Percival Puggina

09/08/2013
A liberalidade para com a formação de novos partidos políticos no país está fazendo com que eles se reproduzam como coelhos. Já temos 30 dessas peças ao todo e isso é uma demasia. Por que tantos? Porque se tornou dominante a ideia de que é preciso garantir a representação das minorias de modo indeterminado e ilimitado. Não raro, essa é a objeção que se levanta contra o sistema de voto distrital que, na prática, leva a uma redução do número de partidos. No entanto, quanto mais partidos, mais complicada, mais onerosa e menos consistente a política. São mais bancadas, mais servidores, maior despesa pública, maior a multidão de candidatos em cada pleito, menos discernível as diferenças entre as legendas, e mais complexa e onerosa a composição de maiorias parlamentares. Não preciso provar que como resultado da atual liberalidade, concebida com o razoável intuito de proteger as minorias, elas acabaram sendo o único produto das nossas eleições parlamentares. A mais numerosa bancada na Câmara dos Deputados tem apenas 17% das cadeiras! É como se fizéssemos eleições para contabilizar eleitores e eleitos segundo suas respectivas minorias, sem que jamais se configure no mundo do poder qualquer maioria natural, consistente e coesa. Convenhamos, isso é um problemão. Viabilizar a formação de maiorias é mais importante do que esquartejar a sociedade, através de sua representação parlamentar, em dezenas de pedaços com pouca ou nenhuma vitalidade. De onde saem tantas minorias? Quais são esses muitos pequenos grupos que teriam resolvido fundar partidos para os representar? Quem pensar que sabe faça aquele exercício de compreensão aplicado antigamente nos colégios - alinhe a segunda coluna em conformidade com a primeira. Una, então, cada partido à minoria que ele representa. Verá que não funciona. O eleitorado não se divide em infinitos pequenos grupos como para justificar a existência de um número infinito de partidos. As pequenas legendas brasileiras, em quase totalidade, nasceram para atender interesses e estratégias locais e pessoais, sem que sobre sua criação e atuação incidam convicções filosóficas ou doutrinárias. Algumas têm sócio-proprietário, outras são artigos de aluguel. Ademais, praticamente todas as minorias efetivamente existentes na comunidade já encontraram nos partidos de maior expressão nichos adequados às suas representações. Essa é a função desempenhada, entre outros, pelos movimentos, facções e núcleos, disto ou daquilo, existentes em todos os partidos maiores. E faz muito sentido que seja assim. É preferível para um grupo social de menor peso ligar-se a um partido com maior vitalidade e expressão do que enfrentar a sacrificada experiência de disputar sucessivos pleitos sem alcançar sequer o quociente eleitoral (essa é a real situação dos corpos políticos minoritários ensimesmados). O voto distrital, reduz, de fato, o número de partidos e de candidatos (o parlamentar do distrito é eleito do mesmo modo como hoje se escolhe o prefeito). Permite o recall (ou seja, que o distrito, mediante votação, retome o mandato de quem perde a confiança da sua comunidade). Reduz os custos das campanhas. Facilita enormemente a fiscalização da Justiça Eleitoral, e por aí vai. Um número menor de partidos obriga os existentes a se distinguirem uns dos outros no discurso e na ação. Por fim, se você, eleitor, gostaria de assistir a uma importante renovação dos quadros dirigentes nacionais, lembre-se de que, diferentemente dos demais jogos, nos quais a regra só determina o modo de jogar, no jogo político, ela também determina quem joga. O atual modelo privilegia candidatos com o perfil dos que atualmente servem à República. Está bom para você? _____________ * Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

07/08/2013
CAMINHOS PARA A DEMOCRACIA Gravação que fiz para o Canal Sulinfo, na qual abordo a importância dos valores morais para a Democracia. http://www.youtube.com/watch?v=haV76xK1P8I

Percival Puggina

03/08/2013
Raras vezes se viu tamanha barafunda num mar de rosas. Dilma Rousseff já cumpriu dois terços de seu mandato acumulando trapalhadas e fracassos. Demorou duas décadas mas, finalmente, o PT está alcançando seu objetivo de 1994 - acabar com o Plano Real. O sonho dourado das esquerdas nos anos 90, o fim do programa que deu estabilidade à moeda nacional, aquilo que Lula tentou mas não conseguiu em seus oito anos, Dilma, está realizando em menos de quatro, à base de trombada na cristaleira. O petismo espatifou a Economia e tudo mais à sua volta. Nem despejando bilhões no mercado, o Banco Central consegue conter a evasão das verdinhas ianques, que se retiram do país como os ratos abandonavam o Titanic nas impressionantes cenas do filme de James Cameron. Há poucos meses, quando o PT festejava em São Paulo seus dez anos no governo da União, o tom ufanista dos discursos mostrava que o partido chegara à overdose de poder. Pode juntar quem quiser, bravateou Lula, convicto de nova vitória do partido em 2014. Qualquer coisa que eles tentarem fazer nós fazemos mais e melhor, prosseguiu o eufórico ex-presidente, nariz enfiado no pote do poder. Seguiu-lhe a arrevesada sucessora, tratando de mostrar serviço. Arrombou a ostra onde oculta sua sabedoria e extraiu esta pérola: Não tenho medo de comparações, inclusive sobre corrupção... Isso tem outro nome, claro. Mas é, também, overdose de poder. Poder sobre a própria imagem, sobre a sociedade, poder sobre os demais poderes, poder sobre a mídia, poder agregado, ano após ano, em sequências exponenciais perante auditórios interesseiros. Quatro meses depois, foi a vez de o povo evidenciar que também ele tivera sua overdose de petismo. E saiu às ruas para pacíficas e civilizadas demonstrações de inconformidade. O povo deu uma olhada no próprio país e percebeu que, por trás da publicidade, dos cenários, das montagens, das invenções e versões, tudo - simplesmente tudo! - vai muito mal. Depois de dois PACs lançados às urtigas, que não valiam a tinta e o papel gastos para redigi-los, a economia arqueja sobre uma infraestrutura carente de tudo que importa - energia, rodovias, ferrovias, armazenagem, portos. Quanto mais PAC, menos PIB. O Rio São Francisco continua no mesmo lugar, levando, dolente, suas águas para o mar de Alagoas. Nas refinarias projetadas, nada se avoluma com maior rapidez do que o preço inicialmente previsto. Aqui no Rio Grande do Sul, de onde escrevo, as ditas obra da Copa ficarão para depois da Copa. O prometido, jurado e sacramentado metrô de Porto Alegre ainda é um risco no papel, em eterna discussão. E a duplicação da travessia do Guaíba resume-se a um trabalho de computação gráfica. A Educação brasileira é a penúltima entre 40 países estudados pela Economist Intelligence Unit. A Saúde beira à perfeição. Sim, é um perfeitíssimo pandemônio! Nós, os cidadãos, reconhecemos que houve uma inversão nos extratos sociais. Mudamo-nos para o submundo, para a zona de perigo, onde não existe a proteção da lei, onde padecemos nossa desdita sob a implacável violência do andar de cima. Ali, no andar de cima, é tudo ao contrário e o mundo do crime opera ao resguardo do imenso guarda-chuva gentilmente proporcionado pelo aparelho de Estado e suas leis. É isso que se chama, aqui, de Segurança Pública. Tudo por obra e graça do petismo que chegou à overdose de si mesmo e perdeu os próprios controles. _____________ * Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

29/07/2013
Como pode ser tão imenso o bem que não se vê? O mal me cansara os olhos e turbara meus ouvidos. A sociedade brasileira, pastoreada por lobos, emitia sinais de completa perdição. Quantas vezes, nas últimas décadas, obriguei-me a escrever - totalmente em vão, pensava - contra as muralhas que se erguiam para apartar os brasileiros da fonte de todo o bem. Eram muralhas erguidas com as pedras de uma certa mídia dotada de princípios e virtudes incertos, com as pedras de ideologias malsãs, com as pedras do deboche e da avacalhação. Eram tão ferozes e tão continuados os ataques à Igreja (por dentro e por fora), andava tão desprotegida a vítima, que o coração dos fieis temia pelo futuro. Mas havia também, absconditus, um imenso bem que eu não via. Por isso, a visita do Papa Francisco foi, de modo muito especial para mim, uma bênção e um bálsamo. Sua figura acolhedora e suas palavras ternas, plenas de verdade, conquistaram o povo brasileiro que, às dezenas de milhões, o acompanhou nos eventos do Rio, ao vivo ou pela tevê, cativado por seus exemplos e suas mensagens. O modo como os brasileiros o recepcionaram embasbacou os meios de comunicação. A audiência era tanta que se impôs uma cobertura quase permanente. Há alguns anos, em viagem pela Espanha com minha mulher, decidimos num fim de tarde entrar na cidade de Saragoza. O trânsito estava tão lento e pesado que estacionei o carro no primeiro hotel que vi. Registrei-nos e saímos para uma caminhada até o centro da cidade. De repente, as pessoas surgiram de todos os lados e, em instantes, nos vimos no meio de uma multidão formada por centenas de milhares de devotos de Nossa Senhora del Pilar, padroeira da Espanha, cuja festa anual ocorre principalmente em Saragoza e exatamente naquele dia. Lembro até hoje da sensação de haver iniciado a caminhada como indivíduo e ir me transformando, aos poucos, em parte da humanidade. Senti a mesma coisa diante das imagens das grandes concentrações ocorridas em Copacabana, a princesinha do mar e esplêndido umbigo da frivolidade nacional. Não, não estamos sós. Nem tudo está perdido. O povo brasileiro ainda conserva a capacidade de emocionar-se, de amar a Deus e ao próximo, de flexionar os joelhos diante do altar do Senhor. Não houve qualquer dessas coisas frívolas que cremos serem as únicas capazes de tirar as pessoas de casa. Houve lágrimas rolando pelas faces e pelos corações. Houve risos da mais pura alegria. Houve um imenso testemunho coletivo de fé proporcionado por um público majoritariamente jovem, do mundo inteiro e do mundo moderno. Quanto isso deve ter embasbacado os inimigos da Igreja, os militantes do ateísmo e os sumo sacerdotes do materialismo! Como soaram patéticas e bisonhas as investidas da marcha das vadias e da militância ateísta contra a Igreja e contra a vinda do Papa Francisco! Ali, nas areias da Praia de Copacabana, milhões de brasileiros mostraram haver, na fonte de todo o Bem, verdades que libertam, belezas que encantam e forças restauradoras que salvam. _____________ * Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

28/07/2013
Quanto é oportuna a vinda ao Brasil do Papa Francisco! O país que ele visitou durante a Jornada Mundial da Juventude se convulsiona num misto de repugnância e angústia. Repugnância diante da realidade política e da despudorada conduta das classes dirigentes; angústia porque não vislumbra alternativas viáveis para reverter essa situação. Precisávamos muito de que alguém, com elevadíssima autoridade moral, falasse aos corações dos brasileiros num momento em que ocorreu o inimaginável - a nação saiu de sua letárgica paciência e tolerância. Nestas últimas semanas, milhões saíram às ruas. E não foi para pular e dançar, mas para explicitar indignação perante os males que tomam conta do nosso corpo institucional. Por outro lado, a febricitante acolhida que o Papa recebeu foi um duro golpe naqueles que, intimamente, cantavam vitória ante o que avaliavam como definhamento do Cristianismo na alma do povo brasileiro. Em nome da laicidade do Estado exigiam que cada brasileiro exonerasse e sepultasse os mais elevados valores de origem cristã plasmados na sua consciência individual. Dedicavam-se a esse trabalho infame como quem engorda rebanho para abate. Mas vimos, por onde o Papa passou, o quanto é vão esse delírio! Jesus Cristo e sua Igreja movem e comovem parcela imensa da nossa gente. Como movem e comovem populações no mundo inteiro. A fé enraizada na alma do povo resistirá, também aos muitos - e tão influentes! - que cortejam os vícios e debocham das virtudes. Resistirá àqueles que não se cansam de distribuir maus conselhos aos jovens, de atacar por todos os flancos a instituição familiar e de usar os estabelecimentos de ensino para cauterizar e extirpar da alma do povo os sinais de sua fé. Paulo VI, na encíclica Populorum Progressio, referiu-se à Igreja como mãe e mestra, perita em humanidade. Junto com outras igrejas cristãs, ela é guardiã de um tesouro de ensino moral que envolve apreço a tudo que seus adversários precisam destruir no coração humano. Falo do amor a Deus, ao próximo, a si mesmo e da vivência da política como elevadíssima expressão do amor ao próximo. Falo da solidariedade como virtude social. Do respeito à vida humana desde a concepção. Da eminente dignidade da pessoa humana, imagem e semelhança de Deus. Da liberdade como irmã gêmea univitelina da verdade, porque, desconectada da verdade, a liberdade se converte em desorientação. Falo do apreço ao bem e da rejeição ao mal. Do amor à à justiça e, além da justiça, à misericórdia. Falo da família como instituição essencial às sociedades humanas. E falo, também, da prudência, da fidelidade, da probidade e da modéstia. Precisamos de tudo isso em altas doses. E nada do que precisamos nos será entregue pelo pós-modernismo, pelo relativismo moral, ou pelos inimigos de Jesus Cristo. Os líderes sem caráter já fizeram todo o estrago possível. A imensa maioria dos bons brasileiros que saíram às ruas nas últimas semanas era formada por jovens. Notável! Eles são, como disse o Papa, a janela por onde chega o futuro. Exatamente por isso foram os primeiros que se mobilizaram para dizer basta!. Meditemos sobre tudo que Papa nos falou. É hora de amar o Bem e de fazer o bem. E de assumir, com todas as energias da vontade, aquelas virtudes individuais e sociais sem as quais não se constrói a nação com que todos temos o direito de sonhar. ZERO HORA, 28 de julho de 2013

Percival Puggina

23/07/2013
DOIS DISCURSOS Percival Puggina O discurso com que a presidente Dilma saudou o Papa Francisco foi uma caprichosa demonstração de falta de senso de oportunidade. Quis apresentar os governos petistas como fiéis seguidores dos ensinamentos evangélicos. Cruz, credo! Não dedicou mais do que uma frase ao visitante e à Igreja. E assim mesmo para dizer, nessa frase, que conta com a Igreja para disseminar universalmente o combate à pobreza. O Papa, em contrapartida, encheu o ambiente com palavras amorosas, humildes, cheias de conteúdo espiritual e fez uma convocação aos jovens para que assumam em suas vidas os mais elevados valores morais. Algo que deve ter ardido nos ouvidos de muitos dos presentes.

Percival Puggina

18/07/2013
No dia 10 deste mês, um grupo de rapazes e moças resolveu descer das galerias e invadir a Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Ali permaneceram por oito dias, impedindo o trabalho no local, controlando entradas e saídas, promovendo reuniões, concedendo entrevistas coletivas e, em eventos às portas fechadas, fazendo sabe-se lá o quê. Qual o motivo da desabrida selvageria? Simples como isto: eles querem passe livre no transporte coletivo da cidade. Ou, mais claramente, desejam entrar e sair dos ônibus sem pagar, transferindo para os demais cidadãos os ônus desse privilégio. O leitor destas linhas que tenha acompanhado tais episódios em Porto Alegre deve estar se perguntando onde quero chegar chovendo no molhado de fatos bem conhecidos e atuais. Acontece que, no meu modo de ver, mais grave do que a conduta violenta e abusiva dos vândalos que se instalaram na sede do legislativo municipal foi a inadequada conduta das autoridades. Foi ver que meia dúzia de vereadores se mantiveram ativos, presentes e coniventes com os invasores. Foi ver alguns dos nossos edis, atendendo condição imposta pelos intrusos para lhes concederem uma reunião de negociações: sentaram-se no chão, os vereadores, para ouvi-los. Quanto achincalhe! Quanta falta de amor próprio! Não bastasse tudo isso, o esquema de autoridade e poder de que se arrogaram os desordeiros acabou acatado pelas autoridades legítimas que estiveram envolvidas no episódio. Assim, a magistrada que atuou no caso, em vez de determinar a reintegração de posse, usou a ideia da reunião de mediação, contida no famigerado PNDH-3 (que a Câmara dos Deputados está rejeitando no projeto do novo Código Civil). Como se fosse possível mediar ou conciliar o invadido com seus invasores! Com isso, legitimou a autoridade e a representatividade dos invasores em tragicômica audiência pública de conciliação. Duvido e faço pouco de que fosse igual o procedimento se o poder invadido, em vez do Legislativo, fosse o Judiciário. Duvido e faço muito pouco. Em Porto Alegre, nestes dias de julho de 2013, ficou decidido que quem invade ganha muito mais do que a confortável tolerância das instituições. Tem apoio político. Conquista autoridade. Impõe as condições e os limites que lhe convêm. Reveste-se de poder. E é tratado como tal. Sinuoso e sombrio, enquanto esses desmandos acontecem, infiltra-se e se arregimenta, de modo serpentino, o ideal totalitário. E todos sabemos o quanto a ideologia da violência é intolerante. Bibliotecas do mundo inteiro alinham quilômetros de estantes com a descrição pormenorizada de suas estratégias e de seus horrores. Antes que me esqueça. 1º) A conta dos estragos feitos será paga pelos contribuintes do município. 2º) Ontem à noite, no dormitório de desocupados em que foi convertida a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, rapazes e moças dançavam nus, mostrando a exiguidade de seus argumentos e zombando das instituições que humilharam para além de todos os limites que se possa conceber. Por estupradas que já estejam. _____________ * Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

13/07/2013
O Brasil está à beira da anomia. Em relação aos poderes de Estado, o povo perdeu a fé, a esperança, e a caridade. Isso é anomia, ou seja, desintegração das normas que regem as condutas e garantem a ordem social. O povo chegou ao ponto de saturação e simplesmente não suporta mais tanta improbidade, corrupção, indignidade e incoerência. Já o Estado, diante do que vê nas ruas, dá mostras de completa desorientação. Seria tão simples - não é mesmo? - reger com probidade, dignidade e coerência! Não haveria mensalão, nem mensalinho, nem emendas parlamentares como moedas de troca no balcão do poder, nem jatinhos, nem jatões para assistir missa em Roma, nem Renan presidiria o Senado (quanta desfaçatez!), nem tantos ministérios, nem companheiros nos tribunais, nem tanto abuso de direitos, nem tamanha distância entre o modo de vida dos frequentadores do salões do poder e o modo de vida do povo, nem tanta incoerência entre o piso que se prometeu ao magistério e os vencimentos que a ele se paga. Asseguro-lhes, sob condições singelas, o povo não estaria nas ruas. O governo Dilma é um morto-vivo que respira por aparelhos. Aparelhos políticos, tutelados pelo poder. E por uma enxurrada de anúncios bilionários proclamados, para auditórios nervosos, em aparições ectoplasmáticas. Aparições que soam fúnebres, do tipo - reúne a família que a hora está próxima. São eventos cujas imagens me trazem à lembrança a famosa foto de Tancredo Neves entre seus médicos no Hospital de Base de Brasília. O dinheiro não compra tudo, presidente. Não se vislumbram saídas. A desatenção às leis da Economia está cobrando sua conta, que, como de hábito, chega mais rápido a quem pode menos. O maldito modelo institucional brasileiro, mal costurado, ficha-suja, nos deixa sem opção por essa via. Quantas vezes votamos, em vão, no mal menor? De fato, o pêndulo que, nos países com boa organização, oscila, periodicamente, segundo as leis da Física e da Política, da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, desaprumou no Brasil. E balança, bisonho e sem tino, entre a esquerda e mais à esquerda. *** Mudando de assunto, sem mudar. A bruma dos séculos envolve fatos e lendas a respeito de Santo Antônio. Conta-se, por exemplo, que certa vez, quando seu pai estava sendo julgado em Portugal, acusado de um assassinato, padre Antônio celebrava missa em Pádua, na Itália. De repente, o santo teria se quedado imóvel perante os fieis e aparecido em Lisboa, onde, não bastasse o prodígio da bilocação, ainda teria ressuscitado o morto para que testemunhasse a inocência do acusado. Extraordinário, não? Pois eu conheço um sujeito nada santo que realiza portento bem maior. Ele, com frequência, consegue não estar em lugar algum. Desaparece. Some aos olhos humanos. Falo de Lula. Sempre tão presente nas horas boas, toma chá de sumiço quando a coisa encrenca. Evanesce. E não me digam que é lenda. Não. É milagre mesmo. Milagre sem interferência divina. Coisas que ele faz por conta de não sei quem. Ou melhor, sei. Mas não digo. O homem que dá as cartas e joga de mão na política brasileira, há dez anos, sumiu de novo, como se nada tivesse a ver com o que está acontecendo no país. ZERO HORA, 14 de julho de 2013

Percival Puggina

12/07/2013
Agora que a noite caiu sobre a greve, depois de o jornalismo nacional haver colhido e exibido em todo país, repetidas vezes, cenas do dia 11, faço uma leitura do que aconteceu. O título acima reproduz conhecido refrão dos movimentos grevistas para apresentar suas reivindicações. Neste caso, a pergunta do refrão deve ser dirigida, mesmo, às centrais sindicais. Por que vocês resolveram parar o país? Qual a urgência que determinou essa desmobilização nacional, esse singular feriado ou feriadão de julho? São perguntas que todos nos fazemos nesta manhã do dia 12. Afinal, o que aconteceu, ontem, no Brasil? Por que paramos? Paramos por quê? A greve teve intensidade abaixo da média em relação ao que se podia esperar de um evento dessa magnitude. Em muitas das grandes cidades a vida transcorreu normalmente. Noutras o comércio fechou porque os empresários foram advertidos de que poderia haver depredações caso os estabelecimentos abrissem as portas. Onde o transporte coletivo aderiu, as consequências foram mais visíveis no panorama urbano. As ruas ficaram com jeito de feriado. Mas ninguém sabia exatamente porque aquilo estava acontecendo. As centrais sindicais, é verdade, elencaram um pot-pourri de reivindicações para justificar a absurda paralisação. Mas o real motivo de quem precisa elencar muitos para justificar o que faz nunca está entre os motivos apresentados. As principais centrais sindicais são braços de partidos da base do governo. E a base do governo, acuada pelas mobilizações dos últimos dias, pensou que se o povo estava saindo para a rua com tamanha determinação, o governo deveria colocar na pista seu próprio bloco. Ou seja, gente, muita gente, portando pautas genéricas, mas sem esconjurar o governo e, principalmente, sem os Fora Dilma! que tão fortemente latejam nos ouvidos oficiais. E por que as centrais sindicais toparam prestar-se a essa pantomima? Porque já lhes era perguntado, não sem razão, o porquê de sua silenciosa omissão diante dos protestos em curso no país. O resultado, tudo visto e contabilizado, foi pífio. Sabiamente, o povo não compareceu. Em inúmeras cidades, os grevistas precisaram interromper o trânsito em avenidas e rodovias como forma de dar aparente vulto ao que faziam (fosse lá o que fosse aquilo que faziam). O grande visual era proporcionado pelos milhares de veículos obrigados a parar enquanto meia dúzia de dirigentes sindicais, de modo delinquente, queimavam pneus na pista por horas a fio. Governo e sindicalismo pelego deram ao país um prejuízo de bilhões de reais com a interrupção de inúmeras atividades produtivas. O dia 11 de julho de 2013 vai entrar para a memória nacional como alarmante evidência de que esse governo conduz suas estratégias políticas e suas ações de gestão de modo igualmente incoerente e irresponsável.