Percival Puggina

05/03/2014
O governador Tarso Genro declarou-se contrário a quaisquer leis, sejam municipais, estaduais ou federais que visem a proibir o uso de máscaras em protestos. Ora, para que não esqueçamos de certas definições consensuais numa sociedade civilizada: protesto se faz em passeatas ou concentrações, erguendo cartazes e faixas, proferindo discursos e refrões, subindo num banquinho ou carro de som, usando megafone. Protesto se faz mostrando a cara. Malfeitor mascarado é bandido, assaltante. Se é apenas manifestante e usa máscara, é covarde. Tem vergonha do que faz. Mas voltemos ao governador. Disse ele, referindo-se ao projeto aprovado pela Câmara de Vereadores da capital gaúcha: Essa lei não tem nenhuma função ou objetivo. Mas como não, governador? Função - permitir a identificação de quem cometer crimes. Objetivo - reduzir a destruição de patrimônio público e privado, bem como proteger a integridade física de policiais e transeuntes. Como não poderia deixar de ser, invocou ele o velho chavão esquerdista usado sempre que ocorre alguma reação frente a atos de selvageria praticados por grupos descontrolados: A lei (contra o uso de máscaras) criminaliza os movimentos sociais. É dose! Onde o ilustre ex-ministro da Justiça foi buscar a ideia de que crime cometido por muita gente deixa de ser crime? Em que alfarrábio Tarso encontrou uma definição de movimento social na qual se enquadrem os black bloc, os incendiários de ônibus, os arrastões em estabelecimentos comerciais? A relação do PT com a impunidade já ultrapassou todos os limites do descaramento. Se é companheiro, se pega junto, se vota com a gente, pode tudo. E mais um pouco.

Percival Puggina

01/03/2014
FETICHISMO ARBÓREO Percival Puggina Discute-se em Porto Alegre sobre a ampliação do Hospital de Clínicas da UFRGS. A obra vai ampliar em mais de 70% a capacidade de atendimento da emergência do hospital e implica no corte de duzentas das mais de mil outras plantadas no local. Pronto! Aqui na capital gaúcha, instalou-se um fetiche arbóreo. Falou em cortar árvore desabam raios e trovões sobre qualquer proposta, inclusive sobre essa. Grupos fanatizados, alegando falar em nome da sociedade, opõem-se à iniciativa, fincam pé e são capazes, até mesmo desse absurdo: retardar uma obra que vai abrandar as terríveis dificuldades em que se encontra a emergência do SUS em Porto Alegre. Há quem, entre árvores e pessoas, fique, definitivamente, com as primeiras. Talvez porque ainda não tenha descido delas, como disse alguém.

Percival Puggina

01/03/2014
Morreu ontem, 28 de fevereiro, em Miami, aos 95 anos, Huber Matos Benítez, revolucionário cubano de 1959. Ele foi o primeiro a passar pelo infindável martírio que a adesão de Fidel ao marxismo-leninismo, posterior à sua malfadada revolução, impõe ao povo de Cuba. Presto minha homenagem a esse valente cidadão, verdadeiro herói, com todos os méritos e dores inerentes a tão qualificador substantivo. Em reverência a ele transcrevo um trecho do meu livro Cuba, a Tragédia da Utopia. *** São vários os casos emblemáticos na caminhada de Fidel sobre cadáveres rumo ao poder absoluto, sempre secundado pelo mano Raul. Um deles é o do comandante Hubert Matos. Na hierarquia revolucionária não havia coronéis nem generais. O posto máximo era o de comandante. Huber Matos entrou em Sierra Maestra e em combates que se seguiram, após intermediar uma operação considerada decisiva para a vitória de Fidel: o fornecimento de armas e munições, em meados de 1958, para a arremetida final contra o exército de Batista. Ganhando o posto de comandante e contando com a confiança de Fidel, passou a divergir dele quando percebeu o alinhamento comunista de seu líder. Ele relata sua amarga experiência no livro Como llegó la noche. Ainda em janeiro de 1959, Fidel o declarou como o terceiro homem da revolução. Na ocasião, os principais comandantes eram Fidel, seu irmão Raul, Che Guevara, Camilo Cienfuegos e Huber Matos. O próprio Matos se declarou surpreso com a designação que recebeu: Primero estoy yo, luego Raúl y después estás tú. Com efeito, Fidel não tinha muita confiança no equilíbrio de Che, Raul tinha ciúmes de Che e ambos desdenhavam Camilo, a quem consideravam um tipo boêmio com pouca rigidez de espírito (embora tivesse grande apelo popular, o que desagradava profundamente o Líder Máximo). Matos relata que certa feita, ainda nos primeiros meses de 1959, após visitar uma obra no porto de Havana onde Fidel falou aos operários, retornando os dois pelo Malecón, perguntou ao chefe sobre seus planos para concretizar a promessa de participação dos operários nos resultados das empresas. E Fidel lhe respondeu: No Huber, eso no lo podemos hacer, porque si propiciamos que los trabajadores tengan independencia económica, de ahí a la independencia política no hay más que un paso. No podemos!?. Diante do que estava percebendo, Matos enviou a Fidel uma carta pessoal, apontando divergências e afirmando que não tinha qualquer intenção de criar problemas para a revolução. Na carta, pedia seu afastamento, em caráter irrevogável do posto de comando que detinha em Camaguey. Foi o que bastou para ser levado a julgamento por alta traição em outubro de 1959. Fidel compareceu pessoalmente ao julgamento para acusar seu antigo companheiro, tomando como base de acusação o fato de que a notícia da renúncia de Matos circulava abertamente na província que ele dirigia e suscitava reações de antagonismo à revolução entre os soldados. A leitura da ata da sessão é uma evidência dos critérios partilhados pelos tribunais revolucionários. Matos é acusado de voltar atrás de seu juramento de lealdade, de atingir com sua renúncia o vigor da revolução, de tentar destruir com seu gesto o patrimônio simbólico e espiritual da revolução. Resumo da missa: condenado a 20 anos de prisão. *** Huber Matos cumpriu integralmente essa sentença, do primeiro ao último dia, por ordem do canalha que há mais de meio século infelicita a nação cubana e recolhe tanto apreço do aparelho político-partidário que governa nosso país. _____________ * Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.

Percival Puggina

28/02/2014
Completou-se, na manhã de quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014, mais uma página na história da construção da hegemonia petista. Ela desenha para o Brasil um estado totalitário, à margem da democracia constitucional. Confirmou-se a formação de uma bancada governista dentro do Supremo Tribunal Federal, situação que passamos a partilhar com os países do eixo bolivariano que, há mais tempo, abandonaram o princípio da independência dos poderes. O STF, apesar de todos os seus pesares, ainda era um último recurso contra o arbítrio. Varreu-se, agora, a linha divisória que nos separava do mundo das trevas onde reina, todo poderoso, o partido que hegemonizou a política nacional. Cerrou-se a porta onde poderíamos bater para conter o braço longo do Estado em suas ingerências na vida privada e o uso abusivo do aparelho estatal. O petismo, que governa a República, que chefia e partidariza o Estado, que mantém a soldo a maioria parlamentar, capturou também o STF para seu aprisco. O modelo institucional brasileiro, tão mal concebido, tão fácil de ser empalmado por quem tenha vocação totalitária, prevê que os membros dos tribunais superiores sejam indicados à aprovação parlamentar pelo chefe do respectivo poder executivo. Assim, quem indica os ministros do STF é a pessoa que preside a República. Essa norma, esculpida na Constituição, pressupunha o natural rodízio dos partidos no mais elevado escalão do poder nacional. Não cogitaram, os constituintes, a possibilidade de um mesmo partido exercer a presidência durante sucessivos mandatos, por 12 ou, mesmo, 16 anos. Pensaram que a gangorra das maiorias e o rodízio dos governantes permitiriam a renovação do STF, preservando conveniente pluralidade. No entanto, a solidificação de uma hegemonia no governo da República foi transformando a Corte em colegiado a ele subalterno. Quando Joaquim Barbosa, com a habitual sem cerimônia, afirmou ao novato Roberto Barroso que seu voto tinha todo jeito de ter vindo pronto quando chegou ao STF no ano passado, ele estava fazendo a leitura de um período muito triste da história do Brasil. O Supremo encolhendo como poder e sendo composto como mesa de banquete nos regabofes palacianos. Diante desse cenário é importante levar em conta que a eleição do dia 5 de outubro não será como outras quaisquer. O que estará em disputa quase definitiva não é uma simples escolha entre dois ou mais nomes. Nosso país estará decidindo se quer ser uma republiqueta bolivariana ou uma nação respeitável, alinhada com as democracias do planeta. Impossível recusar esta verdade bem simples: não é entre tais democracias que o partido hoje hegemônico em nosso país gosta de estar. Seus dirigentes não escondem seu apreço pelas piores companhias, nem seus afetos pelos ditadores e demagogos que infernizam nações vizinhas, alinhadas com as confabulações do famigerado Foro de São Paulo. Em 5 de outubro estaremos fazendo uma escolha praticamente definitiva sobre o tipo de civilização em que queremos nos desenvolver como nação, que tipo de ambiente cultural queremos integrar, que tipo de direitos queremos exercer e de deveres aceitamos cumprir. Isso é bem mais do que eleger um governante. _____________ * Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.

Percival Puggina

23/02/2014
Há poucos dias, em Petrópolis/RJ, com a presença da ministra dos Direitos Humanos, realizou-se evento para assinalar a desapropriação de um prédio identificado como centro de tortura. No final da cerimônia, um coral cantou - adivinhe o quê? nosso Hino Nacional? - não, o hino da Internacional Comunista, peça musical de fervor revolucionário que chegou a ser hino oficial da URSS durante décadas. Cumprindo a tradição, a performance foi acompanhada e aplaudida por uma plateia de punhos cerrados e erguidos. Ninguém desafinou. Nem vaiou. Dizer-se democrata e cantar o hino de uma ditadura comunista é desinformar. A propósito, nenhum dos três livros que acabo de importar chamou a atenção das editoras nacionais, apesar de sua cronométrica e milimétrica aproximação à atualidade brasileira, inclusive com o ocorrido em Petrópolis. São eles: Desinformation, que trata das técnicas para construir imagens e versões, e solapar as liberdades; The Killing of History, a propósito de como certas teorias sociais e críticas literárias estão matando os fatos; e The Tyranny of Clichés, sobre como as esquerdas trapaceiam no conflito das ideias. Não seria fantasioso, de modo algum, considerar que o mutismo a respeito dessas e de outras obras seja uma evidência da realidade abordada nos três livros. Pergunto: não seria, também, por desejo de desinformar, de matar a História e de vencer o debate trapaceando que não se traduzem esses livros? A hipótese explicaria muito bem, por exemplo, a ocultação pela mídia nacional de Camaradas, obra de William Waack, escrita após minuciosa pesquisa nos Arquivos de Moscou, com foco na estratégia e na influência da URSS sobre a atuação dos comunistas no Brasil durante a primeira parte do século passado. Tanto se desinforma, se vandaliza a História e se trapaceia no debate de ideias que hoje ninguém duvida da influência e da participação da CIA nos atos e fatos de 1964. Ao mesmo tempo, sequer entra em cogitação a óbvia consequência disso: que tenha havido simétrica influência e participação soviética na América e no Brasil. Entre 1945 e 1991, a Guerra Fria, sabemos todos, campeou solta no mundo inteiro. Luta estratégica, de vida ou morte, que não poupou a Lua e o espaço sideral. Surpreendentemente, segundo a história que nos é contada, só a CIA se interessava pelo Brasil. A URSS, que estendia malhas, a ferro e fogo, no leste europeu, na África, na Ásia, na América Central, no Caribe e na América do Sul, mediante movimentos guerrilheiros e forças de ocupação, ignoraria solenemente as terrinhas descobertas por Cabral! Se já ouvira falar no Brasil, não prestara atenção. Aqui só xeretariam os gananciosos ianques, difundindo a paranoia de um tal de comunismo que nos humilhava com seu desprezo. Nas primeiras páginas do The Tyranny of Clichés, o autor Jonah Goldberg cita uma frase que cai como roupa de bom alfaiate sobre o que está em curso no Brasil: A História não tem lados, mas os historiadores têm. Foi esse ensinamento que não pude deixar de associar ao fato narrado na abertura deste texto - a reunião da Comissão Nacional da Verdade ocorrida em Petrópolis. Aí está o pecado original de uma Comissão cujo símbolo deveria ser um Saci-Pererê maneta. Com membros apenas do lado esquerdo, essa Comissão não inspira confiança alguma em quem tenha apreço pela verdade. Saberiam cantar o Hino Nacional, com igual fervor e sem desafinar? ZERO HORA, 23 de fevereiro de 2014

Percival Puggina

20/02/2014
O Partido dos Trabalhadores, há bem mais de uma década, nada de braçada nas águas revoltas da nossa política. Isso não aconteceu por sorte ou acaso. Foi perícia coletiva, dentro de bem traçado planejamento e perfeita execução. De um lado, o partido se constituía na tradição dos partidos de massa, rara entre nós, e aplicava com tenacidade os métodos de infiltração que o fizeram presente e ativo nos corpos sociais e nas instituições do Estado. De outro, partia para o ataque a seus opositores sem tréguas nem misericórdia. O objetivo era produzir a demolição moral de quem estivesse em seu caminho. Pela cartilha petista, escândalo no território inimigo era e continua sendo coisa que ou existe ou se fabrica. Onde houvesse o mais tênue fio de fumaça da suspeita o partido era o primeiro a chegar, com um tonel de gasolina. Impoluto, apontava o dedo acusador para as privatizações, por exemplo, com a autoridade moral de quem jamais o usou para contar dinheiro mal-havido. Quando seus líderes clamavam por CPIs para investigar as privatizações e a base do governo FHC não os apoiava, roíam-me desconfianças e suspeições. Ai tem!, pensava eu. Se o nariz petista acusava algo, se sua alma se ouriçava, se seu fino tato acusava, era certo que algo havia. Afinal, eles sabiam tudo, mas tudo mesmo, sobre o governo dos outros. Foi assim que o partido, sem muito esforço diga-se, destruiu moralmente os governos Collor e Sarney. Foi assim que o partido requereu contra o governo FHC mais de duas dezenas de CPIs. As investidas foram tantas, tão contínuas e violentas que o prestígio do ex-presidente despencou dos elevados índices a que chegara nos pleitos que venceu. Quanto de verdade havia naquelas acusações? O PT atribuía a falta de provas cabais ao engavetamento dos processos na Procuradoria Geral da República e à recusa da base do governo em conceder à oposição os votos necessários à formação das CPIs. A posse de Lula seria, também, a hora da verdade para sua oposição? Eu pensava que sim,. Os petistas não mais dependiam das CPIs para investigar e exibir as negociatas alheias. Passavam a dispor de todos os meios de investigação, servidos em bandeja de prata, com guarnição de veludo azul. Ministério da Justiça, Controladoria-Geral da União, ABIN, Polícia Federal, Receita Federal, eram apenas alguns dentre os muitos instrumentos disponíveis. Sem esquecer, ainda, os arquivos de todos os ministérios, repartições e empresas estatais do país. Vai ter muito colarinho branco na cadeia, pensava eu. Surpresa! Em 1º de janeiro de 2003 a inquisição petista deve ter embarcado em Alcântara rumo a algum asteróide distante. O outrora refinado faro não capta mau cheiro sequer quando vem da sola do próprio sapato. Seus sherloques, seus produtores de dossiês, que antes sabiam de tudo que acontecia na República, foram acometidos de um alheamento, de um autismo em que não apenas ninguém está a par do que acontece na sala ao lado, mas é a própria mão direita a primeira a desconhecer o que a esquerda faz. Sobre essa duplicidade de conduta nada se fala, nada se escreve. Quando não há explicação moralmente aceitável é preferível deixar o dito pelo não dito. E Lula maneja com perfeição a prolongada retórica do silêncio.

Percival Puggina

18/02/2014
COMUNICADO AOS MEUS LEITORES NO FACEBOOK Há coisa de um mês, por ter atingido o limite de 5 mil amigos e seguidores no perfil que mantinha no Facebook, migrei para uma Fan Page que, em princípio, não teria essa limitação. Durante o processo de migração que é feito automaticamente pelo Facebook, devo ter perdido contato com alguns milhares de leitores que agora, quando procuram pelo meu nome, encontram o perfil fechado. Precisei abrir um novo e começá-lo do zero. Por isso, este aviso aos eventuais interessados. É possível acompanhar meus posts e textos de duas maneiras: - www.facebook.com/percival.puggina (essa é a fan page) - www.facebook.com/percival.puggina9(esse é o novo perfil) Quem acessar pela fan page deve clicar em Seguir e, depois, em Obter notificações. Quem acessar pelo novo perfil deve solicitar para ser amigo, conforme usualmente é feito. Isso vale, também, para quem era amigo e perdeu contato. Muito obrigado pelo interesse. É um prazer ficar em contato com todos e receber seus comentários.

Percival Puggina

17/02/2014
OU NÃO? Percival Puggina Impressionante a fixação dos petistas em FHC. Qualquer crítica que se faça a Lula (e é infinito o número de críticas a serem feitas) eles, imediatamente, retrucam atacando FHC. Ora, FHC é carta fora de baralho. Já era. Já foi, há mais de uma década. Esquecem, os petistas, que a grande diferença entre os governos de FHC e Lula está no fato de que o FHC, que eles tanto odeiam, prestava muita atenção ao que os petistas diziam de seu governo (e muito se atrapalhou por conta disso), ao passo que Lula nunca deu muita bola para o petismo enquanto governou. Ou não?

Percival Puggina

14/02/2014
Ao se desligar do programa Mais Médicos, a doutora Ramona Matos Rodriguez abriu a caixa de Pandora desse suspeitíssimo convênio firmado entre o governo brasileiro e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) para locação de médicos cubanos. Ramona exibiu à imprensa cópia do seu contrato com uma certa sociedade anônima Comercializadora de Serviços Médicos e informou que dos 10 mil reais por cabeça, pagos pelo Brasil, ela só recebia o equivalente a mil reais no câmbio atual. Ou seja, confirmou ganhar apenas aqueles 10% que eu, desde o início das tratativas para vinda dos médicos, afirmei que constituíam o padrão para contratos desse tipo na Castro & Castro Ltda. - antigamente conhecida como ilha de Cuba - empresa familiar com sede e foro na cidade de Havana. E ainda há quem ouse se referir a tais negociatas como evidências da admirável solidariedade da Cuba comunista para com os necessitados do mundo. Vê se eu posso! Em torno de dona Ramona se formou a primeira das encrencas que haverão de cercar esse convênio nascido nas confabulações do Foro de São Paulo (aquela supranacional esquerdista que a imprensa brasileira faz questão de solenemente desconhecer). Muitas outras encrencas virão porque tudo que é mal feito em algum momento cobra conserto. O problema é que Dilma, apesar de seus 40 ministros, não tem um ministério nem dirige um governo. Ela preside um clube, destinado ao lazer dos sócios, vale dizer, dos partidos políticos que compõem sua base de sustentação. Tivesse ela um bom ministro do Trabalho, este lhe diria que a situação dos cubanos é totalmente irregular perante a legislação brasileira (a doutora Ramona já anuncia que vai buscar na Justiça do Trabalho o que lhe é devido pelo Brasil). Tivesse ela um bom ministro da Saúde, ele a advertiria sobre a deficiente formação média dos profissionais médicos formados em Cuba. Tivesse ela um bom ministro da Defesa, ele haveria de alertá-la para os riscos decorrentes da importação, em larga escala, de agentes enviados por um país que, desde 1959, se caracteriza por infiltrar e subsidiar guerrilheiros no resto do mundo. Tivesse, Dilma, uma boa ministra de Direitos Humanos, menos fascinada por ideologia e mais pela humanidade, esta iria às últimas consequências para impedir que o Brasil protagonizasse escancarado ato de escravidão, trazendo os cubanos sob as condições postas por Havana. Tivesse Dilma um bom ministro da Fazenda, ele certamente lhe demonstraria o quanto é abusivo pagar um overhead de 900% em relação a cada profissional enviado pelos Castro. Tivesse ela um bom ministro da Economia, este abriria um berreiro para mostrar que a contabilidade desse convênio é altamente prejudicial ao interesse nacional diante da desproporção entre o valor do serviço prestado no Brasil e o montante enviado para a matriz cubana. Tivesse Dilma um bom ministro da Justiça, ele ficaria de cabelos em pé diante do atropelo que esse contrato produz nos mais comezinhos princípios de Justiça e na legislação nacional. Tivesse Dilma um bom ministro da Previdência Social, ele mostraria ser líquido e certo o caráter regressivo ao governo de qualquer ação dos médicos cubanos em busca de seus direitos previdenciários porque o patrão de fato desses profissionais é o governo brasileiro. Tivesse Dilma um bom ministro de Relações Exteriores, ele lhe mostraria o quanto resulta negativo à imagem do Brasil o conhecimento internacional das bases em que o país firmou esse convênio. Mas Dilma preside um clube. E se o clube está nem aí para suas verdadeiras ocupações, menos ainda haverá de estar para quaisquer preocupações. O clube, afinal, gosta mesmo é de festa e grana. Se Dilma não fosse Dilma e tivesse um bom ministério, se estivesse ocupada em solucionar problemas estruturais em vez de ficar quebrando galhos e agradando parceiros, ela teria atendido à reivindicação dos médicos brasileiros. Há muito tempo eles pedem uma carreira atrativa no serviço público, à exemplo de outras que iniciam em postos remotos e, gradualmente, promovem seus integrantes para centros maiores. Mas Dilma é apenas Dilma. _____________ * Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.