Silvio Munhoz
Chamou atenção recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em Recurso Extraordinário do Mato Grosso do Sul contra decisão de anulação pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) de flagrante de drogas, por violação de domicílio e, via de consequência, atribuição da pecha de ilícita à prova decorrente e derivada da apreensão dos ilícitos entorpecentes.
Quem acompanha o noticiário sabe o quanto o STJ, nos últimos tempos, atrapalha a atuação da polícia anulando flagrantes e mais flagrantes – de tráfico de entorpecentes, crime deletério que assombra a sociedade brasileira e, comandado por ORCRIMs, deixa um rastro de sangue por onde passa - sob as mais variadas desculpas, deixando a sociedade à mercê da bandidagem, pois, levadas ao pé da letra, praticamente impedem a atividade de polícia preventiva.
Quando li a decisão, lembrei de recente crônica escrita pelo Mestre Puggina: ”O STF formou Maioria”, expressão que causa arrepio e terror aos cidadãos brasileiros, no dias atuais. No caso presente, entretanto, como no velho ditado “até relógio quebrado acerta duas vezes por dia”, foi um acerto.
Qual a situação que ensejara a anulação do flagrante. A Polícia recebeu uma denúncia anônima acerca de “determinada pessoa” estar praticando tráfico de entorpecentes e foi verificar. Encontrou o “sujeito”, porém este, ao avistar a guarnição, empreende fuga e esconde-se no interior da residência ali próxima. A polícia entra na casa e lá apreende 109 tijolos de maconha pesando 89.400gramas.
A Constituição Federal, no inciso XI do artigo 5º, disse ser a casa o “asilo inviolável do indivíduo”, mas, estabeleceu exceções como a ocorrência de FLAGRANTE DELITO e, sabidamente, o tráfico é um delito permanente, ou seja, está sempre em situação de flagrância enquanto estiver ocorrendo. Acerca da matéria o STF já decidiu em caso de repercussão geral (tema 280 – deve ser seguido, obrigatoriamente) onde estabeleceu a possibilidade de violação de domicílio, mesmo à noite, “quando existam fundadas razões, justificadas a posteriore, demonstrando a ocorrência de uma situação de flagrância na casa”.
No caso, além de denúncia anônima, o avistar do sujeito e a fuga, o STJ queria para validar o flagrante que “ocorresse alguma diligência investigatória prévia”. Na realidade, ao exigir tal tipo de diligência, está buscando acabar com o flagrante em tal delito e deixando a sociedade, que deveria proteger (chamado um dia de Corte Cidadã), à mercê do tráfico.
O STF foi incisivo e deixou claro que estava ocorrendo verdadeiro “ativismo judicial”, pois interferindo indevidamente – ao estabelecer requisitos inexistentes para o flagrante (diligência investigatória prévia) – no executivo e em matéria de segurança pública, e disse que não é função institucional do Poder Judiciário “a atribuição de formular e implementar políticas públicas”.
Quanto ao flagrante por tráfico de entorpecentes, estabeleceu que a justa causa para sua fundamentação “não exige certeza da ocorrência do delito, mas, sim, fundadas razões a respeito”.
Acerto, com certeza, e alguém deve estar se perguntando, cadê a contradição? Como diz o velho ditado “pimenta nos olhos dos outros é refresco”, pois, há tempos, o STF profere inúmeras decisões com igual cunho ativista, por exemplo: está a um voto de descriminalizar o uso da maconha, questão afeta ao Congresso Nacional com lei em vigor; ou a ADPF 635, que proibiu a polícia carioca de subir o morro para combater o tráfico, política de segurança de responsabilidade do Executivo estadual, dentre tantas outras.
Deveria o relator, da decisão, enquadrar e colocar em lugar bem visível, para ser lida todos os dias pelos Ministros, a frase que citou em seu voto:
“Inovação excessiva e aventuras judiciais devem ser evitadas. Sem negar o valor ou a legitimidade do desenvolvimento judicial do direito, levado a extremos, tal criatividade judicial pode ela mesma destruir o estado de direito.” Gary Slapper, David Kelly.
Que Deus tenha piedade de nós!..