(Publicado originalmente na Folha de Londrina)
"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."
(Rui Barbosa, 1914)
Se existe algo que foi distribuído amplamente em nosso país, é o sentimento de vergonha. Entre a elite que nos governa e escraviza, a vergonha tornou-se rara, quase inexistente. Todavia, entre a imensa maioria do povo – esse povo que não faz política, mas a sofre – a vergonha é ubíqua e soberana. Somos uma nação envergonhada. Somos a República da Vergonha. Face aos últimos acontecimentos em Brasília, gostaria de declarar aos meus sete leitores:
Eu tenho vergonha do Brasil.
Eu tenho vergonha dos políticos do Brasil.
Eu tenho vergonha do acordão para salvar os políticos do Brasil.
Eu tenho vergonha da Dilma.
Eu tenho vergonha do Temer.
Eu tenho vergonha da chapa Dilma-Temer.
Eu tenho vergonha da absolvição da chapa Dilma-Temer.
Eu tenho vergonha do Joesley.
Eu tenho vergonha da Odebrecht, da OAS, do BNDES, da Petrobras.
Eu tenho vergonha da Smartmatic. Eu tenho vergonha das urnas eletrônicas. Eu tenho vergonha da apuração eleitoral secreta. Eu tenho vergonha das "diretas já".
Eu tenho vergonha do Lula.
Eu tenho vergonha do FHC.
Eu tenho vergonha do Supremo – suprema vergonha.
Eu tenho vergonha do TSE – superior vergonha.
Eu tenho vergonha do Executivo, do Legislativo, do Judiciário.
Eu tenho vergonha do Gilmar Mendes. Do Barroso, do Marco Aurélio, do Tóffoli, do Lewandowski, do Fachin, do Janot. Eu tenho vergonha, sim senhor.
Eu tenho vergonha do Aécio, do Rocha Loures, do Zé Dirceu, do Moreira Franco, do Cunha, do Palocci, do Mantega, do Edinho.
Eu tenho vergonha do PT, do PSDB, do PMDB.
Eu tenho vergonha da Rede, do PSOL, do PC do B.
Eu tenho vergonha dos Filhos da CUT, dos caras da UNE, dos sem-terra, dos sem-teto, dos sem-vergonha.
Eu tenho vergonha do showzão obsceno no tribunal de Brasília, eu tenho vergonha do showzinho erótico na universidade de Maringá: vergonha é o que há.
Vergonha da esquerda mortadela, vergonha da direita moderna, a vergonha em grupo, a vergonha sozinha. Não é vergonha alheia, não: a vergonha é toda minha.
Vergonha do Jaburu, do Planalto, da Alvorada. Tenho vergonha, não tenho mais nada.
Vem ter vergonha também: a vergonha que eles não têm.