Percival Puggina

28/05/2015

 

 Escrevo este artigo em defesa de meus interesses próprios. Não, não me entenda mal. Não tenho fortuna grande, nem média, nem pequena. Minha fortuna é minha família, são meus amigos, meus leitores, minha fé e meus valores imateriais. Mas considero que defendo interesses próprios, como cidadão brasileiro, quando reprovo a taxação das grandes fortunas, como qualquer aumento de impostos, porque essa é uma ideia de jerico. Dela sequer se pode dizer que vem embalada nos ideais do igualitarismo. Não no nosso caso. Não na concepção mau caráter que lhe deu origem.

O ideal do igualitarismo, é bom esclarecer, já produziu desastres em proporções suficientes para que se saiba o que acontece quando deixa de ser ideal e vira prática. No caso brasileiro, porém, a taxação das grandes fortunas não representaria isso. Tampouco significaria um pouco mais do mesmo, ou seja, ampliação da política atual, que confunde donativo com renda e que, por isso, não consegue gerar progresso social. O governo brasileiro não resolve o problema da Educação dos segmentos de baixa renda, não lhes proporciona adequado saneamento básico nem atenção à saúde e não cria condições para que esses recursos humanos se habilitem às atividades produtivas. Todos se tornam, cada vez mais, dependentes do Estado, o que é a segunda pior situação possível.

A taxação das grandes fortunas, no Brasil, seria um caso inédito. Foi pensada agora, num momento de crise fiscal pela qual não precisaríamos estar passando não houvesse, a ganância pelo poder, gerado imperdoável prodigalidade do governo no uso do dinheiro que abusivamente nos toma. Em linguagem simples, sem pedaladas retóricas, a taxação dos mais ricos viria para salvar o Estado da escassez de recursos a que ele mesmo se conduziu. Algo assim só pode parecer razoável a dois tipos de pessoas: os amigos leais do Estado perdulário e os fanáticos do igualitarismo.

Há um erro imenso em atribuir a pobreza dos pobres à riqueza dos ricos, ou vice-versa. Essa é uma ideia desorientadora, que prejudica aqueles a quem pretende ajudar. Os pobres não são pobres por causa dos ricos. Eles são pobres por causa do Estado, são pobres porque não há concentração maior de renda do que a promovida pelo Estado quando fica com quase 40% de tudo que se produz no país! E, apesar dessa monstruosa expropriação, não só rouba e se deixa roubar, mas se omite em relação às políticas e ações que poderiam promover desenvolvimento social nas populações de baixa renda. O Estado não deveria “cuidar das pessoas”, mas deveria, isto sim, proporcionar condições para as pessoas cuidarem bem de si mesmas.

Precisamos das grandes fortunas. Elas viram poupança, investimento, postos de trabalho, consumo (inclusive sofisticado, claro) e tributos. Pegar esse dinheiro e entregá-lo à gestão do Estado é uma operação absolutamente contraprodutiva: tira-o de quem o faz produzir para entregá-lo a quem só sabe gastar.

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.
 

Percival Puggina

25/05/2015


Todos já sabem que o tal “Humaniza Redes” é jogada de marketing saída da cabeça do João Santana. Ou assemelhado. Resulta em bem concebida forma de censura a todos que não amam o PT, o petismo, o governo petista, a presidente Dilma e o ex-presidente Lula. Portanto, é violência disfarçada. É a “criminalização” do antipetismo.

 As organizações, personalidades e práticas políticas construídas em torno do partido da estrela, na cabeça dos que conceberam o Humaniza Redes, devem ser objeto de devoção e reverência nacional. Saudados com “Hasta la vitoria, siempre!”.

 A expressão “Vai pra Cuba!”, aliás, tem sido apontada como sólido indício de ódio contra o PT. Entretanto, poucas coisas tão ansiosamente desejadas por qualquer petista, da base ao topo da pirâmide partidária, quanto uma excursão a Cuba. Viajar a Havana, com ou sem a companhia de Lula, já foi prêmio disputado pela militância. Toda visita à ilha de Fidel Castro constitui ato litúrgico, uma espécie de batismo de fogo simbólico. Encontro-me frequentemente, em debates, com muitos desses “compañeros” que estudaram por lá com aval do partido, ou que fazem peregrinações periódicas à ilha, de onde retornam como quem transpôs os umbrais do paraíso socialista.

 Portanto, todo petista que se preze deveria responder a um “Vai pra Cuba!” com um “Se Deus quiser!”, principalmente porque a expressão poderia substituída por coisa muito mais desagradável e ofensiva, tipo “Vai pra Miami!” ou “Vai pra Nova Iorque!”. Mas isso sim, seria coisa de gente mal-humorada, intolerante, do tipo que se irrita com o Mensalão, o Petrolão, os sucessivos escândalos, as mordomias, as “pedaladas”, a irresponsabilidade fiscal, as mentiras e mistificações, as explicações esfarrapadas, a carestia, a inflação, o aumento de impostos e o crescente desemprego. Para ficar no que se sabe.

Ódio não é um sentimento que se deva cultivar. Por isso, sugiro um programa “Harmonize PT”, para acabar com a semeadura de ódio que o partido, há anos, semeia onde quer que a imaginação humana possa vislumbrar uma fissura em grupos sociais. Foi por esse caminho que o PT foi jogando os brasileiros uns contra os outros até darem conta do que estava acontecendo.

Mas se o ódio faz mal, tampouco seria benéfica e respeitável a passividade tolerante que o petismo apreciaria neste momento. O fiapo de democracia que nos resta está sustentado nos movimentos de rua e nas redes sociais porque as instituições, bem, as instituições estão com a vida ganha. E o país tem um governo petista com uma oposição tucana. Pode haver infortúnio maior? 
 

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.

  

Percival Puggina

24/05/2015

 Há exatos trinta dias um grupo de jovens partiu de São Paulo, a pé, rumo a Brasília, onde deverá chegar no próximo dia 27. Feliz a Pátria que os gerou! Marcham por nós. Esplendidamente teimosos, têm as mochilas cheias de amor à sua terra, anseios por mudanças e sadia indignação contra a praga de gafanhotos que infestou os altos escalões da República. São simbólicos seus passos e admirável sua irresignação. A imprensa os ignora. Cai sobre sua teimosia o silêncio dos acomodados e dos acumpliciados. No entanto, através das redes sociais, multidões os acompanham e chegarão com eles à capital federal, onde ensinarão civismo aos que não sabem o que é isso. Cobrarão das instituições o cumprimento do dever. Haverá, dia 27, o encontro da honra com a desonra. Do amor ao Brasil com seu oposto - a lascívia do poder. Representam-me ante os que deveriam me representar.

Se somarmos as três parcelas - tudo que se sabe, o que se suspeita, e o que tratam de manter oculto - há um camburão de motivos para que a omissão oposicionista seja ofensiva à dignidade nacional. Quando a oposição não faz o que deve, ou faz o que não deve, ou se muda para Nova Iorque, quebra-se uma das duas pernas da democracia. Em sua esplêndida teimosia, a pequena marcha que saiu de São Paulo pretende tirar o carro da oposição da vaga para cadeirante onde parece estar impropriamente estacionado.

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São as pesquisas de opinião que comprovam: se você reunir os adeptos de posições liberais e conservadoras, você congregará bem mais da metade da população brasileira. Majoritariamente, amamos as liberdades e sabemos que há valores que devem ser preservados para o bem de todos. No entanto, não existe no STF um único ministro em sintonia com qualquer das duas posições. O PT ainda não completou seu serviço e ali já puxam, todos, para o mesmo lado. Não bastasse a dissonância com a opinião pública e com o Congresso, é comum ouvir-se nos votos de Suas Excelências libelos contra essas duas posições. E não é só no STF que isso acontece. O estranho hábito de dar aulas à opinião pública se reproduz em boa parte da mídia, onde as palavras "conservador" e "liberal" são pronunciadas entre sorrisos tão maliciosos quanto parvos. O mesmo se reproduz com status professoral nas salas de aula do país. Têm, todos os mencionados e outros mais, a pretensão de agirem como corregedores das nossas opiniões. Mas nós temos, também, essa esplêndida teimosia do livre pensar.


ZERO HORA, 24 de maio de 2015
 

Percival Puggina

21/05/2015

 Duvido que algum pai, ao matricular o filho numa escola, fique na expectativa de que lhe sejam enfiadas na cabeça as ideias políticas que seus professores tenham. Os pais esperam exatamente o oposto. Esperam que os professores não façam isso porque reservam tal tarefa para si mesmos, segundo os valores e a cultura familiar. Quando um professor, o sujeito no quadro negro, o cara de cima do estrado, que corrige prova e dá nota, usa a autoridade e os poderes de que está revestido, para fazer a cabeça de crianças e jovens, exerce sua profissão de modo abusivo. Figurativamente, pratica estupro de mentes juvenis. Se o professor quer fazer proselitismo político, se anseia por cooptar militantes para sua visão de mundo, de sociedade, de economia, de política, de história, que vá procurar um vizinho, um colega, um superior. Figurativamente, que deixe de ser abusador e vá enfrentar alguém de seu tamanho intelectual.

Volto a este assunto porque, aqui no Rio Grande do Sul, o Sinepe/RS, sindicato patronal das escolas particulares, convidou o Dr. Miguel Nagib, coordenador do movimento Escola sem Partido, para uma palestra aos diretores de escolas. Ótimo, não é mesmo? Sim, ótimo para todos os alunos e pais, mas não para o sindicato dos professores das escolas particulares, o Sinpro/RS. Em assembleia geral, o sindicato emitiu Moção de Repúdio ao evento, em veemente defesa do direito dos professores de influenciarem politicamente seus alunos. No texto (que pode ser lido em aqui), os docentes afirmam que "retirar da Educação a função política é privá-la de sua essência" para colocá-la a serviço "da ideologia liberal conservadora" à qual os mestres de nossos filhos atribuem todas as perversidades humanas, das pragas do Egito ao terremoto do Nepal, passando por Caim e Jack o Estripador.

Não é por acaso que nosso sistema de ensino se tornou um dos piores do mundo civilizado. Afinal, sua essência é ser campo de treinamento de militantes para os partidos de esquerda. Os dirigentes do sindicato dos professores do ensino particular (e não pensam diferente as lideranças dos professores do ensino público) estão convencidos de serem detentores não do dever de ensinar, mas do direito de doutrinar! E creem que essa vocação política, superior a todas as demais, "essencial à Educação", encontra na sala de aula o espaço natural para seu exercício. Se lhes for suprimida essa tarefa "missionária" e lhes demandarem apenas o ensino da matéria que lhes é atribuída, esses professores entrarão em pane, talvez porque seja isso o que não sabem fazer.

Espero que tão destapada confissão de culpa emitida pelo Sinpro/RS sirva de alerta aos pais e à direção das escolas. Os pais pagam para que seus filhos recebam os conteúdos pedagógicos do estabelecimento de ensino escolhido. Entregar junto com isso, ao preço de coisa boa, mercadoria ideológica estragada, vencida, não solicitada e sem valor comercial, é fraude.

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.
 

Percival Puggina

20/05/2015

 Durante sua sabatina na CCJ do Senado Federal, o Dr. Luiz Fachin foi confrontado com suas próprias posições, conhecidas do mundo jurídico e acadêmico nacional. O indicado pela presidente Dilma sempre foi um militante de esquerda, ligado ao MST e defensor de teses que se contrapõem à Constituição Federal. Como poderia um magistrado avesso a importantes preceitos constitucionais ser intérprete da Lei Fundamental? Iria ele reproduzir a conduta de seus futuros colegas? Em algumas votações, ao longo dos últimos anos, muitos deles deixaram a Carta de lado e votaram em conformidade com suas opiniões pessoais, afrontando os constituintes de 1988 e os legisladores ordinários que os sucederam.

 Posto entre a espada que o interrogava e a parede de sua biografia intelectual, o candidato Fachin pediu socorro a Max Weber. Disse que, como professor, membro da academia, no mundo intelectual, posicionava-se segundo a ética da convicção. Ou seja, ensinava, escrevia e assumia atitudes públicas em harmonia com suas convicções pessoais. Contudo, na condição de ministro do Supremo, estaria sob a ética da responsabilidade, que lhe era imposta pela Constituição, e que jamais se prestaria para transformar o STF em substituto ou em extensão do Congresso Nacional.

Conversa para senador dormir. Oitenta e um dos 81 senadores sabem que o STF tem legislado, mesmo sem o auxílio do Dr. Fachin. Todos os senadores sabem que o Supremo faz isso, dizendo que não faz, enquanto faz. Todo brasileiro bem informado sabe que o STF, com 11 membros, decide por seis a cinco e que em caso de empate, o voto solitário de qualquer de seus ministros vale mais do que o voto de 257 deputados federais e 41 senadores juntos, ou seja, metade mais um de cada uma das duas Casas.

Portanto, ao enviar para o STF mais um "progressista", ao empobrecer a Corte com mais um membro da vanguarda do atraso, ao conceder cadeira a outro adepto das ideias que infelicitam o Brasil e boa parte da América Latina neste início deste século 21, o Senado se submeteu à ética do PT. Jogou fora Max Weber e aderiu à ética da ambiguidade, da incerteza, da irresponsabilidade. Decidiu na contramão da segurança jurídica. Pisou no acelerador da revolução através do Judiciário. Ajudou a transformar o Supremo numa corte venezuelana, onde pupilos do partido do governo trocam piscadelas de olho como parceiros de jogo de cartas.

Esta noite em que escrevo é uma noite triste para o Brasil. Trocamos Barbosa por Fachin. Mais um ponto para dentro da curva petista. O Paraná, exoticamente, festeja. O Paraná, por indecifráveis motivos, converteu a escolha de um paranaense para o STF, por iniciativa da presidente Dilma, em suprema honraria regional. Se eu fosse paranaense veria essa indicação como um agravo e exigiria reparações. Admito, estou irritado, cansado e triste. Brasília não me dá alegrias.

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.
 

Percival Puggina

19/05/2015

Embora permanentemente desmentida, é muito inerente à nossa formação cultural a idéia de que as leis geram uma força própria suficiente para superar as dificuldades de que tratam. Há um problema? Faça-se lei para resolvê-lo. Feita a lei, lavam-se as mãos e dá-se tudo por resolvido. Essa mesma fé nos leva a crer, por outro lado, que as relações sociais devam estar regidas por estatutos legais, o que acaba inibindo os espaços próprios aos ajustes interpessoais, aos contratos e à liberdade, enfim.

Se verdadeira tal crença no poder corretivo das leis, nosso país deveria ser um modelo de virtudes coletivamente atingidas e a vida fluiria doce e suavemente, conforme a concebem os que redatores dos códigos. No entanto, observo uma realidade diferente e sou induzido a uma convicção diferente. Quanto mais educação dermos às pessoas, quanto melhores forem os valores a elas transmitidos, quanto mais elas se deixarem conduzir por princípios, menor será o número de leis de que necessitaremos e maior será o espaço da liberdade vivida como bem moral determinante de condutas corretas. Em palavras que melhor resumam o que pretendo dizer: estamos fazendo leis em excesso e educando de modo escasso.

Pergunte a qualquer professor na faixa etária dos 50 anos qual a avaliação que faz entre a qualidade da educação que era ministrada ao tempo de sua infância e a que é fornecida hoje. Não estou me referindo a meros conteúdos didáticos. Estou falando em muito mais do que isso, estou aludindo à verdadeira educação, àquela que prepara as novas gerações para a vida social e para o exercício da liberdade. E sublinho: não estou limitando essa tarefa educativa apenas à sala de aula. Estou falando na educação que deve ser proporcionada em casa, nas Igrejas, nos vários ambientes de convívio social e mediante os meios de comunicação.

Faça mais, pergunte a você mesmo sobre a insistência com que a responsabilidade, a solidariedade, e o respeito à verdade, ao patrimônio alheio, à dignidade do outro, às autoridades e instituições, aos idosos, eram passados a você. E compare com o que vê a seu redor. Poste-se diante de um monitor de TV e faça uma sinopse dos valores e desvalores exibidos. Compre uma revista, dessas que são destinadas ao público adolescente, e veja se encontra ali algum conteúdo que contribua de modo positivo para o adequado uso da liberdade.

De nada nos valerão tantas leis enquanto a sociedade, a partir da infância, for educada para a transgressão.

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.

                     

Percival Puggina

16/05/2015

 Estamos assistindo, país afora, aquilo que autores e agentes da doutrinação denominam "releitura da história na perspectiva dos excluídos". Segundo afirmam, sua original e acurada lupa vem corrigir o estrabismo dos vitoriosos, que teriam imposto a versão que melhor lhes convinha. É preciso, dizem, reescrever tudo porque a história foi mal contada.

 Fui buscar meus livros. Eu precisava ver se deles constava que os portugueses haviam comprado a terra dos índios, ou que os bandeirantes se faziam acompanhar de assistentes sociais e antropólogos em suas incursões pelo interior. Nada. Também não encontrei qualquer obra relatando que os negros tivessem vindo para o Brasil a bordo de transatlânticos, atraídos pelos investimentos na lavoura açucareira. Tampouco li que as capitanias hereditárias fizeram deslanchar a reforma agrária, que Tiradentes se matou de remorso, ou que D. João VI foi um audacioso guerreiro português.

Em livro algum vi ser exaltado o fervor democrático e a sensibilidade social da elite cafeicultora paulista. A única coisa que localizei foi uma breve referência ao fato de que a tentativa de escravizar índios não deu certo por não serem eles “afeitos ao trabalho sistemático” (e isso, de fato, era preconceituoso: ninguém, sem receber hora extra, moureja tanto, de sol a sol, quantos os índios).

Mas a tal releitura vem impondo seus conceitos através da persistente ação de muitos professores ocupados com fazer crer que o conflito entre oprimidos e opressores, incluídos e excluídos seja o único e suficiente motor da história. Você sabe bem a quem serve essa alarmante simplificação.

Poucas coisas têm a complexidade dos fatos históricos. Ensina João Camilo, em consonância com Aristóteles, que a História tem causa eficiente (a vontade livre); causas materiais naturais (demográficas, econômicas, geográficas); causas materiais culturais (políticas, educacionais e religiosas); causas formais (doutrinas e ideologias); causas instrumentais (estruturas políticas); e causa final (grandes valores, sentido do bem, etc.).

Sendo assim, como pode prosperar uma simplificação que resume tudo à luta entre classes? São duas as razões. A primeira é político-ideológica: ela serve bem para o discurso da esquerda porque suscita o sentimento de revolta, fermento sem o qual sua massa de manobra não cresce. E a segunda é intelectual: a simplificação satisfaz os que têm dificuldade para entender fenômenos mais complexos.

Arranca-se o véu da mentira e se revela ao mundo que o paleolítico inferior dos indígenas era muito superior à cultura européia do século XVI. E de carona resolve-se o clássico problema: a quem culpar quando não havia FHC, neoliberalismo nem elite branca de olhos azuis?
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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.

 

 

Percival Puggina

14/05/2015

 Enquanto a presidente vai lomba abaixo, como um caminhão sem freio, saudando mandiocas e interessada no armazenamento de ventos, o país, à deriva, colhe tempestades. No último dia 13, Dilma vestiu-se de vermelho e foi a um evento da CUT. Ou seja, saiu de casa e foi para casa. Eventos da CUT são dos raros em que ela consegue não ser vaiada. Nessas oportunidades, o dito "coração valente" de sua excelência sai de trás das cortinas, ganha coragem, recebe injeção de adrenalina e parte para o ataque. Falou do quê? Da imensa crise em que atolou o Brasil? Não! Essa crise, para ela, acontece por fatores extramuros, galácticos, que não guardam relação com a intimidade do governo, dos camaradas, dos companheiros e dos partidos da base. São todos inocentes como ovelhinhas de presépio. Do Lulão ao Lulinha. A economia, segundo Dilma, vai mal por aqui em virtude de não sei qual urucubaca que se haveria abatido sobre a economia mundial.

Falso! Falso como um balanço da Petrobrás petista. Falso como uma prestação de contas do governo. Falso como um discurso do dindinho Lula. O World Economic Outlook do mês de julho, relatório elaborado pelo FMI, atualizou as projeções de janeiro prevendo, agora, um crescimento de 3,3% para a economia mundial. As economias avançadas, referidas pela esquerda brasileira, como em estado canceroso terminal, têm evolução positiva. EUA 2,5%, Área do Euro 1,5% (p.ex: Alemanha 1,6%, França 1,2%, Espanha 3,1%, Portugal 1,7%), Reino Unido 2,4%. Os grandes desastres ficam por conta de alguns parceiros bolivarianos do petismo, especialmente Venezuela, Equador e Argentina os quais, como o Brasil, são conduzidos por inveterados demagogos e bravateiros.

O PIB brasileiro vai cair 3% e seu governo vive um diz e desdiz, um faz e desfaz, um decide assim e logo decide assado, sem rumo nem prumo. Qual a atitude da presidente ante o país à deriva? Segura o leme? Olha para a bússola? Ajeita a vela? Não. Dilma faz negócios. Vende o governo em troca de apoios para permanecer no cargo. E faz afirmações como esta: "Quem tem força moral, reputação ilibada e biografia limpa suficientes para atacar a minha honra?". Diante dessa pergunta milhões de mãos se levantam, presidente!

E ela prossegue: "Lutarei para defender o mandato que me foi concedido pelo voto popular, pela democracia e por nosso projeto de desenvolvimento". Projeto de desenvolvimento com a economia encolhendo três por cento neste ano? Força moral? O governo é um catálogo sobre o que não se deve fazer na gestão pública! Dilma ainda preside a República, é verdade. Mas a preside malgrado não se qualificar, pessoalmente, para qualquer função na iniciativa privada onde se espere desempenho.

* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões e A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


 

Percival Puggina

14/05/2015

 Desde o dia 24 de abril, um grupo jovens caminha ao longo dos 1,1 mil km que separam Brasília da cidade de São Paulo, de onde partiram. Junto com a bandeira do Brasil, levam faixas e cartazes pedindo o impeachment da presidente. Proclamam "Fora Dilma!" e "Fora PT!".

A marcha, de 33 dias, segue pelo acostamento das rodovias e vai sendo aclamada pelos que passam e pelos moradores das cidades por onde transitam. Os caminhantes têm pés de romeiros, corações de guerreiros e amor à pátria. Anima-os um amor verdadeiro ao Brasil, amor virtuoso, que se submete ao sacrifício da intempérie, que vence o cansaço, que desconhece desânimo e que não olha para trás. Aqui ou ali, os exércitos de Stédile ladram enquanto sua caravana passa, na chuva e no sol, por vezes noite adentro.

A marcha cresce, em grandeza e significado, a cada repórter que não reporta, cada fotógrafo que não clica ou noticiário que não noticia. Os grandes gestos se tornam ainda maiores quando ocultados por quem os deveria divulgar. Entende-se. Há neles uma grandeza que oprime e constrange os acomodados e os acumpliciados.

Queridos leitores destas linhas. Feliz a Pátria que gerou tais filhos! Que lição esplêndida, a juventude brasileira vem proporcionando à Nação nos últimos meses! Foram eles, os jovens, rapazes e moças, que levaram milhões às ruas nas grandes demonstrações de março e abril. Nenhum era nascido quando o PT surgiu. A maioria sequer se equilibrava em skate quando Lula foi eleito. Mas descobriram, em poucos anos, algo que a imensa maioria da população levou três décadas para ficar sabendo. E trataram de agir. Hoje, marcham pelo Brasil. Ensinam civismo aos Congressistas. Representam-nos ante os que nos deveriam representar. Falam pelos que calam, embora devessem falar. Cobram das instituições o cumprimento de seu dever.

Pare um momento, leitor, e faça uma oração por eles. Agradeça a Deus pedindo que o Senhor guie seus passos. E divulgue o que estão fazendo. Quem puder, esteja com eles em Brasília no dia 27. O Brasil precisa saber que, malgrado a omissão dos omissos, apesar da penumbra que encobre em mistérios e silêncios os bastidores das instituições, há neste país rapazes e moças que iluminam o futuro com suas presenças.

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* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar.