(Publicado originalmente em www.pontocritico.com)
Que precisamos de uma reforma política, quase ninguém tem dúvidas. As reiteradas crises institucionais dão conta que o nosso atual sistema anda de mal a pior. Problemas de representatividade, campanhas caras, distorções geradas por “puxadores de votos”, o enfraquecimento dos partidos políticos, enfim, a lista de sintomas, que nos permitem concluir que o atual sistema possui muitas falhas, é grande.
COMEÇA MAL
O DISTRITÃO já começa mal, pois o próprio nome induz a uma associação ao sistema distrital. A unidade federativa toda é considerada um “único distrito” e a partir daí, elegem-se os mais votados, independentemente da proporção de votos obtida pela legenda partidária. Aparentemente, isso também não é de todo ruim, pois, afinal, nada mais lógico que os mais votados serem os eleitos.
DISCUSSÃO EM ALTA
Com essa discussão em alta, várias simulações têm sido realizadas a fim de se verificar quais seriam as composições das casas legislativas, caso o DISTRITÃO fosse o sistema vigente. Alguns estudos apontam queda abrupta nos índices de renovação. Outros, sugerem que poderia ser benéfico, pois atenuaria o efeito dos eleitos “puxados” por alguém “bom de voto”.
FALHA COMUM
Independentemente do estudo, todos eles partem de uma falha em comum: se o sistema em vigor fosse o DISTRITÃO, de nada adianta simular cenários de resultados. E a razão é simples: o DISTRITÃO traz consigo a necessidade de os partidos mudarem a estratégia de composição da nominata de candidatos. E nenhuma simulação, por melhor embasada que seja, consegue prever o resultado caso a relação de candidatos tivesse sido muito diferente.
INCENTIVO É CONTRÁRIO
No atual sistema, o proporcional de lista aberta, há um incentivo claro para que os partidos possam lançar o maior número possível de candidatos. Por menor que seja a densidade eleitoral de um determinado candidato, ainda assim ele colabora para que a legenda some votos e obtenha um maior quociente eleitoral. No DISTRITÃO, o incentivo é contrário: quanto menor a dispersão de votos, melhor para o partido e, sobretudo, para cada candidato. Se um partido acredita que tem potencial para obter 5 cadeiras, lançar 5, 6 ou 7 candidatos seria muito melhor para suas pretensões do que lançar 30 nomes. Sob o ponto de vista de cada candidato, melhor seria que ele fosse o único candidato da sua legenda. Enfim, o DISTRITÃO é um sistema que desestimula o surgimento de novos nomes nos partidos já estabelecidos. Os detentores de mandato seriam, naturalmente, candidatos naturais e a oferta de novos nomes passaria a ser uma opção de alto risco para qualquer legenda partidária.
CASUÍSMO
Ora, se o DISTRITÃO incentiva que partidos formem nominatas com poucos nomes, não resta dúvidas que estamos diante de uma reforma que tem por objetivo, única e exclusivamente, oferecer garantias para que os atuais detentores de mandato tenham um processo eleitoral com muito mais chances de êxito. Em um momento histórico, em que a sociedade clama por renovação e que muitos detentores de mandato precisam de foro privilegiado para se protegerem das grandes operações de investigação em curso (como a Lava-Jato), não há como não pressupor que tal proposta seja puro e simples casuísmo.
EFEITOS COLATERAIS DANOSOS
Além de ser claramente um obstáculo à renovação, o DISTRITÃO oferece, ainda, dois efeitos colaterais danosos:
• Enfraquece os partidos políticos: ao colocar o candidato como figura central da eleição, o DISTRITÃO estimula o personalismo e enfraquece os partidos políticos. Em sendo uma eleição majoritária, o “dono” do voto é o eleito e não mais o partido.
• Intensifica os problemas de falta de representatividade: no sistema proporcional, por mais que um determinador eleitor tenha votado em alguém que não se elegeu, ao menos ele ajudou a eleger a bancada do partido que recebeu o seu voto. Analogamente, se um candidato tenha recebido muito mais votos do que o necessário para se eleger, o seu excedente de votos auxiliou a trazer alguém identificado, presumidamente, com suas ideias. No DISTRITÃO, o voto de quem não elegeu ninguém ou que excedeu o mínimo necessário é simplesmente descartado.
ARGUMENTO FALACIOSO
Um ponto destacado pelos defensores do DISTRITÃO é a eliminação completa dos “puxadores” de votos, artifício largamente utilizado pelas legendas pequenas. Quem não lembra do Deputado Enéas Carneiro que com os seus 1,5 milhão de votos acabou levando para Brasília seu colega com menos de 400 votos? Este é, na verdade, apenas um dos diversos aspectos negativos do sistema proporcional de lista aberta. Porém, a última minirreforma eleitoral propôs um dispositivo atenuante, que já esteve vigente na eleição para vereadores de 2016: desde então, o candidato que não obtiver 10% do quociente eleitoral estará automaticamente eliminado da disputa. Logo, o argumento em questão é falacioso.
DISTRITAL NADA TEM A VER COM DISTRITÃO
Um país com dimensões continentais como o Brasil carece de um sistema que aproxime seus eleitos dos seus eleitores. Hoje, um deputado se esconde atrás dos seus “200 mil votos”, que ninguém sabe de onde vieram. Temos um sistema sujeito a atuação de grupos organizados de pressão, que elegem bancadas e que desprezam a ideia básica que deve estar por trás da representação: a geográfica. Precisamos de um sistema que faça com que cada cidadão saiba quem é o seu representante, mesmo que não tenha recebido o seu voto. Além do mais, necessitamos de um sistema que atenue a importância do poder econômico nas campanhas eleitorais. Esse sistema tem nome: é o DISTRITAL, que nada tem a ver com o DISTRITÃO!