• Alex Pipkin, PhD
  • 31 Agosto 2020

 

Evidente que a gestão de uma empresa privada é distinta de um governo ou organismo público.

No entanto, diferentemente do que alguns filósofos ideológicos - tanto liberais como socialistas - pensam, há verdades (novilíngua hoje!) incontestáveis na administração privada que, principalmente na administração pública, deveriam ser honradas e respeitadas.

Afinal de contas, "democracia" não é uma das palavras mais entoadas hoje por nossos governantes, e verdadeiramente não significa que todo o poder reside "no povo"?

Bah, no povo, a mais verbalizada e escrita é uma das que mais me assusta, enfim, a tal "gratidão"!

Muitos afirmam que o Estado é uma espécie de da Mãe Joana, porém, o que tenho constatado cada vez mais assustado é justamente o contrário.

Nossos jovens tiranetes aqui na Cuba dos Pampas e na respectiva capital da vanguarda do atraso, aparentam terem se adonado do governo.

Claro que eu sei que os homens não são anjos, e é por isso que a única forma de conter a ânsia de populistas despreparados e de suas ambições despropositadas e autoritárias, dá-se por meio de um aperfeiçoamento das estruturas que buscam um melhor alinhamento entre os diversos e distintos interesses em jogo.

Imaginem, se numa empresa privada já é difícil gerenciar os conflitos de interesses entre acionistas, gerentes, empregados, fornecedores, etc., que dirá no governo "do povo"?

Qualquer pessoa que queira gerir algo deveria ter conhecimentos básicos sobre a Teoria da Agência.

Sem entrar no detalhe, qualquer um entende que há uma série de conflitos que se estabelecem entre todas as partes envolvidas em um determinado negócio.

A propriedade é de que detém as ações da empresa, a posse está com quem a administra no cotidiano, e o controle, pelo Conselho de Administração, por exemplo, normalmente compreende o fundador, investidores, especialistas externos e representantes dos trabalhadores.

Desde Jensen e Meckling (1976), estuda-se a separação entre o principal, o que zela pelos interesses da empresa, em especial no longo prazo, e do agente, ou seja, aquele que dirige a empresa no dia a dia.

A fim de minimizar os custos e gerenciar os conflitos de interesse, torna-se fundamental um mecanismo de controle, de governança corporativa.

Porém, no nosso Estado e na capital, os donos da bola são exclusivamente eles! Manda quem pode; obedeçam seus servos, porque vocês precisam de nós!

Em termos de serviços públicos, conhecemos bem - e tristemente - a "qualidade" daquilo que nos oferecem... pelo amor dos meus filhinhos.

Os tiranetes e os funcionários estatais nos ditam o que temos e aquilo que nos é imposto a aceitar. Não gostou? Vão reclamar pra FIFA!

Não tem ajudado nem mesmo a entrada de gente com visão e com experiências no setor privado; eles sempre conseguem dar um jeitinho de manter a inércia e a respectiva burocracia para atrapalhar a vida daqueles que pagam seus salários, e que precisam trabalhar e produzir para gerar riqueza!

A "assustadora inovação", é que agora eles recrudesceram as suas sanhas autoritárias e aprofundaram o seu "bel-prazer".

Não dialogam com ninguém, não ouvem, muito menos escutam as lideranças empresariais, sociais - e até mesmo religiosas -, são genuinamente aqueles que têm a posse real de seus poderes!

Na verdade, não dão bulhufas à Câmara dos Deputados e/ou vereadores, entidades empresariais e sociais; aqueles que ousam questionar seus poderes ditatoriais são atacados pessoalmente, na estratégia de agressões ad hominem... simples covardes.

Numa coisa eu preciso ser justo com eles; estão tentando "INOVAR". Mas a inovação que têm praticado, ao invés de ser aquela que deriva do diálogo efetivo com todas as partes interessadas na sociedade, com aqueles reais especialistas que conhecem bem onde os calos apertam, é a REGRESSÃO AUTORITÁRIA, isto é, CALEM A BOCA, QUEM MANDA AQUI SOMOS NÓS, e ponto final.

Definitivamente, a governança na gestão pública tem funcionado basicamente como eu com um taco de golfe na mão...

Tá, o que nós, o povo, podemos fazer para mudar tal situação?

Sem aprofundamentos, duas coisas parecem-me pertinentes.

Em tempos de redes sociais, eu esperaria uma mobilização social intensa contra esses tiranetes, e que a pressão social tivesse - como parece que está ocorrendo - os desejados efeitos poderosos da difusão pela rede.

Segundo, em novembro próximo, na hora de escolher e votar no prefeito e em vereadores, minimamente, olha o currículo, experienciais e vivenciais para além desses mequetrefes políticos profissionais.

Já seria um bom começo, não é mesmo?!

 

Continue lendo
  • Prof. Ubiratan Jorge Iorio
  • 30 Agosto 2020

 De uns tempos para cá vêm provocando perplexidade inquietante certos atos e declarações de alguns habitantes do Olimpo, aquele edifício de arquitetura moderna, bem ali na Praça dos Três Poderes, que tem na frente de sua fachada a estátua de Alfredo Ceschiatti – A Justiça – vazia de beleza, para o meu gosto um tanto arredio ao concretismo –, representada por uma mulher sentada, com os olhos vendados, com uma espada apoiada sobre as coxas e, intrigantemente, sem portar a balança da justiça que se espera deva trazer sempre consigo e, para maior espanto meu, com o pé esquerdo apoiado no chão, mas à frente do direito. Sim, pode ser coincidência, eu sei, mas é porque gosto de procurar pormenores em obras de arte e também porque, segundo rumores que circulam nos corredores do Google, Ceschiatti demitiu-se da Universidade de Brasília, onde lecionava escultura e desenho, em solidariedade a colegas esquerdistas envolvidos em problemas com o governo da época por razões políticas.

Mas vamos ao que interessa? Uma das insólitas atitudes das supremas onipotências deu-se no final de julho, quando o presidente da corte suprema, como em uma erupção de sarampo ou catapora, revelou marcas assustadoras de autoritarismo, ao proclamar - e quem tem ouvidos para ouvir ouviu e quem tem olhos para ver viu - que enxerga aquela corte como editora da opinião de todos os brasileiros. O que isso significa?

Ora, a origem da palavra “editor” vem do latim editio, que é o ato de trazer a público, entregar e que vem, por sua vez, de ex (para fora) e de edere (produzir, levar ao conhecimento). Um editor, então, é alguém que publica, ou corrige, ou adapta algo de acordo com certas regras e normas. O editor de um programa de rádio ou televisão ou de um jornal ou revista, portanto, é o jornalista responsável pela edição do programa, livro ou texto, com liberdade para formatar e alterar a matéria e fazer os ajustes finais, para que a mesma obedeça a normas e padrões estabelecidos pelo órgão responsável por ela.

Por sua vez, o vocábulo censura (do latim censura) expressa a desaprovação e consequente proibição (ou remoção, se for ocaso) da exposição pública de alguma informação, sob o pretexto de proteger interesses, seja de um estado, empresa ou cidadão. Na Constituição Federal de 1988 essa palavra aparece duas vezes. O Art. 5º, inciso IX, do Capítulo I, dispõe que “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” e o § 2º do Art. 220, Capítulo V, estabelece que “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Por conseguinte, nossa lei maior veta a censura, entendida como qualquer ato com o intento de abolir ou suspender a circulação de informações, opiniões ou expressões artísticas.

É óbvio - e do conhecimento até das dezenas de maritacas que diariamente passam voando em sua alacridade defronte à minha varanda, de manhã para o oeste e à tardinha para o leste -, que a Constituição Federal aplica-se igualmente a todos, sejam pessoas físicas, empresas privadas e públicas, autarquias, órgãos de Estado e, destarte – e não deveria nem ser necessário lembrar isso, tamanha a notoriedade –, à colenda e venerável corte que tem por missão precípua ser a garantia de que seja cumprida.

Não é difícil perceber os perigos a que os cidadãos ficam expostos quando a corte suprema do país e – o que realmente é difícil de crer - por intermédio da própria pessoa de quem a preside, arvora-se em editar a opinião de quem quer que seja. Primeiro, porque o direito a ter ideias próprias é intocável em qualquer democracia; depois, porque essa pretensão escapa totalmente à principal atribuição desse tribunal, razão até da sua existência, que é a de resguardar e garantir o respeito à Constituição e terceiro, porque não há como assegurar que os padrões e normas adotados pelos “editores” de plantão não espelhem valores de teor político, pessoais ou preferências ideológicas, o que é normal, pois estamos falando de indivíduos, ou – e neste caso não seria normal – não reflitam interesses partidários.

Cumpre salientar que opiniões, assim como ideias, podem ser boas e más, verdadeiras ou falsas, morais ou imorais, ilegais ou legais, mas, quando aquelas potencialmente causadoras de danos a terceiros permaneçam apenas como ideias nas cabeças de quem as hospeda, não existe crime. Um sujeito pode, por exemplo, planejar assaltar um banco, porém, se não o fizer, não terá cometido crime algum e, portanto, não poderá ser julgado e nem condenado.

É importante frisar que são os atos concretos, e não as intenções de praticá-los, que devem ser levados em conta. Mesmo assim, levá-los em conta, em qualquer regime democrático, não significa que sejam passíveis de “edição” e censura por parte de quem quer que seja. Com toda a franqueza, chega a ser revoltante quando se vê alguém cheio de pose e vazio de modéstia, repetir o chavão “estado democrático de direito” como uma espécie de senha para garantir sua beatificação. Em um estado de direito, estado democrático de direito ou, simplesmente, em uma democracia, ninguém tem o direito de editar a opinião de ninguém. Fazê-lo é censurar e ameaçar fazê-lo censurar ex ante. A Constituição proíbe. E quem tem o dever de zelar por ela jurou fazê-lo.

Por fim, tenho que escrever outra obviedade gritante: quando alguém se sente ofendido, lesado, prejudicado, agredido em sua honra, acusado injustamente, difamado ou ofendido por alguma pessoa, o que tem que fazer é procurar um advogado para resolver o problema.

Sim, um bom advogado, e não um editor, e não um censor. O Brasil cansa.

      *  Publicado originalmente em ubirataniorio.org

Continue lendo
  • Plínio A. V. Lins
  • 30 Agosto 2020

 

No seu quilométrico voto no inquérito sobre as Fake News, o ministro-relator Edson Fachin usou cerca de 1/3 do tempo em citações à justiça americana. Faltou fazer também algumas comparações: os nove juízes da Suprema Corte dos EUA ganham um salário fixo que lhes permite uma vida bastante digna e confortável, e mais nada. Cada um deles tem direito a quatro (isso mesmo, somente quatro) assessores, assim mesmo, temporários, com "mandato" de um ano. Não há auxílios para moradia, paletó ou combustível. Só o presidente da Corte tem carro oficial com motorista, enquanto os demais têm direito apenas ao uso de uma vaga na garagem do Tribunal.

Uso de jatinhos? Nem pensar! Discutem apenas temas relacionados às leis federais, incluindo a Constituição americana, algo facilitado por ter apenas sete artigos e se manter inalterada há 233 anos, exceto pela inclusão de 27 emendas, inclusive a que proíbe o Congresso de votar leis com qualquer tipo de censura à imprensa ou à liberdade de expressão e de manifestação.

Os julgamentos obedecem a uma severa rotina: ouvidas as partes e testemunhas e cotejadas as provas, os juízes se reúnem a portas fechadas, sozinhos, proibindo-se até os assessores de entrar para oferecer água. Obtido o consenso, o lado vencedor fica encarregado de redigir o Acórdão, só então anunciado em plenário. É simples assim o funcionamento da Corte Suprema da mais rica potência democrática do mundo!

Não se discutem Habeas Corpus a políticos ou empresários, até porque na América nem o presidente da República tem foro privilegiado. Todos são julgados pela justiça comum e podem ser detidos logo após a decisão em primeira instância, aguardando presos o julgamento de recursos. A imensa maioria do povo americano não conhece os rostos desses ministros nem sabe seus nomes, até porque juiz lá não dá entrevistas, fica longe dos holofotes, não fala fora dos autos e jamais se manifesta sobre assuntos ou pessoas, justamente pela possibilidade de que um dia possa vir a julgá-los.

Raríssimas são as decisões monocráticas e não se aplicam a temas que afetem direta e profundamente a vida dos cidadãos. Por esse conjunto admirável de características positivas, principalmente o distanciamento seguro da política, é uma Corte extremamente respeitada, inexistindo motivos para manifestações contrárias à sua existência. No Brasil, já tivemos oito Cartas Magnas e somente a última, de 1988, já sofreu 53 emendas! Mudou-se a jurisprudência exclusivamente para soltar corruptos condenados em segunda instância.

Manifestações legítimas e ordeiras em Brasília, com as famílias vestindo verde e amarelo, a favor de Bolsonaro, foram taxadas, inclusive no voto de Fachin, de antidemocráticas e inconstitucionais por exibirem cartazes pedindo o fechamento do STF e do Congresso. Já os quebra-quebras em São Paulo e Curitiba, onde inclusive foi rasgado, pisado e queimado o nosso maior símbolo, a bandeira nacional e houve dezenas de ofensas ao presidente, além de faixas incitando o golpe para tirar Bolsonaro de um dos poderes constituídos da República, foram consideradas democráticas pela mídia e mereceram um sonoro silêncio de todos os membros da Suprema Corte. Por quê?

Segundo o voto do relator Fachin, eu posso ser processado se uma das excelências julgar este texto ofensivo, mas o decano Celso de Mello pode taxar de nazistas os bolsonaristas que sempre se manifestam dentro da lei e da ordem. Onde está a Justiça, a isenção, a imparcialidade?

Ou só se pode manifestar para elogiar?

Plinio A.V. Lis é jornalista
 

Continue lendo
  • Gianfranco Bellinzona
  • 28 Agosto 2020


Sobre as matérias da pandemia, meio ambiente e mudanças climáticas, os intelectuais progressistas, maîtres à penser da nossa época, proclamam ser aliados da ciência contra o suposto obscurantismo dos conservadores. 

Respaldados pela mídia militante, rotulam de anticientíficos aqueles que expressam ideias divergentes das do pensamento único “politicamente correto”.
É a antiga armadilha retorica – argumentum ad hominem - apontada pelo filosofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860) no celebre ensaio Dialética erística - A arte de estar certo: denigre a imagem do opositor para prevalecer no debate e ganhar consenso.

O pensamento liberal, justamente porque aprecia o valor autentico do conhecimento cientifico, distingue com clareza a ciência da pseudociência.
A ciência não é nem progressista nem conservadora, é simplesmente progressiva porque o nosso atual conhecimento sobre a natureza é só uma mínima parte do todo conhecível.

Na historia da ciência, teorias já tidas como certas vem sendo substituídas por outras mais firmes e abrangentes. Portanto, os verdadeiros cientistas não assumem atitudes arrogantes, cientes que os resultados das pesquisas são sempre provisórios e questionáveis e a firmeza de uma teoria, mesmo quando respaldada por centenas de dados, pode ser abalada por uma só evidencia contraria.

O pensador liberal e filosofo da ciência Karl Popper (1902-1994), talvez o maior epistemólogo contemporâneo, ensinou que a marca distintiva de um asserto autenticamente cientifico é propriamente o fato de ser questionável. Toda e qualquer proposição apresentada como inquestionável pode expressar um firme convencimento subjetivo, um mito ou uma crença, mas de certo não é um asserto cientifico.

Apesar do engajamento dos intelectuais progressistas e da mídia militante, o pensamento único politicamente correto não combina com a ciência, não gera progresso e sim estagnação cultural.

*O autor é italiano, residente no Brasil e doutor em História e Filosofia.
 

Continue lendo
  • Gilberto Simões Pires, em Ponto Crítico
  • 27 Agosto 2020

 

PRODUTIVIDADE ESPETACULAR

Antes de tudo é preciso que se faça um importante reconhecimento: dentre os 11 ministros do STF, Gilmar Mendes é, sem a menor sombra de dúvida aquele que mais trabalha. Mais: além de trabalhar com muita disposição e exaustivo afinco, a produtividade que Gilmar Mendes mostra como ministro da Sociedade Protetora dos Criminosos é simplesmente impressionante.

OBSESSÃO POR CRIMINOSOS

A obsessão que Mendes mostra pela INJUSTIÇA, que tem tudo a ver com um TOC - Transtorno Obsessivo Compulsivo, é de tal forma que poucas horas após ter ANULADO A SENTENÇA do doleiro Paulo Roberto Kurg por crimes financeiros cometidos no caso Banestado, considerado como um dos maiores PLANOS CRIMINOSOS já montados no nosso empobrecido Brasil, Gilmar Mendes, sem demonstrar o mínimo sintoma de cansaço SUSPENDEU A AÇÃO PENAL aberta pela Lava Jato de São Paulo contra o senador José Serra e sua filha, Verônica, que foram denunciados por lavagem de propina transnacional pagas pela Odebrecht nas obras do Rodoanel Sul.

ALCANCE AMPLIADO

Na prática, como informa o site UOL, "a medida amplia o alcance de liminar imposta pelo presidente da Sociedade Protetora dos Criminosos, o ministro Dias Toffoli, que em julho suspendeu 'toda a investigação' contra o tucano no âmbito da Lava Jato bandeirante, paralisando a Operação Revoada, que busca aprofundar as apurações. A decisão de Gilmar apenas amplia o alcance para todas as investigações e procedimentos contra Serra. Que tal?

NOJENTO

O curioso, ou melhor, NOJENTO, não é o silêncio dos demais ministros quanto à clara e inquestionável OBSESSÃO que Gilmar Mendes demonstra no sentido de ACABAR DE VEZ com a LAVA JATO, colocando todos os envolvidos na situação de INOCENTES e, portanto, totalmente livres de qualquer investigação.

BARROSO

Pois, ontem, enquanto Gilmar Mendes dava seguimento à sua eterna TARA POR INOCENTAR CRIMINOSOS, outro ministro, desta vez, Luís Roberto Barroso, ao participar de uma LIVE na Fundação Fernando Henrique Cardoso, disse, alto e bom som, que o presidente da República, Jair Bolsonaro DEFENDE A DITADURA E A TORTURA. Disse mais: que a sociedade tem se mostrado “resiliente” a respeito dos ataques do chefe do Executivo. Pode?

A FOTOGRAFIA DA CORTE SUPREMA

Para quem não assistiu a -live-, eis aí, ipsis literis, o que disse o péssimo ministro Barroso: “Temos um presidente que defende a ditadura e a tortura e ninguém jamais considerou alguma solução diferente do respeito à igualdade constitucional. Em face de manifestações autoritárias, tanto pelo presidente ou por pessoas próximas a ele, inclusive evocando a época da ditadura militar, a sociedade civil reagiu a isto com vigor, condenando os ataques às instituições e levando os autores destes ataques a retirarem-nos. Embora frequentemente atacada pelo próprio presidente, a imprensa no Brasil é plural, independente e fortemente crítica do governo. Tanto este, eu diria, como dos governos anteriores. Portanto, uma coisa que acho que contribui com esta resiliência da democracia no Brasil é justamente a liberdade, independência e até o poder da imprensa brasileira”. 

Continue lendo
  • Fernando Fabbrini
  • 27 Agosto 2020

 

Meu pai cuidava com carinho e ciúmes do seu velho radio Pilot, um monstrengo envernizado em tons escarlates. Sintonizado na Rádio Nacional ouviu os choros de Jacob do Bandolim; sambas do Bando da Lua e acompanhou as transmissões internacionais dos jogos das Copas de 58 e 62 na voz do locutor que oscilava em meio aos chiados da estática.

Pontualmente às 8 da noite ele postava-se ao lado do Pilot para escutar “o primeiro a dar as últimas”, o seu "Repórter Esso". Viajando pelo éter, desde os pampas até os cafundós da Amazônia, os quilohertz da Nacional atualizavam milhares de brasileiros com notícias do país e do mundo. O que chegava através do rádio no timbre potente e dramático de Heron Domingues era a verdade indiscutível – e estamos conversados.

- Ouvi ontem no "Repórter Esso"!

Com a expansão das TVs, novos porta-vozes assumiram os papéis de arautos das boas e más notícias. Durante décadas os programas jornalísticos vinham revestidos dessa estranha infalibilidade; recheados de sapiência; incontestáveis nas informações que espalhavam.

- É verdade; deu no "Jornal Nacional".

Otto von Bismarck, o chanceler de ferro, ponderou que os cidadãos não dormiriam tranquilos se soubessem como são feitas as salsichas e as leis. Caso vivesse hoje, o prussiano certamente ampliaria seu mote inserindo ao final, após salsichas e leis, o complemento “...e as notícias”.

Além dessa pretensa primazia, protegida num pedestal soberano, a televisão ainda criou filhotes especializados em economia, esportes, sociologia, beleza, moda, gerenciamento de riscos, medicina, psicologia, acidentes aéreos, naufrágios, sobrevivência na selva, criação de cangurus e sabe-se lá mais o quê. Tais figuras pontificavam; mantinham-se firmes, serenas e, sobretudo, muito bem pagas pelas emissoras com contratos de exclusividade.

Daí, as redes sociais surgiram e bagunçaram tudo. Umberto Eco já alertara para os milhões de idiotas que ganhariam voz pela internet. Porém, não se pode negar o lado bom da coisa: a rede abriu canais de informação, comunicação e discussão até então inéditos. As emissoras levaram um susto, sentiram o golpe e continuam atordoadas até agora. De repente, não detinham mais a exclusividade da notícia, da interpretação conveniente do fato e – pior! - do viés político-ideológico com o qual manipulavam o conteúdo em função de seus próprios interesses e dos interesses de seus anunciantes. Perderam a valiosa exclusividade, milhões de telespectadores e patrocínios vultuosos.

Feito um petardo desorientado, o estrago alcançou de tabela os especialistas em assuntos diversos da TV. Antes, tinham as agendas cheias (e bolsos idem) como convidados de honra e palestrantes em seminários, congressos, encontros empresariais, universidades, eventos diversos. Emanavam confiança, orientação e sabedoria naquilo que diziam ao microfone para a plateia atenta. Uma dessas famosas jornalistas-especialistas chegava a atender a quatro ou cinco compromissos por semana, pelos quais recebia cachês na faixa de dezenas de milhares de reais.

Vários deles tentam se adaptar como podem ao modo “streaming” de viver. O problema é que, antes, gozavam da blindagem provida pela via de mão única da televisão: falou para a câmera, transmitiu, acabou. Já agora, pelas redes, se expuseram à realidade da interação imediata. Falam e são bombardeados em segundos por internautas; devem conviver com a crítica sem filtros, “haters”, anônimos e demais personagens. E mais: a cada dia perdem a concorrência para youtubers, influencers e novas celebridades reveladas no embalo caótico - mas democrático - da internet.

Agora, todo mundo tem um celular – esta pequena e fantástica emissora que levamos no bolso. Cada cidadão ganhou voz própria e virou testemunha ocular da história, como dizia o slogan do velho "Repórter Esso".

*Publicado originalmente em O Tempo, de BH, em 20/08/20
 

Continue lendo