• Luiz Carlos Da Cunha
  • 23/03/2017
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1917 – DA ILUSÃO LIBERTÁRIA AO TERROR SANGUINÁRIO


A Rússia se esfacelava na guerra contra a Alemanha. O caos imperava nas cidades. A fome e o desespero campeavam promovendo revoltas em cada esquina de Moscou a São Petsburgo. O Czar abdica. A Duma- parlamento russo - escolhe para primeiro ministro do Governo Provisório, o jovem advogado Alexander Kerensky, de trinta e seis anos. Ele decide como prioridade, realizar a eleição direta e democrática para instituir um governo de base legal. Foi a inédita expectativa democrática da história russa.

Venceram os sociais democratas com 46% dos votos; os bolchevistas obtiveram 20%. Mas não se conformaram. Imbuídos da teoria da “luta de classes”, miram o poder a qualquer preço. Arregimentam camponeses famintos, evadidos da terra, desertores do front, marinheiros escorraçados pela férrea disciplina da marinha imperial, e tantos aventureiros em busca de proveito imediato. Kerenski tencionava inaugurar uma legalidade democrática. Se tivesse êxito, o mundo teria sido bem melhor. O golpe bolchevique que Lênin havia preparado venceu.

A notícia de um governo de operários e camponeses assombrou o mundo, incendiando o imaginário do idealismo juvenil, e alarmando a sociedade e nações assentes no princípio da propriedade privada e da estabilidade jurídica consolidada em 250 anos. O golpe ousado, que se apelidou Revolução de Outubro, perdurou por setenta anos, oprimindo seu povo e propagando pelo mundo ódio, paixão e muita mortandade. Durou até que os fundamentos econômicos e a ditadura, sobre a qual se fundara a URSS, foram mostrando as fissuras progressivas da sociedade estatizada. Esboroando-se até o colapso em julho de 1991.

Dos escombros se escancarava a crueza dos crimes, a falácia da história oficial, a face da elite corrupta e brutal, a perseguição à inteligência independente, o anti- semitismo, os processos secretos, o império do terror. Era o mundo da mentira. O Nobel de literatura Boris Pasternak foi obrigado a renunciar ao prêmio; o físico Sakharov, condenado ao isolamento. Cientistas humilhados pelo “comissário político” se refugiaram no ocidente. O estado policial e criminoso da URSS submergiu. Mas o sonho democrático de Kerensky permanece ainda distante, cem anos depois.


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