Percival Puggina

21/08/2017

 

 A concessão do título de Doutor Honoris Causa ao réu condenado Luiz Inácio Lula da Silva pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB) seria caricatura de um ato acadêmico sério, não fosse retrato fiel da universidade brasileira.

O que aconteceu ali se reproduz no nosso ensino superior, em pluralidade de formas e manifestações, com a apropriação do espaço docente por fazedores de cabeça a serviços de simpatias e paixões partidárias e ideológicas. As exceções não são significativas e não alteram o cenário geral. Nem prejudicam os objetivos, que são buscados mesmo quando, para alcançá-los, é necessário expor-se ao ridículo, como neste caso.

O juiz Evandro dos Reis ao deferir tutela de urgência em ação popular e suspender a concessão do título, apontou vício de iniciativa do proponente, observância incompleta ou irregular das formalidades requeridas para a concessão, ilegalidade da concessão e desvio de finalidade na oferta do laurel. De fato, a solenidade de entrega ao agraciado ocorreria em ato incluído na agenda política "Lula pelo Brasil". Em outras palavras, tudo foi pensado e feito para usar a UFRB como palco das pautas e objetivos do Partido dos Trabalhadores, cujos militantes aparelham e exercem domínio tirânico no mundo acadêmico brasileiro.

A entrega do título foi cancelada, mas o ato político permaneceu, sendo transferido para a porta da UFRB, onde o presidente Vagner Freitas, da CUT, afirmou que "Sem Lula, eleição é fraude". E acrescentou: "Companheirada, vamos levar isso como mantra, trazer no nosso coração e dizer a quatro pontos nesse pais sem lei". A companheirada de fora aplaudiu em uníssono com a companheirada de dentro.

O fato ficará marcado na história da decadência da universidade brasileira, que perdeu rumo e prumo, confiada a facções militantes. Já não se contentam com disseminar o mesmo vírus ideológico. Querem mais; querem, realmente, tomar as instituições e colocá-las a serviço das causas e pautas da ... companheirada. Quem usa a Educação para tais fins só pode ser contra o Escola Sem Partido. E essa é a razão de sua necessidade.

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

18/08/2017

 


 Lembro-me da primeira vez em que fui advertido de estar sendo politicamente incorreto. "Isso significa que não posso usar a palavra promiscuidade?", perguntei receoso. "Claro que não pode!", foi a resposta que ouvi. Desde então, ser contra essa arenga virou preceito para mim. Tornou-se evidente, ali, que o controle do vocabulário é sutil forma de dominação cultural e política. Impõe servidão mental.

O politicamente correto declara encerrados certos debates e dá por consensuais, por irrecorríveis, conceitos boa parte das vezes insustentáveis numa interlocução esclarecida e bem intencionada. Estamos vendo isso acontecer todos os dias e o fato que trago à reflexão dos leitores dá testemunho.  Encontrei-o por acaso, na internet.

Em maio passado, um delegado de polícia, que é também jornalista, comentou em grupo do whatsapp um estupro de menor (menina de 11 anos que vivia com a mãe). Referindo-se ao caso, observou que "crianças estão pagando muito caro por esse rodízio de padrastos em casa”. O delegado ocupava função de direção na área de comunicação social de sua instituição. A frase foi qualificada como machista e ele, de imediato, exonerado. Fora, politicamente incorreto! Constatara uma obviedade: as sucessivas trocas de parceiros por parte de mulheres independentes expunha as crianças a contatos de risco.

Indagado pelo Jornal Metrópole sobre se estava arrependido o delegado respondeu que não.

“Precisamos discutir responsabilidades e freios morais. As crianças não podem pagar pelas atitudes desmedidas dos adultos, sejam eles homens ou mulheres. Quem leva uma prostituta para casa está arriscando a segurança de seus filhos. Da mesma forma como alguém que levar um psicopata, um ladrão, um homicida para dentro de casa estará colocando a vida dos filhos em risco”. E mais adiante: "Precisamos ter responsabilidade para enfrentar esse tema".

Criado o monstro é preciso alimentá-lo. E ele é nutrido por casos como esse em que o referido delegado ousou expor ideias que não devem ser expressas. Uma coisa é a dignidade da pessoa humana e o respeito a ela devido. Outra é assumir que, em vista dessa dignidade, resultem abolidos os valores que lhe são inerentes. Ou que esses valores sequer possam ser explicitados em público. E ai de quem faça alguma afirmação na qual se possa intuir fundamento religioso ou da moral correspondente! 

A afirmação do policial foi irretocável, mas envolvia uma advertência sobre o exercício irresponsável dos direitos sexuais. E há, sim, uma correspondência entre direitos e deveres que, na situação genérica descrita, são os da mãe, do pai, ou do cuidador responsável por menores no âmbito do lar. Ora bolas!


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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

16/08/2017

 

 No poder legislativo federal, agita-se intensamente o submundo do crime que ali atua de modo ostensivo. Por isso, diante do que vejo, torna-se impossível definir com vocábulos brandos as maquinações constitucionais em negociação com vistas às eleições de 2018.

É bom lembrar. No ano passado, ao cabo de campanhas municipais marcadas pela escassez de recursos técnicos, materiais e financeiros, sem militância paga, houve importante renovação e visível encolhimento de alguns partidos. Ficou nítida, então, no resultado das urnas, esta mensagem: "Senhores, por obséquio, abandonem o recinto". De lá para cá, a disposição para a faxina só aumentou.

Enquanto governo e oposição se contorcem numa luta virtual em que apenas reduzida militância se envolve, a nação aguarda o momento de exercer sua soberania e mandar todos para o olho da rua, por justa - justíssima! - causa: se querem fazer negócios pessoais, abram uma quitanda. Recente pesquisa do Instituto Ipsos revelou que 94% da população não se sente representada pela classe política e por essa legislatura naufragada no próprio descaramento.
Congressistas que precisam comprar suas cadeiras alarmaram-se com a falta de dinheiro que marcou a campanha de 2016. A quem extorquirão agora? De que servirão os usuais requebros e acenos que sugeriam acesso às facilidades do poder? Onde buscarão os milhões que, bem geridos, enchiam as urnas mais indignas no mercado eleitoral? Tudo indica que a conta sobrará para nós, mediante uma tarrafada legislativa que recolherá, sem dó nem piedade, R$ 3,6 bilhões para a campanha deles no ano que vem. É o preço da democracia", afirmam, simulando nobre proteção a um bem superior. Não, não nos tomem por tão ingênuos. Esse é o preço de vossas cadeiras. É a prudente primeira etapa do "Salvemo-nos todos!".

A segunda etapa pode ser resumida como uma bacanal de interesses escusos, indecência que se imaginaria articulada num ambiente sob mortiça luz vermelha. Refiro-me ao aleijão que recebeu o nome de distritão. Ele transforma em majoritária a eleição proporcional de deputados, na base do cada um por si e o diabo por todos. Elegem-se os mais votados. Ora. para que os atuais detentores de mandato estejam entre os mais votados, basta, então, diminuir radicalmente o número de candidatos, pois quanto maior o número de candidatos, menos votos para cada um; e vice-versa. Se os eleitores querem renovar, feche-se a porta para os novos candidatos. Assim, inverte-se o procedimento usual. Os partidos, comandados pelos seus parlamentares, em vez de buscarem candidatos para ampliar suas nominatas e bancadas, porão a correr os novos pretendentes, assegurando, por falta de alternativa, as cadeiras dos que já têm.

É o mais recente truque da cartola dos corruptos. Corrompe-se a democracia, impedindo que se expresse de modo pleno a firme disposição do eleitorado: "Cavalheiros, abandonem o recinto!". Custo a crer que o STF tolere tão nítida disposição de nossos congressistas de promoverem uma farsa eleitoral. Não perceberá o Supremo, aí, o empenho de inibir, por supressão de alternativas, a expressão da vontade dos cidadãos? Não está, a proposta do distritão, em claro antagonismo com princípios essenciais do regime democrático? Será necessário escancarar ainda mais os sinais de má fé legislativa? É sutil a diferença entre a constituinte de Maduro e a reforma política aprovada pela comissão. Ambas estabelecem regras que conduzem a resultados divergentes da vontade social.
 

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

14/08/2017

 

É verdade que a hegemonia esquerdista desgraçou-se naquela esquina do tempo em que a crise causada pela irresponsabilidade fiscal se encontrou com as revelações sobre a corrupção. Mas o projeto para a conquista da hegemonia era primoroso. Fazia parte dele o fatiamento da sociedade com a escolha de determinados grupos sociais contra os quais se lançaram todas as injúrias de modo a suscitar animosidade. Era a velha luta de classes adquirindo múltiplas formas num engenhoso caleidoscópio político.

Estão no foco dos antagonismos e execrações cultivadas ao longo das últimas três décadas:

• os conflitos "raciais" e a imediata identificação da população branca como devedora de uma conta acumulada em três séculos e vencida desde 1888;
• os conflitos de "gênero", em que as presunções de responsabilidade recaem sobre os heterossexuais do sexo masculino que, ademais, são presumivelmente machistas;
• os conflitos de classe social, onde os ressentimentos se concentram nos andares mais altos da classe média para cima, lá onde se situam os maiores ódios de Marilena Chauí;
• os conflitos retrô do mundo do trabalho, institucionalmente patrocinados, nos quais o setor público, supostamente abnegado e generoso, vê com maus olhos o setor produtivo da economia e o "diabólico" mercado.
• os conflitos geracionais, face aos quais, quem tiver mais de 40 anos, é um opressor, inconformado com a liberdade, autonomia, ideias e estilos de vida das gerações mais jovens, devendo ser rejeitado por todos que aí se enquadrem, inclusive pelos próprios filhos.

De início foi um estratagema petista. Com o tempo, consolidaram-se os conceitos e todos os partidos de esquerda passaram a adotá-lo. A imensa maioria dos demais participantes dos mecanismos de formação da opinião pública a ele aderiram: grandes meios de comunicação, mundo acadêmico, agentes do ambiente cultural, militantes em ambientes virtuais e, até mesmo, grupos religiosos. No andar da carroça foram nascendo centenas de movimentos, ditos sociais, cuja existência tem tudo a ver, e só tem a ver, com a organização desses antagonismos, cujo plantio ocorreu diante de nossos olhos.

Ao unir e estruturar uma infinidade de minorias para criar e gerir conflitos, a esquerda brasileira, pilotada pelo PT, definiu esse empreendimento como essência do famigerado "politicamente correto". Enquanto o cultivava, como estratégia diversionista, chegava ao poder e implementava aquilo que, desde logo, deveria ter sido compreendido como o conflito real, a ser enfrentado com total dedicação: a opressão do Estado contra todos, inclusive aqueles que a esquerda arregimentou para suas causas. De fato, o Estado brasileiro, de modo crescente, pratica contra a nação, sua vítima, os crimes de sequestro e extorsão. A cidadania nos põe, de modo irrecorrível, a mercê de um triplo garrote fiscal - federal, estadual e municipal - que não nos deixa alternativa.

Acabei de descrever o grande golpe através do qual o Estado, hegemonizado pela esquerda que se concentra nos seus quadros, subjugou e imobilizou a soberania popular. Um verdadeiro ippon no judô da política.

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

11/08/2017

 

 A moça tem um cortejo de seguidores e funciona, naquele grupo, como uma professora de História do Brasil que preferisse o Paleolítico. Ataca as Grandes Navegações, as usinas hidrelétricas, o capitalismo e o "brutal bloqueio" norte-americano a Cuba. Ela descobriu que os coxinhas tiraram a Dilma para "botar o Temer lá" porque ele é o chefe da quadrilha e a Dilma ia estourar o ponto. A cada frase dessas, a galera esgota o estoque daquelas figurinhas "emojis" com palmas, socos, braços musculosos, polegares erguidos, sorrisos e corações. Juro que vi até um burrinho, mas foi coisa de alguém que clicou errado.

 Na opinião dela, o Temer tem que sair. É um imperativo moral. Tão imperativo moral quanto a prisão de Sérgio Moro, a absolvição imediata de Lula em todos os processos, a execução de Eduardo Cunha, a volta de Dilma, a proscrição da Rede Globo e a capitalização da Carta Capital em joint venture com o BNDES. Posta diante da questão - "Tirar o Temer para pôr quem?" - ela estufa o democrático busto e pede eleições gerais.

Grande ideia! Para funcionar, há que: 1º) mudar a Constituição; 2º) alterar todos os prazos já definidos; 3º) redigir e aprovar as leis complementares necessárias para regrar o pleito; 4º) feito isso, esperar que o TSE redefina as muitas questões que lhe cabe normatizar a cada eleição; 5º) obter do governo a liberação dos tais R$ 3,6 bi ditos imprescindíveis ao financiamento público da campanha. Sobre o fulano que vai presidir a República durante esse tempo eu só sei que se não for "companheiro" a tal internauta estará na rua com um cartaz "Fora fulano".

Se o Congresso Nacional abraçar a solução proposta pelo elevado discernimento político da moça, é certo que a eleição fora de prazo vai acontecer realmente fora de prazo, lá por 2020. Fica a dica para Maduro, que está muito a fim de evitar uma eleição direta censitária.

Por falar nisso, ela é fã do Maduro. Encanta-se com aquele jeito de Mussolini de opereta e com o vocabulário "bolivariano" de 500 palavras. E está indignada (deve ter ouvido orientações de Gleisi Hoffmann) com as críticas que os coxinhas fazem ao camarada ditador da Venezuela sem terem ido lá para ver o que "realmente está acontecendo". No post seguinte, de modo coerente, recomendou ler o que se escreve lá fora sobre o Brasil.

Tentei explicar que a Câmara dos Deputados não julgou e menos ainda absolveu Michel Temer; esclareci que cabia àquela Casa apenas definir se convinha ou não ao país que o presidente viesse a ser julgado pelo STF naquele momento. E afirmei que novos fatos ou diferentes circunstâncias poderão, no futuro, recomendar decisão diferente. Foi a conta! Recebi um página inteira de emojis malcheirosos e fui bloqueado. Não consegui dizer que em 2005 e 2006, quando estourou o mensalão e a Orcrim se tornou conhecida, 33 pedidos de impeachment de Lula foram protocolados e arquivados na Câmara dos Deputados. Nenhum de parlamentar. Por quê? Os políticos sabiam que havendo eleição logo adiante, um processo de impeachment complicaria a cena eleitoral, administrativa e econômica. As responsabilidades criminais seriam tratadas na Ação Penal 470, no devido tempo e no foro adequado. O que de fato aconteceu. Quem quer o circo pegando fogo está noutro lugar e com a vida ganha.

 

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
 

Percival Puggina

08/08/2017

 

 Cláudio Humberto, em recente coluna no Diário do Poder, informou que os veículos oficiais federais custaram aos cofres públicos R$ 1,6 bilhão em 2016. O montante inclui viaturas de serviço e representação e envolve renovação da frota, manutenção e pagamento de impostos.

 Quem acha que deve pagar essa conta toda, especialmente a parcela que envolve os carros de representação, levante a mão. Tais viaturas são resíduos das carruagens do Paço Real no século XIX e das liteiras conduzidas por escravos nos séculos anteriores. Afinal, ninguém realmente importante está aí para sujar sapato na poeira das ruas, misturar-se à plebe ou rodar no próprio automóvel, como se fosse, digamos assim, uma pessoa ... normal, não é mesmo? De que valeria o poder sem aparatos e mordomias que o tornem objeto de cobiça? No século XXI, nós somos os cavalos da carruagem e os escravos da liteira.

 Essa mentalidade é parte do problema brasileiro. É como se o chefe de família, bêbado e jogador, cobrasse à mulher e aos filhos que cortassem as próprias despesas. Falta autoridade moral. Falta autoridade moral para justificar medidas efetivamente necessárias e realmente significativas ao quadro fiscal do país quando o Congresso Nacional negocia uma boca livre de R$ 3,5 bilhões para os gastos de campanha eleitoral no ano que vem. Ou quando o Senado da República renova o contrato de locação de veículos zero quilômetro para os senadores ao custo de R$ 8,3 milhões, por 30 meses. Fazem parte do contrato duas liteiras turbinadas, com motor de 250 CC, cujo peso é sustentado pelos nossos braços.
 As regalias do poder são evidências da distância que o separa do cotidiano em que se vira e contorce a nação. Basta listar alguns que a memória socorre: jatinhos da FAB, helicópteros, cartões corporativos, verbas de ostentação (eufemisticamente designadas como de "representação"), voos em 1ª classe, auxílios moradia e alimentação, adicionais (ah, os tão bem-vindos adicionais!) de vários tipos e motivos. E quanto mais distante dos olhos estiver a realidade social, maior sua distância do coração.

Enquanto isso acontece por aqui, em meio às nossas reconhecidas dificuldades, na Holanda parlamentares não têm direito a carro oficial e o prefeito vai de casa ao trabalho usando sua bicicleta. Na Suécia, nem o primeiro-ministro tem carro oficial; autoridades podem, no máximo, pedir reembolso para viagens oficiais ou se residirem a mais de 70 km de Estocolmo. Parlamentares suecos têm direito a reembolso do combustível. Na Noruega, há 20 carros para atender o governo e só o primeiro-ministro tem direito a veículo exclusivo. Em Londres, o prefeito anda de metrô ou bicicleta; ele e os vereadores recebem um vale-transporte anual para o metrô. Prefeito e vereadores da maior cidade da Europa têm compromisso de usar o transporte público. (Maiores detalhes a respeito estão disponíveis em www.nossasaopaulo.org.br/portal/node/47253)

O de que estamos falando aqui é sobre o "animus" do poder, ou seja, de sua alma, ou, ainda mais precisamente, dos sentimentos que a inspiram. Se e quando aquilo que move a alma do poder político for o indispensável espírito de serviço, estas ostentações e demasias são sumariamente rejeitadas, por aversão e coerência.

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

 

 

Percival Puggina

07/08/2017

 

  "Não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes". Paulo Freire

 A frase em epígrafe, repetida da mais singela salinha de professores ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), é um primor de incorreção pois nega existência à própria ignorância, transformada em cada vez mais comum forma de saber. No entanto, esta frase e tantas outras platitudes de Paulo Freire são a isca que atrai para seu objetivo central: a militância revolucionária através da educação. E aí se instalam minhas mais profundas divergências em relação ao produto do autor de "A pedagogia do oprimido".

Quem lê Paulo Freire rapidamente chega a uma conclusão: sob o ponto de vista literário, o patrono da educação brasileira é medíocre; sua escrita não tem originalidade; a forma é descuidada; o vocabulário é reduzido e, não raro, incorreto ou inadequado. Se o revolucionário quer fazer revolução, calce as botas de campanha e arme-se até os dentes, se esse é o objetivo, ou, se preferir a via institucional, limpe a garganta, agarre-se ao megafone, suba no palanque ou produza seus panfletos. Se o professor quer ensinar, pegue seu material didático e vá ministrar os conteúdos que domina. Mas não venha o pedagogo plantar revolução nas mentes infantis e juvenis. Isso pode ser objeto de lauréis distribuídos em quitandas acadêmicas ou nos mais altos níveis do mundo intelectual, pode granjear elevadíssimo reconhecimento entre camaradas, mas não é um bom serviço prestado às sucessivas gerações sobre as quais se exerce sua influência.

A ideia da pedagogia fazendo revolução e da revolução fazendo pedagogia foi amplamente transformada em experiência histórica. A ela foram submetidos centenas de milhões de jovens, em sucessivas gerações, na Ásia, no Leste Europeu e na África, durante boa parte do século passado. O produto foi, sempre, um enorme sacrifício da liberdade, da criatividade, da espiritualidade. Sacrifício, por vezes, cruento, daquilo que há de mais humano no ser humano, portanto.


Nota do autor: O texto acima é um pequeno extrato do capítulo que escrevi para o livro "Desconstruindo Paulo Freire", obra coletiva, coordenada pelo prof. Thomas Giulliano, composta por seis ensaios sobre o legado do patrono da educação brasileira (!), visto desde diferentes ângulos.

Enfrenta-se, no livro, a tutela que Paulo Freire, em pleno século XXI, continua exercendo sobre os cursos de formação de educadores, a despeito dos desastrosos resultados colhidos nas avaliações dos alunos e das eloquentes lições da história. A estes professores, principalmente, se dedica a obra.

 

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.


 

Percival Puggina

04/08/2017

 

 Como bem me apontou outro dia um amigo, o governo Temer é o menos ruim dos três que o petismo proporcionou ao Brasil. Convém, mesmo, reconhecer os fatos: Temer é produto de duas chapas eleitorais petistas e, no curto espaço que lhe coube, exibe resultados que não podem ser depreciados. Para recordar: emenda constitucional que estabeleceu limite aos gastos públicos; reforma trabalhista e fim da sinecura sindical; afastamento de milhares de militantes a serviço de causas partidárias nos órgãos de Estado, governo e administração; inflação abaixo do centro da meta; investimento de R$ 1 bilhão no sistema prisional; reforma do ensino médio; redução de cinco pontos percentuais na taxa de juros; extinção de oito ministérios; e se alguém chegar com um espelhinho no nariz de dona Economia perceberá que ela, lentamente, volta a respirar.

 Mas nem só por isso 2017 foi um ano melhor do que os precedentes. Aumentou muito o número de brasileiros conscientes de que não se pode brincar com o gasto público e de que é necessário tirar de campo, nas próximas eleições, bem identificados picaretas aproveitadores do erário. A Lava Jato preserva seu vigor, com reconhecimento nacional. Réu em seis processos, Lula colheu sua primeira condenação. Vem aí uma reforma da Previdência. Criou-se necessária rejeição social às regalias de certas categorias funcionais e aumentou a intolerância em relação aos corporativismos do setor público e privado. É o primeiro passo para que essas coisas mudem. Ampliou-se a consciência de que precisamos reformar nossas instituições. Ou seja, tornamo-nos mais esclarecidos sobre temas essenciais e isso, sob o ponto de vista político e administrativo, é promissor para o horizonte de 2019-2022.

Então, o novelo em que se enrolou Michel Temer não vai estragar meu ano. A propósito, a Câmara não o julgou e, menos ainda, o inocentou porque essas não eram atribuições suas. Aquele plenário tinha diante de si a tarefa constitucional de decidir sobre a conveniência de o STF processá-lo neste momento. E decidiu que, de momento, ele fica onde está. De momento. A fila anda e a Justiça o espera, mas o Brasil precisa de estabilidade e das reformas em negociação.

 A saída dele serviria ao PT, a seus coligados, a seus movimentos ditos sociais, a seus fazedores de cabeça na Educação, a seus sindicatos e respectivos “exércitos”. Ou seja, daria a alguns uma alegria que estragaria meu ano e meu humor. Se a maior parte dos detentores de mandato até aqui investigados, de todos os pelos, só amargará acertos nos próximos anos, que também Temer entre nessa lista. Por enquanto, que fique quieto na sua cadeirinha e tenha modos. Por enquanto.

 Observo, nas redes sociais, súbita atividade dos militantes de esquerda em defesa da ética na política. Essa mobilização não me convence nem comove. Aliás, faz lembrar o antagonismo entre os Manos e os Bala na Cara. É disputa pelo mercado do crime organizado. No ano que vem, fora todos eles!

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

Percival Puggina

01/08/2017

 

Não se trata de especulação nem de "teoria da conspiração", como afirmavam alguns sempre que mencionada a perigosa importância política do Foro de São Paulo (FSP). É a Odebrecht, em acordos judiciais firmados com os governos do EUA, Brasil e Suíça que confessa haver pago propina para garantir mais de uma centena de contratos em 12 países. Segundo o Departamento de Justiça dos EUA, o valor dos pagamentos admitidos pela empresa (US$ 788 milhões entre 2001 e 2016) configura "o maior caso de suborno internacional da história". Os pixulecos foram creditados a funcionários de governos, a representantes desses funcionários e a partidos políticos em Angola, Argentina, Brasil, Colômbia, República Dominicana, Equador, Guatemala, México, Moçambique, Panamá, Peru e Venezuela.

Vejamos, agora, que países são esses porque a lista fala por si mesma. Há nela dois africanos, estranhos, portanto, ao FSP. Contudo, seus governantes sempre estiveram na lista preferencial da diplomacia petista. Não por acaso, Angola é presidida desde 1979 pelo ditador multibilionário José Eduardo Santos, amigo de Lula; as delações de Mônica Moura e João Santana incluem o PT, a Odebrecht e entregam o serviço sobre a origem de recursos para a eleição angolana de 2014. Moçambique, por seu turno, desde a independência em 1975, vive sob a ditadura partidária da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo). Lula também andou por lá com a Odebrecht, como se verá mais adiante.

Os demais países são iberoamericanos. Durante o período coberto pelas confissões de culpa da Odebrecht, estiveram sob governos de partidos integrantes do FSP o Brasil, Argentina, Equador, Panamá, Peru, República Dominicana e Venezuela. Aparentemente, os esquemas de corrupção envolvendo aquela empresa no México e na Guatemala foram meramente comerciais, sem relação com interesses políticos de partidos ligados ao FSP.

O site do Instituto Lula disponibiliza um relatório sobre as palestras realizadas pelo ex-presidente. Ali se vê que, em maio de 2011, ele falou para convidados na Cidade do Panamá, contratado pela Telos Empreendimentos Culturais que, por sua vez, segundo constatado pela Polícia Federal, era contratada pela Odebrecht. Em junho de 2011, falou em Caracas e em Angola, contratado pela Odebrecht. Em agosto de 2011, pago pela OAS, falou em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. Em novembro de 2012 em Moçambique, levado pela Camargo Correa. Em novembro de 2013 foi à República Dominicana, pago pela Odebrecht. Em junho de 2013, foi ao Peru, contratado pela Odebrecht e, dois dias mais tarde, ao Equador, desta feita, patrocinado pela OAS. Em fevereiro de 2014 palestrou no Uruguai do companheiro Mujica, contratado pela OAS. Ainda em fevereiro de 2014 foi a Cuba, a serviço da Odebrecht. Em maio de 2014 voltou a Angola, para a Odebrecht.

Parece muito evidente, tanto nas delações da Odebrecht quanto nas da OAS, a convergência de interesses empresariais com interesses políticos. Estes últimos envolvem países sob governos do FSP ou campanhas eleitorais de interesse daquele coletivo partidário internacional.

Você lembra, leitor, da "Pátria Grande"? Pois é desse mega projeto político internacional que estamos falando. Abastecido com financiamentos brasileiros do BNDES, ele teve sua tesouraria esvaziada pelo impeachment e pelas investigações da Lava Jato. 

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.