Eduardo Vieira
Tenho um aluno para quem estou dando aulas há meses. Figurinha inteligentíssima, ótimo caráter, interessado e dedicado. Dentro do meu processo pedagógico já o estimulei a ler diversos livros sensacionais e agora ele vai entrar no mundo vitoriano de Sherlock Holmes, que é abertura para uma jornada mais complexa a tempos anteriores como ele encontrará nos Três Mosqueteiros e no Conde de Monte Cristo, que estão reservados para o seu futuro próximo.
No meio de conversas sobre aspectos fundamentais da existência humana eu gosto de usar videogames, como já mostrei aqui. Tem gente que torce o nariz e não sem alguma razão. Mas deixem-me contar esse episódio. Estamos comandando a Inglaterra no século XVIII, era georgiana. Em nossa universidade em Cambridge Sir Isaac Newton desenvolve pesquisas de temas relevantes para o Império. Meu aluno está curioso para ver se em 1727 o nobre cientista morrerá no jogo, como morreu no mundo real. Provavelmente nunca mais esquecerá em que época este gênio viveu nem da sua importância para o mundo.
Tínhamos que tentar conquistar as 13 colônias antes que elas se revoltassem e deixassem de ser um protetorado e buscassem a independência. Para isso conquistamos alguns territórios dos indígenas e tomamos Quebec dos franceses. Já em guerra com a França terminamos de eliminar a presença desagregadora desse inimigo no Novo Mundo. Adieu.
Piratas, todavia, seguiam infernizando nossas rotas de comércio. Construímos, então, poderosa frota de navios de linha de 4a classe para acabar com a raça daqueles abutres dos mares. E assim limpamos o Caribe de cada brigue, de cada chalupa, galeão e "fluyt" pirata, num trabalho movido a enxofre, carvão, salitre e muito barulho. Capturamos algumas naus de relevância e as colocamos a trabalho do Império, estabelecendo entrepostos comerciais na costa do Brasil, Costa do Marfim e chegando até Madagascar. Todos esses lugares tomam dimensões bem diferentes uma vez que seus interesses comerciais se encontram por lá. Memória!
Nossa economia ainda é algo frágil e temos que equacionar adequadamente os investimentos para manter tanto o crescimento econômico quanto o populacional, sustentando forças militares cada vez mais numerosas e caras. Consultas aos preços de tabaco, algodão e outras commodities são vitais para dirigir nossos investimentos nas "plantations" da Flórida e da Louisianna.
Além de todo o benefício de aprendizado geográfico, histórico, econômico e político de toda essa experiência, esta semana coloquei a cereja no bolo. Pedi-lhe que escrevesse uma história ficcional baseada em qualquer elemento experimentado durante nosso jogo. E eis que o jovem me avisa que sua história está ficando "maior que ele previa" e me mostra um documento de texto com várias páginas. E na maior alegria, porque escrever sobre o que nos empolga é bom demais.
Quando receber esse material poderei trabalhar com ele conceitos relativos à técnica de produção de histórias envolventes, à poesia e contemplação possíveis no relato de fatos, ao fator humano presente em qualquer situação, à transcendentalidade inerente ao universo, a técnicas de redação e composição, jogo de emoções, formação de personagem e muito mais. Para tanto beberei em várias fontes, como o excelente "O herói das Mil Faces", de Joseph Campbell.
Que as escolas não tenham isso é triste e lamentável. Mas não significa que o seu filho não possa ter. A agenda está aberta e deve-se começar esse trabalho ainda em janeiro. Trabalhar com amor é benção. Fazendo o bem é benção dobrada. Obrigado, Deus.