Uma nota, assinada pela Secretaria de Segurança Pública e comandantes das três forças (CBMDF, PMDF e PCDF), afastou indícios de terrorismo na conduta do sargento CBMDF Fabrício Santos, o qual, durante um surto psicótico ou algo parecido, tomou a direção de um caminhão de sua corporação e disparou rumo ao Congresso Nacional, altas horas da noite, quando os senhores parlamentares dormiam nos braços de Morfeu.
No entanto, os comandantes das forças informaram que o sargento responderá pelos crimes de furto qualificado, desobediência, danos ao material da administração militar e tentativa de dano.
O Judiciário, por sua vez, lastreado na lista de crimes, converteu a prisão em flagrante em preventiva, sem recorrer a nenhuma das medidas cautelares diversas da privação de liberdade previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, como é, aliás, de costume nas audiências de custódia.
Não vejo como enquadrar a ação do sargento no artigo 155 do Código Penal, uma vez que, ao se apoderar do caminhão do Corpo de Bombeiros, ele não tinha a intenção de subtrair para si coisa alheia móvel. Acostumado a conduzir esse tipo de veículo durante 10 anos, Fabrício, durante o surto, tendo acesso às chaves, usou o caminhão para executar um gesto tresloucado.
A desobediência e o dano são apurados por meio de Termo Circunstanciado, caso em que, se estiver em pleno gozo de suas faculdades mentais, o autor do fato assina Termo de Compromisso de Comparecimento a Juízo e é liberado de imediato.
A análise das circunstâncias demonstra que o autor não estava em pleno gozo de suas faculdades mentais, deveria ter sido submetido a uma avaliação psiquiátrica e até internado por ordem judicial, ad cautelam, ou recolhido administrativamente pelo Corpo de Bombeiros Militar, com base no Código Penal Militar e Código de Processo Penal Militar, mas não ser trancafiado como um preso qualquer, quando, pela análise da situação, até um leigo perceberá que não é bem assim.
Por fim, lamenta-se que, na ânsia de aparecer, alguém teve a ideia de espalhar que se tratava de ato terrorista. Desmontada a versão, passaram a tratar o profissional como ladrão, numa prova de que uma grande parte da humanidade perdeu a compaixão e está muito longe de ser humana.
Miguel Lucena é Delegado de Polícia Civil do DF, jornalista e escritor.