Percival Puggina

02/11/2009
CAIXA PAGOU R$ 40 MIL DA FESTA PARA TOFFOLI São Paulo - A Caixa Econômica Federal (CEF) pagou R$ 40 mil como forma de patrocínio à festa realizada em homenagem à posse de José Antonio Dias Toffoli como ministro do Supremo Tribunal Federal, no último dia 23, em Brasília. A comemoração para 1,5 mil pessoas ocorreu no Marina Hall, área nobre da capital do País. As informações são do jornal Folha de S.Paulo. De acordo com a Folha, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), entidade que organizou a festa, havia pedido patrocínio de R$ 50 mil para o banco. A Caixa confirmou ao jornal que, do valor pedido, repassou R$ 40 mil. Segundo o jornal, a Caixa afirmou que o patrocínio à festa de Toffoli foi feito visando retorno mercadológico. O banco disse ainda que o dinheiro foi empregado em para cobrir custos com infraestrutura e que serão pagos após a prestação de contas. A Caixa afirmou ainda que decidiu patrocinar o evento por se tratar de um público de relacionamento institucional do banco, e também aproveitou a oportunidade para divulgar produtos e serviços no evento. Luiz Cláudio Flores da Cunha, juiz do 6º Juizado Especial Federal do Rio de Janeiro, afirmou que pretende questionar a legalidade do patrocínio da Caixa no Tribunal de Contas da União e no Ministério Público Federal. Cunha pretende saber se a despesa foi paga de forma regular ou se a associação dos juízes federais foi usada para ocultar o repasse de um órgão público para cobrir gastos de uma festa. Para o juiz, não haveria problema se Caixa repassasse dinheiro para um evento cultural da Ajufe. Cunha afirmou também que não tem a intenção de fragilizar a associação, mas quer tornar a Justiça mais transparente. O presidente da Ajufe, Fernando Mattos, afirmou que algumas entidades fizeram repasses de dinheiro direto à associação, e outras fizeram o pagamento direto aos fornecedores, fato que desqualifica qualquer insinuação de uso da Ajufe como mera repassadora de recursos. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Mozart Valadares, afirmou que a entidade participou com R$ 10 mil, dinheiro proveniente da contribuição de associados e não público.

Percival Puggina

01/11/2009
No dia 12 de novembro de 2002 eu estava em Havana recolhendo subsídios para um livro. No bolso, uma lista com nomes de jornalistas independentes que me fora fornecida pela amiga pernambucana Graça Salgueiro. Pretendia ouvir aqueles obscuros personagens que, com enormes riscos pessoais, enviavam informações ao mundo. De que modo faziam isso? Do mesmo modo utilizado hoje. Como cubanos, cidadãos de segunda categoria em seu país, eles não podem fazer o que aos estrangeiros é permitido. Então, ou se valem do generoso e discreto auxílio de colegas não cubanos com acesso ao Centro de Imprensa ou de contatos em hotéis e outros raros pontos onde estejam disponíveis conexões à internet. Eu trazia comigo, repito, os nomes de três ou quatro dezenas desses bravos ?periodistas? marginalizados pelo regime. Mas não sabia como os localizar. Em Havana, os cubanos te param na rua a cada dez passos para oferecer chicas e charutos ou para se disponibilizar como guias turísticos. Estes últimos fazem plantão diante dos hotéis e costumam ser muito cordiais. Todos rendem a maior solicitude a uma nota de dez dólares (é mais do que o salário de um mês). Então, por duas vezes, na tarde daquele dia, tentei usar a intermediação desses cubanos para me ajudarem a contatar com alguns daqueles jornalistas, sem resultado. Sem resultado? Minto. Ao exibir para essas pessoas os nomes que a Graça me fornecera, colhi um resultado, sim: um esgazeado olhar de pânico lançado ao redor, seguido de súbita e silenciosa retirada. O cubano vive com medo. E eu, naquele exato dia, desisti de encontrar meus periodistas independientes. A minha lista era assustadora. Essas e outras experiências pelas quais passei, como, por exemplo, a de ser filmado e seguido nas ruas depois de conversar com alguns dissidentes, me põem as barbas de molho sobre a possibilidade de que a blogueira Yoani Sanchez seja quem diz ser. O tema foi muito bem levantado em recentes artigos pela própria Graça Salgueiro (notalatina.blospot.com) e pelo psiquiatra rio-grandino residente no Rio, Heitor de Paola (www.heitordepaola.com). A existência de alguém como a blogueira, vivendo em Cuba, dizendo o que diz, livre, leve e solta é algo bem além das fronteiras do crível. Entendamo-nos, leitor. Antes de retornar para o Brasil, eu tive o cuidado de destruir a lista de nomes que levava comigo porque, em virtude das experiências que relatei no livro ?Cuba, a tragédia da utopia?, temi ser revistado ao passar pela Seguridad del Estado no aeroporto José Martí. Pois eis que em março de 2003 um arrastão repressivo varreu a Ilha. Setenta e cinco pessoas presas. Jornalistas independentes e dissidentes políticos condenados a penas que chegavam a 25 anos naquelas infectas prisões políticas. E entre esses presos se contavam três dos quatro dissidentes que eu havia conseguido entrevistar, quando em Havana, porque destes eu tinha comigo os telefones (mais tarde descobri que eram grampeados, o que deu origem aos incidentes que se seguiram). Pois bem, se as coisas em Cuba são assim, como pude constatar pessoalmente, parece-me pouco verossímil que Yoani Sanchez não conte com beneplácito do regime. Seria muito estranho. Sua liberdade de movimentos não combina com os fatos num país onde toda a brutalidade é possível e onde qualquer liberdade é improvável. Basta conversar com um cubano para perceber que emitir opinião contra o regime lhes faz mal à saúde pessoal e familiar. No universo das probabilidades, a maior delas é a de que dona Yoani esteja na missão de sugerir ao mundo que lá se pode, livremente, fazer o que ela faz.

Percival Puggina

25/10/2009
É conhecida a anedota do psiquiatra uruguaio que telefona para um colega de clínica querendo trocar idéias sobre certo diagnóstico que estava prestes a dar. Tratava-se de um caso raríssimo, e ele queria ouvir a opinião do outro. Quando revelou que seu paciente sofria de complexo de inferioridade o colega se surpreendeu: ?Y eso es un caso muy raro? Complejo de inferioridad? Tengo miles de casos así!?. E o primeiro esclarece: ?De argentino??. Lembrei-me dessa anedota ao examinar a conduta do presidente Lula ao longo do exercício de seus dois mandatos. O homem que colocou a faixa no peito em 2003 era um caboclo meio consumido pelas próprias origens, ainda muito próximo delas, inseguro nas aparições oficiais, manifestando ancestral apego à pinga, buchada de bode e outras simplicidades da cozinha nordestina. O novo presidente aparecia em público com gestos contidos e linguajar inadaptado aos usos e costumes da vida presidencial. A toda hora fazia referências à sua condição operária e sertaneja, como que a proporcionar um autodiagnóstico sobre aquela relação meio trôpega com a liturgia do cargo. Sete anos depois, o portador de complexo de inferioridade, que não cansava de se exibir como gente do povão, alma de corintiano, mão de torneiro mecânico, filho de mãe ?que não sabia fazer um ?o? com um copo?, etc. e tal, se apresenta totalmente curado do complexo de inferioridade e precisa, urgentemente, tratar de um injustificável complexo de superioridade. Melhorou demais. Virou o fio. Está se achando, para dizer como a gurizada. Só abre a boca para coisas pretensiosas como emitir lições de sabedoria; exibir como sendo de sua granja colheita que não semeou; comparar-se a Jesus Cristo e determinar os limites para as ações da imprensa e das instituições da República. A buchada de bode e seus assemelhados foram substituídos, até em viagem ao polígono das secas, pela cozinha francesa, vinhos finos e uísques de nobre estirpe e provecta idade. Nada é caro demais ou sofisticado demais, nada é merecedor de suficiente respeito ou demarcador de quaisquer limites ao seu querer. Obama, em Londres, se hospeda na embaixada dos Estados Unidos. Lula vai com a corte, armas e bagagens para um hotel onde a suíte fica em 7,5 mil euros. E é assim, e é sempre assim. Vai esticando ao máximo a misericórdia divina, apesar de sua sabedoria ser uma fraude que não resiste ao menor escrutínio e do imenso contraste que sua jactância estabelece com os pobres que diz representar e cujos interesses apregoa defender. A popularidade lhe subiu à cabeça como vapores alcoólicos. Está inebriado. Ergueu-se vários degraus acima da lei. Sua autoestima não cabe nas bordas constitucionais do cargo que ocupa. Mas nada disso é tão danoso quanto o fato de nosso presidente, nessa fase megalômana, estar consumindo recursos públicos em prodigalidades dignas de um sheik das arábias. Ele bebeu popularidade na vertente estrutural deixada por seus antecessores e nada fez para repor o que consumiu. Curado do complexo de inferioridade, acometido de um complexo de superioridade, Lula inverte a frase de Luís XV: ?Après moi le déluge?. Depois de Lula a seca. Quem chegar em 2011 verá o que é bom para a tosse.

Percival Puggina

24/10/2009
No início dos anos 50, quando ali entrei pela primeira vez, de calças curtas, guarda-pó branco e gravata azul, já era um edifício velho. E feio. Acolhia alunos da 1ª à 5ª séries do primário. As classes tinham espessos tampos nos quais se acumulavam gravações rupestres deixadas por antigos alunos. Chamava-se G. E. Professor Chaves aquela pequena escola pública. Laboratório? Não se sabia bem o que era isso. Biblioteca a gente conhecia, mas não me lembro de algo assim por lá. Da minha turma, entre outros cuja trajetória perdi de vista, saíram profissionais do Direito, da Engenharia, da Medicina, das Finanças, das Artes, e até este modesto arquiteto que gosta de escrever. No ambiente da humilde sala de aula, durante quatro anos, reinou a inesquecível professora Elvira Arlas Pereira. Reinou com a autoridade imposta pelo amor ao que fazia. Com seus cabelos brancos, irretocavelmente arrumados em forma de coque sobre a cabeça, tinha jeito de avó, mas não estava lá para ser tia de ninguém. Era a professora. Ela ensinava, nós aprendíamos. Um processo antigo, que Paulo Freire, Moacir Gadotti, Demerval Saviani e outros profetas da pedagogia marxista nacional viraram pelo avesso com os deploráveis resultados que aí estão. Periodicamente, um sisudo inspetor escolar visitava a classe para fazer perguntas e verificar se aprendíamos. Era o ?Ideb? da época. Não existia Cpers nem essa papagaiada de trabalhador em educação. Ensinava-se mais, aprendia-se mais, estudava-se mais. E nosso Estado, nos anos seguintes, se tornaria conhecido como o que proporcionava a melhor educação pública do país. Lembrei-me da minha infância na querida Santana do Livramento ao acompanhar, semana passada, matérias de ZH e entrevistas com lideranças do magistério. Pais que me leem: a Educação caiu num despenhadeiro e o futuro será tetraplégico! Duvido que vocês enviem seus filhos à escola para que ela os submeta à tal ?educação transformadora?. Cuidado! Professores que rejeitam qualquer controle sobre seu trabalho arvoram-se no direito de transformar nossos filhos? Não confie, leitor, numa Educação que da alfabetização ao doutorado proclama tão autoritária pretensão. Além dos professores a serviço de partidos, quem aí quer isso? E os que não querem por que concordam? Essa pedagogia falsamente dialética, que se apropriou da Educação para construir uma hegemonia ideológica, com fins políticos, converteu a Escola em território livre, onde não se admite autoridade externa. Os porta-vozes dos professores denunciam como brutalidade qualquer tentativa de estabelecer parâmetros curriculares e de cobrar resultados desse reduto do não saber e do não ensinar. Prioritário, ali, é ?construir a cidadania?, sabe? Mas, como era de se antever, o Estatuto da Criança e do Adolescente, cujos excessos são frutos da mesma ideologia malsã, acabou com a disciplina. E os educadores formados segundo essa pedagogia estão sendo vítimas do que aprenderam, sofrendo nas mãos dos alunos que pretendiam ?transformar? em cidadãos comprometidos com suas causas. Vale a pena ouvir esses professores. Sua fala é franca e transparente. O exército dos colegas é dócil ao seu toque de sineta. Clamam por outros alunos, outros pais de alunos, outras escolas, outro salário, outros governantes, outro país, outro planeta. Mas até sua revolução lhes sai pela culatra porque perpetuam os miseráveis na miséria da ignorância. E os alunos das poucas escolas que ensinam, de cujos professores se cobram resultados, olham o próprio futuro com otimismo. Isso não é justo. Zero Hora, 25/10/2009

Percival Puggina

22/10/2009
Sob forte pressão da oposição, o Congresso criou nesta quarta-feira a CPI do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). O primeiro vice-presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), leu o requerimento de criação da CPI durante sessão do Congresso, mas a comissão só será efetivamente instalada se não houver retirada de assinaturas dos deputados favoráveis às investigações. Os parlamentares têm até a meia-noite de hoje para retirarem assinaturas, como previsto pelo regimento do Congresso. A oposição precisa garantir que pelo menos 171 deputados e 27 senadores mantenham as assinaturas. No total, DEM e PSDB conseguiram recolher assinaturas de 185 deputados e 35 senadores favoráveis à instalação da CPI. Nos bastidores, parlamentares da base aliada governista trabalham para convencer deputados e senadores a retirarem assinaturas do texto. Se o mínimo de assinaturas não for mantido, a CPI será automaticamente arquivada --como aconteceu há quase um mês, na primeira tentativa da oposição de criar a comissão. Apenas 70 deputados que integram a base de apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara assinaram o requerimento de criação da comissão. Dos 185 deputados que assinaram o pedido da CPI, 117 são dos três maiores partidos da oposição --DEM, PSDB e PPS. Nenhum deputado do PT, partido do presidente Lula, assinou o requerimento. No PMDB, legenda com maior bancada na Câmara, apenas 22 deputados aderiram ao pedido de criação da CPI. FOLHAONLINE

Percival Puggina

21/10/2009
AGORA É A VEZ DA NICARÁGUA Corte Suprema da Nicarágua abre caminho para possível reeleição do atual presidente A Corte Suprema da Nicarágua declarou nesta segunda-feira (19) que não existe impedimento legal para que o atual presidente, Daniel Ortega, seja candidato à reeleição em 2011, quando acabaria seu mandato. A declaração, que diz respeito a um artigo polêmico da Constituição do país, provocou uma onda de críticas na imprensa local, que já fala em golpe por parte dos magistrados. A Sala Constitucional da Corte Suprema de Justiça declara a inaplicabilidade de um artigo da Carta Magna que impede ao presidente e ao vice-presidente de disputarem um segundo mandato consecutivo no cargo, disse o juiz Francisco Rosales, ao ler a decisão para a imprensa. A decisão indica que o presidente da República [...] pode perfeitamente concorrer como candidato [nas eleições de 2011], explicou o vice-presidente da Corte, Rafael Solís. Para valer, a interpretação deve passar pela Corte Plena, onde Ortega tem maioria favorável.

Percival Puggina

18/10/2009
O descontrole do governo Lula com o gasto público se evidencia: a) na excessiva propaganda do governo; b) na domesticação da grande mídia; c) no inchaço da máquina pública; d) na megalomania dos grandes anúncios; e) na inusitada mordomia do presidente operário. Como resultado dessa conduta irresponsável, o governo chegou ao cúmulo de anunciar que suspenderia, por falta de caixa, a devolução do IR retido na fonte. Mesmo nos períodos mais difíceis pelos quais passou o país, essa devolução sempre foi tratada com o respeito que o contribuinte merece.

Percival Puggina

18/10/2009
No Brasil, tudo que se abriga no amplo espaço da política vive tempos de agonia. Agonia para valer. Sofrimento terrível, diante do qual as pilhérias e ironias do presidente da República soam como piada em velório. Se dispuséssemos de monitores capazes de acompanhar os fatos numa perspectiva que levasse em conta a saúde do corpo político nacional, ou ? quem dera! ? se contássemos com uma mídia atenta ao que é importante, perceberíamos as faltas de ar, as convulsões e os desfalecimentos que a acometem. Foi assim no caso de Honduras. Com raras exceções, a relação do Brasil com o que se passava naquele pequeno país centro-americano foi objeto de análises de natureza geopolítica que peço licença para considerar desfocadas. O Brasil nada tem a ver com aquele peixe. Aliás, o Brasil não lidera um sabugo em qualquer dos cinco continentes. ?Que exagero é esse, seu Puggina? Lula é um figurão da política internacional e o senhor diz que ele não lidera coisa alguma?? indagará o leitor. Nem na América Latina, meu caro. Aqui no Brasil, Lula tem 80% de aprovação. Fora daqui responde por 80% das gargalhadas. Na América Latina, até onde a minha vista alcança, Chávez é o cara em todos governos esquerdistas na América Central, para os quais o Brasil é irrelevante. Os demais estão ligados ao México ou aos Estados Unidos. No Caribe, Cuba está com Chávez e o resto na órbita dos Estados Unidos ou da Europa. Diante de Chávez também se perfilam, na América Sul, nossos vizinhos da Bolívia, Equador e Paraguai. Sobrou o quê? Argentina, Uruguai e Chile. Você acredita que qualquer deles tolere liderança brasileira? Poupem-me, então, dessa arrogância caipira que mantém inimizade profunda com os fatos da vida e do mundo. Prefiro o Brasil low profile do Itamarati, respeitado por quem tem a cabeça em cima dos ombros e longe dos intestinos, a esse Brasil que entregou sua embaixada para o caubói hondurenho e seus asseclas. Vale a pena, então, nos fixarmos no que é realmente importante. Por que o Brasil se meteu na enrascada de Tegucigalpa? Como foi possível apertar o gatilho de um tiro que lhe saiu pela culatra, quando qualquer estagiária do Itamaraty seria mais prudente? Bem, para responder tal pergunta é preciso saber o que se passa nas cabeças que dirigem, hoje, aquilo que só por teimosia a imprensa insiste em chamar de ?diplomacia brasileira?. Nossas relações exteriores, digamos assim que fica melhor, são comandadas por militantes de um partido político. E correspondem à política desse partido. Com base nessa cartilha e segundo seus gostos e desgostos, despreza-se uma nobre tradição. Ela nasceu com a criação da Secretaria dos Negócios Estrangeiros em 1822 e se consolidou ao longo do último século como uma respeitabilíssima política de não-intervenção, mediação e solução pacífica de controvérsias. O que sempre foi uma política externa do Brasil, com Lula e os seus sumiu para dar lugar à política de uma facção partidária, cuja capacidade de conviver harmonicamente com a divergência sempre teve o vulto de um cromossomo. É a mesma cartilha e o mesmo alinhamento político, ideológico e partidário que leva Lula a sobrevoar Israel pelos quatro pontos cardeais, sem jamais pousar (apesar dos insistentes convites), e ir dar tapinhas nas costas de todos os ditadores e aiatolás que circundam aquele país. Por quê? Ora por quê! Você sabe por quê. Não se espante, então.

Percival Puggina

18/10/2009
Com apoio de uma grande mídia incapaz de ver a verdade ainda que ela lhe fosse pingada nos olhos como colírio, cerrou-se uma cortina de silêncio sobre o que aconteceu nos últimos 18 anos da vida política e econômica nacional. E uma espécie de Mal de Alzheimer instalou-se na memória do país, afetando a capacidade de análise. Tudo em perfeita cumplicidade com o estelionato através do qual Lula, ao esticar a mão para colher os frutos do laborioso plantio promovido por seus dois antecessores, assumiu como coisa sua o conjunto da obra. Para que isso acontecesse, assim como os cãezinhos fazem com suas necessidades, Lula cuidou de jogar terra em cima das bobagens ? digamos assim ? que fez e disse contra todas as mudanças estruturais empreendidas nos governo de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. O modo como Lula enterrou 12 anos do trabalho planejado e executado pela devastadora máquina do petismo, foi de uma desfaçatez inominável: a gente, na oposição faz muita bravata... Pronto! Toda a injúria, toda a irresponsabilidade, todo o malefício que foi gerado e que tanto atrapalhou a vida de quem governava, fica do tamanho de uma bravata, ganha a rápida indulgência plenária e tudo segue conforme concebido nos salões do poder. Em sucessivos debates em rádio e tevê tenho desafiado o lulopetismo a apontar uma única iniciativa pessoal de Lula à qual se possa atribuir a estabilidade da economia brasileira e sua trajetória superior às expectativas durante a atual turbulência da economia mundial. Não há uma só! Nada! O lulopetismo sabe que essa estabilidade se deve a um conjunto de significativas providências de natureza estrutural, adotadas e preservadas teimosamente, a despeito do constante ataque da artilharia retórica e publicitária do lulopetismo. Foram oito essas medidas saneadoras: 1) o Plano Real, ao qual o lulopetismo se opôs vigorosamente; 2) a abertura da economia brasileira, à qual o lulopetismo denominava globalização neoliberal; 3) o fim do protecionismo à indústria nacional, que o lulopetismo chamava de entrega da nossa indústria às multinacionais; 4) o Proer, que deu solidez ao sistema bancário nacional e criou severos mecanismos de fiscalização que impediram a reprodução, no Brasil, dos financiamentos tipo subprime (a esse Proer o lulopetismo acusava de dar dinheiro do povo para banqueiro); 5) o cumprimento das nossas obrigações com os credores internacionais, prática responsável, contra a qual o lulopetismo se opunha ferozmente e que Lula chamava de dar aos ricos o dinheiro dos pobres?, ou de ?pagar a dívida com o sangue do povo, prejudicando a imagem do país, ampliando o ?Risco Brasil? e onerando a nossa dívida; 6) a geração de superávit fiscal, que o lulopetismo combatia, afirmando tratar-se de guardar dinheiro para dar ao FMI enquanto o povo passa fome?; 7) a primeira reforma da previdência, que o lulopetismo oposicionista combateu como um leão e que o Lula presidente já teve 2320 dias para mudar e não mudou; 8) o apoio dado à agricultura empresarial, que duplicou a produção nacional de grãos, fazendo com que ela saltasse das 70 milhões de toneladas nas quais estava estagnada havia mais de uma década para 130 milhões de toneladas (a isso o lulopetismo chamava modelo agrícola exportador, que desemprega e não produz alimentos, embora seja exatamente daí que vem quase todo o lastro de nossas atuais divisas). Tenho certeza de que os lulopetistas lêem essa lista sem nenhum constrangimento. Depois, olham-se do espelho e gostam do que vêem. Ainda que essa lista lhes traga à memória antigas passeatas, surradas páginas da velha cartilha e muito xingatório desfechado contra a ?direita neoliberal?, ainda que ela explicite objetos de seus ódios ancestrais e malquerenças que semearam durante anos a fio, tudo se passa como se não fosse coisa deles nem com eles. O inteiro receituário contido nessa lista, em relação ao qual Lula presidente não ousou mexer numa vírgula, evadiu-se da memória nacional como coisa irrelevante. O Brasil vai bem por causa de Lula e do PT e só por causa de Lula e do PT. Vai bem assim, na base da pessoa física do presidente e da pessoa jurídica do partido. Eles teriam o poder de fazer com que as coisas ocorram imotivadamente, tendo o nada como matéria-prima, mais ou menos com o Senhor fez o universo sobre as trevas do abismo. É bom observar que esses bons resultados estão sendo aproveitados por Lula de modo irresponsável, expandindo excessivamente o gasto público, passando para 37 o número ministérios (os Estados Unidos têm 16), ampliando em mais de 50 mil o contingente de servidores públicos, adquirindo uma nada urgente parafernália militar, enredando-nos com o enorme compromisso da realização dos jogos olímpicos de 2016, gastando em inomináveis mordomias e por aí vai. Como consequência dessa gastança, o governo chegou ao inédito anúncio de que não tinha recursos para continuar devolvendo neste exercício o Imposto de Renda cobrado a mais dos contribuintes. O círculo de proteção midiática, ideologicamente comprometido ou financeiramente cooptado, faz o jogo lulopetista. Aponta o milagre, mas o atribui ao santo errado. Escapa-lhe à atenção a lei universal segundo a qual não há efeito sem causa. Esquece que as coisas começaram a melhorar, para o Brasil, a partir do ano de 2004. E que não há mágica em matéria de economia. Se alguma iniciativa do governo Lula, tomada em 2003, teve a capacidade de produzir um ciclo virtuoso de desenvolvimento nacional a partir do ano seguinte, haveria um prêmio Nobel na prateleira do sábio de Garanhuns. Da mesma forma como conseguiu espaço e apoio midiático para desqualificar seus antecessores, o lulopetismo no poder voltou-se para desqualificar moralmente seus opositores. Os rolos em que se meteram não têm agente conhecido nem partido envolvido. Lula, o PT e os lulopetistas sabem coisa alguma. Mas estão a par de tudo sobre a oposição. Qualquer brasileiro, minimamente informado, sabe que Lula se relaciona, paparica, protege, elogia e vive cercado pela pior espécie de picaretas que já surgiu na política brasileira. São picaretas que ele mesmo sempre definiu como tais. Mas hoje são amigos de copa e cozinha, servindo aos seus interesses e aos interesses do PT. Como são fraudulentos em suas indignações morais! Como são ridículos esses 80% dos brasileiros que se escandalizam perante quaisquer desvios de conduta e, nas pesquisas, apontam o Lula quando lhes perguntam quem é o cara! Observe, por fim, o ódio do lulopetismo à oposição. É um ódio ideológico. É um ódio que se ouriça ante a menor ameaça à sua continuidade no poder. É inconcebível tamanha ira contra uma oposição inerte, insignificante e impotente. A oposição ao governo Lula é ridícula quando comparada a oposição que o PT faz onde quer que esteja fora do poder. E é absurdo que até esse pouco, muito pouco, quase nada incomode tanto o lulopetismo. A mais tímida manifestação oposicionista suscita uma raiva só comparável com a que eles mesmos cultivavam contra os governos aos quais se opunham. O lulopetismo mantém com a democracia uma relação sui generis. Ao fim e ao cabo, os lulopetistas, na falta do que contar aos netos como iniciativa própria para a redenção da economia nacional das brumas dos anos 80 do século passado, plantam a ideia de que Lula ama os pobres e seus antecessores amavam os ricos. E essa seria a causa do ciclo positivo vivido pelo país. Ora, isso é falso sob o ponto de vista dos fatos e inconsistente sob o ponto de vista das relações de causa e efeito. Em raros momentos de nossa história os ricos do país andaram tão faceiros como agora. Não, definitivamente, o Brasil não vai bem por causa do Bolsa-Família. O Brasil não trafega pela crise da economia mundial com certa desenvoltura por causa do Bolsa-Família. O Bolsa-Família é outra coisa. Como disse alguém, é apenas o maior programa de compra de votos do mundo. E eu acrescento que é a felicidade geral da nação: os ricos sempre gostaram de voto comprado e os pobres sempre gostaram de voto vendido.