Percival Puggina
02/08/2018
“Poder não é um meio, é um fim. Não se estabelece uma ditadura para salvaguardar a revolução; a revolução é feita para salvaguardar a ditadura. O objeto da persecução é persecução. O objeto da tortura é tortura. O objeto do poder é poder. Agora você começará a me entender.” George Orwell, 1984.
Ao ler que o STF inicia dentro de dois dias “audiências públicas” para ouvir opiniões da sociedade sobre aborto, lembrei-me inevitavelmente de livro “1984”. O STF começou a legislar e não vai mais parar. E nós, como previu Orwell, estamos começando a entender.
Haverá 45 exposições orais às quais os senhores ministros estão convidados a comparecer. Em tese, elas têm por objetivo ajudá-los a firmar convicção sobre o tema. Mas a pergunta que não quer calar é a seguinte: não é exatamente isso que o Legislativo, ou seja, o poder localizado no outro lado da praça vem fazendo através dos anos, realizando audiências públicas e examinando projetos sobre a matéria? Que bis-in-idem, que repeteco é esse? Ora, o PSOL quer liberar o aborto passando por um atalho que vai direto à casa do senhor lobo. E o STF, que já não mais esconde os dentes, acolheu o pedido e decidiu que vai examinar a matéria. Afinal, ele pode fazer qualquer coisa; seus ministros, pessoalmente, podem tudo; eles são indivíduos “supremos”, formando um colegiado de supremos.
O leitor deve estar se perguntando se a tarefa de ouvir a sociedade para definir o que é permitido ou proibido, não pertence ao Poder Legislativo. Não é ele que elabora a Lei Maior? Não é de sua competência, estabelecer o Código Penal?
Pois é. Já não nos basta custear as duas casas do Congresso Nacional para que ambas, salvo excepcionalmente, gastem seu tempo fazendo as mesmas coisas. Agora devemos submeter-nos, também, a um terceiro poder legislativo usurpado por 11 pessoas sem mandato popular.
A alegação de que o STF precisa intervir diante da “omissão dos legisladores” é conduta de má-fé. Um tolo não diz isso e não há tolos no Supremo. De fato, há décadas tramitam no Congresso dezenas de projetos de lei, emendas à Constituição e decretos legislativos dispondo sobre aborto e direito à vida. O motivo pelo qual não são submetidos ao plenário é apenas um, suficientemente forte para tudo esclarecer: são iniciativas que não têm maioria para aprovação e os autores, por isso, não se mobilizam para inclusão em pauta. Não é que o Congresso “se omita” em votar; é que os proponentes sabem que perdem e, em muitos casos, apresentam os projetos apenas para fazer cena. É o mesmo motivo pelo qual os abortistas não propõem um plebiscito sobre a liberação do aborto: eles sabem que a maioria da opinião pública é contra. Nas casas legislativas, senhores ministros, não deliberar é, também, uma deliberação.
Portanto, se removermos a peneira e encararmos o sol dos fatos, o que os defensores do aborto querem é enfiar uma legislação genocida, permissiva ao aborto, goela abaixo da sociedade. Querem uma democracia em que seus minoritários desejos se imponham. A proteção da vida humana em sua mais inocente e indefesa forma não é uma questãozinha individual da mulher, como espetar um piercing na língua ou no umbigo. É um tema da humanidade.
Onde encontrar apoio para absurdas imposições minoritárias se não no STF dos nossos “supremos”? Quem, mais eficazmente do que eles, teria poder de resolver o assunto com apenas seis votos?
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
30/07/2018
Nos últimos meses, escrevi vários artigos tratando da importância das redes sociais para a democratização do direito de opinião. Com o advento da internet, dos blogs e sites, e, por último, das redes sociais, esse direito se expandiu influenciando fortemente a política. Para quem educou a mente a descartar o lixo, assim como em casa se separa o lixo doméstico, houve um descomunal ganho de pluralidade, qualidade e inteligência. O efeito desse fenômeno sobre o esquerdismo dominante nas redações dos principais veículos da mídia tradicional foi arrasador. Sua posição hegemônica entrou em colapso.
Num período de tempo extremamente curto, diferentes modos de ver a realidade e de interpretar os fatos passaram a influenciar milhões de pessoas. Princípios, valores e autores consagrados em outros países, aqui mantidos ocultos, ganharam notoriedade. As árvores do pomar acadêmico foram sacudidas e muitas frutas podres vieram ao chão, em plena sala de aula, derrubadas por alunos que simplesmente foram ler “fora da caixa do professor”. O monopólio da “narrativa” e da “interpretação” exercido pelos que atuavam como fazedores de cabeças simplesmente ruiu. Absurdos, como, por exemplo, a suposta inocência de Lula, perderam espaço; o naturalmente ridículo, como, por exemplo, os cursos de extensão universitária sobre o “golpe de 2016” em universidades federais, se tornou escandalosamente ridículo.
Enquanto, no mundo real, a inteligência se abastecia, no impenetrável bas-fond das plataformas os companheiros algoritmos operavam para virar o jogo. O Facebook, por exemplo, declarou-se vocacionado às trivialidades da vida cotidiana, social e familiar. Se você estiver interessado em puppys e kittens, culinária e arranjos de flores, eventos familiares, entre que a casa é sua! Mas se você pretende usar a rede para restituir o Brasil a seu povo, salvando-o dos corruptos, dos coniventes, dos omissos, dos incompetentes e dos vilões, então seus amigos e seguidores ficarão sem saber que você ainda existe. Será sepultado em vida. E isso representa um nada para quem já enterrou no ambiente acadêmico Burke, Kirk, Chesterton, Aron, Sowell, Mises, Friedman, Hayek, Bohm-Bawerk e tantos outros gigantes do pensamento conservador e liberal.
A reação iniciou no começo deste ano, multiplicando na mídia tradicional a afirmação de que as redes sociais se haviam tornado uma usina de fake news. E elas existem, sim! Altas autoridades da República as disseminam quando anunciam investimentos que não se verificam, ou proclamam realizações mágicas como a extinção da miséria e o fim da fome, Acontecem fake news quando se apresenta Lula ao mundo como um São Thomas More de Garanhuns, condenado apenas porque virtuoso.Foi para enquadrar ideologicamente esses ataques que escrevi vários artigos apontando, em contrapartida, o problema das fake analysis na mídia tradicional, pois são essas mistificações as que mais desencaminham a opinião pública. A elas, com grande vantagem, se opunham tantos bons e sérios autores nas redes sociais.
Enfim, os algoritmos companheiros, ao que tudo indica, estão no comando. Enquanto o mercado não reagir criando novas plataformas, o Ministério Público não intervier, o Congresso não tomar providências (?), os instrumentos da inteligência artificial agirão ocultos, a serviço da conhecida má-fé natural daqueles que os manipulam.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
27/07/2018
Qual o partido que:
• votou contra a Constituição de 1988 porque a queria ainda mais socialista?
• quando na oposição, pediu dezenas de CPIs e impeachments, mas ao assumir em 2003 não promoveu um único inquérito envolvendo os atos daqueles a quem acusava?
• governou o Brasil no ambiente internacional mais favorável dos últimos 60 anos?
• e provocou, apesar disso, 33 meses sucessivos de recessão, derrubou o PIB em 8,6% e deixou 14 milhões no desemprego?
• aliou-se a todos os políticos mal falados que combateu quando na oposição (Paulo Maluf, Fernando Collor, José Sarney, Jader Barbalho e tantos outros)?
• sistematizou a corrupção motivando a ação penal do mensalão e os escândalos da Lava Jato?
• tomou dinheiro emprestado a 14% ao ano para que o BNDES, em seguida, concedesse crédito subsidiado às empresas amigas a 6% ao ano, mandando a diferença para o Tesouro, ou seja, à conta dos pagadores de impostos?
• enquanto discursava sobre o nosso petróleo, transformou a Petrobras numa pequena fração do que era, permitiu que a Bolívia nacionalizasse nossas refinarias (um negócio em que, desde a prospecção, a empresa investiu US$1,5 bilhão), sem contar os US$ 8 bilhões do gasoduto que, pelo menos, continua sendo brasileiro?
• teve a audácia de proclamar que acabou com a pobreza, que “pobre agora viaja de avião” e deixou o país com 4,4 milhões de pessoas na extrema pobreza de quem ganha menos de R$ 73 mensais?
• abriu um rombo de R$ 70 bilhões nos fundos de pensão, causa de desespero para mais de 7 milhões de associados dessas instituições em todo o país?
• é declaradamente contra a Lava Jato e escalou como inimigo número 1 o competente juiz Sérgio Moro?
• dá apoio e refúgio a terroristas (Cesar Battisti é apenas um dos casos)?
• capturou e devolveu a Fidel os boxeadores que fugiram da delegação cubana no Pan-Americano de 2007?
• apoia politicamente e financiou os governos comunistas de Cuba, Venezuela e demais países do Foro de São Paulo?
• através de seus vereadores homenageia líderes comunistas e guerrilheiros com nomes de ruas?
• concede apoio explícito a companheiros condenados pela justiça por graves crimes?
• revela verdadeira fobia pela construção de presídios e por órgãos de segurança, resultando em gravíssimo incremento da violência?
• manifesta incondicional dedicação aos direitos humanos dos bandidos e total desconsideração aos direitos das vítimas?
• se empenha em inibir a ação armada das instituições policiais e se dedica à causa do desarmamento dos cidadãos?
• é contra a redução da maioridade penal?
• criou o MST e movimentos sociais semelhantes, apoiando suas truculentas invasões às propriedades públicas e privadas, bem como a expansão de reservas indígenas sobre áreas de lavoura?
• alegando a laicidade do Estado, promove e protege atividades pedagógicas e material didático que visam se contrapor aos valores morais e às orientações familiares?
• criou o kit gay e financiou, com recursos públicos, a parada gay e a marcha das vadias?
• manipula o material didático, a interpretação dos fatos históricos e oculta do conhecimento escolar livros de autores liberais e conservadores?
• apoia a legalização do aborto?
• criou, com Fidel Castro, o “Foro de São Paulo”, onde ditadores e simpatizantes entram em conluio para produzir a hegemonia comunista na América Latina?
• tentou e continua tentando acabar com a lei de anistia e manipula a História para transformar guerrilheiros e terroristas comunistas em paladinos da democracia?
• promove gigantesco aparelhamento da administração pública, dos órgãos de Estado, dos tribunais superiores e do corpo docente das universidades?
• perdoou dívidas de ditadores africanos e tiranetes sul-americanos para favorecer contratação de obras suspeitíssimas, financiadas com recursos do BNDES e que hoje ensejam investigações análogas às que ocorrem no Brasil?
• elevou a taxa de evasão escolar entre os jovens de 7,6% para 16,5%?
• aumentou a taxa de desocupação dos jovens brasileiros de 9,5% para 25,8%?
• investiu no porto cubano de Mariel, dez vezes mais do que nos portos brasileiros?
• tentou implantar o Decreto nº 8243 que instituiria os conselhos bolivarianos no Brasil, em afronta à Constituição e ao Congresso Nacional?
• atraiu, irresponsavelmente, a Copa de 2014 e os jogos Olímpicos de 2016, ensejando corrupção em valores bilionários e dispêndios que a nação não suportava?
• governou com absurdos 40 ministérios para distribuir cargos e favores a camaradas, companheiros, amigos e protegidos?
Quem errar não é brasileiro, nem estrangeiro. É alienígena.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
25/07/2018
Subindo na ponta dos pés, o horizonte brasileiro que podemos discernir além das águas agitadas do córrego eleitoral, ali adiante, não é de causar entusiasmo sequer ao mais otimista dos cidadãos.
A maioria dos partidos políticos brasileiros me faz lembrar as opium dens, as covas de ópio onde chineses viciados se recolhiam, em nichos e catres, para longas jornadas de narcotização assistida. Não dão a mínima para os anseios por renovação, tão perceptíveis na sociedade brasileira. Seus principais agentes estão viciados. Vegetam na dormente modorra de práticas que as pessoas de bem reputam como intoleráveis.
O conhecimento dessa realidade borra o quadro eleitoral e desqualifica o que ainda chamamos democracia. As grandes siglas se conformam na mesmice, viciadas e acomodadas nos nichos e catres do poder. Jamais se renovam, pois são avessas a toda mudança que ponha em risco as posições de seus líderes. As pequenas, se têm apreço por suas ideias, precisam de tempo, muito trabalho e apoio para se tornarem significativas. Semeiam nas escarpas das dificuldades enquanto as demais colhem na várzea fertilizada com os recursos tomados da sociedade. Ainda assim, como escrevi há alguns meses aos esperançosos da intervenção militar: “Não haverá intervenção; haverá eleição”. E é preciso renovar o que der, levando ao Congresso Nacional gente nova, não contaminada pelas práticas vigentes – e mais do que isso: avessa a tais práticas.
Muitos leitores me perguntam: “Fala-se em renovar, mas devem os bons que hoje têm mandato ser jogados fora com a água desse banho”? Claro que não! Se forem bons, se não forem corruptos, nem coniventes, nem omissos (provavelmente não sobrarão muitos) devem ter seus mandatos preservados por uma questão de racionalidade e justiça. Para certificar-se disso, ou para votar em candidatos novos, consulte os sites e aplicativos que disponibilizarão avaliações completas dos candidatos, como os do Vem Pra Rua e o RenovaBR, fale com quem os conheça, informe-se, não se fie em lero-lero publicitário.
Procure saber o que os candidatos realmente pensam sobre segurança pública, legislação penal, progressão de regime, foro privilegiado, Lava Jato, STF, escola sem partido, ideologia de gênero, educação, Paulo Freire, tamanho do Estado, carga tributária, corporativismo, reforma da Previdência, reforma institucional, meritocracia, privatizações. Dá trabalho? Claro que dá trabalho! Mas votar errado custa muito mais caro. E não há como corrigir um voto mal dado a não ser a duras penas, longo prazo e grande custo.
Com eleições dentro de pouco mais de dois meses, é inútil continuar questionando a confiabilidade das urnas porque essa atitude só afasta os bons eleitores. Retomemos essa pauta no ano que vem. Os que afundaram o Brasil e os que por eles torcem estarão todos na fila de votação do dia 7 de outubro. Então, vote; não os deixemos sozinhos como donos das urnas. Do jeito que o Brasil está, considero moralmente inaceitável a omissão do cidadão consciente.
*Especial para a Gazeta do Povo.
** Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
24/07/2018
A vigilante mídia brasileira se espanta mais com a adesão de uma quarta parte da população às posições conservadoras do candidato Bolsonaro do que com a adesão de um terço dessa mesma população às condutas moralmente corrosivas e economicamente destrutivas de um criminoso condenado, réu em meia dúzia de outros processos cujo denominador comum é a promíscua relação pessoal com grandes empresas que prosperam à sombra do Estado.
Qual o motivo do estresse em que se envolveu o circo político-partidário nacional nas últimas semanas? Tratava-se, visivelmente, de barrar a presença de um intruso, um outsider, uma zebra que entrou no picadeiro eleitoral com ponderável estoque de intenções de voto.
É fácil compreender o desconforto que isso causa. As forças políticas tradicionais, que degustaram os canapés do poder ao longo dos últimos trinta anos não sabem como operar com intrusos. Habituaram-se a atuar como corretoras de votos parlamentares e operadoras de verbas públicas legítima e ilegitimamente coletadas. Todo intruso é risco e todo risco tem preço, sabem os aprendizes do mercado de capitais.
É verdade o que intuem. Bolsonaro é um intruso e, como tal, fator de risco. No entanto, esses mesmos partidos que somam letrinhas para encorpar a sopa, gastaram e continuam gastando seu tempo – e em muitos casos, longo tempo – cuidando de cargos e negócios. Em vez de ouvirem as vozes mais sensatas da opinião pública, de abrirem quadros e mentes para a renovação exigida pela sociedade, em vez de compreenderem seus anseios, fecharam-se no entorno de elites decadentes e, em muitos casos, totalmente desmoralizadas. Deram as costas para os interesses nacionais e para os clamores por responsabilidade e equilíbrio fiscal. Lançaram e deixaram que fossem lançados pela janela dos interesses mais escusos valores monetários duramente produzidos pelo trabalho dos cidadãos. Jogaram e continuam jogando o país no caos. Não ouviram os liberais e se afastaram dos conservadores que, juntos, formam folgada maioria do eleitorado.
Bolsonaro representa um risco? Sim, há risco em toda eleição presidencial. Viver sob esse modelo político é como rodar em estrada esburacada – anda-se devagar e aos solavancos. Pneus estouram. Há candidatos de risco e candidatos sabidamente catastróficos. Quem confia no centrão ou no Ciro “tarja preta” Gomes, não deve atravessar a rua desacompanhado.
Em política, muito do que se é resulta definido pelo que se combate. Reitero ser ainda cedo para opções eleitorais definitivas. Na minha planilha, chegou a hora de marcar quem combate quem e o quê. Isso tem seu lado divertido e seu lado desolador. É divertido observar o descaramento das negociações que distribuem terrenos na lua do poder. É desolador o confinamento da maioria do eleitorado.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
20/07/2018
Vou dar os números rapidamente e seguir em frente para que você não desista de prosseguir na leitura. Segundo dados do PISA, divulgados nesta quinta-feira (19/07), referentes a um conjunto de 70 países, 61% dos estudantes brasileiros desistiram no decorrer da prova (foram 18% na Colômbia e 6% na Finlândia). Os estudantes brasileiros conseguiram o 65º lugar em ciências, o 63º em matemática e o 58º em leitura.
Pronto, pronto, o pior já passou. Agora, segure essa tristeza cívica, seque as lágrimas e vamos examinar o fato em si. A imensa maioria dos pedagogos brasileiros está convencida de que isso se resolve com mais Paulo Freire, aquele autor a quem você só critica em público se estiver a fim de ouvir desaforos. Eis o motivo pelo qual, mesmo os que dele divergem silenciam em vez de denunciar os danos que já produziu à educação brasileira. Jamais use o nome desse deus em vão. Diante do lead deste texto, os fiéis seguidores do “padroeiro” da educação nacional afirmarão que o PISA é um parâmetro bom para a realidade do aluno da Finlândia, mas não “dialoga” com uma sociedade em que os jovens precisam ser “conscientizados” de sua condição oprimida e de sua necessidade de libertação. Deu para entender, ou quer que o professor barbudinho lá do quadro negro desenhe?
Cresça e apareça, PISA! Quando a turma de vocês estiver interessada em “problematizações” que não envolvam aritmética, ou em medir a qualificação e preparação de alunos para a cidadania, venham todos ao Brasil. Antes não. Elaborem um questionário sério sobre oprimidos e opressores, machismo, feminismo, racismo, preconceito, politicamente correto, ideologia de gênero, ditadura militar e conscientização política. Aí sim, vocês ficarão conhecendo a força da educação à brasileira. Não apareçam mais aqui com raiz quadrada, regra de três, propriedades do oxigênio e compreensão de texto, que é mera submissão do leitor à intenção do autor. Raus! Get out!
Não me digam o quanto dói o que acabei de expressar porque machuca a mim enquanto escrevo. Sei que apesar da má remuneração, da carência de meios, da pressão dos sindicatos e dos colegas que fizeram curso e concurso para militantes políticos, milhares de professores acolhem diariamente suas turmas mobilizados pela sublime intenção de educere, nos dois sentidos em que o vocábulo latino tanto diz à educação: dar vazão às potencialidades, aflorando seus talentos, e encaminhá-los para uma vida proveitosa no mundo real.
Milhões de crianças e adolescentes brasileiros, porém, são recebidos em sala de aula como se fossem seres de quem não se pode cobrar sequer conduta civilizada, disciplina e respeito às autoridades escolares porque são mal nascidos, inferiores, incapazes de absorver qualquer conhecimento que exceda os limitados contornos do mundo em que vivem. Creio que nem na estreiteza dos países totalitários exista opressão igual.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
19/07/2018
A elite do esquerdismo brasileiro, tendo à frente Dilma Rousseff e Gleisi Hoffmann, foi a Havana para o 24º Encontro do Foro de São Paulo. O evento acontece a poucos meses dos festejos que marcarão 60 anos da renúncia de Fulgencio Batista em 1º de janeiro de 1959, seguida da tomada do poder por Fidel Castro. Sessenta anos! Vidas inteiras, do parto ao velório, submetidas aos caprichos e delírios ideológicos de uma pessoa. Mesmo depois de morto é ele, Fidel, que mantém de pé o vacilante e falimentar arcabouço ideológico da sua revolução.
Há um equívoco em afirmar que o regime cubano não funciona. Ele é perfeitamente funcional na perspectiva dos que se apossaram do poder. O pequeno grupo dirigente, representado pelo Comitê Central do Partido Comunista Cubano, habita o bem instalado andar superior da sociedade que o mantém. É um sistema em que a posição de mando não sofre qualquer ameaça.
Essa é a questão central da política cubana neste momento: como garantir o poder ao Partido Comunista e retirar o país da miserável enrascada em que a revolução o meteu. Obama, ao aproximar-se de Cuba, não fez qualquer exigência e jogou fora uma oportunidade de ouro. Ele queria os ganhos políticos da aproximação; o povo da ilha, com suas mazelas, que se danasse. Já o camarada chinês Xi Jiping deu bola e, por esse motivo enviou a Cuba o secretário geral do Partido Comunista do Vietnã, Nguyen Phu Trong, no mês de março deste ano. O conselho levado era simples: façam como nós, chineses e vietnamitas - segurem as rédeas da política e afrouxem as da economia. Deixem o povo ganhar dinheiro, mas não entreguem a caneta nem a chave da cadeia.
Pelo sim, pelo não, Cuba deu a partida para um processo constituinte cujas diretrizes já estão praticamente definidas. Alinham-se aquém do que agradaria aos chineses, mas além do que faria Fidel sorrir. O texto reafirma o papel reitor do Partido como “força dirigente superior da sociedade e do Estado” e define Cuba como um “estado socialista de direito”. De outra parte, reconhece o direito à propriedade privada, o direito de herança, abre-se para empresas totalmente privadas, inclusive estrangeiras e – por supuesto - preserva as estatais como sujeitos principais das atividades econômicas.
Imagino as dores de parto envolvidas no nascimento desse “bebê de Rosemary”. Quanto deve estar custando àqueles marxistas-leninistas reconhecer o amontoado de besteiras que praticaram durante seis décadas na condução da economia! E quanto, por causa disso, padeceu o povo com o permanente racionamento e os salários simbólicos, suficientes apenas para disfarçar sua real escravidão!
Pois foi nesse contexto local que se realizou o 24º Foro de São Paulo, presentes ardorosos líderes comunistas do continente. Pense numa situação desoladora! Lula preso, Fidel morto, Raúl aposentado, Maduro ferrando a Venezuela, Ortega indo pelo mesmo caminho e Cuba entrando no mundo dos negócios, aberta aos interesses do grande capital. Credo!
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
17/07/2018
Sei que nada é mais livre do que a burrice. A inteligência tem limites e a sabedoria exige imenso autocontrole. Mas a burrice não conhece obstáculos. Quando contrai matrimônio com uma ideologia, qualquer dessas que por serem também burras se opõem a tudo que delas não provier, surge uma energia destrutiva na sociedade.
Porto Alegre, a bela capital gaúcha que escolhi para viver, lá pelas tantas de sua história mais recente se tornou conhecida como Havana do Sul. Tudo começou no final dos anos 80 do século passado, quando parte expressiva da população encantou-se e se deixou conduzir pelos ditames da esquerda mais retrógrada do país. A cidade elegeu, consecutivamente, quatro prefeitos – fato inédito na história universal – tão esquerdistas quanto Olívio Dutra, Tarso Genro (duas vezes!) e Raul Pont. Com essa sequência ainda em curso, Porto Alegre se credenciou a ser a cidade símbolo do Fórum Social Mundial, aquele convescote do comunismo internacional que aqui começou e levou anos dando cria. Valendo-se do mecanismo de recíproco reconhecimento e mútua promoção característico dos aparelhos esquerdistas mundo afora, a capital gaúcha era exibida como “referência mundial” em democracia popular. Democracia popular, você sabe, era a trademark daquelas infelizes repúblicas dominadas pelo comunismo no Leste Europeu e na Ásia, cuja principal característica consistia em serem não democráticas e impopulares.
Essa esquerda, com o passar dos anos, perdeu o prestígio, mas continuou seu proselitismo, atuando coletivamente como efetiva vanguarda do atraso, título, aliás, de um bom livro do jornalista Diego Casagrande. Os espaços dessa atuação são os usuais e é desnecessário repeti-los aqui. Entre suas pautas estava a ferrenha oposição a toda forma de progresso, desenvolvimento econômico, oportunidade de negócios (para quem não lembra, foi durante o período em que Olívio Dutra governou o Estado que a mais nova planta industrial da Ford, que já produziu 3 milhões de veículos, foi despachada para a Bahia). Pelo viés oposto, mesmo fora do poder, seguiu alimentando o corporativismo e promovendo o aparelhamento da administração pública e das instituições do Estado.
Entre as consequências desse infeliz pacote esteve a resistência à modernização da orla do esplêndido Guaíba e o aproveitamento das antigas instalações portuárias do Cais Mauá e do Estaleiro Só, relegadas ao abandono e à degradação. Qualquer projeto de melhoria para essas áreas passou a ser combatido como desrespeito à natureza, ao Guaíba e à cidade. Atos de repúdio, abraços públicos de proteção, plebiscitos, acaloradas audiências e quanto mais estivesse disponibilizado no arsenal do mais tacanho retrocesso foram usados ao longo dos anos para impedir a integração desses locais à vida urbana.
Finalmente, há poucos dias, fez-se visível o resultado da primeira vitória da população da cidade contra tais absurdos: aproveitando-se do primeiro domingo de sol após a inauguração da nova orla do Guaíba, verdadeira multidão estimada em 40 mil pessoas tomou posse do local. Só faltou um cartaz advertindo que quem foi contra deveria manter-se afastado dali. Essas pessoas deveriam dirigir-se ao trecho seguinte, onde tudo ainda está como lhes agrada – a terra é nua, propriedade privada das macegas, ratos, rãs, tuco-tucos e lixo.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina
12/07/2018
Você sabe por que o Brasil não consegue solucionar o problema da miséria? Porque, de um lado, deixamos de agir sobre os fatores que lhe dão causa, e, de outro, nos empenhamos em constranger e coibir a geração de riqueza sem a qual não há como resolvê-la. Os fanáticos da política, os profetas de megafone, os "padres de passeata", para dizer como Nelson Rodrigues (ao tempo dele não existiam as Romarias da Terra), escrutinando os fatos com as lentes do marxismo, proclamam que os pobres no Brasil têm pai e mãe conhecidos: o capitalismo e a ganância dos empresários. Em outras palavras, a pobreza nacional seria causada justamente por aqueles que criam riqueza e postos de trabalho em atividades desenvolvidas sob as regras do mercado.
Estranho, muito estranho. Eu sempre pensei que as causas da pobreza fossem determinadas por um modelo institucional todo errado (em 2017, o 109º pior entre 137 países, segundo o World Economic Forum (WEF). Pelo jeito, enganava-me de novo quando incluía entre as causas da pobreza uma Educação que prepara semianalfabetos e nos coloca em 59º lugar no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), entre 70 países. Sempre pensei que havia relação entre pobreza e atraso tecnológico e que nosso país não iria longe enquanto ocupasse o 55º lugar nesse ranking (WEF, 2017). Na minha santa ignorância, acreditava que a pobreza que vemos fosse causada, também, por décadas de desequilíbrio fiscal, gastos públicos descontrolados tomados pela própria máquina e inflação. Cheguei a atribuir responsabilidades pela existência de tantos miseráveis à concentração de 40% do PIB nas perdulárias mãos do setor público (veja só as tolices que me ocorrem!). E acrescento aqui, se não entre parêntesis, ao menos à boca pequena, que via grandes culpas, também, nessas prestidigitações que colocam nosso país em 96º lugar entre os 180 do ranking de percepção da corrupção segundo a Transparência Internacional.
Contemplando, com a minha incorrigível cegueira, os miseráveis aglomerados humanos deslizantes nas encostas dos morros, imputava tais tragédias à negligência política. Não via como obrigatório o abandono sanitário e habitacional dos ambientes urbanos mais pobres. Aliás, ocupamos a 112ª posição no ranking, entre 200 países, no acesso a saneamento básico. Pelo viés oposto, quando vou a Brasília, vejo, nos palácios ali construídos com dinheiro do orçamento da União, luxos e esplendores de uma corte dos Bourbons.
Mas os profetas do megafone juram que estou errado. A culpa pela pobreza, garantem, tampouco é do patrimonialismo, do populismo, dos corporativismos, do culto ao estatismo, dos múltiplos desestímulos ao emprego formal. Não é sequer de um país que, ocupando a 10ª posição entre os mais desiguais do mundo, teve a pachorra de gastar, sob aplauso nacional, cerca de R$ 70 bilhões para exibir ao mundo sua irresponsabilidade na Copa de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016. No entanto, os Pinóquios da política, das salas de aula, da mídia e dos púlpitos a serviço da ideologia, fanáticos da irrazão, asseguram-nos que existem pobres por causa da economia de empresa e dos empreendedores.
Um dos fenômenos brasileiros deste início de século é o silêncio das consciências ante toda falsidade. É a morte do grilo falante.
* Este texto atualiza dados de um pequeno trecho do meu livro “Pombas e Gaviões”, publicado pela AGE em 2010.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.