• Prof. Francisco Ferraz
  • 19/07/2017
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A CONDENAÇÃO DE LULA I E II


 Nada de surpreendente na condenação de Lula.

 As primeiras reações indicam que se tratava de um fato esperado.

 O juiz Sérgio Moro fez questão de proceder como é habitual em decisões judiciais: tornou público os termos da decisão e desapareceu do cenário. Lula, diz-se, que reagiu com serenidade. A mídia repercutiu sem sensacionalismo. Líderes do PT se pronunciaram reiterando as explicações que vinham oferecendo: que foi uma decisão parcial do juiz Sérgio Moro, que condenou Lula sem provas e, que deverá ser reformada pelo Tribunal da 4ª. Região.

 Reações moderadas, repercussão previsível, explicações conhecidas.

 Ao que tudo indica, a pauta política deve voltar a se ocupar das dificuldades do governo Temer, das votações sobre admissibilidade para processar o presidente e sobre a Previdência Social.

 Não creio,entretanto, que este estado de espírito de moderação e de expectativa para o próximo “round” da batalha judicial no Tribunal, vá se manter. Tudo leva a crer que todas as partes envolvidas: Lula, PT, CUT e a esquerda em geral esperavam e contavam com este desfecho para desencadear a próxima fase: a campanha presidencial de 2018.

Se a decisão judicial de condenação em primeira instância era uma decisão contra um ex-presidente, a decisão judicial de segunda instância (Tribunal) deverá ser tomada em relação a um possível próximo presidente.

 

A CONDENAÇÃO DE LULA II
Francisco Ferraz

Um dia após a divulgação da sentença que condenou Lula os fatos confirmaram a análise de ontem (A condenação de Lula). A reação do PT e de Lula corresponderam ao que fora previsto naquele texto:
“Lula, PT, CUT e a esquerda em geral esperavam e contavam com este desfecho para desencadear a próxima fase: a campanha presidencial de 2018”.

Também a estratégia de campanha, implícita no seu discurso, ao menos para sua fase inicial foi claramente definida:

O inimigo
(1) A condenação foi política;

(2) O juiz Sérgio Moro condenou para inabilitar legalmente Lula na eleição de 2018;

(3) A Globo é a principal coadjuvante deste ‘golpe’;

(4) ‘República de Curitiba’:Procuradores e Polícia Federal;

(5) Léo Pinheiro;

(6) Os “senhores da Casa Grande”

A estratégia

(1) Anunciar candidatura e desencadear a campanha presidencial;

(2) Foco da candidatura: Perseguição política para anular o poder de quem luta pelos direitos da “Senzala”;

(3) Globo + Sergio Moro + República Curitiba + Leo Pinheiro mataram dona Mariza;

(4) Aproveitar momento em que não há ainda candidato contra ele com prestígio e potencial equivalente para crescer;

(5) Politizar totalmente a próxima fase deste processo e dos demais para buscar deslegitima-lo juridicamente;

(6) Buscar junto ao povo (Senzala) este apoio e respaldo;

(7) Antecipar-se ao julgamento do Tribunal ao ameaça-lo com a denúncia de uma decisão politica, em caso de sua condenação;

(8) Anunciar a condicionante da legitimidade da próxima eleição, a palavra de ordem: “Eleição sem Lula é fraude”


Possíveis efeitos não intencionados dessa estratégia

(1) A precipitação da candidatura Lula vai estimular uma outra que se oponha à dele e que com ela polarize;

(2) Sua defesa da ocupação da mesa do Senado e das ‘heróicas senadoras’(fato mais recente) mostra Lula continuando a falar para dentro do PT, caminho seguro para o fracasso, já testado várias vezes,inclusive com Dilma;

(3) Também a reiteração de sua estratégia “nós x eles” agora “Casa Grande x Senzala” também não corresponde a um Brasil com uma classe média grande e crescente que já mostrou não aceitar este enfoque;

(4) Analogamente, não se constatou que a vitimização da morte de Dona Mariza tivesse produzido o efeito que ele esperava. Seu depoimento ao juiz Sérgio Moro, ao desviar responsabilidades para ela nas respostas às perguntas que poderiam comprometê-lo, anulava boa parte do que talvez conseguira de simpatia com a vitimização da esposa;

(5) Por fim a estratégia de ameaçar juízes, já tentada de forma infrutífera com Sérgio Moro, reiterada agora com os desembargadores do Tribunal Federal da 4ª. Região, também não deverá surtir os efeitos que ele desejaria. Lula ainda não entendeu o Poder Judiciário.Nem seus órgãos de cúpula nem seus juízes singulares. Salvo casos bem individualizados e desqualificados pela instituição, são pessoas que prezam muitíssimo sua independência e a qualidade do seu trabalho, que é sempre um trabalho intelectual.
Pressionado por ameaças ou as ignoram ou despertam nele o sentimento da preservação da sua independência.

(6) Sua provocação ao juiz Sérgio Moro, desafiando-o a vir disputar com ele a eleição, não chega a ser uma pilhéria nem tampouco uma declaração séria. É uma piada que só os militantes do PT acham graça.
Ela revela o quanto a personalidade do juiz o perturba.

Identificados os inimigos que Lula vai usar para iniciar sua campanha de 2018; desvelada a estratégia política que ele deverá adotar; e analisados os possíveis efeitos não intencionados de suas escolhas estratégicas, alguns dos elementos analíticos básicos da situação, envolvendo Lula e o judiciário, talvez possam ajudar para acompanhar o processo político que poderá desencadear a campanha presidencial a partir de agora.
 

*Professor de Ciência Política, ex-reitor da UFRGS, pós-graduado pela Universidade de Princeton, é criador e diretor do site Política para Políticos