguei o bonde andando, presumo que a pauta fosse sobre arranjos de convívio sexual. Um terreno complicado, onde há de tudo. E havia, mesmo, um pouco de quase tudo. A personagem central da primeira entrevista que assisti era uma senhora muito dadivosa que se alternava entre dois cônjuges. Ora com um, ora com outro. Levava a vida assim, contando com o consentimento de ambos, por sinal, presentes à entrevista. Um dos homens, mesmo sem ser chamado às falas a respeito, fez seu comercialzinho aduzindo que, pessoalmente, não descartava relacionar-se, também, com outros do mesmo sexo, desde que fossem interessantes. Enquanto assistia aquilo, fiquei pensando que, muito em breve, com a multiplicação de tais casos, o Supremo Tribunal Federal será chamado a sacramentá-los. E o fará, numa sessão em que o Congresso, lá do outro lado da praça, ouvirá doutas repreensões por silenciar ante assunto de tamanha relevância e interesse social. Assim, face à omissão legislativa, em nome dos princípios da liberdade, da igualdade e da dignidade da pessoa humana, o STF tomará em suas mãos a deliberação sobre os aspectos jurídicos desses enroscos sexuais. São coisas que existem desde que o mundo é mundo. Já são tema para novela. Novidade é a colher torta do Estado se metendo no meio. Aliás, já existem advogados da tese. E em Tupã, interior do São Paulo, li outro dia, um conluio desse tipo foi formalizado em cartório. Seguiu-se uma entrevista sobre suingue (eis aí mais uma, STF!). No caso, o marido levava a esposa para assistir seu desempenho com outras mulheres em festas de casais liberais. Surpreendentemente, ele não admitia a recíproca por ser muito ciumento... Noutro bloco, com som e imagem distorcidos, o Bial ouviu mulheres e homens, casados regularmente, que mantinham relações extraconjugais clandestinas valendo-se, para tanto, de sites de relacionamento. Por fim, a produção do programa arranjou-lhe um petisco adicional, uma extravagância, coisa inaudita, beirando ao escândalo - tira as crianças da sala, meu bem!: um casal formado por homem e mulher (o esclarecimento é politicamente corretíssimo), que viviam seu matrimônio há 42 anos. Quarenta e dois anos? E nunca pularam a cerca? Nunca, segundo informaram. Do jeito que a coisa anda, tratou-se, obviamente de um programa banal, tratando tais temas como se banalidades fossem. Nada de novo em qualquer das situações focadas. Coisas melhores e piores são exibidas todos os dias. E ninguém tem nada que ver com a intimidade alheia. O completo absurdo, o motivo pelo qual escrevo, veio pouco depois, no encerramento do programa. O apresentador encarou a câmera, fez um discurso resumindo cada uma das situações que apresentara e sublinhou o surpreendente feito do casal casado, fiel, a caminho das bodas de ouro. E arrematou com uma pergunta que, apesar de dirigida aos telespectadores, fustigou a aparentemente insólita situação vivida por ambos: Que tal ser fiel ao desejo? Ao fechar o programa com essa interrogação, o apresentador proclamou sua opção contra o casamento, contra a fidelidade conjugal, e optou pela degradação do humano. Fidelidade ao desejo, conforme proposto pelo jornalista, se expressa numa vida desregrada, sobre a qual não se impõem os freios da razão e do amor. ZERO HORA, 26/08/2012

Percival Puggina

25/08/2012
Tenho acompanhado, no limite das minhas possibilidades de tempo, o julgamento do Mensalão (ooops!) Ação Penal 470. Aliás, não gosto do apelido. Ele desvia a atenção dos cidadãos e esconde problema ainda maior. Refiro-me à prática também delinquente, recorrente e transparente na política nacional: governos compram base parlamentar. O Mensalão foi apenas uma modalidade. Restam muitas outras. Negá-lo seria cinismo em estado puro. A que mais servem as emendas parlamentares no mecanismo vigente? O que é o disputadíssimo rateio de postos da administração pública direta e indireta entre os partidos políticos? O que estava por trás de todos os escândalos que derrubaram meia dúzia ou mais de ministros no início do governo Dilma? Seja como for, alguns ratos acabaram apanhados na desregulada e displicente ratoeira do sistema. E temos aí o julgamento de seus réus. Levei um susto quando, no primeiro ato, Márcio Thomaz Bastos, de improviso, suscitou o desmembramento do processo e o ministro Lewandowski sacou da pasta, também de improviso, alentada adesão à tese, enchendo de jurisdiquês 63 páginas da minha paciência. O ministro pretendia espargir por comarcas dispersas do país 35 réus com crimes interconectados. Delírio, puro delírio. Mas era uma tese, que, acolhida, acabaria com o processo ali mesmo, e José Dirceu seria julgado sabe lá Deus onde. Aleluia, fomos em frente! Ouvi Joaquim Barbosa e as discussões preliminares em torno do modo como ele havia organizado sua exposição. Em quase todas as falas dos ministros, aliás, fico com a impressão de haver script demais para pouco argumento. Muito falatório para pouco drama, por exemplo, no caso do fatiamento proposto pelo relator. Uma coisa assim tipo novela da Globo, que enche o roteiro de lero-lero. Aquele ritmo de trabalho, numa empresa privada, punha todo mundo na rua no segundo dia. Mas vá que seja. A boa justiça não tem pressa. A má justiça tampouco. Quando Ricardo Lewandowski começou a falar, me veio à mente seu currículo de ovo jurídico chocado no ninho petista de São Bernardo, em cujas administrações foi Secretário de Governo e Secretário de Assuntos Jurídicos. De São Bernardo, em lista tríplice da OAB local, chegou a Juiz de Alçada do TJ de São Paulo, de onde saltou, por indicação de Mario Covas (ora vejam só!), para o TJ/SP. No pulo seguinte, foi nomeado por Lula para o STF. Lembrei-me disso e esperei o julgamento do primeiro petista. Bingo! Lewandowski descantou o verso. Enquanto escrevo este artigo, especula-se sobre os dois próximos votantes - Ministra Rosa Weber e Ministro Luiz Fux. Nomeados por Dilma. Terá Dilma decidido assuntos tão importantes para Lula sem ouvi-lo? Terão aberto voto antes da nomeação? Conjeturas, conjeturas... Cabíveis, no Brasil. Vem-me à mente o fato de a ministra ser oriunda da Justiça do Trabalho. Sua relação com o mundo do Direito Penal deve ser ainda menos amistosa do que com o mundo do Direito Constitucional. Que dirá ela? E que importância terá o que diga, tirante seu direito a voto e o apoio que possa estar recebendo de assessores? Próximo! Boto o olho em Dias Toffoli, ex-funcionário do PT na Câmara dos Deputados, ex-advogado do PT em campanhas presidenciais, reprovado em dois concursos para magistratura paulista, ex-Advogado Geral da União, alçado por Lula ao Supremo em setembro de 2009, quando a Ação Penal 470 já rolava por lá havia bom tempo. Com dois dedos de consciência teria feito com eles um X sobre os lábios e ido para seu gabinete, tão longe quanto possível da encrenca. Em relação ao que vai acontecer, extraio uma única certeza. Continuará livre, leve e solto, com habeas corpus permanente, esse miserável modelo político que primeiro elege o governante e depois o conduz a adotar uma base parlamentar teúda e manteúda (*). * Expressão do português antigo. Eram o particípio presente dos verbos ter e manter. Ficou preservada na forma feminina, através dos tempos, para representar, unicamente, a figura da concubina, tida e mantida, por seu amante. ______________ * Percival Puggina (67) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões

Percival Puggina

19/08/2012
Já vi muita gente vaidosa. Já vi muito pavão. Já ouvi muito vitupério. Mas nunca antes lera algo semelhante à declaração que encabeça a segunda parte da proposta do novo Código Penal, elaborada por uma comissão de juristas a pedido do Senado. Trata-se de uma frase de Tobias Barreto, intelectual sergipano do século 19. Afirmada pelo autor, tem o peso de sua opinião pessoal. Reproduzida pelos notáveis, como preâmbulo do trabalho feito, credencia-o por inteiro à cesta de lixo inorgânico. A frase, diz assim: O Direito não é filho do céu. É um produto cultural e histórico da evolução humana. Compreenda, leitor, a natureza do problema. Existem correntes conflitantes na Teoria do Direito. Cada qual com sua lógica intrínseca. Com essa frase, os formuladores do anteprojeto assumem a cultura e a história como determinantes do Direito positivo e rejeitam o Direito Natural. Não pensavam assim os legisladores do antigo Código Penal. Nem pensa assim a sociedade brasileira, que tem enraizado em sua cultura o caráter determinante e universal de certos princípios morais sobre as leis dos povos. Abro parêntesis: é por força da lei natural, por exemplo, que nos indignamos quando uma mulher iraniana é morta a pedradas ou quando o regime cubano efetua prisões por delito de opinião. Fecho parêntesis. Tampouco nossos constituintes de 1989, que esculpiram na Carta brasileira um elenco de princípios fundamentais e, até mesmo, cláusulas pétreas, pensavam como os elaboradores do anteprojeto do novo Código Penal. Com efeito, fosse o Direito mero produto cultural e histórico da evolução humana, princípios e cláusulas pétreas o colocariam em oposição tanto à cultura quanto à evolução. Pois eis que o relativismo moral, associado ao positivismo jurídico, vem fazendo estragos no ordenamento jurídico brasileiro. Recentíssimas decisões do STF foram pinçar e lapidar certos princípios da nossa Constituição, ao gosto de grupos minoritários da sociedade, para forçá-la a admitir o que ela explicitamente recusa. Agora são os notáveis, convidados pelo Senado, que declaram ser, o seu anteprojeto, um produto da nossa cultura e da nossa evolução histórica. De onde essa certeza, caras-pálidas? Quem os proclamou reflexos perfeitos da atualidade cultural brasileira e tomógrafos precisos a capturar nosso flagrante histórico? A sociedade certamente não foi porque ela discorda de diversos preceitos propostos em vosso anteprojeto. Em quantas famílias os pais permitiriam aos filhos criar sua hortinha de cannabis sativa ou operar um mini-laboratório caseiro para produção de cocaína? Quantos haverá que endossam a autorização para prática do aborto simplesmente porque a mãe tem condições de criar o filho que traz no ventre? Quando esse estratagema foi inventado, na Espanha, em 1983, as clínicas de aborto mantinham psicólogos contratados apenas para assinar atestados de incapacidade materna. Em qual recanto cultural do Brasil encontra guarida a descriminação do terrorismo quando seus agentes forem movidos por fins sociais ou reivindicatórios? É claro que nem tudo é imprestável no anteprojeto da comissão. Mas sua mercadoria legislativa vem com esse vício redibitório que a torna imprópria para o uso. Seus autores não são tudo que pensam ser. ______________ * Percival Puggina (67) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões

Décio Antônio Damin

17/08/2012
POR QUE FALTAM LEITOS? Décio Antônio Damin Entre os sonhos que acalentamos é prioridade tornar o atendimento a saúde acessível a todos. È uma utopia se não mudarmos o enfoque. O constituinte o tornou uma obrigação do estado, materializando-o na Constituição Federal. Isto é fonte de ufania e de frustração. Os anos se passam e o cumprimento deste direito está cada vez mais distante. O SUS, teoricamente perfeito, claudica. Não consegue se financiar porque os custos crescentes da saúde, com métodos e medicamentos caros, o tornam um verdadeiro ?saco sem fundo?. Não há recursos suficientes para cobrir o ?state of art? da medicina. O hospital que atender 60% de pacientes do SUS será considerado filantrópico e isentado de impostos. É o reconhecimento tácito da falência do sistema que não se sustenta. Se o atendimento da saúde é um dever do estado, deve ser por ele custeado com preços que permitam aos hospitais se manter saudáveis, podendo ser ampliados. Ocorre o contrário com muitos fechando as portas com dívidas impagáveis. As emergências lotam e a tendência é piorar. Culpa-se como responsável o fechamento de hospitais que, com a diminuição de leitos, cria gargalos nas emergências que passam a atender e ?internar? em cadeiras e macas. Como se manterão abertos hospitais que dão prejuízos que os levam à falência? Para que haja solução é preciso que a medicina seja considerada como uma atividade normal em suas relações funcionais e comerciais e ?que os preços pagos sejam de tal monta a permitir o lucro?. Assim haverá interesse em investir em hospitais. Este é o caminho, numa sociedade capitalista. Temos que acabar com a hipocrisia de achar medicina é sacerdócio e que ?lucro nesta atividade é pecado!? Como poderiam se manter? O estado não deve ?subsidiar?, deve pagar o justo! É inaceitável taxar de odioso o lucro na medicina. Tais afirmações é que estão levando ao caos! O estado não é bonzinho ao pagar o atendimento médico, previsto na Constituição, é sua obrigação, sem subterfúgios de qualquer espécie, mas deve fazê-lo adequada e prontamente. Nem os planos de saúde particulares conseguem internar com presteza os seus usuários! Num hospital como o Moinhos de Vento, uma paciente de 86 anos com fratura de colo de fêmur espera em uma maca no corredor por horas a fio até que, alertada, se disponha a pagar pela ?suíte presidencial? embora tenha plano de saúde e cobertura integral, por absoluta falta de leitos normais!! A culpa não é do hospital, é do sistema de saúde do país! (*) Médico

Percival Puggina

15/08/2012
OS PACOTES DO DESESPERO Percival Puggina Há evidências de desespero nos sucessivos pacotes que o governo petista vem desembrulhando no caminho do país para o buraco da estagnação econômica. Vários pacotes foram lançados para ativar o consumo. Depois, para baratear os financiamentos (leia-se endividamento da sociedade). Depois, para reduzir os preços de determinados bens encalhados nos pátios e armazéns das fábricas. Depois, para reduzir um pouco o custo Brasil (cortando parte dos tributos sobre energia). Depois, anunciando novos investimentos em infraestrutura (enquanto o PAC I e o PAC II ainda vegetam nas prateleiras das repartições e dos anteriores cortes orçamentários). Tudo em vão. A maré baixou assustadoramente e a ilha de prosperidade brasileira está ligada ao mapa-mundi pelo istmo dos erros e desvios de rumo praticados no segundo governo Lula e na farra publicitária que elegeu Dilma. Ela comanda, por norma constitucional, o Estado, o governo e a administração federal. Pois bem, o Estado brasileiro só anda em más companhias; o governo brasileiro está sem rumo; e administração pública federal está em greve. O tique-taque das bombas relógio espalhadas pelo taumaturgo ou mandingueiro Lula na sua trajetória para o Panteão republicano já se faz ensurdecedor. Só não ouve quem não quer.