• Jayme Eduardo Machado
  • 16/04/2016
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A MALDIÇÃO DE BROSSARD


      Aquela cerca metálica que quebra a harmonia arquitetônica da Esplanada dos Ministérios é a óbvia demarcação de sentimentos divididos. Pois parece que com os olhos nela e ouvidos no alerta do ministro Marco Aurelio de que o Supremo Tribunal Federal é “... a última trincheira da cidadania” um porta-voz para os Direitos Humanos da ONU emitiu nota recomendando: “... respeitem o Poder Judiciário”.

     Verdade que a sessão extraordinária da quinta-feira passada não foi um bom exemplo de “dar-se o respeito “, condição para ser respeitado. Mas inobstante aventurar-se em latitudes e longitudes antes nunca navegadas, - passando a idéia de que se Cristovão Colombo seguisse as “interpretações geográficas” dos senhores ministros, jamais teria descoberto a América – chegou-se ao continente. Pois a despeito de duas cartas marcadas, a sequência acabou por garantir a rodada do fim de semana do jogo do “impeachment”.

      Pois ninguém como o ministro Paulo Brossard dos idos do impedimento de Collor soube tão bem discernir - como era do seu talento – os limites da atuação do STF em face das prerrogativas congressuais. Não porque tal processo tenha “natureza” política – e certamente tem. Mas – enfatizava – porque uma decisão política do legislador constituinte decidiu transferir ao Legislativo uma função tipicamente judiciária. Brossard antevia que sempre que nessa matéria o Supremo iniciasse qualquer apreciação - mesmo nos limites do devido processo legal - tal qual uma “maldição”, não teria mais como parar. Por isso não seria despropósito supor que muito provavelmente sairia vencido no plenário recentemente chamado a balizar o rito do “impeachment” de Dilma. Pois se não é da jurisprudência da casa, era da prudência do jurista contrapor que tal função, nessa excepcionalidade, foi transferida ao Poder Legislativo para a convivência harmônica dos poderes e a segurança jurídica da nação, pois não convém que o Supremo seja o último a errar.

Parecia ser essa a preocupação de quem se negava a avançar o sinal, preferindo um cauteloso “... não é conosco”, a um presunçoso “... deixa comigo”. Pois quem ultrapassá-lo poderá criar, no presente, problemas novos para velhas soluções já alcançadas no passado. E se o STF assumir tudo, incluída aí a gestão das incertezas regimentais, “interna corporis” das casas legislativas,como vem ocorrendo, sobrevirão mais e mais dúvidas, num indo e vindo infinito, até não conseguir mais dar mais conta do que a sociedade espera dele. Paulo Brossard já havia se dado conta disso há mais de 30 anos, muito antes de nossas apreensões e da recomendação da ONU. Eis porque faz muita falta no plenário do Supremo para lembrar da “maldição” quando os ministros parecem não saber que quem deve legislar mora ao lado.

* Ex-subprocurador-geral da República