Muitos analistas políticos têm batido na tecla da necessária interlocução entre o Executivo e o Legislativo. Afinal, o Congresso tem a legitimidade institucional para aprovar ou não os projetos do governo e os cidadãos devem ficar fora desses assuntos. O parlamento é o lugar onde se fala e onde se verbalizam opiniões divergentes. Portanto, “bora conversar” que tudo se resolve.
Resolve? Não. Contudo, ainda que resolvesse – e vota e meia não resolve mesmo – a política é só isso? É apenas um formulário institucional onde os poderes conversam e as opiniões, magicamente, se harmonizam porque todos querem o bem do país? Acumulam nossas instituições méritos que as façam merecedoras da confiança nacional? Novamente, não.
Tenho como verdadeira a clássica lição segundo a qual a política é possível pelo que as pessoas têm de bom e necessária pelo que nelas há de mau. Sociedades humanas, para um ou para o outro, precisam de elite e precisam de liderança.
Certa feita, comentando as habilidades de Lula como comunicador, registrei minha observação segundo a qual, sobre o mesmo assunto, ele tinha opiniões diferentes para públicos diferentes e, graças a isso, era aplaudido dizendo A e dizendo o contrário de A. Essa “habilidade” é uma das condições necessárias para identificar um trapaceiro, jamais um estadista. Estadistas não molham o dedo na saliva e o esticam ao ar para perceber de que lado sopra o vento no auditório.
Na política, liderança e, especialmente, liderança exercida sobre a massa, é um dom distribuído em proporções escassas. Bolsonaro tem esse dom e só ele explica a vertiginosa escalada que o levou à Presidência, contrariando a vontade explícita de quase todos os profissionais da opinião pública, aí incluídos políticos e comunicadores.
Não adianta atacar e fustigar Bolsonaro, apontando suas limitações porque elas nunca foram dissimuladas. Ninguém está a descobrir uma face oculta do Presidente. Tais limitações sempre fizeram parte do jeito Bolsonaro de ser, jeito que a população conhece e ao qual atribui valor elevado num mercado de baixas cotações.
Parcela significativa da sociedade sabe que Bolsonaro não é o príncipe perfeito, mas percebe nele sadia intenção de se sacrificar para fazer a coisa certa. Não tenho o costume de usar citações bíblicas em textos sobre política, mas é impossível não lembrar, aqui, das palavras de Jesus sobre tomar a própria cruz e segui-lo. Tirar o Brasil da situação em que está exige do governante esse mesmo ânimo para enfrentar aqueles que fogem como o diabo de qualquer cruz. Que dizer-se de carregá-la! Ela, a cruz, é parte do problema do governo com a base.
O empenho que se percebe em tantos meios de comunicação, visando a constranger as redes sociais ao silêncio, sustar as cívicas e civilizadas mobilizações de rua e diagnosticá-las como intrusivas e impróprias, outra coisa não é que tentativa de isolar o Presidente de seu principal e mais consistente apoio.
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* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
ADILSON JORGE MUROS VEIGA - 24/06/2019 23:22:14
Sempre comentei sobre isso entre os familiares. A grossura e o mau jeito dele, está ligado ao caráter sincero. Ele é isso aí, e não muda de acordo com as circunstâncias.Lincoln Aires Pacheco - 24/06/2019 18:18:39
Presidente Bolsonaro está "dando mole" como sugeriu o Fagner na Conversa com o Bial numa destas madrugadas de insônia. Dia 30 precisamos "rugir mais alto" pois o tempo ruge. Professor Puggina sempre nos mostrando o caminho certo.Vanderlino Horizonte Ramage - 24/06/2019 14:07:14
Meu caro Puggina, teu verbo é perfeito. Com tua permissão vou explicitar meu lamento e meus temores. A luta será longa e dolorosa. As elites retrogradas, à esquerda e à direita que historicamente saquearam a nação, não cederão graciosamente. Isto me conduz à uma reflexão, como sair dessa pela via democrática? Como estou na oitava década da existência, estou há oitenta anos esperando o "país do futuro". Sou um otimista inveterado, mas sou humano, simplesmente humano, meu otimismo começa a fraquejar!!!Eduardo - 23/06/2019 14:50:21
Com sempre: o professor tem um discernimento incrível e sabe manifestá-lo como poucos. Prossiga, professor.Afonso Pires Faria - 20/06/2019 15:05:20
Puggina, já li muita coisa boa escrita por ti. Mas creio que agora, abusastes da sabedoria. Perfeito. Este texto tem que ser emoldurado e distribuído para todos os cidadãos de bem. Meus parabéns.ODILON SILVEIRA SANTOS ROCHA - 20/06/2019 00:09:35
Caro Professor Sem tecer comentário religioso, amém!