Percival Puggina
14/10/2021
Percival Puggina
Em 13 de outubro, a Gazeta do Povo publicou matéria do Daily Signal sobre a ONU Mulheres, uma organização das Nações Unidas. Como se diz cá no Rio Grande do Sul em situações de grande espanto: “Me caíram os butiás do bolso!”.
Imagine, leitor, que a ONU Mulheres, uma espécie de albergue internacional do movimento feminista, decidiu que em vez de cuidar dos direitos das mulheres passaria a tratar da igualdade de todos os gêneros. Segundo a organização, “termos como masculino e feminino, mulheres e homens, excluem pessoas não binárias e intersexuais que não se enquadram em nenhuma dessas categorias”. E recomenda que em vez de senhores e senhoras, sejam adotados vocativos de gênero neutro, como “Pessoal!”, “Crianças!”, “Vocês aí!”. Gente, é sério.
Recomendo fortemente a leitura da matéria em questão. O texto me fez pensar que, seguindo por essa mesma linha de raciocínio, a própria organização não deveria se chamar ONU Mulheres porque a palavra mulheres tem um sentido não inclusivo, ou diretamente excludente do sexo masculino e isso não fica bem para uma entidade que se pretende inclusiva. Talvez pudesse mudar o nome para ONU, simplesmente, encerrando-se as atividades da matriz que custa muito e faz pouco.
Pensando com meus botões, percebo que a própria palavra “casal”, opressoramente excludente como se sabe, poderia ser substituída por um coletivo, como “nós” ou “vocês”, ainda que vocês, por não serem nós, acabem também excluídos. Não se diga diferente de “família”, que além das incorretas questões de ordem sexista, reforça a exclusão com a presença de relações afetivas e – coisa terrível – de consanguinidade.
E se todos os pronomes possessivos pudessem ser apagados na linguagem humana? Já pensou, leitor, num mundo sem meu nem teu, sem cercas nem muros, sem portas nem fechaduras, sem bens privados? Já pensou na fraternidade dos desprovidos e dos filhos de ninguém? Nem meu corpo, nem minhas regras, companheir@? (Não, isso não!).
É incrível, mas ideias assim, que parecem cozidas numa enlouquecida babel linguística, são apresentadas como trunfos de superioridade moral. E o mais incrível ainda é que se propaguem e avancem, sem cessar, em direção aos objetivos propostos. A cada passo dado, mais remota vai ficando a pura e simples dignidade humana.
Aprendi, cedo, que advertir é um ato de amor.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
13/10/2021
Percival Puggina
Completou 90 dias, ontem, a indicação de André Mendonça para ocupar a cadeira vaga no STF. Cabe ao presidente da CCJ do Senado, Davi Alcolumbre, marcar data para que o candidato seja ouvido, em “sabatina”, pelos membros da Comissão.
Nunca houve algo assim, ao menos no meu horizonte de memória. Todas as indicações, inclusive as mais despropositadas pela inadequação e despreparo da pessoa à função, foram aprovadas após breves passeios dos indicados pelos gabinetes da Casa. As sabatinas eram indulgentes, os pré-requisitos desconsiderados e o notório saber substituído por notoriedades bem menos úteis à nação.
Assim, Lula e Dilma empacotaram uma dúzia de companheiros para o Supremo. Dos oito designados por Lula, cinco já se aposentaram. Dentre os cinco apontados por Dilma houve uma defecção por morte. Dos atuais, portanto, sete passaram pelo crivo ideológico de José Dirceu. Com essa orquestra, por si majoritária, afina-se, de uns tempos para cá, Gilmar Mendes (indicado por FHC) e com ela se perfilou, caneta em riste, Alexandre de Moraes (indicado por Michel Temer). É um autêntico rolo compressor que não se constrange com os malabarismos jurídicos e estripulias repressivas em curso na Casa.
Por outro lado, quem conhece o Congresso Nacional sabe que quando algo não tramita porque surgem “dificuldades”, “facilidades” estão à venda e a demora eleva o preço. Infelizmente, devemos ter ciência e consciência de ser assim que funciona o parlamento brasileiro. Não, leitor, não creia que os obstáculos enfrentados pelo indicado André Mendonça tenham algo a ver com más credenciais. É diante as boas que eles se levantam.
Pesa contra ele uma posição religiosa, a adesão a certos valores que vêm sendo combatidos dentro do STF, alguns dos quais fazem parte da preocupante “agenda internacional do Supremo”. Pesa contra ele ser indicado pelo presidente Bolsonaro, algo que, para muitos senadores de critérios rasos, é considerado vício de origem. Outros, sempre receosos do STF, veem a aprovação como algo que possa causar desagrado ao tal rolo compressor.
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Há um laicismo militante segundo o qual a moral não pode influenciar o Direito e esse laicismo está bem sentado dentro do Supremo e do Congresso. Segundo ele, a única convicção que pode influenciar o Direito é a laicista, diagnóstico que não consigo fazer sem achar muito engraçado.
Desde meu modesto posto de observação, é exatamente essa concepção que permite aos poderes de Estado agir de um modo que põe a moral para fora pela mesma porta pela qual entram, soberanos, os interesses particulares, políticos e partidários de qualquer ordem. O desprezo a princípios e valores dos candidatos enche os plenários de indivíduos que os mesmos eleitores, se os conhecessem bem, não convidariam para jantar em casa.
Para mim, a resistência à indicação de André Mendonça se converteu em sua mais insigne credencial.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
10/10/2021
Percival Puggina
Telefonei para um querido e velho amigo, jurista dos bons. A essas credenciais, ele soma invejável talento para analisar política. Eu queria ouvi-lo, depois de ano e meio sem conversarmos. Impressionou-me vivamente o que falou, autorizando-me a reproduzir, como farei abaixo, sintetizando hora e meia de sua dissertação.
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Na opinião do meu amigo, o 7 de setembro não foi convocado para que algo acontecesse em favor do presidente da República, mas para conter iniciativas que o ameaçavam. Com base instável na Câmara dos Deputados e tendo contra si a maioria do Senado, o STF e os grandes grupos de comunicação, o presidente precisava conter inimigos que avolumavam suas ações desde o início do mandato, buscando impedi-lo de disputar (à facada), assumir (ações no TSE), governar (boicotes políticos, judiciais e administrativos) e terminar o mandato (impeachment).
No início de agosto, no auge da pressão, o presidente reagiu jogando toda sua força política na convocação do povo para as manifestações nacionais do dia 7 de setembro. Prometeu comparecer, falar e ouvir a população. Jogou pesado na atração de seus apoiadores.
Entenda-se a estratégia. É sabido que não há impeachment sem multidão na rua e o presidente mostrou suas cartas. Ah, jogavam pôquer? Pois as dele ficariam abertas sobre a mesa. Foi como se dissesse: “O que vocês têm aí?”. Pagou para ver.
Ergueram-se contra o evento do dia da Independência todos os grandes meios de comunicação, gastando tempo em esforços para desmobilizar a população. Apelaram para o terrorismo. Prenunciaram violência, ações contra a democracia e riscos graves, buscando criar um ambiente psicológico de medo e rejeição. Mulheres e crianças eram insistentemente aconselhadas a não comparecer. Gente poderia morrer!
Impossível estimar o número de pessoas que, em virtude disso, deixaram de comparecer. Mesmo assim, milhões de brasileiros foram às ruas sem que um vidro sequer fosse quebrado, sem que um carro fosse arranhado, com as autoridades policiais sendo aplaudidas e com preces sendo dirigidas a Deus. À vista de todos, a mentira circulou de pernas curtas e de muletas. Muitas estratégias oposicionistas entraram em colapso naquele dia.
Derrotada no dia 7, a mídia amiga da oposição assumiu a publicidade da manifestação pelo impeachment agendada para o dia 4 de outubro. Como nunca se viu antes, fez eco às convocações, listando cidades e locais. Se participar do apoio ao presidente fora um perigo, ir às ruas pelo impeachment seria algo sereno, tranquilo como um entardecer na lagoa.
Só o fracasso foi clamoroso. Tão clamoroso que teve que ser admitido. O impeachment morreu ali. Junto com ele, perderam força quaisquer ações oposicionistas que precisem de apoio popular, ou tragam para a rua, novamente, as cartas perdedoras exibidas no dia 4. "O que vocês têm aí?”. É assim na democracia, não?
É apenas uma análise, mas dela se pode dizer, como Giordano Bruno: “Se non è vero, è molto ben trovato” (se não é verdade, é muito bem achado).
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
08/10/2021Percival Puggina
Durante muitos anos, em palestras sobre problemas institucionais brasileiros, afirmei que visitar Roberto Marinho era condição indispensável para uma bem sucedida campanha eleitoral à presidência. Eu não estava errado. Errado era o sistema, que funcionava assim mesmo, e o poder concedido à Globo.
As redes sociais, democratizando o direito de opinião e a subsequente eleição de Bolsonaro, derrubaram a mesa desse jogo. Nem tudo é para sempre. Ao sentir-se demitida de seu poder, a Globo contra-atacou. Decidiu acabar com o presidente e desmoralizar as redes sociais, mesmo que para isso fosse necessário apoiar a prisão de jornalistas que atuam nesse segmento e causar dano ao país.
Durante meses, a covid-19 e a urgência da vacinação foram as principais armas dessa investida. A pressão, no começo deste ano, era terrível. Começar a vacinar um mês depois dos Estados Unidos virou escândalo. A Anvisa, porém, tinha suas regras, as compras públicas tinham suas exigências e os contratos de fornecimento, cláusulas leoninas (entre elas o “vendo, recebo, entrego quando puder e não me responsabilizo”). Aqui, Butanan, Dória e sua parceria chinesa arrumavam a vitrine de uma vacina praticamente caseira, testada em brasileiros. Para serem aprovadas as vacinas, que poderiam, em tese, alcançar uma eficácia de 100%, precisavam atinrir qualquer número significativo após o piso mínimo de 50%. A vacina paulista bateu martelo em 50,7%. Duas doses vieram parar no meu braço. Com ela, porém, não posso entrar em inúmeros países. Na próxima semana tomarei a terceira dose com a vacina da Pfizer.
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Leio em Poder 360: “Na última terça-feira (05.out) o Ministério da Saúde informou que não vai comprar a vacina CoronaVac em 2022 por ela ter sido autorizada só para uso emergencial pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A pasta ainda declarou que o imunizante, desenvolvido no Brasil pelo Instituto Butantan, tem “baixa efetividade entre idosos acima de 80 anos”. A informação foi divulgada na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid no Senado, nessa 5ª feira (7.out.2021). (...)
“A razão sobre a possível descontinuidade da vacina CoronaVac no ano de 2022 está diretamente relacionada com condição de sua avaliação pela Anvisa. Até o presente momento, a autorização [da CoronaVac] é temporária, de uso emergencial, que foi concedida para minimizar, da forma mais rápida possível, os impactos da doença no território nacional”, responderam os servidores da pasta.
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Um império desaba. Gradualmente, a vida volta ao normal. A Ciência segue seu curso enquanto a onisciência dos sabichões da política e da mídia, oportunistas de poucas letras e ainda menos juízo, se vale dela para seus fins. Daí a menção à canção de Nelson Ned no título desta crônica.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
06/10/2021
Percival Puggina
Enquanto o Ocidente se suicida, fala-se em 3ª via para a corrida presidencial de 2022. O retorno dessa estratégia para o teatro das ações significa desprezar o discernimento da sociedade brasileira. Supõe que somos desmemoriados e incapacitados para nossas responsabilidades como cidadãos. A peça exibida no teatro em questão é ruim e a gente identifica, desde o início, os vilões e as vítimas do roteiro.
Lula e FHC desfilavam ombro a ombro, braços dados em campanha pelas diretas e pela anistia. Cochicho a cochicho, levaram ao limite do possível a esquerdização da Constituição de 1988. Costuraram o Pacto de Princeton, em 1993, definindo estratégias comuns ao Foro de São Paulo (Lula/PT) e ao Diálogo Interamericano (FHC/PSDB). Nas seis eleições presidenciais consecutivas de 1994 até 2014, seus partidos adotaram a estratégia conhecida como “tesoura”, em que duas esquerdas, operam as lâminas para o mesmo fim comum. E espicaçaram o país com a direita, sem nome, partido ou movimento, votando no PSDB na reta final dos pleitos presidenciais.
Tão prolongada supremacia só ocorrera no início do século passado, durante a Primeira República, com a política “Café com Leite” das oligarquias de São Paulo e Minas Gerais. Quase cem anos mais tarde, os dois velhos amigos mantiveram o país na esquerda durante 24 anos. Nunca o MST foi tão feliz como durante o governo de FHC; nunca os banqueiros foram tão felizes quanto nos governos de Lula e Dilma. Juntos, com mera troca de manobristas e de retórica, levaram o Brasil para aquela esquerda que se diz “progressista”. O estrago foi grande. Mas não desanimou os propósitos, como se vê nos bastidores destes dias.
Aliás, o nonagenário FHC já se abraçou com Lula jurando amor para a eleição de 2022. E já se apartou de Lula quando percebeu o amplo apoio da mídia amiga da esquerda para a proposta de uma 3ª via. Esse apoio prova que a ideia é ruim. E é ruim porque seu objetivo é restaurar a situação em que, durante 24 anos, a direita (aqui entendida como conservadores e liberais) foi representada por um candidato de esquerda: o vitorioso FHC e os derrotados José Serra, Geraldo Alckmin, José Serra II e Aécio Neves. Como resultado, a direita definhou politicamente por mais de duas décadas.
Como podemos ter uma terceira via política – porque política não é um candidato! – se sequer temos uma segunda via política organizada? A esquerda tem via própria, ampla, pavimentada por muito trabalho! Ela opera em toda parte, onde houver poder público, ensino, cultura, comunicação social e meio de influência. É uma via política muito mais eficiente do que a representação dos seus partidos.
Agora querem retornar. Se isso ocorrer, outras décadas fluirão. Conservadores e liberais se recolherão, novamente, às catacumbas. A 3ª via é a estratégia da esquerda. Cair nessa é levar-lhe em mãos a minuta de nosso atestado de óbito. Não votar em Bolsonaro porque ele é assim ou assado, ou porque serão mais quatro anos desse ambiente conflituoso, significa esquecer que tais conflitos são criados e mantidos para produzir esse raciocínio e obter esse resultado!
Pela direita, leitores, só Bolsonaro vence essa eleição.
Olhem para o palco. Vejam quem dá apoio a essa ideia que reputo desastrosa por suas consequências passadas e futuras. O Brasil não pode retornar a quem tanto mal lhe fez no governo e continua a fazer na oposição.
Retomemos o trabalho suspenso pelas absurdas regras atribuídas à pandemia e comecemos a organizar a 2ª via política de que o país tanto necessita. Ao menos aqui, salvemos o Ocidente!
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
04/10/2021
Percival Puggina
Desde o início da pressão para o impeachment da presidente Dilma, há sete anos, participo das muitas manifestações verde-amarelas aqui em Porto Alegre. Acompanho e me integro aos esforços de mobilização. Torço por um clima favorável. Contribuo com a caixinha que habitualmente percorre a multidão coletando recursos para cobrir os gastos de organização. Em todos esses eventos, por deferência carinhosa dos promotores, sou chamado a me manifestar.
Sei do que falo, portanto, quando menciono o sonoro silêncio da mídia sobre cada um deles. Vivi toda essa história e sou testemunha de ser ela motivada por consistentes razões, estrito amor à pátria, defesa de princípios e valores que, com o tempo, se revelaram majoritários na sociedade brasileira. Da grande mídia, quase nenhuma, ou nenhuma referência. Notícias eventualmente publicadas minimizavam os eventos, afastavam-se do essencial, por significativo que fosse; desconheciam os objetivos e fixavam-se em um ou outro cartaz nos quais descarregavam sua animosidade.
Por isso, afirmo sem medo de errar que essa má vontade nada tem a ver com Bolsonaro. Nada!
Começou antes de ele surgir na cena, continuou depois e sempre teve como objetivo criar dificuldades à erupção de uma força política antagônica à hegemonia esquerdista instalada no país desde os tempos em que o jovem arrogante e estouvado Fernando Collor foi destituído da presidência. A hegemonia que desde então se instalou deu tempo para Collor se tornar um idoso senador da República e para o Brasil arruinar nas mãos da esquerda.
A campanha pelo impeachment do atual presidente, impulsionada, como impulsionados foram a criação da CPI da Covid, o “fecha-tudo” e o “fique-em-casa”, tem muito menos a ver com Bolsonaro e muito mais a ver com a ojeriza ideológica a conservadores e liberais. O passado recente evidencia-o de modo convincente e o passado mais remoto conta como tudo foi sendo construído no jornalismo brasileiro, no ambiente cultural, nos sindicatos, na administração pública, nas igrejas cristãs, em todo o sistema de ensino, e onde mais você possa imaginar.
Acompanho as notícias sobre as recentes mobilizações vermelhas com que os reds pretendem retornar ao ninho do Planalto e as comparo com o modo como os mesmos veículos fazem a cobertura das mobilizações verde-amarelas. A Globo chegou ao desplante de exibir as gigantescas concentrações do dia 7 de setembro com a tarja “Manifestações antidemocráticas”. Aos atos chochos da esquerda estão abertos espaços à divulgação prévia, bem como às agendas, horários e locais, cidade por cidade. Há matérias de redação sobre o coquetel de finalidades que vão da “luta pela democracia” e do “combate à corrupção” ao desejado “impeachment”.
A mídia madrinha cuida de seus mimosos...
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
01/10/2021
Percival Puggina
Há um tipo de jornalismo que não consegue esconder seu desagrado perante a democratização do direito de opinião. Quem detinha o monopólio da informação e da opinião, percebe, na vida real, quanto de poder precificável, ou monetizável, perdeu com isso. Em sociedades democráticas, não ser refutado era privilégio de poucos.
Há, nas redes sociais, muita gritaria multilateral, xingamentos, manifestações impróprias, notícias falsas? Sim, claro. Mas não podem ser esses desvios o assunto principal quando possibilidades abertas pelas novas tecnologias fazem resplandecer notáveis talentos que, por motivos óbvios, não teriam espaço nos veículos da outrora grande mídia. Esta, aliás, internamente, de um modo que a empobrece, dispensa seus talentos divergentes para preservar coesão em sua linha editorial. O efeito apenas contribui para seu descrédito. E lá se vão eles, os despedidos, fazer sucesso, criar e dinamizar as novas mídias.
Como desconhecer que grande número dos novos comunicadores sociais chega ao público com preparo cultural, competência dialética, proporcionados pelo curso do Olavo de Carvalho? Quanta diferença entre eles e militantes produzidos por cursos de Jornalismo de nossas universidades!
Imagine o quanto contraria o complexo de superioridade da esquerda, perceber, pelos motivos expostos, a disparidade de suas forças nas redes sociais.
Imagine a contrariedade daquele grupo de comunicação que se considerava “fazedor de presidentes”, atuando no Brasil, a cada quatro anos, como uma espécie não canônica de sagrador de cabeças coroadas!
Imagine a contrariedade dos políticos que, também eles, falavam sozinhos às suas bases através de uns poucos meios regionais de comunicação e, agora, precisam conviver com as redes sociais locais, chegando à palma da mão dos eleitores.
Imagine o desagrado de um poder de Estado sendo avaliado e criticado pelo próprio povo. Logo ele que, diante do espelho, se vê mimetizado, individual e colegiadamente, em democracia.
Imagine o desagrado de grandes veículos – tão seletivos nas matérias que divulgam – vendo suas omissões, erros e contradições, expostos à sociedade. A propósito, fatos recentíssimos me vêm à lembrança. Nenhum grande veículo (ao menos nada há no Google que o registre) noticiou a mais recente capa desonesta da revista IstoÉ plagiando uma capa da revista Time. Neste dia em que escrevo (01/11), nenhum grande veículo dedicou linha ou imagem para registrar a multidão de brasileiros que se aglomerou diante do hotel do presidente para festejá-lo em Roma. Não deixe de ver aqui as cenas proporcionadas pelo vídeo disponibilizado por Gustavo Gayer.
O ódio “às redes sociais” tem razões consistentes. Cutucam poderosíssimos vespeiros que se coligaram para enfrentar seus adversários nesse vasto e dinâmico território.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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01/10/2021Percival Puggina
Enquanto assistia à participação do dono da Havan na CPI, antevia que quando terminasse a sessão seria informado pela outrora grande mídia de que as coisas se passaram de outro modo. Há muito disso hoje. Você comparece, assiste, presta atenção e, mais tarde, fica sabendo em manchetes que foi enganado por seus olhos e ouvidos. Quem cometesse a imprudência de relatar conforme os sentidos lhe tornaram perceptível incorreria no crime hediondo de fake news.
Há um universo paralelo no qual tudo se desencaixa e a realidade se evade como sabonete foge das mãos em banho de cachoeira. É o universo onde vivem os mais destacados veículos de comunicação do país, partidos e organizações de esquerda, ministros do STF, o Congresso Nacional e, claro, a CPI da Covid-19 (cujo nome já é fake news porque seu objetivo é ferrar com a vida do presidente da República e ponto).
Assisti, então, boa parte da sessão em que a CPI inquiriu o dono da Havan. Quem perdeu ainda pode recuperar aqui. Valerá cada segundo. Os macacos velhos da política brasileira saltavam de um galho para outro tentando, inutilmente, capturar o empresário em pré-fabricadas narrativas. A todo instante, Luciano Hang os desconcertava com respostas corretas, surpreendentes, e uma descontraída insubmissão às pretensões autoritárias que caracterizam a conduta dos senadores oposicionistas.
De um lado, a fina ironia do inquirido, em sua expressiva fatiota verde e amarela; de outro, o deboche e a chacota, como única reação disponível no estoque de artimanhas da mesa dos trabalhos. Ora, a ironia é atributo dos espíritos livres, asas na porteira da liberdade (agauchando Vitor Hugo). O deboche é típico dos indivíduos rasteiros, aprisionados em si mesmos. Quanto mais tentavam aplicar ao inquirido seus próprios padrões, mais avultavam, mesmo não referidos, os apêndices caudais dos macacos velhos inquisidores.
Frequentemente, o senador Omar Azis, secundado pelo colega Renan Calheiros, sentindo que escorregavam de seus galhos, apelavam para restaurar as narrativas e as descarregavam sobre o empresário e todos os insubmissos como ele. Nesse momento, se erguia o vozerio do plenário para reforçar as imputações. Os ataques não correspondiam ao dito nem ao feito, mas era preciso contrapor algo para não ficar mais feio ainda.
Restou muito claro, durante todo o tempo, que a CPI tem um objetivo político e que sua preocupação passa longe da saúde pública e do contestável zelo de seus protagonistas pelo erário. Eles funcionam como metralhadora giratória, que dispara para qualquer lado onde possa servir ao objetivo dos viventes no universo paralelo. Essa metralhadora tem dois apoios retóricos: 1º) no Brasil, quem mata não é o vírus, mas o presidente e o tratamento precoce; 2º) conservadores, liberais, povo na rua, manifestações contra conduta de instituições de má conduta são antidemocráticos, exceto se forem para destituir o chefe do governo...
Absolutamente nada disso você vai encontrar em qualquer matéria da mídia militante sobre as seis horas de inquirição do dono da Havan.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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29/09/2021
Percival Puggina
Quando o presidente advertia para as consequências da paralisação da economia com os lockdowns, o “fecha tudo” e o “fique em casa”, a resposta que obtinha da oposição, das demais instituições de Estado e de entes da Federação (na voz de governadores e prefeitos), era a frase que dá título a este artigo: “A economia a gente vê depois”.
Duas perguntas, contudo, ficavam no ar. A gente, quem? Depois, quando? Tenho certeza de que todos os que repetiam essa bobagem, se tivessem botões dos antigos, bons de conversa, confessariam a eles que, no caso, “a gente” seria o Bolsonaro e “o quando” seria o mais tarde possível, para seu maior desgaste político.
O presidente teria que produzir a mágica de que àquilo não se seguisse um corolário de desemprego, queda da atividade econômica, escassez e alta de preços. O inesperado dessas estratégias típicas de nossa subpolítica é que o fim do mês chega, inexoravelmente, aos dois lados do tabuleiro. Chega para os prós e para os contras. E, com ele, o supermercado, o aluguel, a conta de luz. Aliás, quando me lembro de tudo que foi feito pela esquerda (partidos, ONGs, MP) para impedir o funcionamento na região amazônica de hidrelétricas capazes de atender durante décadas a elevação da demanda nacional, meu único consolo é saber que a conta de energia que escasseia e encarece chega para os autores e para as vítimas daquela imprudência (bilhões de reais foram mumificados lá).
Não existe vacina contra o analfabetismo econômico. Dele só vamos tomando consciência na CTI das crises.
Também o aumento dos preços chega para todos. Como lembrou com precisão o amigo Gilberto Simões Pires em recente artigo, essa é a conta do “fecha tudo e fica em casa”. As pessoas pararam de trabalhar, mas continuaram consumindo. As vendas pela internet dispararam até a escassez se instalar, pois quem podia e sabia produzir estava em casa. Os preços subiram por total desequilíbrio entre a oferta e a demanda. Fenômeno mundial que, agora, se transforma em arma política dos intelectualmente desonestos e tiro no pé dos que imaginavam possível decidir sobre questões nacionais desconhecendo rudimentos de Economia. São vítimas do mal que fizeram.
A alta de preços é, por tais motivos, um problema mundial. Nesse particular, nossa posição é até mesmo privilegiada, pois somos um país fornecedor de commodities, com destaque à produção de alimentos. Lá fora, o aumento de preços de gêneros alimentícios é muito superior ao que temos aqui.
Desde o começo da pandemia, a tônica dos raros bons conselheiros clamava contra o “faça-se de tudo para que as pessoas fiquem em casa” e invertia a perspectiva: “Faça-se de tudo para que as pessoas possam trabalhar com a máxima segurança possível”.
A linha de frente do retrocesso e do analfabetismo funcional, os agentes do desemprego, os promotores de falências, os cientistas de redação, os pensadores de fone de ouvido, os noviços no claustro das narrativas têm que cumprir sua desatinada missão. Agora, apresentam como obra alheia as consequências da miséria a que deram causa.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.