Augusto Nunes

12/06/2011
OREMOS Augusto Nunes O núcleo duro do governo Dilma Rousseff agora é formado pela própria presidente, por Gleisi Hoffmann, chefe da Casa Civil, e por Ideli Salvatti, ministra das Relações Institucionais. Juntaram-se o neurônio solitário, a normalista oradora da turma e um berreiro à procura de uma ideia. Todas dependentes de Lula, também dependem dos humores do PT e do PMDB. É como entregar o comando de um Boeing a três comissárias de bordo, orientadas por um controlador de voo que se promoveu a melhor piloto do mundo sem saber onde fica o manche e atarantadas com o bando de passageiros que não param de berrar pedidos. Oremos.

Percival Puggina

08/06/2011
Twitter: @percivalpuggina Aprendi de criança que não se deve levantar falso testemunho ou acusar sem prova, e que a honra alheia deve ser respeitada até incontestável evidência em contrário. É uma regra que sempre sigo, independente de qualquer alinhamento político, seja com parceiros, seja com adversários. Trata-se de incontornável convicção moral. Não agiria de modo diferente em relação ao ex-ministro Palocci no caso de seu súbito enriquecimento. No entanto, quando o ministro se demite porque não quer ou não pode esclarecer a excepcional atividade de sua empresa de consultoria, subitamente transformada numa administradora de imóveis, resulta impossível não extrair dos fatos algumas inevitáveis conclusões. A primeira diz respeito a haver ele preferido trocar o cargo de ministro por um lugar no epicentro de nebuloso conjunto de suspeições. A diferença entre sigilo profissional ou segredo político é tão sutil que político algum deveria expor-se a uma situação dessas. E nenhuma empresa séria deveria correr o risco de integrar a lista de clientes de tal personagem em qualquer das hipóteses, seja como serviço profissional, seja como serviço político. Não é absolutamente abusivo, sob o ponto de vista moral, tratando-se de um deputado, de um ex-ministro da Fazenda e de um homem público que até anteontem ocupava a mais importante pasta do governo da União, supor que a silenciosa demissão de Palocci seja uma discretíssima queima de arquivo. Surge, então, a segunda questão. A demissão de Palocci deixou no ar um cheiro de papel queimado. E sequer esse odor suscitou no Procurador-Geral da República aquilo que ele chama de ?indício idôneo? a justificar uma investigação que, além do desfibrado Congresso Nacional, só ele poderia autorizar. Convenhamos, nem mesmo o PT quis abraçar a bronca que o dr. Roberto Gurgel, do alto de seu elevadíssimo cargo, matou no osso do peito. E vem daí a terceira questão. A Constituição Federal criou certas encrencas sem solução razoável. Uma delas é a de que cabe à Presidência da República a atribuição de nomear o membro do MP que tem a prerrogativa exclusiva de investigar e denunciar as mais altas autoridades do governo. Entre elas o próprio presidente. Não se trata de servir a dois senhores, é claro. Mas por que ? oh raios ? eu não consigo pensar em analogia melhor? A encrenca acima descrita trava o curso da Justiça, também, numa outra direção. Em casos de corrupção (e eu não estou afirmando que seja esse o caso em tela) os arquivamentos dos processos de investigação criam outro grupo de protegidos. Refiro-me aos agentes ativos do processo de corrupção. A proteção, ou a tolerância, ou o desinteresse em investigar protege, simetricamente, as empresas que possam estar no outro polo de uma relação suspeita. A situação faz lembrar algo recorrente em nosso país. Muitas vezes, os corruptos se tornam conhecidos e enfrentam ? impunes, é verdade ? a rejeição social. Mas os corruptores, parte ativa na relação, são protegidos num verdadeiro sacrário onde ninguém entra. Por quê? Porque ninguém é bobo de matar a galinha dos ovos de ouro, ora essa. ____________ * Arquiteto e escritor, titular do blog www.puggina.org e autor de ?Crônicas contra o totalitarismo?, ?Cuba, a tragédia da utopia? e ?Pombas e Gaviões?.

Percival Puggina

05/06/2011
twitter: @percivalpuggina Li, recentemente, artigo criticando os que se aventuram a opinar sobre Educação sem o preparo acadêmico específico. Educação, a exemplo de outras ciências, segundo aquele texto, somente poderia ser abordada, com propriedade, por profissionais da área. Traduzindo: cada macaco no seu galho. Como também eu, cá no meu canto do arvoredo, tenho dado pitacos, posso explicar perfeitamente o que leva tantos primatas a se imiscuírem nessa sofisticadíssima pauta: estamos todos apavorados com o que vemos acontecer na educação nacional. Não é que as coisas vão mal. Não, as coisas vão de mal a pior, numa decadência acelerada que acende sinais de alerta em todas as direções quando se pensa na sustentabilidade do nosso desenvolvimento através da maior riqueza de qualquer nação ? o povo que a constitui. Se estivéssemos em guerra, gente de todas as áreas de conhecimento estaria escrevendo a respeito. E o fato inegável é que os generais da Educação conduziram o Brasil para a vitória de uma pedagogia que derrota a nação. O que era perfeitamente previsível quando comecei a escrever sobre isso há quase trinta anos passou a ser constatado e medido. Os indicadores da educação nacional nos arrastam para constrangedoras companhias no ranking mundial. E só os profissionais da área, os mestres dos educadores em primeiríssimo plano, continuam acreditando nas teorias que deram causa ao desastre em curso. São professores que se veem como trabalhadores em educação, fazedores de cabeça, intelectuais orgânicos com a tarefa essencial de promover a ?formação para a cidadania?. Seguem teses segundo as quais não existe saber maior nem menor, mas tão somente saberes diferentes, de tal forma que alunos e professores bebem-se uns aos outros na fonte equivalente dos respectivos conteúdos! Contrastando com esses e em meio a imensas dificuldades, alguns professores ainda preparam seus alunos ? sem distinção de classe ? para as competências que lhes abrirão oportunidades ao longo da vida. Sabem que Lula é um case. Jamais um modelo. O manuseio da educação para fins políticos e ideológicos passou a ocupar o centro da reflexão acadêmica. Alunos dos cursos de formação para o magistério contam-me que é difícil encontrar, para seus estudos, literatura não marxista. Não sugiro, aqui, que ela não circule. Trato, diferentemente, de apontar o produto visível das ideias dominantes. Eis por que, leitor, não passa ano sem que seja inutilmente denunciada a manipulação ideológica dos livros didáticos. Eis por que o MEC aprovou um livro de história com elogios ao governo Lula e críticas ao governo FHC (imagine-se o resto da história). Eis por que as provas do ENEM contêm perguntas com a mesma orientação. Eis por que o tal kit-gay foi contratado pelo MEC junto a uma ONG de homossexuais para distribuição nas escolas e só foi barrado (se é que de fato foi) porque virou moeda troca no kit-blindagem do ministro Palocci. Vergonha? Vergonha é para quem tem. Escrevo sobre inevitáveis relações de causa e efeito. Escrevia quando era previsível e agora escrevo sobre o constatado. A Educação no Brasil, com a malícia de alguns e a dócil ingenuidade de quase todos, deu uma banana para as expectativas sociais, para as necessidades nacionais, para o direito dos jovens e das famílias, para o futuro da pátria, e passou a fazer o que seus donos desejam. O livro do MEC que denuncia a Gramática como instrumento de dominação cultural tem tudo a ver com isso. ZERO HORA, 05 de junho de 2011

Autor desconhecido

29/05/2011
PARA DESVENDAR OS MISTÉRIOS DE PALOCCI (CONTANTO QUE AS AUTORIDADES QUEIRAM) Autor desconhecido Recebi este texto por email. O autor não está identificado, mas a sugestão é totalmente válida. O fato de até agora tudo permanecer oculto da opinião pública, como se fosse algo misterioso e insondável, mostra a extensão da operação abafa. Os mistérios de Palocci Tenho uma pequena firma que me sustentou 22 anos. Ao longo deste tempo, aprendi alguma coisa referente a legislação fiscal e tributária, conhecimento este que repasso aos colegas, pois talvez sirva para ajudar a abrir a caixa preta do Dr. Palocci.(Ação civil pública ? - Ministério Público Federal) 1 - Nenhuma firma existe sem o respectivo CNPJ. (Equivalente ao CPF da pessoa física). 2 - Se é uma firma de consultoria, tem que ter registro na prefeitura, para recolhimento do ISS. Não há como fugir disto. 3 - Se o Dr. Palloci faturou horrores, ele tem que ter emitido NF, pois de outra forma é muito pior.Incorreu em crime federal, trabalhando sem NF. 4 - A soma das NF extraidas em 1 mês, resultam no faturamento mensal, que servirá de base para o cálculo do PIS e COFINs. 5 - A Prefeitura tem a cópia da totalidade das NF extraidas. 6 - O pagamento do IR atualmente é em avanço, com base nas NF extraidas no mês. 7 - Portanto, qualquer Auditor Fiscal da Receita Federal tem autoridade para se dirigir a firma do Dr. palloci e lavrar um auto, comunicando que a firma será auditada a partir do dia X, devendo estar a disposição os livros fiscais x,y,z, etc. 8 - Pronto ! em 72 horas tornar-se-a clara a situação da firma do Dr. Palloci. (Quel é mesmo o nome da firma ?) Vamos saber quais são os clientes, (NF) o serviço prestado, (NF) o valor cobrado. 9 - Se a firma do Dr Palloci não for uma firma individual, ele tem que ter pelo menos 2 sócios. 10 - Estes sócios declaram IR de pessoa física. Com o faturamento cavalar do Dr. Palloci, vale a pena consultar as declarações de renda das PF´s, socios do Dr. Palloci. 11 - As informações das PF´s e da PJ tem que ser coerentes, ou então, todos estão incorrendo em sonegação. (Crime fiscal). 12 - A compra da sala, é considerada como variação patrimonial positiva e tem que recolher imposto, ou entao estará configurada mais uma sonegação. 13 - Se um engenheiro caipira do interior sabe destas coisas, claro que os cérebros iluminados de Brasilia sabem muito mais. Só não apuram porque não querem. 14 - Desculpe, mas que saudade dos militares!

Percival Puggina

21/05/2011
twitter: @percivalpuggina Não precisa ser ministro do Supremo para saber que toda proposição legislativa com apoio popular, maioria parlamentar e concordância do governo vai a votação e é aprovada. Viés oposto, se uma proposição, mesmo com apoio do governo, leva anos tramitando e não chega ao plenário (como as que tratam de união homossexual) é porque não tem apoio popular nem parlamentar. Nesses casos, o próprio autor evita a votação porque percebe que vai perder. Melhor do que ninguém ele sabe que a Casa já decidiu. E decidiu contra. Portanto, quebra o nariz contra o óbvio quem repreende o Congresso por não haver votado matéria reconhecendo as uniões homossexuais estáveis como constituintes de entidade familiar. Sabe por que, leitor? Porque nesse caso, além do óbvio dito acima, o Congresso já deliberou três vezes! E em todas reconheceu como entidade familiar somente: 1) a união estável entre o homem e a mulher (Constituição de 1988); 2) a união estável de um homem e uma mulher (Lei Nº 9.278 de 1996); e 3) a união estável entre o homem e a mulher (Novo Código Civil de 2002). E ainda há ainda quem ouse afirmar, com face lenhosa, que o Congresso se omitiu. Por outro lado, os ministro do STF sabiam! Sabiam que essa mesma questão surgiu durante o longo processo constituinte dos anos 1987 e 1988. Sabiam que a versão inicial do art. 226 só falava em união estável. Sabiam que a redação assim posta deixava margem à dúvida. Sabiam que essa dúvida gerou debate nacional e foi pauta, inclusive, do programa Fantástico. E sabiam que o texto do § 3º do art. 226 foi redigido por emenda do deputado Roberto Augusto, exatamente para dirimir a ambiguidade e esclarecer que a norma se referia à união entre o homem e a mulher. Aliás, ao justificar a emenda do colega constituinte no dia em que foi a votação, o deputado Gastone Righi disse que a proposta visava a evitar qualquer malévola interpretação do texto constitucional, eis que, em sua ausência, poder-se-ia estar entendendo que a união poderia ser feita, inclusive, entre pessoas do mesmo sexo. O plenário do Supremo sabia tudo isso porque o ministro Ricardo Lewandowski, ao votar, se encarregou de o rememorar. Mas a malévola interpretação que os constituintes quiseram evitar acabou urdida no dia 5 de maio, a vinte mãos, pelo STF. Apesar de tudo. Aquilo foi o AI-5 do STF! Ele não apenas legislou, mas legislou contra a vontade explícita do Congresso Nacional. Fez hermenêutica pelo avesso da norma. Doravante, até que se restabeleça o Estado Democrático de Direito, só é constitucional aquilo que a Corte desejar que goteje dos princípios da Carta de 1988. O Poder Legislativo foi sorvido pelo Supremo, onde onze pessoas extraem tudo que querem de meia dúzia de artigos da Constituição. O resto é letra morta, palavra ao vento, sem valor normativo. Deixaram os ministros de ser guardiões para se converterem em donos da Lei Maior. Assim como Geisel concebeu a democracia relativa (relativa à sua vontade), o STF inventou a relativização da Constituição (relativizada ao desejo de seus ministros). Foi escancarada a porta para o totalitarismo jurídico. Passou o bezerrinho. Atrás vem a boiada. Doravante, se um projeto de lei não tiver guarida no Congresso, recorra-se ao Supremo. Sempre haverá um princípio constitucional para ser espremido no pau-de-arara das vontades presentes. Zero Hora, 22/05/2011

Percival Puggina

20/05/2011
twitter: @percivalpuggina Quando me deparei com a notícia de que novos livros didáticos aprovados pelo MEC e pagos com dinheiro do contribuinte eram claramente alinhados com o petismo no poder eu não me surpreendi. Livro didático aprovado pelo MEC é prêmio literário para intelectual orgânico, ora essa. Quem conhece o petismo sabe que ele não perde chance de fazer proselitismo. A mesma destapada malandragem se derrama pelos concursos públicos, pelas provas do ENEM e onde quer que surja uma brecha para a semeadura ideológica. Sabe aquele inço que nasce e se infiltra até numa trinca do piso? Pois é. Não há cargo em disputa, nomeação possível, cadeira ou cátedra vazia, título honorário, medalha, redação de jornalismo, microfone livre, espaço cultural, passeata ou procissão onde o PT não se apresente. O PT não deixa livre nem cadeira de engraxate. Faça o teste. Quando estiver frente a um auditório lotado diga assim: Quem quer ser.... Não precisará terminar a frase. Todos os que levantarem a mão são petistas. Estão sempre prontos para ser. Seja lá o que for. Quando conseguem ser, criam um aparelho e ficam sendo. Vá ao estádio do Beira-Rio em Porto Alegre. No meio da torcida colorada, faça chuva ou faça sol, frio ou calor, haverá uma enorme faixa com a estampa do Che Guevara - aquele vampiro argentino que se dizia com sede de sangue. O que faz ali a faixa? Por que se dão ao trabalho de carregá-la e desfraldá-la num campo de futebol, ano após ano? Proselitismo. Nada escapa do aparelhamento. Estão nas Igrejas, nos sindicatos, nas universidades, nas escolas, nos cursos de preparação para o vestibular, nos cursos organizados para ingresso nas carreiras jurídicas (notadamente naqueles criados pelos órgãos de classe da magistratura e do ministério público), estão nas carreiras de Estado, nos conselhos profissionais, nas Forças Armadas, nos seminários, nos grandes jornais e nos boletins paroquiais, nos folhetos das missas e - claro, por que não? - nos livros didáticos do MEC petista. Então, essas coisas não me surpreendem. Plantou colheu. Elegeu o PT, vai ter isso aí. Tudo aparelhado. Tudo a serviço da causa. O que me surpreendeu foi o retorno a uma fase anterior ao petismo no poder. Aquela segundo a qual o bom é ruim e o péssimo é ótimo. Lembrei-me daquele período e de que já havia escrito algo a respeito. Fui atrás e encontrei o texto. Ele foi publicado em 8 de dezembro de 1997 no Correio do Povo, numa época em que o petismo, chegando ao poder, começava a usar gravata. Lá pelas tantas, eu escrevi assim, referindo-me ao que se observara no esquerdismo dos anos anteriores: Chegou a ser moda não pentear os cabelos, tomar o menor número possível de banhos, andar mal vestido, falar com incorreção, tratar-se com curandeiros. Quem adotasse conduta oposta e ainda por cima lesse artigos de jornal e bons livros, acabava malvisto pelos companheiros. Havia políticos que eram incorrigíveis nos seus erros gramaticais cuidadosamente cultivados porque lhes proporcionavam singular identificação com as bases. Conheci alguns cujas esposas eram sempre apresentadas como companheiras porque tal palavra expressava uma relação mais popular e portanto mais adequada do que a outra. Ter uma boa formação acadêmica atrapalhava mais do que ajudava quando o assunto envolvia imagem e popularidade. Conheci pessoas que quando precisavam ir a uma vila trocavam de carro, de roupa e de sapato. O tal livro do MEC que valoriza os erros de linguagem sinaliza, na esteira do lulismo, um retorno àqueles velhos tempos. Falar bem é ruim. Falar mal é bom. Nivele-se tudo por baixo! Na atividade rural, ser produtivo é ruim; ser improdutivo é bom. Os ministros petistas do STF que acusaram a família tradicional de ser uma família voltada para o patrimônio, ao passo que a família gay seria voltada para o amor andaram na mesma direção: família tradicional é ruim; família gay é bom. Na mesma linha, Venezuela é bom; Chile é ruim. Cuba é bom; Estados Unidos é ruim. Também na linguagem, o petismo quer endeusar Lula. O cara sacralizou a linguagem inculta, certo? Logo, precisamos fazer com que as escolas não corrijam quem fala como o chefe, até porque há quem se disponha a pagar R$ 200 mil (!) pelo privilégio de vê-lo atropelar o idioma... Por fim, a produção verbal de Lula, consolidador da derradeira flor do Lácio, ainda mais inculta, mas sempre bela, o habilita ao fardão da Academia Brasileira de Letras. Alô, alô, Machado de Assis, os companheiros estão querendo Lula lá! ______________ * Percival Puggina (66) é titular do blog www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

15/05/2011
twitter: @percivalpuggina Todo mundo sabe: o mercado de trabalho no Brasil é ponto de convergência de uma infinita e sempre crescente normatização. Há material para todos os gostos. Vai do saudável ao demagógico. Do feito para complicar ao absolutamente incompreensível. Quando se acrescenta a isso, por um lado, o pequeno valor atribuído por tantos magistrados ao que está escrito na lei e, por outro, o infinito amor de tantos juízes ao que eles monocraticamente acham da vida, tem-se um quadro caótico, dentro de cuja moldura pode aparecer qualquer coisa. Até justiça. Não, não estou exagerando. Isso é tão verdadeiro que o Tribunal Superior do Trabalho resolveu parar durante toda esta semana numa tentativa de sair do enrosco e acabar com a consequência mais visível de tal situação: sentenças contraditórias sobre causas idênticas, que comprometem a credibilidade da justiça trabalhista e causam indignação às partes. Note-se que essa realidade nada tem de recente nem é exclusividade da justiça do trabalho. Vou relatar fato ocorrido numa vara de Porto Alegre, segundo ouvi há quase quarenta anos de um amigo procurador do Estado. Um advogado comparece para audiência, expõe sua tese e perde. Dias mais tarde, volta à mesma vara defendendo a tese oposta e tranquiliza o cliente: Essa está no papo. Conheço a posição do juiz. Cheio de confiança, entra para a sala de audiências e... perde novamente. Enquanto junta seus papéis e os enfia, furioso, dentro da pasta, o advogado resmunga entre dentes: Sinto-me nesta vara como o flautim do czar. O magistrado pede que ele esclareça o que quer dizer. Ele recusa. O juiz insiste. E o advogado, constrangido, acaba contando a história do flautim do czar. Aqui vai ela. Os mongóis estavam invadindo a Rússia. Numa determinada batalha, em que os russos levavam a pior, a banda, sentindo a derrota, executou com impressionante vigor o hino do czar (embora à época das invasões mongóis ainda não houvessem czares nos principados russos, a história vai como foi contada). Essa arremetida cívico-musical empurrou os combatentes para a reação e para uma inesperada vitória. O czar, sabendo do fato, mandou presentear os integrantes da banda com tantas moedas de ouro quantas coubessem no seu instrumento de trabalho. O sujeito da tuba ficou rico e o do flautim não recebeu uma moedinha sequer. Meses mais tarde, em nova batalha, repete-se a situação, mas foi a banda mongol que levou vantagem. Desta feita, encolerizado com a derrota, o czar determinou que cada membro da banda fosse punido com a introdução do respectivo instrumento de trabalho no - digamos assim - trecho final de seu tubo digestivo. E a pena só pode ser cumprida no infeliz do flautim. É lamentável e é preocupante, mas essa anedota reflete a realidade comum no judiciário brasileiro, com a sua excessiva politização, com o pouco respeito à lei escrita, com o uso indevido e o abuso interpretativo dos princípios constitucionais segundo a ideologia de cada um (prática que acaba de ser solenizada pelo próprio STF). O nome do monstrengo gerado é este: insegurança jurídica. Como natural consequência dela, o cidadão, antes de agir, em vez de ler a lei, ou de ouvir um advogado, deve consultar o juiz. ______________ * Percival Puggina (66) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

14/05/2011
twitter: @percivalpuggina Acumularam-se na mídia internacional, ao longo desta semana, análises segundo as quais, na execução de Bin Laden, os Estados Unidos atuaram de modo totalmente irregular. Escândalo! Os ianques foram lá e mataram o sujeito dentro de casa! Pois é. Fizeram isso mesmo. As coisas deveriam ser levadas de outro modo? Vejamos, então, em que consistiria a tal conduta regular, pela qual tudo andaria nos trinques. Segundo esses estrategistas de day after, o governo ianque, alertado de que Bin Laden morava em um casarão fortificado, próximo a instalações militares da cidade de Abbottabad, deveria:1º) solicitar ao governo paquistanês, através da embaixada em Islamabad, que confirmasse presença do líder da Al Qaeda, em território daquele país soberano, no endereço indicado e, se possível, que o prendesse para investigações; 2º) o governo do Paquistão teria que postular isso perante seu Poder Judiciário (afinal, se há juízes em Berlim deve havê-los também no Paquistão, não é mesmo?); 3º) cumpridas essas preliminares, levada a cabo a investigação inicial, confirmada a presença do terrorista, a justiça paquistanesa determinaria à autoridade policial que retornasse ao bunker de Bin Laden e o prendesse; 4º) os EUA, então, peticionariam a extradição do preso com a finalidade de julgá-lo em território norte-americano, segundo suas leis; 5º) no caso de não haver acordo de extradição entre os dois países, seria necessário firmar um termo de reciprocidade pelo qual o governo do senhor Obama se comprometeria a agir simetricamente em circunstâncias análogas e inversas; 6º) por fim, obtida a extradição, proceder-se-ia ao julgamento de Bin Laden nos Estados Unidos. Não mencionei aqui a indispensável presença de advogados de defesa interpondo habeas corpus e embargos em quase todas as etapas sucessivas à prisão do líder da Al Qaeda, porque um processo que não contemple amplas garantias à defesa do réu não pode ser considerado um processo regular. Ao fim e ao cabo, tudo andaria segundo os conformes e Bin Laden seria julgado. A menos que aparecesse no Paquistão um Tarso Genro de sherwani para duvidar da correção da justiça ianque e negasse a extradição. A tal conduta regular, prezado leitor, seria algo assim, ou mais ou menos assim, dependendo da ordem jurídica do Paquistão. Como se vê, esses conselheiros presidenciais de internet e mouse desejavam tanto que Bin Laden pagasse por seus crimes quanto você está interessado na captura de tubarões brancos no arquipélago de Vanuatu. Estou de brincadeira? Não. De brincadeira está quem imagina que as coisas deveriam ser conduzidas, mesmo, desse modo. Houve quem citasse como modelo para a ação os julgamentos de nazistas em Nürenberg, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, e o recente processo contra Saddam Hussein. Deduziam daí que teria havido, em relação a Bin Laden, um retrocesso na conduta norte-americana. Aqueles casos, porém, se referem a julgamentos ocorridos após as respectivas guerras, em tempo de paz. A guerra contra o terror, diferentemente, é uma guerra em curso. Tanto está em curso que a Al Qaeda já revidou. E sempre é bom lembrar aos que se consideram longe do problema: o ataque às Torres Gêmeas não feriu apenas os EUA; o ataque aos trens de Madrid não feriu apenas a Espanha. Nos aviões, nos prédios, nos trens havia gente do mundo inteiro. Eis por que caberia aos Estados Unidos, nas circunstâncias, agir como agiu. Aliás, nenhum comando militar, em país algum, ciente de que o QG de seu inimigo está acessível em tal ou qual lugar, deixará as armas de lado para agir por via diplomática e jurídica. Nem general bêbado faz uma coisa dessas. A lista de abusos e tropelias norte-americanas é imensa, mas não creio que os fatos do dia 2 de maio façam parte dela. ______________ * Percival Puggina (66) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

Percival Puggina

08/05/2011
twitter: percivalpuggina Poucas coisas tão postiças quanto a sabedoria dos intelectos vaidosos. E poucos tão infelizes quanto os que pretendem beber a felicidade no próprio copo, de canudinho, como refresco. Comecemos pelos primeiros, pelos enfatuados do próprio saber. Para eles, todo espelho é mágico e lhes atira beijos. Lambem seus títulos. Devoram as próprias palavras após pronunciá-las para que nada se perca de seu sabor. E vão engordando de lipídios um orgulho autógeno, encorpado pelas lisonjas alheias e pelas que generosamente dedicam a si mesmos. De quem falo? Bem, pessoas assim estão em toda parte. Não posso dizer que formam um exército numeroso porque não há exército composto apenas por generais de quatro estrelas. Andam dispersos, portanto. Mas se há um lugar onde, por dever de ofício, se reúnem expoentes de tal conduta, esse lugar é o STF. Chega a ser divertido assisti-los desde a perspectiva pela qual eles mesmos se veem. Aferi-los pela infinita régua com que se medem. Apreciar o esforço que fazem para ostentar sabedoria. As frases lhes saem lustradas, polidas como corneta de desfile. Não que isso seja mau em si, mas chama atenção como parte da grande encenação das vaidades presentes. Imagino que por vezes se saúdem assim: E sua vaidade como vai, excelência?. E o outro retruca, cortesmente: Bem, bem, recuperando-se do último voto vencido, mas as perspectivas são boas, obrigado ministro. Nada mais próprio do que a palavra corte para designar aquele colegiado (cuja importância para a democracia e o Estado de Direito - esclareço porque não quero ser mal entendido - ergue-se acima dessas fragilidades humanas). É uma corte. É uma corte onde todos exercem, sobre o Direito a que estamos submetidos, uma soberania irrestrita, que flutua em rapapés e infla os egos à beira do ponto de ruptura. Se há alguém, ali, cuja vaidade consegue sobressair-se dentre todas, esse é o ministro Marco Aurélio Mello. Imagino o mal-estar que cause entre os demais quando se põe a lecionar-lhes. No plenário ele é o Verbo. Sua excelência sequer fala como as pessoas comuns falam. As palavras lhe saem arquejadas, numa espécie de sopro divino, criador, forma verbal das cintilações do astro rei da constelação. Ante um brilho desses só se chega usando óculos escuros e protetor solar. Pois bem, quando os ministros sentaram para decidir sobre direitos das uniões homoafetivas, Marco Aurélio Mello resolveu atacar a Igreja. Foi até a Inquisição, passeou sobre os diferentes doutrinadores a respeito da relação entre a Moral e o Direito - círculos concêntricos, círculos secantes, mínimo ético e por aí passeou, sempre buscando deslegitimar a influência religiosa sobre a moral social e sobre o Direito. Por fim, abraçou-se à tese de uma desembargadora gaúcha, para quem a família formada por homem, mulher e prole é coisa voltada para o patrimônio e causa da infelicidade universal. No viés proposto, família é qualquer outro arranjo possível, enquanto perdurar a felicidade de cada um. Muitos doutrinadores da zorra geral chamam a essa coisa transitória de família eudemonística (eudemonia é felicidade em grego). Pergunto ao senso comum do leitor: mas não é exatamente essa visão egoísta, a busca de uma felicidade que transforma os outros em bens de consumo a causa determinante da infelicidade geral e das desagregações familiares? Pergunto a pais e mães neste dia das mães: pode existir família onde não exista capacidade de renúncia e de sacrifício? Não é esse egoísmo deslavado que arrasta ao abandono e ao desabrigo tantas mães cujos maridos foram buscar felicidade em outros ninhos? Os membros de nossa Suprema Corte talvez se bastem com a própria vaidade. Mas nem a vaidade, nem a fruição da felicidade como um refresco tomado em canudinho são capazes de gerar conteúdos válidos para orientar a harmonia social aqui onde nós, os humildes cidadãos, levamos responsavelmente nossa vida, nossos deveres e nossos amores. Foi-lhes dado, senhores, o poder para decidir o que bem entendam. Decidam, mas não ensinem o mal ao povo. ______________ * Percival Puggina (66) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.